Acórdão nº 06S1542 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução22 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. Em 28 de Setembro de 2001, no Tribunal do Trabalho do Porto, AA intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra BB, pedindo que seja declarada a existência de justa causa de rescisão do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador e a condenação do réu a pagar-lhe: (a) 400.400$00, correspondentes aos danos patrimoniais sofridos, em virtude da violação das garantias legais do trabalhador, acrescida de juros de mora desde a data da rescisão do contrato até efectivo e integral pagamento; (b) 1.500.000$00, relativos aos danos não patrimoniais sofridos, em virtude da violação das garantias legais do trabalhador, acrescida de juros de mora desde a data da rescisão do contrato até efectivo e integral pagamento; (c) 510.082$00, a título de créditos salariais vencidos até à data da rescisão do contrato, acrescida dos juros de mora legais desde aquela data; (d) 1.320.000$00, a título de indemnização por antiguidade.

O autor alega, em síntese, que foi contratado, em 15 de Setembro de 1990, pelo pai do réu para exercer as funções de paquete em escritório de solicitadoria e advocacia; a partir de 1995, o pai do réu deixou de comparecer no escritório, continuando o autor a exercer as mesmas funções para o réu, sendo que, por carta de 4 de Outubro de 2000, rescindiu o contrato de trabalho invocando justa causa, com fundamento em violação culposa das garantias legais e convencionais, lesão culposa de interesses patrimoniais sérios e ofensas à sua honra e dignidade.

O réu contestou, por via de excepção, invocando a prescrição dos créditos reclamados e a sua ilegitimidade para a acção, e, por via de impugnação, defendendo a inexistência de justa causa para a rescisão do contrato de trabalho e salientando que, antes de 4 de Outubro de 2000, já o autor tinha sido despedido; o réu deduziu, ainda, reconvenção em que pede a condenação do autor a pagar-lhe 362.393$00, bem como todas as quantias que o autor desviou em situações de abuso de confiança, e requereu a condenação do autor como litigante de má fé em multa e indemnização.

O autor respondeu sustentando a improcedência das excepções invocadas, a não admissibilidade do pedido reconvencional ou a sua improcedência, tendo pedido a condenação do réu como litigante de má fé em multa e indemnização.

No despacho saneador, as excepções da ilegitimidade do réu e da prescrição foram julgadas improcedentes, não tendo sido admitido o pedido reconvencional.

Realizado julgamento, foi exarada sentença que julgou a acção parcialmente procedente, declarando a existência de justa causa de rescisão do contrato de trabalho pelo autor e condenando o réu a pagar-lhe (i) 2.544,28 euros, a título de créditos salariais vencidos até à data da rescisão do contrato de trabalho, acrescendo juros de mora, à taxa legal, desde aquela data, e (ii) 2.864,10 euros, a título de indemnização por antiguidade, tendo condenado o réu como litigante de má fé na multa de 10 UC.

  1. Inconformados, o autor apelou e o réu agravou e apelou, tendo a Relação negado provimento aos recursos de agravo, confirmando os despachos recorridos, e julgado improcedente a apelação do autor e parcialmente procedente a apelação do réu, revogando a sentença recorrida na parte em que declarou a existência de justa causa de rescisão do contrato de trabalho pelo autor e condenou o réu a pagar-lhe a quantia de 2.864,10 euros, absolvendo o réu de tais pedidos, bem como do pedido de condenação como litigante de má fé, e confirmando a sentença recorrida quanto à condenação do réu a pagar ao autor a quantia de 2.544,28 euros, a título de créditos salariais vencidos até à data da rescisão do contrato de trabalho, e juros de mora.

