Acórdão nº 07B1974 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Junho de 2007
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 21 de Junho de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça de um prédio ali situado e I AA Ldª intentou, no dia 5 de Julho de 1999, contra o Município de Mangualde, BB e CC, acção declarativa constitutiva, com processo ordinário, pedindo a declaração da nulidade da transferência da propriedade do Lote nº .. da Zona Industrial do ....., freguesia de Mangualde, de que o contrato de promessa está inalterado e é válido e eficaz apenas entre a autora o e Município de Mangualde e a anulação da substituição contratual dela pelo réu BB.
Fundamentou a sua pretensão na promessa do Município de Mangualde de lhe vender o referido terreno, para construção de uma fábrica de moldes e plásticos injectados, na autorização ilegal da cessão da posição contratual da autora para os réus BB e CC por não estar vinculada ao pedido de transferência feito pelo seu sócio DD. Os réus, em contestação, afirmaram a validade da cessão da posição contratual pela autora, BB e CC sustentaram a produção de efeitos jurídicos pelo contrato de permuta na esfera jurídica da primeira e a validade da cessão da posição contratual no contrato-promessa, chamaram à intervenção DD e EE e, em reconvenção, pediram a condenação deles e da autora no pagamento de 600 000$ a título de indemnização por danos morais, intervenção essa admitida em associação com a autora na reconvenção, impugnada pela última. Na réplica, a autora reafirmou o expendido na petição inicial e, na fase da condensação, foi rejeitada a tréplica de BB e de CC, julgada inadmissível a reconvenção e absolvidos da instância reconvencional a autora, CC e EE, julgada improcedente a acção, absolvidos os réus do pedido e condenada a autora por litigância de má fé.
Apelou a autora, e a Relação, por acórdão de 3 de Abril de 2001, negou provimento ao recurso, do qual a apelante interpôs recurso de revista, e o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão proferido no dia 19 de Dezembro de 2001, negou revista quanto à validade formal originária da cessão de posição contratual e, no tocante à eventual nulidade ou anulação subsequente do contrato, celebrado na República da África do Sul, determinou a ampliação da matéria de facto e sua subsequente valoração jurídica.
A Relação, por acórdão proferido no dia 26 de Fevereiro de 2002, ordenou a remessa do processo ao tribunal da 1ª instância, a fim de ser organizada a base instrutória contendo a matéria de facto controvertida e relevante para a posterior averiguação da validade do aludido contrato.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 20 de Fevereiro de 2006, por via da qual os réus foram absolvidos do pedido de declaração de nulidade ou de anulação do contrato e de indemnização por enriquecimento sem causa, e condenado CC na multa correspondente a dez unidades de conta por litigância de má fé e no pagamento das custas da acção.
Apelou a autora, e a Relação, por acórdão proferido no dia 24 de Outubro de 2006, negou provimento ao recurso.
A apelante interpôs recurso de revista do referido acórdão, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - a sistematização das ocorrências retratadas na matéria de facto revela que DD e EE não se apropriaram do imóvel e que apenas nele residiram por um curto espaço de tempo, sem que tal apropriação de facto se tivesse consubstanciado em apropriação de direito; - a transferência da propriedade para DD e EE ficou sem eficácia jurídica porque o prédio penhorado reverteu para a esfera patrimonial de BB e de CC, para não prejudicarem os credores; - as declarações de DD de EE não têm o sentido de reconhecimento de se não tratar de uma disposição sem valor patrimonial porque houve contraprestação por via do pagamento do prédio; - o negócio oneroso da transferência da posição contratual em causa envolveu uma contraprestação por investir BB e CC na titularidade da posição de promitentes compradores e de um valor equivalente ao sinal já pago; - o acórdão subestima a contraprestação adquirida em Portugal por BB e CC, não valorou os efeitos da invalidade do negócio sobre a cessão operada em Portugal e não mantém a equidade nos resultados das negociações operadas entre as partes; - extraindo a sentença da lei sul-africana que o negócio foi declarado sem valor, não o pode considerar sem valor patrimonial uma vez que ele operou em Portugal e aumentou e enriqueceu a esfera patrimonial de BB e de CC; - ficou prejudicado o negócio celebrado na África do Sul porque DD e EE não puderam entrar na posse do prédio que BB e CC haviam vendido como contraprestação no mesmo; - deve operar a resolução do contrato, ou seja, a destruição da relação contratual operada e fazer regressar as partes à situação em se encontrariam se o contrato não tivesse sido celebrado e manter-se válido e eficaz o contrato-promessa celebrado entre a autora e a Câmara Municipal de Mangualde; - o enriquecimento sem causa é regulado pela lei com base na qual se verificou a transferência do valor patrimonial a favor do enriquecido e, caso não sejam aceites os motivos constantes da causa de pedir, tem sempre que se lançar mão do disposto nos artigos 473º e 474º do Código Civil; - se a pretensão de resolução do contrato não for atendida, ocorrem os pressupostos do enriquecimento sem causa, porque há uma relação imediata e de causalidade directa entre o enriquecimento de BB e de CC e o empobrecimento dos recorrentes, que não podem ser indemnizados de outra forma; - não resulta dos articulados dos recorrentes que hajam litigado de má fé, sendo BB e CC quem no processo fizeram crer inexistir contra eles processo executivo não obstante as notificações que receberam; - BBe CC têm trazido para a recorrente e sócios enormes problemas de ordem financeira e do foro psicológico, pelo que se não justifica a sua condenação por litigância de má fé; - foram violados os artigos 220º, 286º, 424º, 432º e 473º do Código Civil, pelo que o acórdão deve ser revogado.
