Acórdão nº 047555A de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Fevereiro de 2007

Data13 Fevereiro 2007
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A...

, com os sinais dos autos, por apenso e como incidente do recurso contencioso nº47555 que corre termos na 2ª Subsecção, onde pede a anulação do acórdão do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público de 31.01.2001, que lhe indeferiu a reclamação do acórdão da Secção Disciplinar do mesmo Conselho de 14.12.2000, que lhe aplicou a pena disciplinar de Demissão, vem requerer:

a) A concessão de providência destinada a suspender a eficácia da pena disciplinar de demissão aplicada ao requerente, permitindo-lhe exercer as funções de Procurador da República e ser remunerado por elas; b) Em alternativa, a regulação provisória da sua situação económico-financeira mediante a determinação do pagamento, a título provisório, do seu vencimento como magistrado do Ministério Público, com a categoria de Procurador da República, até ao termo do processo; c) Finalmente e também em alternativa, a antecipação provisória do pagamento da pensão de aposentação, a que sempre terá direito nos termos do artº 15º da Lei nº 15/94, de 11 de Maio.

Alega para o efeito, que estão preenchidos os pressupostos da concessão das providências cautelares requeridas: Quanto ao «fumus boni iuri» alega, em síntese, que face à Decisão de Não Pronúncia do Tribunal da Relação de Lisboa, de 07.04.2003, confirmada pelo Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 22 de Junho de 2006, relativamente aos mesmos factos valorados no processo disciplinar que afastou o requerente de funções, e ao acórdão do Plenário do CSMP de 11.07.2006, que autorizou a revisão da pena de demissão, parece evidente que não só não é manifesta a falta de fundamento da pretensão impugnatória do agora Requerente como ainda é provável a sua procedência.

E isto porque não se tratando de um comportamento administrativo, a sua validade, nem sequer é susceptível de apreciação pela jurisdição administrativa, relevando, neste aspecto, as conclusões dos tribunais judiciais.

Existe, assim, uma contradição insanável entre a decisão disciplinar que considera ter existido um acto ilegal e ilícito e as decisões judiciais que julgaram o mesmo comportamento legal, adequado e lícito.

Logo, a probabilidade desta decisão ser materialmente inválida é bastante elevada, tal parecendo suficiente para dar como preenchido o requisito «fumus boni iuri», quer na versão menos exigente, quer na versão mais exigente.

Quanto ao requisito «periculum in mora», também considera estar preenchido, pois a concessão das providências requeridas são a única forma de evitar a criação de uma situação de facto consumado: a absoluta penúria do requerente.

Os factos que suportam a decisão disciplinar de Demissão que lhe foi aplicada reportam-se ao ano de 1993, quando o requerente exercia funções de Delegado do Procurador da República, na comarca de ....

Em consequência da referida punição, desde 27 de Fevereiro de 2003 que o ora Requerente cessou todas as suas funções como magistrado do MP, com perda de vencimento, sem segurança social e assistência médica.

Alega não ter bens, nem rendimentos, e as pequenas poupanças que fez já se esgotaram e os familiares e amigos a que tem recorrido não podem, por impossibilidades materiais, manter a sua solidariedade.

Que pretendeu, mas foi-lhe negado o exercício da advocacia, face à natureza das infracções imputadas ao recorrente, pelo CSMP.

Também não pode recorrer ao crédito bancário, não só por não ter garantias para a sua concessão, mas também pela simples razão de que não teria como o pagar.

Desenha-se para o Requerente uma única saída: ter de desistir do presente recurso contencioso de modo a poder activar a faculdade concedida pelo artº 15º da Lei da Amnistia de 1994 (Lei 15/94 de 11.05) e auferir a reforma a que sempre teria direito.

Ou seja, chega-se à conclusão insustentável de que o requerente para poder sobreviver tem de renunciar ao direito constitucional de tutela jurisdicional efectiva dos seus interesses e direitos.

Refere que o CSMP, na deliberação em que então reconheceu que o diferimento da execução da pena de demissão seria gravemente prejudicial para o interesse público, fundou tal posição no prestígio e na imagem do Ministério Público.

Neste momento, em que se sabe que, do ponto de vista criminal, nenhuma censura há a fazer ao comportamento do Requerente, não é possível deixar de concluir que a manutenção da situação actual causa danos à imagem, prestígio, bom nome e consideração do Requerente incomensuravelmente superiores aqueles que supostamente causaria à imagem do MP a continuação do exercício de funções.

Considera, pois, que não existe razão para o impedir de exercer funções e, portanto, para a atribuição do efeito suspensivo ao recurso.

Se assim se não entender, o que não concebe, entende que sempre os pedidos alternativos formulados deverão proceder, pois não é possível deixar de ponderar a situação económica em que se encontra e que, só por si, justifica, medidas urgentes, ainda que provisórias.

