Acórdão nº 06P2674 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelSORETO DE BARROS
Data da Resolução11 de Abril de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

"AA", identificado nos autos, recorre do acórdão de 29.03.06, do Tribunal da Relação do Porto (proc. n.º 3511/04), que negou provimento ao recurso que o arguido havia interposto do acórdão do Tribunal da Comarca de Vila Pouca de Aguiar (proc. n.º 13/02), que, em síntese, o havia condenado, por autoria de um crime de violação, p. e p. pelos art.s 164.º, n .º 1. e 177.º, n.º 4., do Código Penal, na pena de sete anos de prisão (para além da indemnização de 40.000 euros, por danos patrimoniais e não patrimoniais, segmento que, aqui, não está autonomamente em causa).

1.

1 O recorrente termina a motivação com as seguintes conclusões : 1.

Há violação das normas constantes do artigo 412º do CPP quando se não manda proceder à Renovação das provas como alegado e requerido foi em sede de recurso para o Tribunal da Relação do Porto, o qual nem sequer se pronunciou quanto a essa questão.

2.

Da prova produzida em audiência de discussão e julgamento extrai-se, salvo o devido respeito, a conclusão de que não houve qualquer ameaça; 3.

Não se verifica a existência do elemento violência que o Tribunal a quo deu como provada ao dar como provado "arrastou".

4.

Não se verifica a existência de elementos para que seja considerado ter havido "movimento rítmico", nem deveria o tribunal ter julgado no sentido de que houve cópula.

5.

Da prova pericial efectuada não resulta claramente que tivesse havido qualquer violação nem indícios suficientes para se poder concluir sem que reste qualquer sombra de dúvida pela existência da mesma já que o Douto acórdão proferido dá como não provado que "a laceração do hímen descrita e examinada a fls 107/108 seja consequência da actuação do arguido".

6.

Da matéria provada não resulta claramente provado que o arguido tivesse praticado o crime de que foi acusado o que, no nosso modesto entender, e em caso de dúvida como é a resultante da análise da prova produzida na audiência de discussão e julgamento, sempre deveria o arguido beneficiar da aplicação do princípio in dúbio pro reo, verificando-se, por isso, nítida violação desse princípio.

7.

O arguido é um jovem, devidamente integrado no meio social que o rodeia.

8.

Não se lhe conhecem quaisquer antecedentes criminais, foi e é pessoa que sempre soube comportar-se, é pessoa que é afável, prestativa, amiga de ajudar o próximo.

9.

É um indivíduo trabalhador, assíduo ao seu trabalho, respeitador.

10.

Contribui com o seu vencimento para ajuda nos gastos familiares já que vive com sua mãe e mais dois irmãos, estes também solteiros, sendo a sua condição económica modesta e tem a instrução primária obrigatória.

11.

Nada se consta acerca de comportamentos gravosos do arguido quer anteriores quer posteriores.

12.

O arguido é pessoa humilde, ordeira, respeitada e respeitadora.

13.

Nunca antes esteve preso nem nunca respondeu em Tribunal, nem nunca faltou a qualquer diligência a este Tribunal, nem nunca faltou ao cumprimento das obrigações que lhe foram impostas, o que ainda hoje faz.

14.

O arguido não é pessoa com inclinação para o crime nem que revele falta de preparação para manter conduta ilícita.

15.

Entendemos, com a devida vénia, que, da matéria constante das conclusões de 1 a 12, o Tribunal incorreu nos vícios tipificados no n° 2 do art. 410º do CPP que originarão, salvo o devido respeito, o reenvio do processo a novo julgamento.

16.

Os pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados, as provas que impõem, na sua perspectiva, decisão diversa da recorrida e as provas que no seu entender deverão renovadas são as indicadas supra em IX que aqui se dão por integralmente reproduzidos, sob pena de violação das normas constantes do artigo 410º do CPP.

17.

Verifica-se a violação das normas constantes dos artigos 40º nºs 1 e 2, 71 nºs 1 e 2, 72º, 73º e 127º todos do CPenal, bem como do preceituado no art. 410º do CPPenal, com cuja aplicação levarão à redução da pena de prisão aplicada.

Termos em que e nos melhores de direito que V. E.xas suprirão se requer seja concedido provimento ao presente recurso com as legais consequências. (fim de transcrição) 1.

2 O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos, com efeito suspensivo. (fls. 810) 1.

3 Respondeu o assistente, que concluiu do seguinte modo : 1° - O douto acórdão recorrido não infringe qualquer preceito legal, enquadra-se perfeitamente na letra e no espírito da lei, é absolutamente legal e fundamentado, pelo que não existe motivo para a sua alteração.

  1. - O Tribunal da Relação do Porto procedeu ao reexame crítico das provas, respondendo especificadamente às questões colocadas pelo recorrente e explicando quais as provas que, contrapostas às aduzidas pela defesa, permitiram concluir pela prática, por parte do arguido, do crime de que vinha acusado.

