Acórdão nº 01239/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução19 de Junho de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A... interpôs no Tribunal Central Administrativo recurso contencioso de anulação do indeferimento tácito de um recurso hierárquico e do despacho de indeferimento expresso do mesmo recurso, datado de 26-11-2002, do Senhor Secretario Regional da Educação do Governo Regional da Região Autónoma da Madeira.

O Tribunal Central Administrativo rejeitou o recurso contencioso do indeferimento tácito, por carência de objecto, e concedeu provimento ao recurso do acto expresso, anulando-o.

Inconformado, o Recorrente interpôs o presente recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1. Ao contrário do decidido pelo douto Acórdão recorrido o despacho objecto de recurso hierárquico - deliberação do Conselho Administrativo - era um acto contenciosamente impugnável, pelo que, como tal, não se estava perante recurso necessário, sendo o acto do Secretário Regional meramente confirmativo. (V., entre outros, Acórdão do S.T.A. de 09-07-91, in AD nº 361 e Acórdão de 16-02-93, in AD nº 383).

  1. Tal acto consolidou-se na ordem jurídica e tornou-se verdadeiro caso decidido ou resolvido, devendo o Secretário Regional recorrido ter sido absolvido da instância (artº 493º do CPCivil, ex vi do artº 1º da LPTA), disposições que o douto Acórdão recorrido violou.

  2. Acontece que, em qualquer caso, e ao contrário do decidido pelo douto Acórdão recorrido, o acto em causa - despacho do Secretário Regional recorrido - não enferma de qualquer vicio, designadamente, de violação de lei.

  3. Estava sempre em causa "um mero erro ou lapso dos serviços da escola", sendo inadmissível que o recorrido se prevaleça, abusivamente, de tal falha.

  4. Desse lapso decorreu a necessidade de reposição de verba indevidamente paga ao recorrido, sendo certo que, ao contrário do decidido pelo Acórdão recorrido, a Administração dispõe de um prazo de cinco anos para corrigir tais erros de verbas indevidamente processadas e que consubstanciam meros actos materiais, correcção que não envolve a menor revogação de qualquer acto administrativo.

  5. Acresce que, como se decidiu nos Acórdãos do S.T.A., de 14-05-96,( ( ) Proc. nº 39403, citado nos CJA, nº 10, p. 61.

    ) e de 09-10-97,( ( ) AP - DR, 25-09-2001, p. 6760.

    ) tal obrigação de reposição subsiste durante cinco anos, mesmo que tenha já decorrido o prazo de 1 ano da revogação do acto administrativo anterior que tivesse conferido tal remuneração.

  6. Por outro lado, o artº 70º da Lei nº 55-B/2004, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado para 2005, veio introduzir um novo nº 3. ao artº 40º do Dec-Lei nº 155/92, de 28 de Julho.

  7. A referida norma, que tem a natureza de interpretação autêntica, veio clarificar o sentido do preceito, considerando que o regime do artº 141º do CPA não prejudica a possibilidade legal de determinação da reposição de quantias indevidamente pagas, no prazo de cinco anos.

  8. Esta norma tem efeito retroactivo, nos termos do artº 13º do CCivil, pelo que não há dúvida de que tem de ser considerada e aplicada na decisão do caso dos autos.

  9. Andou, assim, mal, o Acórdão recorrido que ignorou também o disposto no artº 148º do CPA, que autoriza a rectificação de erros materiais a todo o tempo.

  10. O Acórdão recorrido violou, entre outras disposições legais, o artº 40º do Dec-Lei nº 155/92, de 28 de Julho; os artºs 267º e 268º da C.R.P.; os arts 141º, 148º e 167º, nº 1., do CPA e artº 493º do CPCivil e artº 1º da LPTA.

    O Recorrente Contencioso contra-alegou, defendendo a manutenção do acórdão recorrido.

    O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos: 1. O recorrente imputa ao douto Acórdão recorrido erro de julgamento sobre a improcedência da questão prévia da irrecorribilidade do acto contenciosamente impugnado, em razão do princípio da autonomia das escolas e da alegada competência exclusiva do Conselho Administrativo do estabelecimento de educação em referência, em matéria de gestão financeira.

    Em nosso parecer, o recurso não merecerá provimento.

    Na esteira do entendimento perfilhado pelo Mº Pº, em primeira instância, e adoptado pelo Acórdão recorrido, as escolas são serviços locais desconcentrados do Estado, no caso integrados na Secretaria Regional da Educação da Região Autónoma da Madeira, sendo dotadas de autonomia tão só quanto ao projecto educativo do estabelecimento de ensino e em função das competências e dos meios que lhe estão afectos, nos termos do artº 3º do Regime de Autonomia, Administração e Gestão dos Estabelecimentos Públicos dos ensinos básico e secundário, aprovado pelo Decreto-Lei nº 115-A/98, de 4 de Maio e do seu art' 13; e bem assim do art' 3' do DLR n' 4/2000/M, de 31 de Janeiro.

