Acórdão nº 06S3208 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Dezembro de 2006
Magistrado Responsável | SOUSA PEIXOTO |
Data da Resolução | 06 de Dezembro de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. "AA" propôs a presente acção no tribunal do Trabalho de Lisboa contra o Empresa-A (actualmente ....), pedindo que seja declarada inconstitucional a interpretação que determina que, sendo a mesma entidade jurídica a tutelar o contrato de trabalho e a reforma, o trabalhador ainda assim pode renunciar, na pendência da relação laboral, a créditos salariais no momento em que negoceia as condições da sua reforma, por violação dos artigos 59.º, n.º 3 e 63.º, n.º 1 e 4, da Constituição e que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia que se vier a apurar em execução de sentença, mas nunca inferior a 17.500,00 euros, a título de diferenças salariais referentes ao subsídio de isenção de horário de trabalho, acrescida dos juros legais e a quantia de 5.985,60 euros referente ao prémio de produtividade e mérito que lhe foi retirado, acrescida de juros legais contados desde a data da citação.
Alegou, em resumo, o seguinte: - foi admitido ao serviço do réu em Julho de 1976, tendo atingido a categoria de Director, com o vencimento do nível 18 do ACTV; - trabalhava em regime de isenção de horário de trabalho, desde Janeiro de 1998, auferindo, por isso, o respectivo subsídio; - todavia, o subsídio recebido foi de montante inferior ao devido, pelo facto de no cálculo do mesmo o réu só ter levado conta a remuneração de base e as diuturnidades, deixando de fora desse cálculo as demais prestações remuneratórias que por ele eram auferidas (prémio de produtividade e mérito, plafond de cartão de crédito, telefone, gasolina, participação nos lucros, as gratificações e incentivos, utilização de viatura para fins pessoais e respectiva manutenção e a sua aquisição da viatura, a custo zero, ao fim de 4 anos); - foi Director Coordenador desde 1994 até Outubro de 2000, data em que o réu deixou de lhe atribuir funções, colocando-o na Direcção de Riscos a desempenhar funções meramente administrativas; - em Janeiro de 2003, o réu deixou de lhe pagar a quantia de 498.80 euros que mensalmente vinha recebendo, desde Maio de 1996, a título de prémio de produtividade e mérito; - em 15 de Dezembro de 2003 celebrou um "acordo" com o réu, nos termos do qual passou à situação de reforma por invalidez no dia 31 do mesmo mês e ano; - nos termos desse "acordo" foi-lhe atribuída uma compensação pecuniária de natureza global, mas essa importância visou única e exclusivamente compensá-lo da perda de rendimentos que iria sofrer entre a data em que passou à reforma e a data em que atingiria a idade legal de reforma (65 anos de idade), não valendo, por isso, como quitação total de todos os seus créditos, nem como remissão abdicativa; - a entender-se como possível a remissão abdicativa no "acordo", o disposto no art.º 8.º, n.º 4, da LCCT seria absolutamente inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 59.º, n.º 3 e 63.º, n.os 1 e 4 da Constituição, pelo facto de não ter liberdade para reclamar todos os seus créditos, uma vez que estava ao serviço do réu.
O réu contestou, excepcionando a extinção dos créditos peticionados com base na presunção, que considera juris et de jure, contida no n.º 4 do art.º 394.º do Código do Trabalho (C.T.) e com base na remissão abdicativa e impugnando o direito aos referidos créditos.
Respondendo à contestação, o autor alegou que a presunção contida no art.º 394.º, n.º 4, do C.T. é juris tantum e que a declaração de quitação plena constante do "acordo" se refere apenas à compensação aí mencionada, a qual se destinou exclusivamente a compensá-lo da perda de rendimentos pela passagem à reforma.
Realizado o julgamento sem prévia selecção da matéria de facto e proferida a decisão sobre a matéria de facto, foi proferida sentença julgando a acção improcedente com o fundamento de que o contrato de trabalho tinha sido revogado por mútuo acordo e de que nesse acordo tinha sido estabelecida a favor do autor uma compensação pecuniária de natureza global, sendo, por isso, de presumir, juris et de jure, nos termos do n.º 4 do art.º 394.º do C. T., que os créditos peticionados na presente acção tinham sido incluídos na referida compensação, encontrando-se, por isso, pagos e com o fundamento de que o "acordo" inseria também um contrato de remissão abdicativa, traduzido na declaração nele emitida pelo autor de que se encontrava "integralmente pago de todos os créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua cessação, pelo que dá à ré, no que respeita a tais créditos, quitação total e plena." O autor recorreu da sentença, mas o Tribunal da Relação de Lisboa julgou improcedente o recurso, por ter considerado que o contrato de trabalho tinha cessado por revogação por mútuo acordo e não por caducidade (como o autor defendia no recurso) e que a declaração de quitação emitida pelo autor no referido "acordo" consubstanciava um contrato de remissão abdicativa perfeitamente válido.
