Acórdão nº 1931/06 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução12 de Julho de 2006
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Recorrente: “A...

” Recorrido: Ministério Público; e B...

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Acordam na secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I. – Relatório.

Desavindo com a decisão que não admitiu o requerimento em que pretendia comprovar a anunciada falta de indícios exarada no despacho de adesão à informação e indicação viática do Senhor Coordenador de Investigação Criminal, recorre a assistente, “A...”, despedindo a diserta com o sequente acervo conclusivo: “B-1: Não estava vedado ao Mmo. Juiz, contrariamente ao que se entendeu no acórdão para fixação de jurisprudência, do Supremo Tribunal de Justiça, que o mesmo cita, determinar a notificação da assistente para afeiçoamento do requerimento e abertura da instrução. Porém, B-2: afigura-se que isso seria desnecessário, uma vez que pode afirmar-se que o mesmo cumpre, minimamente, os requisitos formais da parte final do nº 2 do artigo 287°, do Código de Processo Penal B-3; razão pela qual este comando foi viola o, por demasiadamente estreita consideração da referida exigência B-4: e assim, como consequência, violado foi a norma do nº 7 do artigo 32° da Constituição da República Portuguesa, norma, pura e simplesmente, desconsiderada pelo Mmo. Juiz Por outro lado, B-5: também relativamente ao disposto n, parte final do nº 3 do artigo 287º, do Código de Processo Penal, salvo o devido respeito, incorreu o senhor juiz em erro interpretativo B-6: pois, contrariamente ao referido pelo douto julgador a referida norma não recobre a situação dos autos. Ao considerar, ao invés B-7: o douto julgador violou o disposto o nº 4 do artigo 32º do diploma fundamental e, bem assim, o nº 1 do algo 286º, do Código de Processo Penal, norma do direito legislado esta de valência constitucional, nas quais o Mmo juiz não atentou. Outrossim, B-8: o Mmo juiz acabou por desconsiderar o verdadeiro vício que inça a situação em apreço, é o da nulidade insanável do inquérito B-9: nos termos da alínea d) do artigo 119º do mesmo Código, pelo que lhe competia, uma vez que se deu conta de a, declarar a nulidade da referida fase processual. Ora, B-10: ao omitir esta declaração de nulidade o Mmo juiz incorreu em omissão de pronúncia, uma vez que a mesma é oficiosamente cognoscível B-11: e, por conseguinte, na violação de tal comando que, salvo o devido respeito, pura e simplesmente ignorou. Finalmente, B-12: não assiste também razão ao senhor juiz quando sugere que recorrente cabe reclamar hierarquicamente do despacho de arquivamento, porquanto um tal mecanismo é de apelo facultativo, sendo certo que, ultrapassado está o prazo legalmente estabelecido para o efeito B-13: pelo que o Mmo juiz procedeu a irrita interpretação do disposto no artigo 278º, do Código de Processo Penal, ao parecer considerar que a reclamação hierárquica funciona como que uma actuação prévia à pretensão de abertura da instrução B-14: e, bem assim, do artigo 279º, do Código de Processo Penal, uma vez que a reabertura do inquérito" só pode ocorrer, nos casos, por certo, excepcionais, do surgimento superveniente, de elementos de prova que sejam novos para quem fez desencadear o procedimento criminal, ou para o assistente B-14: pelo que, na procedência do presente recurso, deverão V.as EX.as anular a decisão recorrida, com as legais consequências”.

Na instância, o digno magistrado do Mº Pº, é de opinião que o despacho que desestimou a pretensão da assistente, não violou qualquer dos preceitos com que é apenado na douta motivação que ceva o pedido de revogação do predito despacho.”1-Na decisão recorrida, foi correcta e legalmente rejeitado o requerimento formulado pela assistente apara abertura de instrução; 2-O requerimento em causa não obedece as requisitos do disposto no art. 287.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não contendo em súmula as razões de facto e de direito de discordância com o despacho de arquivamento do Ministério Público, nem o lugar, o tempo, a motivação da prática e o grau de participação que o arguido possa ter tido, nem quaisquer outras circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe possa ver a ser aplicada; Pelo que, consequentemente, a instrução é legalmente inadmissível, devendo manter-se o despacho recorrido em conformidade”.

Mais assertivo e enxundioso é o arguido B..., que faz desaguar a motivação no iterado acervo conclusivo que de seguida se transpõe, por economia de meios.

“1- O Juiz de Instrução, não obstante investigar autonomamente o caso submetido a instrução, tem de ter em conta e actuar dentro dos limites da vinculação factual fixados pelo requerimento de abertura da instrução - cfr. art. 288º, nº 4 do C. P.P ..

  1. - O requerimento de abertura da instrução constitui, pois, o elemento fundamental para a definição e determinação do âmbito dos limites da intervenção do Juiz na instrução: investigação autónoma, mas autónoma dentro do tema factual que lhe é proposto através do requerimento de abertura da instrução.