  2. - A lei basta-se com a referencia a determinado testemunho, não sendo exigível a sua reprodução mecânica no acórdão, para que o mesmo sirva de base decisória, ou para que se possa aferir do reexame crítico das provas.

  3. - O Tribunal da Relação do Porto procedeu à transcrição do testemunho da menor BB, do qual se conclui, para além de qualquer dúvida, pela existência de relacionamento sexual entre o arguido e a menor BB.

  4. - Testemunho que tem de ser analisado à luz dos relatórios supra referidos e que concluem pela veracidade do relato efectuado pela menor BB e que o Tribunal da Relação do Porto analisou criticamente.

  5. - O Apelante AA, cinge, no essencial, as suas alegações aos seguintes pontos : 1- Ao vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

    2- Ao vício da contradição insanável entre a fundamentação e a decisão.

    3 - Da violação do princípio" in dubio pro reo ".

    4 - Da medida da pena.

  6. - O presente recurso não versa sobre a matéria de facto, versando o presente recurso unicamente sobre matéria de direito, sendo que só quanto a esta e com base nos factos dados como provados pelo Tribunal colectivo e confirmados pelo Tribunal da Relação do Porto se limita o recurso intentado.

  7. - A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada não se confunde com a insuficiência da prova para a decisão de facto proferida, pelo que não pode ser posta em causa a liberdade de apreciação de que dispõe o Tribunal colectivo na analise da prova produzida em audiência de julgamento.

  8. - No que concerne ao vício da contradição insanável ente a fundamentação e a decisão e relativamente ao caso concreto é óbvio que a conclusão a que chegou o Tribunal Colectivo não sofre de qualquer irrazoabilidade passível de ser patente a qualquer observador comum nem ofende as regras da experiência comum. O Tribunal Colectivo ponderou todos os elementos não havendo défice de investigação. Lida a prova transcrita constata-se uma bem fundada convicção objectivada e motivada.

  9. - Determinados meios, como a violência, a ameaça, a privação de liberdade da vítima, não são pressupostos objectivos do crime de violação, particularmente no crime de violação de menores de 12 anos, como é o caso, que é punido independentemente dos meios empregados.

  10. - A vítima não necessita de lutar até ao esgotamento para haver violência, há violência sempre o acto seja praticado contra ou sem a sua vontade, sendo que sempre seria irrelevante o consentimento para a cópula, quando este não for livre ou se trate de menor de 12 anos.

  11. - O depoimento da menor BB é credível, "tendo não só em conta a forma segura como o depoimento foi prestado, mas também os demais elementos probatórios", em tudo coincidentes com as suas declarações.

  12. - Ficou provado para além de qualquer dúvida razoável, que o arguido, " ao mesmo tempo que tapava a boca da menor para esta não gritar, introduziu o seu pénis erecto na vagina da mesma, onde esteve com o mesmo bastante tempo. após o que o retirou saindo decima dela ( BB ) e vestiu-se." tendo assim arguido com o propósito de manter cópula com a menor BB.

  13. - Deve considerar-se acto análogo a cópula, por já lesar os bens jurídicos protegidos, a fricção do pénis dentro da vulva de uma menor de 12 anos, independentemente de ter havido ou não «imissio seminis». Esta também não é necessária à consumação da copula vaginal, que a lei toma como referência para o acto análogo, bastando que se pense no chamado coito interrompido, na impossibilidade física de ejacular ou no uso de preservativos - casos em que a cópula se verifica igualmente, só se exigindo a introdução, mesmo parcial, do pénis na vagina.

  14. - Assim, tem de concluir-se que bem andou o Tribunal Colectivo e o Tribunal da Relação do Porto ao terem considerado que a cópula ocorreu e que a mesma só foi possível devido à violência utilizada pelo arguido sobre a menor BB.

  15. - Todos os exames considerados úteis para a investigação foram realizados, muito estranhando o Apelado que o arguido faça referência aos mesmos, pois se durante todo o inquérito e instrução nunca requereu tais exames, quem sabe não querendo correr o risco de ver os seus resultados.

  16. - Falecem assim os argumentos aventados pelo aqui Apelante, não descortinando o Apelado quaisquer razões para que o processo seja reenviado a novo julgamento.

  17. - A virgindade não é elemento essencial do crime de violação, mesmo que o exame pericial não seja conclusivo, dada a existência de himens complacentes.

  18. - É despropositada a invocação do princípio" in dubio pro reo " se não existe nenhuma dúvida de ter o arguido cometido o crime que lhe foi imputado.

  19. - A conduta levada a cabo pelo arguido, atendendo aos factos dados como provados em sede de julgamento, e mantidos na integra pelo Acórdão de que ora se recorre, demonstra suficientemente a prática de um crime de violação agravada, na forma consumada, p e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 164°, nº 1, e 177°, nº 4, do Código Penal.

  20. - A decisão do Tribunal da Relação do Porto, não violou qualquer normativo legal, pois tendo em conta os factos que foram dados como provados e a gravidade das lesões sofridas pela ofendida...

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