Acórdão nº 06P2683 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Outubro de 2006
Magistrado Responsável | PEREIRA MADEIRA |
Data da Resolução | 12 de Outubro de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.
No Tribunal Judicial de Ponte da Barca responderam os arguidos 1º - AA; 2º - BB; 3ª - CC; 4º - DD; 5º - EE; e 6º - FF, todos devidamente identificados e que haviam sido pronunciados, cada um deles, pela prática de um crime de tráfico e outras actividades ilícitas agravado, p. e p. pelos art.ºs. 21º, nº 1, e 24.º, alíneas b) e c), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, levando em atenção o disposto na tabela I-C anexa ao mesmo diploma.
A final foi proferida decisão em que, além do mais, foi decidido: - Absolver os arguidos CC e DD da prática dos crimes pelos quais haviam sido pronunciados; - O arguido BB foi absolvido do crime pelo qual foi pronunciado, de tráfico e outras actividades ilícitas agravado, p. e p. pelos art.s 21.º, nº 1, e 24.º, b) e c), D.L. n.º 15/93, de 22.1, mas condenado pela prática de um crime p. e p. pelo art.º 26.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, na pena de 14 (catorze) meses de prisão; - Condenar o arguido AA, pela prática, como autor material, de um crime de tráfico e outras actividades ilícitas, p. e p. pelo citado art.º 21.º, n.º 1 do citado Decreto-Lei, na pena de 8 (oito) anos de prisão; - Condenar o arguido EE, pela prática, como autor material, de um crime de tráfico e outras actividades ilícitas, p. e p. pelo citado art. 21.º, n.º 1, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão; - Condenar finalmente o arguido FF, pela prática, como autor material, de um crime de tráfico e outras actividades ilícitas, p. e p. pelo citado art. 21.º, n.º 1, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.
Recorreram à Relação de Guimarães os três arguidos em último lugar referenciados, ou sejam: os arguidos AA, FF e EE, mas em vão o fizeram, já que aquele tribunal superior, por acórdão de 27/04/2006, por votação maioritária, negou provimento aos recursos.
Ainda irresignados, recorrem agora ao Supremo Tribunal de Justiça os mesmos três arguidos, que assim delimitam respectivamente os respectivos leques conclusivos: A. EE - Os factos previstos não são enquadráveis na previsão do artigo 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22 de Janeiro, que vinha imputado ao recorrente.
- Pelo contrário, o quadro factual a considerar, que revela um comportamento determinado pela exclusiva necessidade de obtenção de meios para o auto-consumo de cocaína e haxixe, um estado de grande carência e dificuldades económicas do arguido, o seu papel de «correio» para o seu fornecedor habitual de estupefaciente a quem devia dinheiro e com tal liquidava o débito, o seu profundo e sincero arrependimento, expresso numa confissão integral, sincera e de grande importância para o apuramento dos factos, justifica o respectivo enquadramento no tipo de tráfico de menor gravidade previsto pelo artigo 25.º, al. a), daquele diploma.
- No mínimo, integra as atenuantes especiais previstas na al. c) do n.º 2 do artigo 72.º do CP e no art.º 31.º do DL 15/93, por referência ao tipo de tráfico de estupefaciente simples, p. e p. pelo artigo 21.º do DL 15/93.
- Em qualquer das hipóteses, deve o recorrente ser condenado em pena de prisão não superior a três anos e suspender-se a respectiva execução.
- Decidindo de modo diverso, o douto acórdão ofendeu o disposto nos preceitos que ficaram invocados e ainda nos art.s. 73.º, n.º 1, als. a) e b) e 50.º, n.º 1, do CP.
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FF 1- O único facto que fundamenta a decisão condenatória, alegadamente apurado, na forma como vem descrito no texto da decisão em causa, é impossível materialmente pois não se pode entregar pó (mínimos fragmentos que andam no ar).
2- Os dados constantes do acórdão recorrido e dos autos nunca permitiram ao tribunal recorrido concluir pela certeza de que era o arguido o indivíduo referido no episódio, vagamente, relatado no acervo fáctico que foi vertido na decisão questionada.
3- Existe, pois, erro notório na apreciação da prova pois esse erro é de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja quando o homem médio dele se dá conta, enfermando o acórdão sob recurso do vício previsto na al. c) do art.º [n.º] 2.º do artigo 410.º do CPP.
4- O solitário facto referido no acervo fáctico em que a decisão recorrida se fundamentou não foi apurado com o mínimo de certeza e rigor, não se indica, com o mínimo exigível de aproximação, a hora, o local, as circunstâncias e não se provou, nem curou de apurar, se o recorrente sabia do que se tratava e a que fim se destinava tal produto.
Ora a indagação de tais factos era essencial para poder ser apreciada e julgada a conduta do recorrente.
E o vício da insuficiência da matéria de facto provada aqui denunciado é concretamente eficaz pois resulta do texto da decisão recorrida por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.
5- A conduta do recorrente, considerando o «non liquet» de toda a prova produzida e tratando-se de um acto isolado nunca poderia integrar a prática do crime previsto pelo art.º 21.º do DL n.º 15/93, de 22/1, mas sim a prática do crime previsto pelo art.º 25.º do mesmo diploma, e nesta circunstância, a condenação devia respeitar este último preceito.