3- Este requerimento não está sujeito a formalidades especiais, mas deve conter, em súmula, os elementos que são enunciados n artigo 287°, nº 2 do C.P.P., sendo ainda aplicável ao requerimento do assistente (no caso de. arquivamento do processo, como sucedeu in casu) o disposto no artigo 283°, nº 3, alíneas b) e c) do mesmo diploma legal. Ou seja, o mesmo deve conter, para além do mais a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo, a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada e a indicação das disposições legais aplicáveis.

5- Na definição do objecto processual que vai ser submetido ao conhecimento e decisão do Juiz de Instrução há uma assimilação funcional entre a acusação do Ministério Público e o requerimento do assistente para abertura de instrução no caso de não ter sido deduzida acusação. Donde, 6 - O requerimento de abertura da instrução por parte do assistente (no caso de arquivamento do processo) não pode, em termos materiais e funcionais, deixar de revestir o conteúdo de uma acusação (alternativa ao arquivamento decididos pelo Ministério Público), de onde constem os factos que considerar indiciados e que integrem o crime, de forma a possibilitar a realização da instrução, fixando os termos do debate e o exercício do contraditório.

7- O requerimento de abertura de instrução formulado pelo assistente deve conter, para além do mais, uma acusação, que é acusação que o assistente entende que deveria ter sido deduzida pelo Ministério Público. 8- O requerimento de abertura de instrução formulado pelo assistente, não sendo uma acusação em sentido processual-formal, deve constituir processualmente uma verdadeira acusação em sentido material, que delimite o objecto do processo (da instrução). E, 9- Por isso, os termos e os limites dos poderes de conhecimento e de decisão do Juiz de Instrução - artigos 308° e 309° do C.P.P.

10- O requerimento do assistente com que pretenda, de modo processualmente necessário, útil e eficaz, fazer abrir a fase de instrução, e definir o seu objecto, tem de conter, ainda de que forma sintética, a narração dos factos que fundamentem a aplicação de uma pena, incluindo o lugar, o tempo e a motivação da sua prática e quaisquer outras circunstâncias relevantes e indicar as disposições legais aplicáveis - cfr., nomeadamente, art. 283º, nº 3 do C.P.P. E, 11- O M.mo Juiz de Instrução não pode acrescentar nada de essencial ao requerimento pois, se o fizer, a pronúncia será nula – cfr. artigo 309°, nº 1 do CPP; Sucede que: 12- O requerimento de abertura da instrução formulado pela recorrente A... não participa das características de uma acusação em sentido material, não respeitando, por isso, as exigências essenciais de conteúdo impostas pelos artigos 287º, nº 2, e, pelas alíneas b) e c) do nº 3 do 283º, todos o C.P.P. E, 13- Para além disso, como expressamente é referido no douto despacho/decisão proferido pelo M.mo J.I.C., o requerimento da assistente e recorrente A... não contém as seguintes indicações: "1) - Quem é que deve ser pronunciado? Não o diz. Não refere quem são os eventuais arguidos; - E porque factos? Também não os indica. Refere apenas aos crimes; - Onde, quando e porque foram praticados? Nada diz.

4) - Que grau de participação tiveram os eventuais vários arguidos? Nada refere; Isto é, para o juiz de instrução, são desconhecidos os arguidos, são desconhecidos a maior parte dos factos, são desconhecidas todas as demais circunstâncias. Não pode o juiz substituir-se à assistente na procura de tudo isso. Em tais circunstâncias, não pode admitir qualquer investigação por não identificação clara contra quem e em que termos possa ser dirigida uma pronúncia. Esta, a existir, seria nula.".

14- Da matéria acima exposta resulta, sem margem para dúvidas, que o requerimento que a assistente apresentou para a abertura da instrução não contém os elementos essenciais à função processual que lhe é assinalada, não é processualmente prestável para tal finalidade, o que equivale a dizer que não pode cumprir a função processual a que estaria vocacionado. E, 15- Em termos processuais tudo se passa, assim, como se não tivesse havido requerimento, o que determina a sua rejeição por inadmissibilidade legal e a impossibilidade de abertura de instrução nos termos do disposto no artigo 287º, nº 3 do C.P.P., como mui doutamente decidiu o M.mo J.I.C.

16- Quanto á possibilidade de mandar corrigir 0 aperfeiçoar o requerimento de abertura da instrução: O M.mo J.I.C. entendeu que o não devia fazer pelo seguinte conjunto de razões: "Primeiro, pela natureza do prazo peremptório, como é o prazo para requerer a abertura de instrução. Permitir tal convite, é superar tal natureza. O prazo para requerer a abertura da instrução é um prazo peremptório que não pode nem deve ser alterado por decisão judicial (Cfr. Ac. de fixação de...

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