Acórdão nº 05P4307 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2006

Data01 Março 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça 1.

1.1.

No Tribunal Colectivo do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do …, no Pº nº …, respondeu, com outro, o arguido AA, cidadão cabo-verdiano, solteiro, ladrilhador, nascido em …, filho de BB e de CC, residente na Rua …, nº ..º Esqº, …, acusado de ter praticado, em concurso efectivo, um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL 15/93 de 22.01, um crime de posse de arma proibida, p. e p. pelo artº 275º, nº 3, do Código Penal, com referência ao artº 3º, nº 1 al. f), do DL 207-A/75 de 17.04, e um crime de condução ilegal, p. e p. pelo artº 3º, nº 2, do DL 2/98 de 03.01.

A final, na procedência parcial da acusação, foi: - absolvido do crime de posse de arma proibida; e - condenado, como autor material e em concurso real: - de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL 15/93, na pena de quatro anos e seis meses de prisão e na pena acessória de expulsão do território nacional, com interdição de aqui entrar, pelo período de cinco anos; - de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nº 2, do DL 2/98, na pena de quatro meses de prisão; - em cúmulo jurídico, na pena única de quatro anos e oito meses de prisão e na pena acessória acima referida.

1.2.

Inconformado, recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, fls. 506 e segs.

O recurso foi, no entanto, julgado improcedente pelo acórdão de fls. 594 e sgs.

1.3.

De novo inconformado, recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, rematando a respectiva motivação com as seguintes conclusões: «I. Por não se conformar com a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, o Recorrente interpôs recurso da decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa.

  1. O recurso abrangia a matéria de facto e de direito, tendo o Recorrente redigido um capítulo referente ao que considerou ser a análise crítica da matéria dada como provada.

  2. Foram devidamente especificados os pontos que não deveriam ter sido dado como provados, em concreto os pontos 7, 11, 12, 15 e 16 da decisão, para além dos excertos resultantes do depoimento das Testemunhas que contrariam tais factos e o respectivo suporte magnético, tendo sido requerida a transcrição da prova.

  3. Foram especificadas devidamente as questões decorrentes da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, a especificação dos artigos ou pontos da matéria de facto que considerou incorrectamente apreciados e consequentemente as provas que impõem decisão diversa da recorrida, nos termos do art. 412.°, n.° 3 do C.P.P.

  4. Por entender que o recurso interposto se encontrava circunscrito à matéria de direito, o Tribunal da Relação de Lisboa absteve-se de o apreciar no que concerne à matéria de facto invocada.

  5. O acórdão recorrido é nulo, por omissão de pronúncia - vide arts. 4.° do C.P.P.; art. 668.°, n.° 1, al. d), 731.°, n.° 1 e 2 do C.P.C., devendo tal nulidade ser suprida.

    Por mera cautela de patrocínio: VII. 0 Recorrente possui uma estável, digna e consistente personalidade do Arguido, assumindo-se por inteiro nas suas responsabilidades e obrigações, confessando os factos de que foi acusado - o que deve valorar em seu favor.

  6. Encontra-se social e familiarmente inserido.

  7. Vive em Portugal há pelo menos cerca de um ano, tendo a viver em Portugal três irmãos, mais velhos.

  8. Vivia com uma companheira, em casa arrendada, a qual lhe tem prestado incondicionalmente o seu apoio, visitando o Recorrente sempre que possível, no Estabelecimento Prisional onde se encontra detido.

  9. O Recorrente é primário, não tendo antecedentes criminais.

  10. Trabalhou na construção civil, como ladrilhador.

  11. Desde Abril de 2003 a conselho médico, face à desconfiança deste de o recorrente ter contraído tuberculose, deixou o recorrente de trabalhar nas obras, para evitar o contacto com o pó dessas obras, sob pena de agravar o seu estado de saúde.

  12. O Recorrente esteve internado no Hospital …, no …, desde 09.06.2003 até 17.07.2003, na sequência da confirmação da tuberculose.

    .XV. A conduta do Arguido não é susceptível de integrar a previsão do tipo legal de crime de tráfico de estupefacientes p. e p., pelo art. 21° do D.L. 15/93.

