Acórdão nº 06S3955 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Fevereiro de 2007
Magistrado Responsável | SOUSA PEIXOTO |
Data da Resolução | 14 de Fevereiro de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na secção social do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório "AA" propôs a presente acção no Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Gaia contra a Associação Desportiva de ..., pedindo que a ré fosse condenada a pagar-lhe a importância correspondente às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença, bem como a indemnização de antiguidade e diversas importâncias a título de retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal e de indemnização por violação do direito a férias.
Em resumo, a autora alegou que foi admitida ao serviço da ré em Março de 1998, para trabalhar sob as suas ordens, direcção e subordinação, mediante a retribuição mensal líquida de 350 euros, tendo sido por ela ilicitamente despedida em 7 de Julho de 2002, por falta de processo disciplinar e de justa causa e mais alegou que nunca gozou férias nem recebeu qualquer retribuição a título de férias e de Natal.
A ré contestou alegando que o contrato celebrado com a autora não era de trabalho, mas sim de prestação de serviços, não tendo ela, por isso, direito aos créditos salariais peticionados.
Na 1.ª instância, decidiu-se que o contrato celebrado entes as partes era um contrato de trabalho subordinado e que a autora tinha sido ilicitamente despedida, tendo, por isso, a ré sido condenada a pagar à autora a quantia de 2.250 euros a título de indemnização de antiguidade, bem como a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença referente às retribuições que ela teria auferido desde os 30 dias que antecederam a data da propositura da acção até à data da sentença (5.11.2004) e às retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal referentes aos anos de 1998 e seguintes, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação.
A ré apelou da sentença, impugnando a decisão proferida sobre a matéria de facto e a qualificação jurídica dada ao contrato, mas o Tribunal da Relação do Porto julgou improcedente o recurso, o que levou a ré a interpor o presente recurso de revista, cujas alegações concluiu da seguinte forma: 1. O presente recurso tem por objecto a qualificação da relação jurídica existente entre a autora AA e a recorrente Associação Desportiva de ...., como contrato de trabalho (como pretende aquela) ou como contrato de prestação de serviços (como pretende esta).
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O douto acórdão recorrido decidiu tratar-se de contrato de trabalho.
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Para aferir da existência de contrato de trabalho ou de prestação de serviços devem verificar-se um conjunto de indícios que apontem num ou noutro sentido, apreciados na globalidade e sempre em função do caso concreto.
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No caso concreto destes autos, devem ser ponderados indícios como: 5. No tocante ao horário de trabalho, não foi dada por provada a existência de qualquer horário de trabalho.
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Quanto ao indício prestação de resultado ou desempenho de actividade, não restam dúvidas que a autora foi contratada para apresentar um resultado perante a recorrente, como produto do seu desempenho, que consistia na limpeza dos balneários e o tratamento das roupas.
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Não fora assim e como se compreenderia que a autora não reclamasse subsídio de férias e de Natal durante tantos anos.
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Sobre o indício da retribuição, verifica-se que a matéria dos itens 15 e 16 está em contradição com aqueloutra também considerada provada nos itens 44, 45 e 46 do mesmo acórdão recorrido.
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A respeito do indício segurança social e regime fiscal, sempre a autora agiu nessa conformidade, com a consciência de que recebia retribuição como prestadora de serviços e não como assalariada e que partilhava essa receita do seu agregado com a colaboração do marido BB e da própria filha de ambos.
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Por isso, declarou e confessou na acta (24/09/2004) que nunca incluiu essas retribuições na declaração de IRS como remuneração provinda de um contrato de trabalho, devendo a confissão da acta citada ser conjugada com a matéria provada dos itens 15 e 16 da sentença.
