Acórdão nº 06P3137 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DA COSTA
Data da Resolução07 de Dezembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I.

RELATÓRIO 1.

No Tribunal Judicial da comarca da Póvoa de Lanhoso, no âmbito do processo comum colectivo nº 470/04.8GAPVL, foram julgados os arguidos AA, BB, CC e DD, todos identificados nos autos, e condenados: A) o arguido BB - a) como co-autor de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos art. 131º e 132º, n.º 1 e 2, alíneas d), g) e i), do Código Penal (CP), na pena de dezasseis (16) anos de prisão; - b) como co-autor de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos art. 203º e 204º, n.º 1, a) do C.P., na pena de um (1) ano de prisão; Em cúmulo jurídico pela prática dos referidos crimes, foi o arguido condenado na pena única de dezasseis (16) anos e seis (6) meses de prisão.

  1. o arguido CC: - a) como co-autor de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos art. 131º e 132º, n.º 1 e 2, alíneas d), g) e i), do C.P., na pena de dezasseis (16) anos e seis (6) de prisão; - b) como co-autor de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos art. 203º e 204º, n.º 1, a) do C.P., na pena de um (1) ano de prisão; - c) como autor de um crime de detenção ilegal de arma, previsto e punido pelo art. 6º, n.º 1 da Lei n.º 22/97, de 27/06 (redacção introduzida pelo art. 2º da Lei 98/2001, de 25/08), na pena de oito (8) meses de prisão; Em cúmulo jurídico, pela prática dos referidos crimes, foi este arguido condenado na pena única de dezassete (17) anos de prisão.

  2. o arguido DD - a) como co-autor de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos art. 131º e 132º, n.º 1 e 2, alíneas d), g) e i), do C.P., na pena de dezassete (17) anos de prisão; - b) como co-autor de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos art. 203º e 204º, n.º 1, a) do C.P., na pena de um (1) ano de prisão; Em cúmulo jurídico, pela prática destes referidos crimes e pelo crime de coacção pelo qual foi condenado no processo comum singular 144/03.5GDBRG, do 4º Juízo Criminal do Tribunal da Comarca de Braga, foi o arguido condenado na pena única de dezoito (18) anos de prisão.

    Na procedência parcial do pedido de indemnização, os arguidos foram ainda condenados solidariamente, enquanto demandados, a pagar aos demandantes a quantia de € 71.390,00 (setenta e um mil trezentos e noventa euros), acrescida de juros à taxa de 4%, desde a notificação do pedido e até integral pagamento. 2.

    Inconformados, recorreram para o Tribunal da relação de Guimarães, que negou provimento a todos os recursos.

    1. Mais uma vez irresignados, recorreram para este Supremo Tribunal, colocando as seguintes questões: A) - O arguido BB: - A co-autoria dos factos, afirmando que apenas as declarações do co-arguido AA inculpam o recorrente e, mesmo essas, em alguns pontos, excluem-no da co-autoria, e nos demais são contraditórias, incongruentes e cheias de hesitação; - As declarações incriminatórias dos co-arguidos exigem outras provas de corroboração, o que não aconteceu, sendo portanto nulas aquelas declarações; - Paira dúvida insanável sobre a conduta de cada um dos arguidos e sobre o seu contributo na produção do resultado; - Poderá com absoluta certeza dizer-se que: O recorrente não atraiu a vítima, nem se propôs assaltá-la, não a conhecendo, nem os seus hábitos (factos provados sob os n.ºs 1.º, 2.º, 3.º e 6.º); Não foi ele que levou o carro onde a vítima entrou (factos provados sob os n.ºs 5.º e 12.º); Não foi ele que entregou a pistola, que se encontrava no carro, nem era dono dela (facto provado sob o n.º 37); Não colaborou na remoção do cadáver (facto provado sob o n.º 36).

    - Por conseguinte, não praticou actos que se tornassem indispensáveis à produção do homicídio.

    - A decisão recorrida viola o art. 32.º da Constituição, o art. 374.º, n.º 2, por falta de fundamentação, e enferma de erro notório na apreciação da prova.

    - Ao não analisar em separado a conduta de cada arguido, a decisão recorrida não atendeu ao quadro factual que diminui de forma acentuada a culpa do recorrente, pelo que, a ser punido, este devia sê-lo nos termos do art. 72.º do CP.

  3. - O arguido CC: - A decisão recorrida assentou fundamentalmente nas declarações do co-arguido AA, que se mostraram contraditórias com as prestadas no inquérito e que foram lidas na audiência, e sem corroboração de outros elementos de prova; - Essa decisão enferma dos vícios das alíneas a) e c) do art. 410.º, n.º 2 do CPP; - E enferma de nulidade (a da alínea c) do art. 379.º do CPP), por não ter conhecido de todas as questões colocadas, nomeadamente a análise crítica e a valoração das declarações de co-arguido, incorrendo ainda em violação do art. 32.º, n.º 1 da Constituição; - Violou também os arts. 124.º, 125.º e 127.º do CPP e ainda o princípio in dubio pro reo.