II É a seguinte a factualidade declarada provada nas instâncias: 1. A autora foi constituída no dia 16 de Dezembro de 1992, com um capital social de 400 000$, por FF, casado com GG, e DD, casado com EE, cada um com uma quota de 200 000$, com gerência de ambos e assinatura de qualquer deles para a obrigar.
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Em 14 de Abril de 1993, o presidente da Câmara Municipal de Mangualde, em representação daquela, e o representante da autora, declararam por escrito, prometerem: - a primeira vender á segunda, e esta comprar, por 4 732 000$, o lote de terreno nº 16, sito na Zona Industrial do ....., freguesia de ....., com a área de 6 760 metros quadrados destinado à construção pela última de uma fábrica de moldes e plásticos injectados; - entregar a segunda à primeira, como sinal e princípio de pagamento, 1 892 800$; - na altura da celebração da escritura, em complemento do preço do negócio, dever a segunda entregar à primeira mais 1 892 800$ e pagar o restante do preço - 946 400$ - no prazo de 12 meses a contar da celebração da dita escritura; - obrigar-se a segunda a iniciar, no prazo de um ano, a contar de 14 de Abril de 1993, a construção das suas instalações fabris e solicitar por escrito à primeira a celebração da escritura definitiva de compra e venda daquele Lote; - obrigar-se a segunda a pôr a funcionar a mencionada unidade fabril dentro dos doze meses subsequentes à data da escritura definitiva; - reverter automaticamente o dito lote de terreno para o património do Município de Mangualde, sem direito a qualquer indemnização, com a perda do sinal estipulado, no caso da segunda não cumprir a obrigação de iniciar no prazo de ano a construção das suas instalações fabris e de solicitar à primeira, por escrito, a marcação da escritura do lote; - não poder o lote de terreno ser transaccionado pela segunda durante o período de vigência do contrato-promessa, ou seja, até à celebração da escritura definitiva.
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A autora veio a construir naquele lote de terreno a fábrica em referência, o loteamento em que o referido lote se integra ainda não foi aprovado, e a respectiva escritura publica não foi levada a efeito.
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Por carta de 2 de Dezembro de 1994, endereçada ao Presidente da Câmara Municipal de Mangualde, recebida nesse dia, DD requereu-lhe "autorização para transferir "a minha aquisição do Lote nº ..da Zona .....do .......para segundos, expressando que "Os motivos desta decisão já foram expressos a V.Exª. em carta de Julho de 1994, que passo a enumerar: falta de mão-de-obra especializada no meu sector; não colaboração do Instituto de Emprego e Formação Profissional na formação de pessoal como tinha sido estimada; isolamento desta empresa no contexto do sector de trabalho e da Região a que este se destina, moldes e plásticos; as dificuldades financeiras de todo o projecto, baseando-se na ¬não laboração e capitais investidos e as dificuldades encontradas nas respectivas licenças e legalização do projecto; estas são as principais dificuldades encontradas para poder desenvolver a actividade a que me propus, e existe neste momento uma empresa de origem estrangeira que está interessada na aquisição deste lote industrial e instalações. Querendo esta empresa começar a laborar já em Janeiro, julgo que estariam preenchidos os requisitos e intuitos de V. Exa. para desenvolver o parque industrial da Cidade de Mangualde" 5. Em 20 de Dezembro de 1994, foi averbado ao documento mencionado sob 2 que, por deliberação de 12 de Dezembro de 1994, foi autorizada a transferência do citado Lote nº ...para HH Lda", com sede em Viseu.
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Foi registada no dia 15 de Abril de 1996, a transmissão a favor EE a quota de 200 000$, por cessão de FF e de GG, cessando aquele as funções de gerente por renúncia no dia 2 de Março de 1994, registada em 15 de Abril de 1996.
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Foi registada no dia 14 de Abril de 1997 a alteração do respectivo pacto social, passando a figurar como únicos sócios e gerentes da autora, DD e EE, bastando a assinatura de qualquer um deles para a obrigar.
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Por escritura outorgada em Joanesburgo, República da África do Sul, no dia...
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