6- A decisão recorrida errou manifestamente no que tange à dosimetria concreta da pena, desrespeitando o preceituado no artigo 71.º - 1 e 2 e 40.º do CP, por ter condenado o recorrente em pena de prisão manifestamente excessiva.
7- Como resulta da modesta exposição antecedente a orientação jurisprudencial deste Supremo Tribunal de Justiça vai claramente no sentido de que a concreta actuação do recorrente, se houve alguma actuação concreta que mereça condenação, implica uma condenação menos grave, impondo-se e pedindo-se empenhadamente a redução da pena ao mínimo aplicável ao crime praticado, se este Supremo Tribunal entender que crime houve.
8- Porque o acórdão recorrido sofre dos vícios constantes do n.º 2 als. a) e c) do art.º 410.º do CPP, deve este Supremo Tribunal determinar o reenvio do processo para novo julgamento nos termos do art.º 426.º do CPP.
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AA 1- A decisão recorrida não indica, ainda que por aproximação, as circunstâncias de tempo e lugar, quantidades, espécies de drogas de cada uma, valores, nem periodicidade, factos que são absolutamente essenciais para a definição da ilicitude da conduta dada como provada para o recorrente na parte em que se fala do impreciso e vago «comércio de compra e venda de droga».
2- A decisão recorrida não toma posição quanto às quantidades de droga apreendidas ao recorrente no seu estabelecimento e residência, quanto a serem sua propriedade e qual o fim a que se destinavam, se ao consumo se à comercialização.
3- Resulta pois evidente que o acórdão recorrido sofre do vício do artigo 410.º, n.º 2, al. a), do CPP, da insuficiência da matéria de facto para a decisão e que tal vício é concretamente eficaz por resultar insanável e completamente do texto da decisão recorrida.
4- A prova produzida ferida como se disse de iliquidez, dúvida e imprecisão insanáveis, foi erroneamente apreciada e tal erro é notório por de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja qualquer homem médio dela se dá conta, padecendo também a decisão recorrida do vício previsto na al. c) do n.º 2.º do art.º 410.º do CPP.
5- Em consequência dos vícios apontados deve este Supremo Tribunal determinar o reenvio do processo para novo julgamento nos termos do art.º 426.º do CPP.
6- A conduta do recorrente, considerando o «non liquet» da prova produzida não poderá integrar a prática do crime previsto pelo art.º 21.º do DL n.º 15/93, de 22/1.
7- E considerando não ter o tribunal tomado posição quanto às quantidades de droga apreendida ao recorrente quanto ao fim a que se destinavam, se ao consumo ou à comercialização, e no respeito do princípio «in dubio pro reo», a sua conduta só poderá integrar a prática do crime previsto no art.º 40.º do DL 15/93, de 22/1.
8- A não entender assim e na pior das hipóteses, tal conduta só poderia ser condenada à luz do art.º 25.º do citado diploma.
9- A decisão recorrida errou manifestamente no que tange à dosimetria concreta da pena, desrespeitando o preceituado nos artigos 71.º, n.º 1 e 2, e 40.º, do CP, por ter condenado o recorrente em pena de prisão manifestamente excessiva.
10- Como resulta da modesta exposição precedente, a lei e a orientação jurisprudencial deste Supremo Tribunal vão claramente no sentido de que a concreta actuação do recorrente implica uma pena menos grave, impondo-se e pedindo-se, empenhadamente, a redução da pena ao mínimo aplicável ao crime que este tribunal entenda que o recorrente praticou.
Respondeu o Ministério Público junto do tribunal recorrido, defendendo em suma a inexistência dos vícios da matéria de facto invocados pelos recorrentes, ao mesmo tempo que concede em que a pena de oito anos aplicada ao arguido AA poderá «de algum modo ser diminuída, embora sempre no âmbito do artigo 21.º do DL 15/93, de 22/1.», devendo manter-se as dos demais.
Subidos os autos, nada foi encontrado que impedisse a remessa do caso para julgamento em audiência.
As questões a decidir, tal como emergem das conclusões supra transcritas, são em suma: A - Pretensa existência de vícios na matéria de facto - erro notório na apreciação das provas e insuficiência (recorrentes FF e A
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B - Pretenso erro na qualificação jurídica dos factos levada avante pelo tribunal recorrido e que deveria ter sido pelo artigo 25.º do DL 15/93, de 22/1 (recorrentes EE e FF e, supletivamente, AA), ou pelo artigo 40.º do mesmo diploma (recorrente AA).
C - Consequentemente, a medida concreta das penas é exagerada e deve ser reduzida (todos os recorrentes).
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Colhidos os vistos legais e realizada a audiência, cumpre decidir.
Factos provados O 1º arguido (AA, também conhecido por "...") é casado com a arguida CC (3ª arguida, também conhecida por "....") e cunhado do 6º arguido (FF).
Aquele 1º arguido, desde, pelo menos, meados de 2003 até à altura em que foi detido (7 de Outubro de 2004), foi-se dedicando ao comércio de...
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