Acórdão nº 06P263 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Março de 2006

Magistrado ResponsávelSILVA FLOR
Data da Resolução29 de Março de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. No 3.º Juízo do Tribunal Judicial da comarca de Caldas da Rainha, em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, AA foi condenado como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 8 anos de prisão.

Inconformado com tal condenação, o arguido recorreu para este Supremo Tribunal, finalizando a motivação com as conclusões que em seguida se transcrevem: 1. Tendo em vista o circunstancialismo atenuante, nomeadamente, a sua confissão integral e sem reservas dos crimes por si praticados, ficando implícito o seu arrependimento, à personalidade do arguido, à sua condição social, familiar e económica, as suas condutas, anteriores e posteriores aos factos de que foi acusado e condenado, à sua idade, ao apoio que a sua mãe ainda lhe dá, ao abandono de comportamentos de consumo de estupefacientes desde que se encontra em reclusão, as exigências de prevenção dos crimes, o principio da justeza e adequação das penas, a medida concreta das penas aplicadas ao arguido mostra-se desadequada por excessiva; 2. Face a todos os circunstancialismo enunciados, existe, fundamento legal e de facto para enquadrar a actuação do arguido na prática de um crime de tráfico de menor gravidade, previsto e punido pelo artigo 25° al. a) do Decreto-Lei 15/93 de 22/11, e não pela prática de um crime previsto e punido pelo artigo 21° do Decreto-Lei 15/93 de 22/11; 3. Face a todos os circunstancialismos enunciados, e face à prova produzida, a pena deveria ser fixada, atendendo ao disposto nos artigos 40°, 70°, 71° e 72° do Código Penal; 4. Ao assim não entender, violou o Douto Acórdão recorrido, as normas dos artigos supra referidos, nomeadamente, artigos 40°, 70°, 71° e 72° do Código Penal; Termos em que, face ao exposto, deve ser concedido provimento ao recurso ora interposto, condenando o arguido pela pratica de crime previsto e punido pelo artigo 25° al. a) do Decreto-Lei 15/93 de 22/11, e não pela prática de um crime previsto e punido pelo artigo 21° do Decreto-Lei 15/93 de 22/11; Caso este douto Tribunal entenda manter a condenação do arguido pela prática de um crime previsto e punido pelo artigo 21° do Decreto-Lei 15/93 de 22/11, requer-se a V.Exa que: 5. Face ao crime de tráfico de produtos estupefacientes, e perante o circunstancialismo atenuante, que o arguido seja condenado numa pena, que não poderá ser superior a 5 (cinco) anos de prisão.

O Ministério Público respondeu à motivação do recurso, dizendo em síntese conclusiva: 1. Considerando a matéria de facto dada como assente no douto acórdão recorrido a correcta subsunção jurídica da mesma é no ilícito previsto no artigo 21° do DL 15/93, 2. Sendo certo que nos casos em que ao lado de um tipo simples existem um tipo privilegiado e um tipo agravado, é no tipo simples que o legislador prevê a conduta proibida enquanto elemento do tipo, 3. surgindo depois os elementos atenuativos ou agravativos que modificam o tipo base e cuja afirmação tem de ocorrer de modo claro para que se possa abandonar o tipo simples.

4. No caso em apreço, em que o recorrente se dedicou à venda de heroína durante cerca de seis meses, vivendo exclusivamente do produto dessa actividade, com um sistema de contactos organizado via telemóvel, e sendo ainda detido com uma quantidade já considerável de tal substância ( 14,678 gramas, mais 1,195 gramas) não poderá falar-se em crime de tráfico de menor gravidade, mas antes no tipo legal simples, o crime de tráfico de estupefacientes p.p. pelo art. 21° n° l do D.L. 15/93, de 22/1.

5. Por outro lado e no que concerne à determinação da medida da pena aplicada ao recorrente, a mesma mostra-se correctamente doseada, 6. pois situa-se dentro do limite médio da moldura penal abstracta correspondente ao ilícito ( 4 a 12 anos de prisão), 7. não podendo olvidar-se o dolo directo, o modo de execução da conduta ( prolongando-se no tempo durante seis meses), a substância utilizada, a quantidade de produto apreendido, o facto de a actividade desenvolvida ser a única que exerceu durante esse período, bem como as condenações anteriormente sofridas, nomeadamente pela prática de idêntico ilícito, sendo que a conduta em causa nestes autos ocorreu ainda em período de liberdade condicional.

8. Em face do que fica dito considera-se que a pena cominado se mostra correctamente doseada, 9. não merecendo o douto acórdão recorrido qualquer censura, pelo que deve ser integralmente mantido.

Colhidos os vistos legais, teve lugar a audiência, com produção de alegações orais, cumprindo agora apreciar e decidir.

Suscitam-se no recurso as questões da qualificação jurídico-penal dos factos e da medida da pena.

  1. Foram dados como provados os seguintes factos: 1.

    º No decurso do período compreendido entre finais do Verão de 2004 e 7 de Abril de 2005, o arguido, de alcunha "Minhoca", dedicou-se ao abastecimento a toxicodependentes de estupefaciente, heroína, em Caldas da Rainha, nomeadamente, na Rua …, nas imediações dos Cafés …, … e ….

    1. Para o efeito, deslocava-se regularmente à região de Lisboa, em média duas vezes por semana, normalmente no veículo Citroen ZX, de matrícula …, onde, no bairro da Cova da Moura, adquiria a heroína ao preço de € 30 a grama, adquirindo de cada vez que aí se deslocava 5, 10 ou 15 gramas de heroína.

    2. Na posse desta heroína, vendia a mesma directamente aos consumidores, a preços que variavam entre os € 15 e os € 20 a "quarta" de grama.

    3. Esta venda era feita todos os dias ou praticamente todos os dias, havendo dias em que o arguido chegou a vender entre 10 a 15 «quartas», tendo como compradores pelo menos cerca de dez consumidores toxicodependentes.

    4. A heroína adquirida pelo arguido durante o período referido em 1. e pela forma referida em 2., foi destinada pelo arguido em parte à venda a terceiros e a parte restante, não exactamente apurada mas sempre inferior a metade do total, para o seu próprio consumo.

    5. No dia 7 de Abril de 2005, o arguido...

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