Acórdão nº 06S1731 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelMARIA LAURA LEONARDO
Data da Resolução18 de Outubro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - "AA" intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra Empresa-A, pedindo que lhe seja reconhecido o direito à integração na sua pensão de reforma da quantia mensal de € 699,63 correspondente à prestação recebida a título de isenção de horário de trabalho (52,33% da reforma/base), desde 1 de Setembro de 2001, e em consequência que a ré seja condenada a pagar-lhe, a esse título, as prestações já vencidas até 31 de Outubro, no valor de € 21.688,46, e ainda as que se vencerem após tal data e até integral cumprimento.

Alegou, em síntese, que: - trabalhou sob as ordens, direcção e autoridade da ré até ao dia 31 de Agosto de 2001, detendo nessa data a categoria profissional de Gerente com o nível 11, prevista no ACTV para o sector Bancário (2); - no dia 28 de Junho de 2001, autor e ré anuíram em pôr fim à relação de trabalho subordinado nos termos do acordo constante do documento junto a folhas 4-7; - a ré reconheceu ao autor uma situação de invalidez permanente para o serviço, factor este que esteve na base do acordo celebrado - cláusulas 3ª e 5ª do mesmo; - no âmbito do referido acordo o autor passou a usufruir de uma pensão de reforma no montante global ilíquido de € 1.324,30, assim discriminado: € 1.126,78 de mensalidade reforma e € 195,72 de diuturnidades; - tal acordo, na parte em que foi fixado o montante da reforma ofende preceitos laborais imperativos, nomeadamente, os relativos ao princípio da irredutibilidade da retribuição e ainda os respeitantes à Lei de Bases da Segurança Social e Constituição da República; - o autor auferia mensalmente, desde 1992, uma prestação a título de isenção de horário de trabalho, cujo montante era à data, do último mês no activo, de 52,33% do seu vencimento base; - sobre tal remuneração complementar incidia os competentes descontos legais, sendo o pagamento de tal prestação incluído nos subsídios de férias e de Natal, mesmo que não ocorresse prestação efectiva de trabalho; - o pagamento de tal prestação passou a integrar mensalmente o orçamento normal do autor durante mais de oito anos, conferindo-lhe justa expectativa do seu recebimento; - tal quantitativo integra o conceito de retribuição quer à luz do disposto no artº 26º-3 da Lei nº 100/97, de 13 de Fevereiro, quer à luz do que se acha consagrado no artº 82º da LCT ou no ACTV.

A ré contestou dizendo, no essencial, o seguinte: - o regime de Segurança Social aplicável aos trabalhadores bancários, maxime no que à reforma respeita, é o que consta do ACTV do sector Bancário; - o cálculo das pensões de reforma por invalidez ou por velhice (invalidez presumível) deverá efectuar-se nos termos das cláusulas 137ª e 138ª do referido ACTV; - dos respectivos preceitos decorre que os trabalhadores bancários têm direito, quando passam à situação de reforma, a uma pensão constituída por mensalidades calculadas nos termos dos Anexos V e VI do ACTV do sector Bancário, acrescidas de diuturnidades; - essas pensões de reforma não podem ser de montante inferior ao do valor ilíquido da retribuição do nível mínimo do grupo a que pertenciam nos termos do nº 2 da cláusula 137ª; - o autor aceitou a sua passagem à situação de reforma por invalidez nos precisos termos que constam do acordo que juntou; - no cálculo da pensão de reforma não pode entrar a remuneração a título de isenção de horário de trabalho que a ré atribuiu ao autor enquanto foi seu trabalhador, pois tal valor não é pensionável; - aquele cálculo está sujeito aos critérios referidos, nos quais não interfere o princípio da irredutibilidade; - não existe violação das normas dos artigos 19º-b) e 21º-c) do Decreto-Lei nº 49408 e do artº 26º-3 da Lei nº 100/97, porque estas, por força dos contornos da sua estatuição e previsão, não se aplicam ao sistema de reformas do sector Bancário; - a cláusula 137ª-7 não foi violada e hoje não tem outro significado que não a sua razão histórica e uma mera função preventiva para futuras revisões do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical do Sector Bancário; - a passagem à situação de reforma e a consequente caducidade do contrato de trabalho implicou a abolição de qualquer retribuição por isenção de horário de trabalho, por falta do pressuposto legal que é o exercício da actividade laboral sem horário de trabalho; - os descontos efectuados foram os descontos referentes a IRS e os descontos para a CAFEB e nada têm a ver com as prestações devidas a título de pensões de reforma; - o acordo realizado com cada um dos trabalhadores, referente à sua passagem à situação de reforma, resultou de negociação individual, com cada um deles.

A acção foi conhecida no despacho saneador, sendo a acção julgada improcedente e a ré absolvida do pedido.

O autor apelou do saneador/sentença, mas o Tribunal da Relação julgou a apelação improcedente e confirmou a decisão da 1ª instância.

