Acórdão nº 07B497 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução08 de Março de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I "AA", instaurou, no dia 8 de Abril de 2001, contra o Estado Português, no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, através de patrono por ela escolhido, com pagamento de honorários no quadro do apoio judiciário, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe 500 000 000$, a título de indemnização por danos não patrimoniais resultantes do seu desgosto e sofrimento em virtude de haver decretada judicialmente a adopção plena do seu filho, BB, retirando-lho sem razões atinentes de facto e de direito, com base em informações, relatórios de assistentes sociais, de técnicos de reinserção social, de pareceres de magistrados do Ministério Público falsos ou ilegais.

Na contestação, excepcionou o réu a incompetência material do tribunal e a ilegitimidade passiva, e impugnou, contrapondo, por um lado, que relativamente ao dito menor havia uma situação de risco social, necessitando de uma medida de protecção e que isso justificou a adopção.

E, por outro, que as informações e os relatórios sociais tinham sido prestados com verdade, mediante visitas ao domicílio dos pais do menor, observação das condições em que eles viviam, entrevistas, informações médicas sobre a real situação do nascimento, desenvolvimento psico-afectivo e material do menor e dos seus pais, sem que algum interveniente tivesse abusado das suas funções.

O apoio judiciário na modalidade de patrocínio e de dispensa de pagamento de taxa de justiça e de outros encargos com o processo foi concedido à autora por despacho proferido no dia 8 de Maio de 2001.

Absolvido o réu da instância com fundamento na incompetência material dos tribunais da ordem administrativa por sentença proferida no dia 15 de Julho de 2002, o processo foi remetido à Vara Mista do Tribunal de Braga a fim de aí prosseguir nos seus termos.

No despacho saneador foi o réu declarado parte legítima, realizou-se a audiência de julgamento, na sequência da qual foi proferida sentença, no dia 20 de Abril de 2005, por via da qual o réu foi absolvido do pedido.

Apelou a autora, impugnando também a decisão da matéria de facto, e a Relação, por acórdão proferido no dia 26 de Outubro de 2006, negou provimento ao recurso.

Interpôs a apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - deve valorar-se o depoimento do desembargador CC e desvalorizar-se o depoimento das assistentes sociais; - a recorrente e o pai do menor não punham, por acção ou omissão, em perigo a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação dele; - as informações prestadas pelos serviços sociais de apoio não foram correctas nem verdadeiras, pois não versavam sobre a situação fáctica efectivamente existente, visando tão só atingir a adopção do menor; - o pai nunca foi ouvido no processo de adopção, a recorrente só o foi sobre o requisito legal do consentimento, e nunca houve factos justificativos da confiança judicial do menor ou da dispensa de consentimento para adopção; - foram impedidos de se pronunciar sobre os factos contra si deduzidos porque nunca receberam cópia de articulados, relatórios, informações ou exames e ela apenas foi confrontada com a cópia da decisão de adopção; - a recorrente foi sempre mãe carinhosa a lutar pelo filho, deixou de beber por lhe ter sido assegurado que se o fizesse ser-lhe-ia entregue, e sempre ela e o pai lutaram por ele; - as informações prestadas pelos serviços sociais de apoio não foram correctas nem verdadeiras, pois não versavam sobre a situação fáctica efectivamente existente, visando tão só atingir a adopção do menor, como ocorreu; - decidiu-se erradamente com base na informação da Maternidade onde ocorreu o parto por lhe terem sido detectados problemas psíquicos, mas não foi avaliada por qualquer técnico com vista à decisão; - o encaminhamento do menor para a adopção violou as regras processuais e substantivas do instituto em causa, e a indicação de família idónea só poderia ter como finalidade a aplicação de medida de protecção do menor e dos seus pais; - a falta de fundamento da dispensa do consentimento implica a nulidade da decisão de adopção, não relevando as reais vantagens que para o adoptando advenham da adopção; - não havia nem há fundamento que determinasse ou impusesse essa adopção, tendo-se feito errada aplicação do direito aos factos, e a recorrente sofreu e sofre enorme desgosto, perturbação e ansiedade por falta do filho único que lhe foi brutalmente subtraído; - a adopção do menor foi motivada por erro grosseiro de pareceres e informações gratuitas e intencionalmente vertidos nos autos, sem o mínimo de correspondência com a realidade, tendo-se feito errada aplicação do direito aos factos; - foram violados os artigos 341º, 346º,1918º e 1978º do Código Civil, e 3º e 517º do Código de Processo Civil, 12º, 18º, 19º, 26º, 146º, 157º, 166º, 194º-A e 198º da Organização Tutelar de Menores, os Decretos-Leis nºs 190/92 e 185/93 e os artigos 67º, 68º e 69º da Constituição.

Respondeu o réu, em síntese de conclusão:- a decisão da 1ª instância não merece reparo; - o recurso deve ser rejeitado porque reedita as questões levantadas no recurso de apelação; - as questões reeditadas estão fora do âmbito do recurso de revista porque só respeitam à decisão da matéria de facto.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. BB, nascido no dia 20 de Julho de 1994, é o único filho da autora, nascido quando ela tinha trinta e nove anos de idade, e de DD, quando ele tinha setenta e dois anos de idade e com ela vivia.

  1. DD tinha outros filhos, os quais, com excepção de um, por razões sucessórias, viram com desagrado o nascimento do irmão.

  2. A autora viu no nascimento do filho a sua realização como mulher, e, nos momentos e nos dias que se seguiram ao seu nascimento, mostrou-se preocupada com ele e com interesse em acompanhar o seu internamento.

  3. BB corria então risco se não fosse afastado da mãe e do pai.

  4. No dia 3 de Agosto de 1994, o Tribunal de Menores do Porto decidiu confiar provisoriamente BB ao Centro Regional de Segurança Social, para que providenciasse pelo seu encaminhamento, vindo o mesmo a ser colocado no Centro Social Padre David, onde esteve até 22 de Dezembro de 1995, data em que foi entregue ao casal com quem ainda se encontra.

  5. À data do nascimento do seu filho, tinha a autora sequelas de alcoolismo, e consumia, ainda, bebidas alcoólicas em excesso, e procurou tratamento de desintoxicação, em Nogueiró, sem sucesso.

  6. A autora e DD visitavam o filho, e aquela representou as alegrias que o nascimento de um filho produz e potencia, sabe que ele foi adoptado, sofre por via de tal adopção, deixou de poder tê-lo consigo e de vê-lo crescer e de o visitar.

  7. Os técnicos da segurança social puseram a autora ao corrente da situação do menor, foi ouvida nos processos tutelar e de adopção, pretendeu reavê-lo e opôs-se à sua adopção.

  8. As aludidas informações e relatórios sociais foram efectuados com base, quer em visitas ao domicílio dos pais do menor, onde eram observadas as condições em que viviam, quer em informações prestadas pela filha mais velha do pai do menor, de nome EE, quer em entrevistas aos pais do menor, quer na informação social do Hospital Júlio de Matos, onde o menor nasceu, quer no relatório médico do Centro de Acolhimento Infantil de Ruílhe, quer no relatório médico-psicológico do Hospital de São Marcos, de Braga.

  9. Por...

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