Acórdão nº 06P1414 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Maio de 2006

Data24 Maio 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça.

No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 00/05, do Tribunal Judicial da comarca de Bombarral, após contraditório foi proferido acórdão que condenou o arguido AA, com os sinais dos autos, como autor material de um crime de homicídio simples, previsto e punível pelo artigo 131º, do Código Penal, na pena de 11 anos de prisão.

Interpôs recurso o Ministério Público em cuja motivação formulou as seguintes conclusões:1.

Pelo douto acórdão recorrido, o arguido foi condenado na pena de 11 (onze) anos de prisão, pela autoria de um crime de homicídio, previsto e punível pelo artigo 131º do Código Penal.

  1. Tal condenação assentou, no que ao crime propriamente dito respeita, na seguinte factualidade: · No dia 9 de Janeiro de 2005, cerca das 21H30M, o arguido, que nessa noite já havia bebido três copos de vinho branco, deslocou-se ao café propriedade de BB, sito na Columbeira, onde esteve a beber uma cerveja na companhia de CC, com o qual conversou.

    · A dada altura e ainda no interior do café o arguido e o CC envolveram-se numa discussão por causa do furto de umas máquinas do arguido, imputando o arguido o furto dessas máquinas a cidadãos dos países do Leste Europeu.

    · Depois de saírem das instalações do café, o arguido, o CC e DD, que o acompanhava, estiveram no exterior do café, nas suas proximidades, durante cerca de quinze minutos, tendo o arguido e o CC continuado a discutir, em tom de voz mais elevado do que no interior do café.

    · Por causa dessa discussão, o arguido, mal se separou do CC e do companheiro deste, cerca das 22 horas, deslocou-se, na sua viatura, à sua residência, distante cerca de 200 metros daquele local, e muniu-se de uma espingarda caçadeira de dois canos basculantes, de calibre 12, de marca Danok, com o número de série 91105, de origem espanhola, que carregou com dois cartuchos de calibre 12 e granulometria compreendida entre 3 e 5, um em cada cano.

    · De seguida, o arguido, deslocando-se na sua viatura, procurou o CC, tendo-o encontrado, alguns minutos antes das 22 horas e 15 minutos, a caminhar na berma da Estrada Nacional 000, junto à residência com o n.º 00000, juntamente com o DD.

    · De imediato, o arguido parou a sua viatura uns metros mais à frente daqueles e saiu do carro pegando na arma que trazia.

    · Com a imobilização da viatura, o CC e o DD imobilizaram-se também, dirigindo-se então o arguido na direcção destes, trazendo a espingarda caçadeira, que mantinha com os canos apontados para o chão.

    · Nesta altura, o CC e o DD encontravam-se a cerca de um metro e meio a dois metros da traseira do veículo.

    · O arguido dirigiu-se para junto da traseira do veículo, onde proferiu palavras em português cujo teor não foi possível apurar, ao que o CC respondeu perguntando "O que é que se passa AA?" · Nesta altura o arguido levantou a espingarda caçadeira, apontou-a na direcção do CC e, quando a frente da arma se encontrava a uma distância do corpo do CC não inferior a trinta centímetros nem superior a um metro, o arguido disparou um tiro na direcção do CC.

    · Este tiro foi disparado da frente para trás, ligeiramente da esquerda para a direita, e com ligeira inclinação de cima para baixo.

    · Como consequência deste disparo o CC sofreu lesões traumáticas do abdómen, as quais constituíram causa adequada da sua morte, que sobreveio no dia 10 de Janeiro de 2005, às 2 horas e 40 minutos, no Centro Hospitalar de Caldas da Rainha.

    · O arguido agiu com o intuito conseguido de matar CC.

    · O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente bem sabendo que os seus actos eram legalmente puníveis.

  2. No que respeita à medida da pena concretamente aplicada, a mesma resultou das seguintes considerações: A favor do arguido: · Ausência de antecedentes criminais.

    · Bom comportamento disciplinar na prisão.

    · Condição pessoal e situação económica, com relevo para a circunstância de ter a 4ª classe do ensino primário e sempre ter trabalhado toda a sua vida, estando bem inserido socialmente antes de preso.

    · Idade (63 anos) Contra o arguido: · Grau de ilicitude elevado, sobretudo pelo desvalor social da sua conduta e pela reprovação ético-jurídica necessariamente provocada no cidadão comum.

    · Modo de execução do facto desvalioso, atendendo à superioridade do meio usado sobre a vítima, deixando a esta menores possibilidades de defesa.

    · Culpa de média gravidade, por, apesar de ser exigível um outro tipo de comportamento, os factos terem sido cometidos depois de uma discussão com a vítima.

  3. O crime de homicídio previsto no artigo 131º do Código Penal é punível com pena de prisão de 8 a 16 anos.

  4. A aplicação de penas, tal como preceitua o artigo 40º do Código Penal, visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, sem que possa, no entanto, ultrapassar a medida da culpa. Assim e tal como refere o Prof. Figueiredo Dias (1) "as finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade. Por outro lado, a pena não pode ultrapassar, em caso algum, a medida da culpa", "a qual constitui um limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas(2) 6.

    Na determinação da medida concreta da pena, deve atender-se à culpa do agente e às exigências de prevenção (artigo 71º, n.º 1, do Código Penal), devendo ainda ser atendidas todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor ou contra o agente, nomeadamente: o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres; a intensidade do dolo; os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; as condições pessoais do agente e a sua situação económica; a conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena (artigo 71º, n.º 2, do Código Penal).

  5. No caso em apreço e tendo por base a factualidade provada, verifica-se, com relevância para a determinação da medida concreta da pena, que: O grau de ilicitude do...

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