Tal regulação provisória permitiria, pelo menos, afastar o perigo imediato de grave carência económica do Requerente e sua família, não causando qualquer prejuízo ao interesse público, já que, no demais, a situação manter-se-ia inalterada.

Por outro lado, o artº 15º da Lei 15/94, de 11.05, aplicável ao caso, tendo em conta o momento da prática do mandado de detenção censurado, permite a substituição da pena de demissão por aposentação compulsiva, num prazo subsequente ao trânsito em julgado das decisões judiciais que tenham apreciado a validade da sanção.

Em qualquer caso, o Requerente tem o direito de requerer a sua aposentação, por isso, tendo em conta os danos económicos já indicados, pede seja antecipada a pensão de aposentação, de modo a permitir obter uma fonte de rendimento susceptível de assegurar a sua sobrevivência.

A manutenção da situação actual permite a continuação de danos irreparáveis na esfera jurídica do Requerente incompatíveis com a tutela judicial efectiva. Por ironia, o recurso à tutela contenciosa impede o Requerente de se aposentar.

As providências requeridas não determinam o mais leve dano para o interesse público.

*Notificada a entidade requerida para, querendo, deduzir oposição, veio a mesma juntar aos autos uma "Resolução Fundamentada", datada de 08 de Janeiro de 2007, onde refere que «a materialidade assente no processo disciplinar e no processo crime permite concluir que a prestação funcional do Requerente provocou uma grave depreciação da imagem abalou o prestígio da Magistratura e dos serviços do Ministério Público», que «já após a prática dos factos que determinaram a pena de demissão o CSMP aplicou ao Requerente por acórdão da Secção Disciplinar de 19.07.2006, a pena de inactividade por um ano, por factos cometidos no exercício de funções de magistrado do MP na comarca de ..., no período compreendido entre 1995 e 1999, por violação com negligência dos deveres profissionais de zelo, obediência e lealdade», pelo que «o regresso do Requerente ao serviço afectará gravemente o interesse público que exige uma prestação funcional que não ponha em momento algum em crise, o rigoroso cumprimento da lei e o respeito pelos deveres de isenção, imparcialidade, objectividade, legalidade e honestidade».

O Requerente foi notificado da Resolução Fundamentada, tendo requerido o seu desentranhamento, por falta de fundamento, já que se não verificam os pressupostos do nº1 do artº 128º do CPTA e a condenação da entidade requerida como litigante de má fé, nos termos do artº456º, nº2, a) do CPC.

A entidade requerida, notificada do referido requerimento pelo Requerente, veio aos autos pronunciar-se sobre tais pedidos, concluindo pela sua improcedência.

Inexistindo prova a produzir, vêm os autos à conferência, para decisão.

*II - OS FACTOS: Com vista à decisão do presente incidente, consideram-se provados os seguintes factos:

a) Por acórdão da Secção Disciplinar do CSMP de 14 de Dezembro de 2000, foi aplicada ao aqui requerente, a pena disciplinar de Demissão, concluindo-se que «revelou falta de honestidade no tratamento privilegiado que deu à participação apresentada por ... contra ..., o que integra a infracção disciplinar prevista no artº 159º, nº1, alínea b) da Lei Orgânica do Ministério Público vigente à data dos factos (Lei 47/86, de 15 de Outubro) e actualmente no artº 95º nº1 b) do Estatuto do Ministério Público aprovado pela Lei nº60/98, de 27 de Agosto». (cf. fls.49 a 59, maxime fls. 59 dos autos principais, que aqui se dão por integralmente reproduzidas).

b) O Requerente reclamou para o Plenário do CSMP, que por acórdão de 31 de Janeiro de 2001, indeferiu in totum a reclamação (cf. fls.145 a 149 dos autos principais, que aqui se dão por integralmente reproduzidas).

c) O Requerente requereu ao CSMP, em 12.02.2001, a Revisão da pena disciplinar de Demissão, tendo tal pedido sido indeferido liminarmente por acórdão de 04 de Abril de 2001 (cf. fls.162 a 166 do processo principal e fls.18 a 33 do rec..../03, em apenso).

d) O Requerente requereu em 15.02.2001, a suspensão de eficácia da deliberação referida em b), o que deu origem ao P. ... deste STA, que correu termos na 1ª Secção e que foi apensado a estes autos.

e) Por acórdão de 10.05.2001 foi indeferida a providência referida em b), tendo o Requerente interposto recurso para o Tribunal Constitucional e para o Pleno da Secção, tendo o primeiro, por decisão sumária de 23.10.01, não tomado conhecimento do recurso e o segundo, julgado inexistente a invocada...

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