    Neste sentido, os Acórdãos deste STA, de 26/11/03, rec. 1162/03; de 14/10/03, rec. 933/03 e de 1/7/03, rec. 579/03.

    Por outro lado, a autoridade recorrente é o órgão de topo da hierarquia administrativa em que se insere o Conselho Administrativo do mesmo estabelecimento de ensino, o que resulta nomeadamente das disposições constantes do art. 22.º do DL nº 43/89, de 3 de Fevereiro; art's 36º e 38º do DLR nº 4/2000/M, de 31 de Janeiro; artºs 1º e 2º, nºs 4 e 7 do DRR n.º 25/2001/M, de 18 de Outubro e dos artºs 2º e 3º, n.º 1, alíneas c) e d) do DRR nº 8/2001/M, de 2 de Maio.

    Assim sendo, na ausência de disposição legal expressa atributiva a este órgão de competência exclusiva em matéria de gestão financeira, objecto do acto recorrido, haverá de prevalecer o entendimento pacificamente aceite de que a competência do órgão subalterno é própria separada e que os seus actos estão sujeitos a recurso hierárquico necessário, como bem se entendeu no Acórdão recorrido.

  11. Improcederá também o recurso quanto à alegada violação, por erro de interpretação e aplicação, das normas do artº 40.º do Decreto-Lei nº 155/92, de 28 de Julho e dos artºs 141.º e 148º, ambos do CPA, por estar apenas em causa, no acto contenciosamente impugnado, a determinação de reposição de verbas indevidamente pagas por mero erro ou lapso dos serviços e não a revogação ilegal de qualquer acto administrativo.

    Com efeito, o processamento indevido, a favor do ora recorrido, de quantias a título de horas extraordinárias não consubstancia erro de cálculo ou deficiência burocrática dos serviços, antes pelo contrário deveu-se a erro jurídico de atribuição ao mesmo recorrido de um horário lectivo semanal de 20 horas, em vez de 22 horas, como seria devido.

    A definição da obrigação de reposição daquela quantia importa pois a eliminação da ordem jurídica, com fundamento na respectiva invalidade, do(s) acto(s) que, autoritária e unilateralmente, determinaram o horário lectivo do recorrido e a sua consequente remuneração, com efeitos vantajosos para a respectiva esfera jurídica.

    Como o Pleno deste STA tem reiteradamente afirmado, "O prazo prescricional de cinco anos, estabelecido no art. 40.º do D.L. 155/92, de 28.7, para a obrigatoriedade de reposição de quantias recebidas que devam entrar nos cofres do Estado, reporta-se exclusivamente à exigibilidade ou à possibilidade de cobrança de um crédito preexistente a favor do Estado e não à prévia definição jurídica da obrigação de repor, em nada interferindo, pois, com a regra geral da revogação dos actos administrativos constitutivos de direitos - Acs de 23/5/06, rec. 01024/04; de 6/12/05, rec. 672/05 e de 5/7/05, rec. 159/04.

    Ora, no caso em apreço, forçoso é concluir que a definição da obrigação jurídica de restituir, importando a revogação do(s) acto(s) administrativo(s) definidor(es) da situação remuneratória do recorrido, operou-se com violação do artº 141º do CPA, pelo decurso do prazo estabelecido para o efeito, de acordo com a matéria de facto dado como provada.

  12. Improcedendo todas as conclusões das alegações do recorrente, deverá, em nosso parecer, ser negado provimento ao recurso.

    O Recorrente Jurisdicional pronunciou-se sobre este douto parecer, defendendo que deve ser revogado o acórdão recorrido.

    Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    2 - No acórdão recorrido deu-se como assente a seguinte matéria de facto: 1 - O recorrente foi notificado por ofício de 31/7/02 do Despacho do Director da Escola Secundária ... que: " Tendo sido verificado que nos anos lectivos de 1999/2000 e 2000/2001, por lapso foi-lhe considerado um horário semanal de vinte horas, quando deveria ser de vinte e duas, o que levou à atribuição de duas horas extraordinárias pagas indevidamente durante estes dois anos. Informo V. Ex.ª que o valor ilíquido auferido indevidamente foi de ... 2.319,18 euros ...Solicita-se que nos termos legais seja efectuada a reposição...", do qual interpôs recurso hierárquico.

    2 - Por carta de 11/10/02 o recorrente foi notificado pelo Presidente do Conselho Administrativo da ESMJ "...nos termos do artigo 137º 1 a contrario, do CPA, se procede à reforma do acto administrativo recorrido. Assim, no ofício ...de 31/7/02, na parte reservada à indicação do órgão subscritor, onde se lê "O Director" deverá ler-se "O Presidente do Conselho Administrativo." 3 - Pelo ofício 1906/1 de 4/12/02 o recorrente foi notificado do despacho de 26/11/02 de autoridade recorrida de seguinte teor: Indeferido o recurso hierárquico com os fundamentos...

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