  13. É de aplicar e integrar a conduta do Arguido na previsão do tipo legal de tráfico de menor gravidade previsto e punido pelo art. 25° do mesmo diploma legal atento o facto de a ilicitude se mostrar consideravelmente diminuída (o grau de ilicitude do facto é inferior à media), atenta a modalidade ou as circunstâncias da acção (o arguido dedicou-se ao tráfico, por não poder mais trabalhar nas obras, em virtude de lhe ter sido diagnosticada tuberculose) e atenta ainda a quantidade, que é manifestamente pequena.

  14. É entendimento da defesa do Arguido que a conduta do mesmo, todo o enquadramento social e familiar deste, ausência de antecedentes criminais, não se ter demonstrado qualquer elemento agravante, deveriam subsumir a conduta do Arguido ao disposto na alínea a) do art. 25° do D.L. 15/93, censurando o facto, mas não o privando da liberdade.

  15. O mesmo equivale a dizer que o Arguido deveria ser condenado, sim, nos termos previstos e punidos na alínea a) do artigo 26° do D.L. 15/93 em pena, cuja execução, pudesse ser suspensa.

  16. Na determinação da medida concreta da pena deve o juiz atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente - cfr. arts. 71.° e 72.° do C.P..

  17. Há que atender à influência da pena sobre o agente, tendo em consideração as condições pessoais e a situação económica deste.

  18. O Recorrente é pessoa de modesta condição económica e social, tendo como habilitações literárias a 4.ª classe.

  19. Ao ser-lhe aplicada ao Recorrente uma pena de 4 anos e 8 meses de prisão, há uma clara violação do disposto no art. 71.° do Código Penal.

  20. Não há pois qualquer dúvida que o enquadramento jurídico do crime de tráfico praticado pelo Recorrente é o constante do art. 25.° e não do art. 21.° do D.L. 15/93, configurando os presentes autos um caso de tráfico de menor gravidade.

  21. Para se aquilatar do preenchimento do tipo legal do art. 25. ° do D.L. 15/93, de 22-01 haverá de se proceder a uma "valorização global do facto" ; não devendo o intérprete deixar de sopesar todas e cada uma das circunstâncias a que alude aquele artigo, podendo juntar-lhe outras. - 07-12-1999; Proc. n.º1005 -3, Secção - Lourenço Martins, Virgílio Oliveira, Leonardo Dias, Armando Leandro XXV. O que importa, isso sim, é apurar na falada análise, se de todo o conjunto da actividade do arguido emergem itens inculcadores de reiteração, habitualidade, intensidade, disseminação alargada ou sintomaticamente expressiva, reiteração, ligações mais ou menos marcadas ao mundo dos estupefacientes ou ao seu mercado, carácter dos actos praticados e sua dimensão. Só deste apuramento pode partir-se para, com razoável segurança, se extremarem, entre si, o grande tráfico, o médio tráfico e o pequeno tráfico e, através dessa diferenciação, alcançar-se suporte para se afirmar se se trata ou não de um caso de ilicitude consideravelmente diminuída. - 12-10-2000; Proc. n.º 170/2000 - 5.ª Secção - Oliveira Guimarães, Dinis Alves, Guimarães Dias, Costa Pereira.

  22. O tráfico de menor gravidade (art. 25º do D.L. 15/93) pressupõe que a ilicitude do facto aferida, nomeadamente pelos meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das substâncias - se mostre consideravelmente diminuída. A interpretação que parece mais consentânea com o texto (e com a epígrafe) do art. 25. ° do D.L. 15/93 é a de que o legislador quis incluir aqui todos os casos de menor gravidade, indicando exemplificativamente circunstâncias que poderão constituir essa situação. Assim, será correcto considerar-se preenchido este crime sempre que se constate a verificação de uma ou mais circunstâncias que diminuam consideravelmente a ilicitude, como poderá ser, por exemplo, uma quantidade reduzida de droga, ou esta ser uma droga leve, ou quando a difusão é restrita, etc. O crime do art. 25. ° é para o pequeno tráfico, para o pequeno retalhista de rua. - 31-01-2002: Proc. n.'4264/01- 5.ª Secção - Carmona da Mota, Pereira Madeira, Simas Santos, Abrahches Martins XXVII. Vejam-se também os Acórdãos do STJ de 22-11-2002 (www.dasi.pt/iurisprudência do STJ, n.°...

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