Mantendo o seu inconformismo, o autor interpôs o presente recurso de revista, suscitando as questões que adiante serão referidas (não se reproduzem as conclusões do recurso por serem demasiado extensas - 12 páginas).
O réu contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso e, neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no mesmo sentido, em parecer que mereceu resposta por parte do autor.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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Os factos A matéria de facto dada como provada na Relação, que alterou ligeiramente a que tinha sido dada como provada na 1.ª instância, é a seguinte: 1) O autor iniciou funções ao serviço da ré em Julho de 1976, tendo atingido a categoria de Director.
2) O autor celebrou com a ré "Acordo" de fls. 18 a 20.
3) A IGT elaborou o escrito de fls. 15 e 16, que remeteu ao Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários do Estado.
4) Esse escrito foi remetido à ré.
5) Por volta de Junho de 2002, numa reunião da Administração da ré com alguns dos seus trabalhadores que se haviam reformado, o Presidente da Comissão Executiva da ré disse que os montantes dos acordos de rescisão foram para compensar a perda de rendimentos que adviria com a passagem à reforma.
6) Após a celebração de "Acordos" com conteúdo semelhantes ao do autor, a ré liquidou a outros trabalhadores da ré "créditos" salariais (fls.21 62) e ao autor os montantes e sob as designações de fls. 63.
7) O autor foi Director Coordenador da ré desde 94 até Outubro de 2000, altura a partir da qual a ré deixou de lhe atribuir funções.
8) Nessa altura, o autor foi colocado na Direcção de Riscos a desempenhar funções administrativas.
9) Em Fevereiro de 2001 (1), o autor foi colocado na Direcção de Riscos sob a coordenação de outro Director.
10) A ré não renovou o carro ao autor e não mais o convocou para reuniões de Quadros com a Administração.
11) Através da comunicação de fls. 116 e 117, o autor expôs esta situação ao Vice--Presidente da Comissão Executiva da ré, não tendo obtido qualquer resposta.
12) Em Janeiro de 2003, foi retirada ao autor a verba recebida a título de prémio de produtividade e mérito, no valor de € 498,80, que recebia mensalmente desde a sua instituição no Banco, em Maio de 1996.
13) O prémio de produtividade e mérito foi retirado ao autor, em virtude de a ré não ter considerado satisfatório o seu desempenho.
14) Por exigência do autor, na compensação pecuniária de natureza global constante do referido "Acordo", foi incluído o valor do prémio de produtividade e mérito.
15) A ré deixou de permitir ao autor aparcar o automóvel nas suas instalações.
16) O autor endereçou à ré a carta com os dizeres de fls. 120.
17) O autor teve Isenção de Horário de Trabalho desde Janeiro de 1988.
18) Auferiu diuturnidades.
19) Auferiu prémio de produtividade e mérito.
20) Tinha cartão de crédito, com plafond anual.
21) Beneficiava de telefone (periodicidade mensal) e de gasolina (periodicidade mensal).
22) Participações nos lucros, gratificações e incentivos.
23) Uso pessoal, do carro de serviço, sem limites, incluindo todos os custos.
24) A atribuição da viatura ao fim de 4 anos, a custo zero.
25) A gasolina, as senhas utilizadas e posteriormente o cartão GALP Frota destinavam-se a uso pessoal do autor.
26) Todos os meses, o autor entregava à ré a sua factura telefónica mensal (telefone residencial) e a ré pagava mensalmente um valor fixo dessa factura, sem efectuar o controle das chamadas efectuadas.
27) A ré permitia ao autor utilizar o carro durante os fins de semana e férias, inclusivamente no estrangeiro.
28) De quatro em quatro anos, o autor via a sua viatura ser substituída por uma nova, ficando ele como dono da que havia sido alvo de substituição, sem encargos adicionais.
29) A ré enviou ao autor a carta datada de fls. 123.
30) A ré emitiu "As normas de...
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