  4. - O arguido DD: - A decisão recorrida assentou em prova proibida ao valorar as declarações de todos os arguidos prestadas perante o juiz de instrução, sendo certo que o recorrente não prestou declarações em audiência e as que prestou perante o JIC não podiam ser lidas em audiência; - Incorreu a decisão na nulidade prevista no art. 118.º, n.º 3, por referência ao n.º 1 do art. 355.º, acrescida da nulidade prevista no art. 356.º, n.º 8, para onde remete o art. 357.º, todos do CPP; - Incorreu ainda na nulidade prevista no art. 379.º, n.º 1, alínea c) do CPP, por não se ter pronunciado sobre todas as questões suscitadas, nomeadamente o exame crítico das provas, com referência às declarações produzidas pelo co-arguido AA durante o inquérito; - A factualidade provada não preenche os requisitos do homicídio qualificado, mas apenas do homicídio simples, pelo que o recorrente deveria, em última instância, ter sido condenado no quadro desse tipo legal; - Ainda que assim não fosse, a pena aplicada é excessiva.

    1. Respondeu o Ministério Público junto do tribunal «a quo», que pugnou pela manutenção do decidido.

    2. Respondeu também a assistente EE, que rebateu os pontos de vista dos recorrentes e concluiu pela improcedência dos recursos interpostos.

      Neste Supremo Tribunal, o Ministério Público teve vista dos autos.

      Colhidos os vistos, realizou-se a audiência de julgamento, na qual usaram da palavra o Ministério Público e a defesa dos arguidos.

      O Ministério Público considerou que a única questão relevante em termos de direito é a que diz respeito à forma de comparticipação dos arguidos BB e CC. Segundo o seu ponto de vista, ambos eles devem ser considerados cúmplices e não co-autores, já que não tomaram parte directa na execução do facto, mas apenas em actos preparatórios.

      A defesa alegou em sentido coincidente com o das motivações de recurso.

      1. FUNDAMENTAÇÃO 6. Matéria de facto apurada 6.1. Factos dados como provados: 1º- Desde data não determinada, mas pelo menos durante os meses de Outubro a Dezembro de 2004 que o arguido DD (o ‘…') vivia numa pensão sita na vila da Póvoa de Lanhoso; 2º- Durante o período em que permaneceu na área da vila e concelho da Póvoa de Lanhoso, este arguido foi-se apercebendo que, pelas diversas artérias desta vila, habitualmente deambulava, durante o dia e parte da noite, um indivíduo, por todos conhecido por ‘…', o FF, que não se coibia de exibir em público, diversas notas de quinhentos euros e outras de valor diverso, num total aproximado de cinco mil euros; 3º- Era do conhecimento da generalidade das pessoas deste concelho da Póvoa de Lanhoso, que o FF (o ‘…') sempre transportava consigo, entre outros objectos, num saco em plástico que guardava no bolso da camisa, quantias em dinheiro (vários milhares de euros), dinheiro esse que o mesmo ia aforrando por força e na sequência da solidariedade e ajuda da população em geral, já que, apesar dos notórios e evidentes sinais de deficiência ao nível mental, era por todos querido e considerado; 4º- Tendo conhecimento deste circunstancialismo, em noite anterior a 29 de Dezembro de 2004, o arguido DD (o ‘…'), juntamente com os arguidos BB (o ‘…') e o CCl (o ‘…'), que se haviam reunido no ‘Café …', sito em S. Mamede D'Este, Braga, arquitectaram um plano para se apoderarem de todo o dinheiro de que o FF (o ‘…') era portador; 5º- Para o efeito, deslocaram-se da mencionada freguesia de Braga para a vila da Póvoa de Lanhoso, fazendo-se transportar no veículo automóvel do arguido CC, com a matrícula …, da marca BMW, mod. 318 TDS (veículo que tem duas portas, mais a porta da mala); 6º- Uma vez aí chegados, e após terem detectado o FF, ofereceram-lhe boleia de regresso a casa, sendo certo que o FF só aceitou tal oferta em virtude de ter reconhecido o DD, já que, como regra, não aceitava boleia de estranhos; 7º- Sucede, porém, que, atenta a corpulência física do FF e o facto do mesmo se fazer acompanhar de um bastão em madeira (taco de ‘basebol'), os arguidos, receando a reacção do mesmo, desistiram do plano que haviam arquitectado para se apoderarem do dinheiro do FF, pelo que se limitaram a transportá-lo até à respectiva residência; 8º- Na noite de 29 de Dezembro de 2004, os arguidos DD, BB, CC e AA (o ‘…'), encontraram-se no ‘Café …', em S. Mamede D' Este - Braga, tendo os três primeiros informado este último do seu propósito de se apoderarem de todo o dinheiro de que o FF (o ‘…') era portador, plano ao qual o AA de imediato aderiu manifestando a intenção de tomar parte activa na sua execução; 9º- Dirigiram-se à Póvoa de Lanhoso no sentido de detectarem o FF, e tendo-lhe oferecido boleia para o levarem a casa, ele recusou; 10º- Encetaram os arguidos a viagem de regresso a Braga (este S. Mamede), sendo certo que durante esse percurso, e na sequência da troca de opinião entre todos, chegaram à conclusão de que para poderem lograr retirar o dinheiro ao FF tinham que, previamente, colocá-lo na impossibilidade de reagir, tirando-lhe a vida, combinando, então, reunirem-se todos, outra vez, no dia seguinte, em S. Mamede D´ Este - Braga; 11º- No dia 30 de Dezembro de 2004, pelas 22/23 horas, os quatro arguidos reencontraram-se, tal como havia ficado acordado no dia anterior, junto ao "Café …"...

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