Acórdão nº 05P4129 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Fevereiro de 2006

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça.

No processo comum colectivo n.º 426/03. 8, do 1º Juízo da comarca de Felgueiras, após a realização do contraditório foi proferido acórdão que absolveu o arguido AA, com os sinais dos autos, da autoria material de um crime de rapto, de dois crimes de sequestro e de um crime de detenção e porte de arma proibida, previstos e puníveis, respectivamente, pelos artigos 160º, n.º 1, alíneas c) e d), 158º, n.º1 e 275º, n.º 3, do Código Penal, tendo-o condenado como autor material, em concurso real, de dois crimes de roubo, um na forma tentada, previstos e puníveis, pelo artigo 210º, n.º1 e 210º, n.º1, 22º, 23º e 73º, do Código Penal, nas penas de 10 meses e 20 meses de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena conjunta de 2 anos de prisão.

O Digno Magistrado do Ministério Público interpôs recurso, sendo do seguinte teor a parte conclusiva da respectiva motivação: 1. No caso concreto, o arguido AA cerceou a liberdade de movimentação das ofendidas BB e CC por um período de tempo e por um percurso que em muito ultrapassa o necessário para o pretendido levantamento de dinheiro em posto de ATM; 2. Assim, a limitação da liberdade das ofendidas vai muito para além do necessário e do indispensável para o cometimento do crime de roubo; 3. Por outro lado, em qualquer das situações consideradas, os factos dados como provados preenchem os elementos típicos objectivos do crime de sequestro, para além do crime de roubo, na medida em que representam uma violação do bem jurídico ali protegido de liberdade de locomoção inerente à pessoa humana, ou seja, a liberdade física ou corpórea de mudar de lugar, de se deslocar de um sítio para outro; 4. Demonstra-se igualmente o elemento subjectivo já que resulta da factualidade provada que o arguido sabia ser-lhe proibida tal conduta e que a mesma violava a liberdade de movimentação das vítimas; 5. Assim sendo, em ambas as situações de facto relatadas no acórdão recorrido, verifica-se concurso efectivo de crimes, ou seja, a conduta do arguido AA preenche simultaneamente a previsão estabelecida pelo artigo 210º, n.º 1 e pelo artigo 158º, n.º1, do Código Penal; 6. Ao não entender assim, o acórdão recorrido violou o disposto no artigo 30º, n.º1, do Código Penal; 7. Para além do mais, as penas de prisão aplicadas em concreto, por cada um dos crimes de roubo cometidos pelo arguido, não satisfazem os propósitos preventivos de estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade da norma violada; 8. Na verdade, quer pela frequência da prática de crimes de roubo na comunidade, quer pela intranquilidade social que tal crime gera, impõe-se uma intervenção forte do direito penal sancionatório, por forma a que a aplicação da pena em concreto responda às necessidade de tutela do bem jurídico, assegurando a manutenção, apesar da violação da norma ocorrida, da confiança comunitária da prevalência do direito; 9. Por outro lado, a forma como o arguido cometeu o crime de roubo evidencia um grau elevado de frieza e de insensibilidade, porquanto é cometido com a utilização de uma navalha, sempre à vista das vítimas, o que, em nosso entender, eleva a culpa pelo facto; 10. Acresce ainda, em desabono do arguido, o facto de cada uma das vítimas, ambas ainda jovens, se encontrarem sozinhas no momento em que este actuou e o facto de serem obrigadas, nos moldes relatados na matéria de facto, a conduzir a sua própria viatura sob as instruções de quem as ameaça e inibe a sua liberdade; 11. No caso concreto, também no plano da prevenção especial se detectam particulares exigências, dado o percurso de toxicodependência e de vida delituosa do arguido AA; 12. Além do mais, como acima se defendeu, a factualidade considerada no acórdão recorrido integra ainda, em concurso efectivo de crimes, o cometimento de dois crimes de sequestro, previstos e puníveis pelo artigo 158º, n.º1, do Código Penal, reclamando, obviamente, cada um deles, a aplicação de uma pena de prisão; 13. Tudo ponderado, temos por ajustado a aplicação, ao arguido AA, das penas de 2 anos e 6 meses de prisão pelo crime de roubo, na forma consumada, 1 ano e 6 meses de prisão pelo crime de roubo, na forma tentada, e de 8 meses de prisão por cada um dos crimes de sequestro; 14. Em cúmulo jurídico, considerando, em conjunto os factos e a personalidade do arguido, evidenciada nos factos, de acordo com o que dispõe o artigo 77º, do Código Penal, temos por adequada a pena única de 3 anos e 6 meses de prisão; 15. Não procedendo assim, o tribunal "a quo" violou, para além do disposto no artigo 30º, n.º1, do Código Penal, o disposto no artigo 71º, do Código Penal.

O recurso foi admitido.

Na contra-motivação apresentada o arguido formulou as seguintes conclusões: 1. Não assiste qualquer razão ao Ministério Público.

  1. No que ao crime de sequestro diz respeito, muito embora estarem patentes os elementos tipificadores do crime de sequestro, no caso sub judice o crime de sequestro é consumido pelo crime de roubo, na medida em que o sequestro foi apenas um meio de execução do roubou.

  2. Resulta claramente da matéria fáctica dada como provada que o arguido apenas reteve a liberdade das ofendidas até concluir os seus intentos, a prática do roubo, e não mais do que por esse tempo, ao contrário do que sustenta o Ministério Público.

  3. Pelo que ao absolver o arguido da prática dos crimes de sequestro pelos quais vinha acusado o tribunal "a quo" fez sã e devida justiça, não tendo em consequência violado qualquer preceito legal.

  4. Ora, no que à medida da pena diz respeito, também carece o Ministério Público de que qualquer razão, sendo que em nosso entender é de manter a pena fixada pela 1ª instância ao arguido.

  5. A pena aplicada ao arguido é a pena necessária para o afastar da delinquência e integrá-lo nos princípios dominantes na comunidade, tendo em atenção que a medida da pena é a necessária à reintegração do indivíduo na sociedade...

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