De novo inconformado, o autor vem pedir revista, formulando na sua alegação as conclusões que, em síntese, se indicam: 1ª) - O recorrente arguiu a nulidade da sentença, porquanto a fls. 213 da sentença, o Tribunal da 1ª Instância entendeu que não podia concluir pela violação do princípio da igualdade, "face à escassez da matéria de facto vertida no nº 14 da petição inicial"; 2ª) - Se o Tribunal de 1ª Instância considerou que o constante no artº 14º da p.i. era insuficiente para demonstrar a violação do princípio da igualdade e se se apercebeu que a matéria era de importância vital para a boa decisão da causa, deveria ter proferido um despacho de aperfeiçoamento, nos termos dos artº 508º do CPC e 27º-b) do CPT, como bem se pronunciou o Tribunal da Relação do Porto, no seu acórdão de 18 de Setembro de 2003 (in www.dgsi.pt) e o Supremo Tribunal de Justiça, no seu acórdão de 11 de Maio de 1999 (in BMJ, 487, 244); 3ª) - Contrariamente à interpretação proferida pelo Tribunal a quo, a omissão desse acto - despacho de aperfeiçoamento - de carácter essencial para a boa decisão da causa constitui uma nulidade da sentença, nos termos do artº 201º do CPC, nulidade que se vem arguir, novamente, com as legais consequências; 4ª) - Segundo o acórdão recorrido, o autor/recorrente baseou a sua pretensão em três fundamentos: os usos da empresa; a violação do principio da igualdade de tratamento; a inconstitucionalidade das normas do ACT face ao artº 63º da CRP; 5ª) - Considerou, porém, o tribunal recorrido, incorrectamente, não haver "qualquer violação do princípio de igualdade nem desrespeito por qualquer uso juridicamente relevante (...)"; 6ª) - Acontece que foi o próprio Tribunal de 1ª Instância que obstou ao conhecimento deste facto na sua plenitude ao decidir a acção no despacho saneador, dessa forma impedindo a produção de prova em sede de audiência de julgamento; 7ª) - Por outro lado, não se compreende a posição do tribunal recorrido, face à documentação junta pelo recorrente e admitida na Relação e ao facto de dar como provada a matéria constante dos pontos 9 a 16; 8ª) - Na verdade, considerando-se provado (ponto nº 13) que "relativamente aos trabalhadores neles referidos, a ré autorizou os acordos de passagem à situação de reforma cujas cópias constam de fols. 390 a 413, 417, 419 e 422 a 441, tanto bastaria para proceder a pretensão do autor/recorrente (se este facto não é violação do princípio da igualdade então nada o será!); 9ª) - Diz o tribunal recorrido que quanto à questão de saber se o regime especial relativamente ao geral é mais ou menos favorável, porque se trata "de questão absolutamente nova, não suscitada anteriormente pelo autor nos autos", não pode a mesma ser conhecida; 10ª) - Não houve qualquer invocação de factos novos, nem se trata de uma questão nova, apenas uma análise exaustiva do regime jurídico aplicável; 11ª) - Nos últimos quinze anos têm vindo a ser instituídas, no âmbito da Banca - especialmente para os trabalhadores com funções de direcção, técnicas ou de chefia -, componentes de retribuição (remunerações acessórias ou complementares - subsídio de função, remuneração complementar, bónus, cartão de crédito, senhas de gasolina, telefone, carro, isenção de horário de trabalho, etc...) que, nos regimes públicos de protecção social, influiriam no cálculo das pensões, mas que, no âmbito do regime do ACT, não têm qualquer relevância para este efeito; 12ª) - Tais complementos completam um vencimento-base baixo, de modo a que também seja baixa a reforma nos termos do ACTV; 13ª) - Chegou-se ao absurdo de, entre as diversas instituições bancárias, e até no âmbito da mesma instituição, para carreiras remuneratórias similares, existirem diferentes regimes de protecção social; 14ª) - Veja-se o que se passa com ex - trabalhadores do Banco .. [do mesmo grupo do ... .... .... e do Banco ..... (Empresa-B)], que têm vencimentos majorados, por forma a cumprir o prescrito na Cláusula 92ª, nº 5, do ACT, já que os descontos feitos para a Segurança Social são superiores no regime geral, e, que, por isso, quando se reformam, têm valores substancialmente maiores de pensão do que os que recebem os seus colegas de carreira oriundos dos outros bancos; 15ª) - Estas situações anómalas, configurando graves entorses ao sistema constitucional vigente, foram objecto de estudo específico dos Professores Doutores Diogo Freitas do Amaral e Rui Medeiros e Jorge Miranda, nos pareceres ora juntos aos autos; 16ª) - Por um lado, a perversidade do sistema permite que os valores atribuídos a título de isenção de horário de trabalho e demais complementos salariais, sejam de montante substancialmente elevado face à retribuição-base, possibilitando que as entidades empregadoras manipulem a carreira salarial dos trabalhadores durante a vida activa, de forma a que venha a ser fixado, desde logo, um montante de pensão substancialmente baixo; 17ª) - E, por outro, determina que algumas instituições bancárias, aquando do momento da reforma, atribuam valores complementares (nalguns casos adicionais face ao que prevê o ACT) a...

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