Acórdão nº 01168/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelJORGE LINO
Data da Resolução26 de Abril de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

1.1 "A…" vem interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, de 23-3-2006, que, nos presentes autos de recurso de contra-ordenação, julgou improcedente o recurso, «mantendo-se a decisão que aplicou a coima, nos seus precisos termos» - cf. fls. 62 e seguintes.

1.2 Em alegação, a recorrente formula as seguintes conclusões - cf. fls. 74 a 78.

  1. De acordo como artigo 8° do Regime Geral das Contra-Ordenações (adiante RGCO), aplicável ao caso em apreço ex vi artigo 3° do RGIT, só é punível o facto praticado com culpa; 2. O mesmo resulta, aliás, do disposto nos artigos 1° do RGCO e 2° do RGIT, que definem, respectivamente, os conceitos de contra-ordenação e de infracção tributária; 3. A culpa objectiva não é admissível no nosso ordenamento jurídico contra-ordenacional, bem como não poderá ser admitida a culpa presumida nesta mesma área de direito; 4. O que realmente define a punição do acto serão os elementos subjectivos do tipo contra-ordenacional, ou seja, o dolo, a negligência e também a culpa, que, no caso, não foram sequer abordados na sentença; 5. Para que a Recorrente pudesse ser condenada, teria a sentença recorrida de conter a fundamentação da punição, sendo essencial apreciar a ilicitude e culpabilidade do facto; 6. Nos termos do disposto no artigo 379° do Código de Processo Penal (adiante CPP), aplicável ex vi artigos 3° al. b) do RGIT e 41° n.º 1 do RGCO, é nula a sentença que não contiver os elementos do artigo 374° n.º 2 do CPP; 7. O n.º 2 do artigo 374° determina a necessidade de fundamentação da sentença, expondo os motivos de facto e de direito que levam à condenação; 8. No caso em apreço, a sentença recorrida não contém qualquer fundamento de direito, mormente apreciação e valoração da culpa, dolo ou negligência, que fundamente a condenação; 9. Nestes termos, deve a sentença recorrida ser considerada nula, por ausência de fundamentação, devendo a mesma baixar ao Tribunal a quo, para aí se proferir nova e mui douta sentença; 10. Não pode a Recorrida concordar com a sentença recorrida no que se refere à não aplicação do disposto no artigo 32° do RGIT, pois considera que a interpretação a ser efectuada do mencionado artigo não foi a correcta; 11. A doutrina e a jurisprudência referem por vezes que a exigência cumulativa de que a prática da infracção não ocasione prejuízo efectivo à receita tributária não terá em vista referenciar os casos em que a regularização veio a ocorrer, com pagamento integral da quantia em dívida, mas antes reportar-se às situações em que não chegou a produzir-se prejuízo, antes da regularização; 12. Contudo, fontes igualmente autorizadas também têm vindo a considerar que a interpretação a dar da mencionada expressão não será exactamente a acima referida, pois não se aceita que o artigo 32° do RGIT não se aplique devido a um prejuízo hipotético ou potencial consubstanciado numa presumida não disponibilidade da receita por parte da Administração Fiscal; 13. Não basta a aferição de um prejuízo hipotético, mas antes de um prejuízo concreto e verificado, pois o próprio teor literal da lei prende-se com o prejuízo efectivo para a receita; 14. Deve por isso considerar-se que o legislador quis incentivar o sujeito passivo faltoso a regularizar o pagamento do tributo prevendo exactamente a dispensa da coima, tendo em conta ainda o inexistente ou diminuto grau de culpa inerente à generalidade dessas situações; 15. Sendo esse o sentido que a Recorrente interpreta o artigo 32° n.º 1 do RGIT, considera a mesma que a sentença recorrida deve ser anulada e substituída por douto Acórdão em que seja dispensada a aplicação da coima nos termos do artigo 32° do RGIT, ou, pelo menos, aplicada uma atenuação especial da mesma, de acordo com o n.º 2 do referido preceito legal.

    Nestes termos e nos demais de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, seguindo-se os demais tramites legais.

    1.3 O Ministério Público no Tribunal recorrido contra-alegou do modo que segue - cf. fls. 87 e 88.

    Entende a recorrente A…, que a douta sentença condenatória deve ser considerada nula, por ausência de fundamentação no que concerne à apreciação e valoração da culpa, dolo ou negligência, que fundamente a condenação.

    Entende ainda que, por ter regularizado o pagamento do tributo, não houve um prejuízo concreto para a Ad. Fiscal, razão pela qual deveria ter sido dispensada a aplicação da coima ou ter sido ela atenuada especialmente, tudo de acordo com o art.º 32.º do RGIT.

    Não parece ter razão.

    Com efeito, e quanto ao primeiro ponto, a recorrente não abordou a questão da valoração da culpa no recurso que interpôs da decisão administrativa condenatória.

    Ora, sendo assim, não tinha o Mm.º Juiz que se pronunciar, na decisão que versa sobre o recurso apresentado, sobre tal questão.

    Razão pela qual, a esse respeito, nenhum vício afecta a douta sentença dos autos.

    Quanto ao segundo ponto, apenas se acrescentará, ao que já se encontra na decisão recorrida, que é manifesto que o facto de ter havido posterior pagamento do tributo, em nada afecta o facto de a Ad. Fiscal ter tido um prejuízo efectivo com o seu não pagamento atempado. A única alteração a essa situação, com tal pagamento, é que esse prejuízo foi ressarcido, o que não afasta a ocorrência efectiva do mesmo para os efeitos da al. a) do art.º 32.º do RGIT, e para afastar a possibilidade de dispensa da coima.

    Não afasta, é certo, a possibilidade de atenuação especial da mesma coima, de acordo com o n.º 2 do mesmo artigo, mas a esse respeito, e sobre a faculdade que é dada ao julgador de atenuar, ou não, especialmente a coima, não se julga necessário algo acrescentar, ao que doutamente se disse a esse respeito na sentença questionada.

    Deve pois improceder o recurso apresentado.

    1.4 Não houve contra-alegação da Fazenda Pública.

    1.5 O Ministério Público neste Tribunal veio dizer o que segue - cf. fls. 102 verso.

    Sobre o mérito do recurso pronunciou-se já a fls. 87 o Ministério Público, que, aliás, figura nos autos como recorrido.

    Como assim, ao abrigo do disposto no artigo 146.º do CPTA, afigura-se-nos não haver lugar a intervenção do Ministério Público no Tribunal de recurso, pelo que não emite parecer.

    1.6 Colhidos os vistos, cumpre decidir...

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