    É contra esta decisão da Relação que o réu e o autor agora se insurgem, mediante recursos de revista, ao abrigo, em substância, das seguintes conclusões: RECURSO DO RÉU: - As instâncias cometeram dois clamorosos erros de Direito, ao não observarem, por um lado, a cominação dos artigos 60.º, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho, e 490.º, n.os 1, 2 e 3, do Código de Processo Civil, relativamente aos artigos 1.º a 15.º da contestação, e, por outro, ao considerarem que o autor podia legalmente voltar a fazer cessar, em 4/10/2000, um contrato que o mesmo já tinha considerado extinto em 26/7/2000, data em que se declarou verbalmente despedido pelo réu, erros que merecem a censura e a reparação jurisdicional do Supremo Tribunal de Justiça, nos termos dos artigos 722.º, n.º 2, e 722.º, n.º 1, e 729.º, n.º 1, do Código de Processo Civil; - É que, o autor fora despedido pelo réu em 3/6/2000 e esse facto deve ser considerado provado, por decorrência do estabelecido nos artigos 60.º, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho, e 490.º, n.os 1, 2 e 3, do Código de Processo Civil; - Sem prejuízo do anteriormente alegado, a matéria de facto assente conduz, por si só, à absolvição do réu da totalidade do pedido do autor, por via dos acrescentados pontos 31 e 32, dado que, perante essa matéria de facto, ficou provado que o autor já se considerava despedido em 26/7/2000 e, não obstante, propôs a acção inicial fora do prazo previsto injuntivamente no artigo 38.º, n.º 1, da LCT; - Face ao constante nos n.os 1 a 8 e 26 da matéria de facto assente, verifica--se que o autor fora contratado pelo pai do réu, em Outubro de 1991, e tal contrato subsistiu ininterruptamente até 31/3/2000, data em que o pai do réu faleceu; e, nem o pai do réu despediu o autor até 31/3/2000, nem o autor rescindiu o contrato celebrado com o pai do réu, inexistindo, nos autos, a enunciação, pelas instâncias, do dies a quo de um posterior contrato de trabalho, que tivesse sido celebrado entre o autor e o réu, seguidamente ao contrato inicial de Outubro de 1991; - A presente causa está eivada de gritantes injustiças processuais contra o réu, atentatórias dos princípios processuais da igualdade de tratamento das partes, do contraditório e da plenitude da assistência dos juízes; - O autor litigou, ostensiva, reiterada e dolosamente, de má fé, devendo, por isso, ser condenado, como litigante de má-fé, em multa e numa indemnização condigna ao réu, a fixar nos termos conjugados dos artigos 456.º, n.os 1 e 2, alíneas a) a d), e 457.º, n.os 1, alínea b), e 2, do Código de Processo Civil; - A acção do autor sempre deverá improceder por decorrência das regras do abuso de direito, previstas no artigo 334.º do Código Civil, pois, o autor, não obstante se considerar despedido, por declaração de 26/7/2000, e sabendo que esse despedimento já ocorrera em momento anterior a essa data, vem depois, por carta de 4/10/2000, tentar rescindir o que já estava rescindido, e aceite por ambas as partes; - O acórdão recorrido violou, assim, o disposto nos artigos 60.º, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho, 490.º, n.os 1, 2 e 3, do Código de Processo Civil, 38.º, n.º 1, da LCT, 456.º e 457.º do Código de Processo Civil e 334.º do Código Civil.

    Em conformidade, pede a revogação do acórdão recorrido, a absolvição da totalidade do pedido e a condenação do autor como litigante de má fé.

    O autor não contra-alegou.

    RECURSO DO AUTOR: - Perante a factualidade julgada provada, é forçoso concluir que foi o comportamento omissivo do réu, ao não entregar à Segurança Social os descontos que fez sobre o vencimento do autor, que obviou à atribuição ao autor do subsídio de doença no período da baixa compreendido entre Maio de 2000 e Outubro do mesmo ano; - Em consequência, tinha de proceder o pedido do autor, deduzido na petição inicial, de condenação do réu no pagamento da quantia de 400.400$00, correspondente aos danos patrimoniais sofridos pelo autor, em virtude da violação, por parte do réu, das garantias legais do trabalhador, a que acrescem os respectivos juros de mora calculados desde a data da rescisão do contrato até efectivo e integral pagamento; -Assim, a sentença proferida em primeira instância evidencia contradição entre os fundamentos e a decisão verificando-se, consequentemente, a nulidade prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil, pelo que deveria ter sido julgada procedente a invocada nulidade; - Atenta a factualidade julgada provada e o disposto nos artigos 74.º e 75.º do Código de Processo do Trabalho, o réu deveria ter sido condenado pelos danos patrimoniais em causa porquanto, não obstante o autor não ter feito prova dos montantes que, a título de subsídio de doença, deixou de auferir, o seu exacto montante resulta de simples operação aritmética e da aplicação de preceito inderrogável de lei; - Com efeito, atento essa factualidade e o disposto nos artigos 23.º, n.º 2, alínea e), e 26.º, n.os 1 e 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 874/76, de 28 de Dezembro, o autor faltou por doença, o que só determinaria perda da respectiva retribuição, se o mesmo tivesse direito a subsídio, o que não sucedeu por facto imputável ao réu que não entregou à Segurança Social os descontos que efectuou na remuneração do autor (artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 132/88, de 20 de Abril); - Assim, o autor não obstante ter faltado justificadamente por motivo de doença, uma vez que, comprovadamente, não recebeu qualquer subsídio nesse período, terá de receber, nos termos dos citados preceitos, a respectiva retribuição do réu a qual ascende a 720.000$00 (120.000$00 mensais x 6 meses, de Maio a Outubro), isto é, € 3.591,34 - artigo 74.º do Código de Processo do Trabalho; - Assim não se entendendo, não tendo o autor auferido o subsídio de doença num período de 107 dias e face ao disposto no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 132/88, de 20 de Abril, conclui-se que o autor teria direito a receber a título de subsídio de doença a quantia de 278.200$00 a que acresceriam as remunerações relativas ao período de Maio a Outubro de 2000 em que o autor não tenha estado impedido de trabalhar por se encontrar doente, isto é, as remunerações relativas aos...

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