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O conjunto e escassez dos indícios dados como provados, para a qualificação do contrato em crise como contrato de trabalho, impõe a consideração do desempenho da autora com o de prestação de serviços, na esteira da doutrina geralmente aceite e da jurisprudência maioritária (Acórdão da Relação do Porto de 19/2/2001 - Colect. Jurisp., ano 2001, tomo I, pág. 251; da Relação de Lisboa de 2/2/2000, in Colect. Jurisp., Tomo I, pág. 270; da Relação do Porto de 9/10/2000, Colect. Jur., ano 2000, tomo IV, pág. 246 e Ac. S.T.J. de 22/11/2000, in Col. Jurisp.-Ac. ST J , III, pág. 288).
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As escassas instruções da recorrente não podem considerar-se indício de subordinação (Acórdão da Relação de Lisboa já citado e respectivas considerações das presentes alegações).
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Ao decidir de forma diversa, o douto acórdão recorrido violou o correcto entendimento do disposto no art.º 10.º e 12.º do Código do Trabalho e no art.º 1154.º do Código Civil.
A autora não contra-alegou e, neste Supremo Tribunal, a Ex.ma magistrada do M.º P.º emitiu parecer, a que as partes não responderam, no sentido da confirmação do julgado.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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As questões O objecto do recurso restringe-se à questão de saber se o contrato, ao abrigo do qual a autora prestou a sua actividade à ré, deve ser considerado de trabalho (tese da autora e das instâncias) ou de prestação de serviços (tese da ré).
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Os factos Os factos dados como provados na 1.ª instância e que a Relação manteve integralmente são os seguintes: 1) A autora foi admitida ao serviço da ré, em Março de 1998, para trabalhar sob as suas ordens, direcção e subordinação, contra a respectiva remuneração e desempenhava as funções de técnica de equipamento e funcionária de campo.
2) As funções exercidas pela autora eram desempenhadas por esta de acordo com as instruções dadas pela ré.
3) Nos últimos anos, a remuneração mensal da autora era de 350,00 € líquidos.
4) No dia 7 de Julho de 2003, cerca de 19h30 e após ter sido solicitada para arrumar as roupas dos jogadores, a autora foi despedida pela ré.
5) A ré despediu a autora sem efectuar um processo disciplinar.
6) À data do despedimento, a autora auferia como vencimento mensal a quantia de 375,00 € líquidos.
7) A autora não gozou as férias vencidas em 01/01/2003 nem recebeu qualquer quantia pelo ano de trabalho prestado em 2002.
8) Desde que a autora se encontra ao serviço da ré, esta nunca lhe pagou os montantes referentes ao subsídio de férias e subsídio de Natal.
9) Enquanto trabalhadora ao serviço da ré, a autora nunca gozou férias.
10) A autora nunca recebeu qualquer quantia a título de subsídio de Natal.
11) A autora assumiu perante a ré a obrigação de prestar os seguintes serviços: limpar os balneários e lavar os equipamentos.
12) A autora executava os serviços de limpeza dos balneários e lavagem dos equipamentos a seguir aos treinos ou provas desportivas da ré ou nos dias seguintes.
13) Lavava as roupas e equipamentos na máquina do campo.
14) Não era a ré quem escolhia ou comprava os produtos de limpeza, sacos do lixo, vassouras e diversos, mas era a autora quem assim procedia.
15) A autora pediu à anterior Direcção da ré para que regularizasse a situação na Segurança Social.
16) Tendo a citada Direcção anterior à actual, de acordo com a autora, acordado em declarar as horas dos serviços prestados à Segurança Social, para poder beneficiar das respectivas regalias sociais.
17) O cartão junto a fls. 9 é um cartão emitido pela Associação de Futebol do Porto destinado aos diversos colaboradores dos clubes inscritos naquela, de molde a permitir o acesso gratuito a todos os eventos desportivos em que a ré seja interveniente.
18) Em 7 de Julho de 2003, o Presidente da Direcção da ré fez sentir à autora que a Direcção estava descontente com a qualidade dos serviços prestados.
19) Tendo-lhe manifestado esse desagrado que era também o resultado de diversas queixas de directores e associados.
20) Comunicou-lhe ainda...
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