Acórdão nº 0491/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelJORGE LINO
Data da Resolução24 de Janeiro de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

1.1 "A..., SA" vem interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa 2 (Loures), de 20-5-2005, que julgou improcedente a impugnação judicial que deduzira contra a liquidação adicional de IRC do exercício do ano de 1999 - cf. fls. 209 e seguintes.

1.2 Em alegação, a recorrente formula as seguintes conclusões - cf. fls. 242 a 244.

I . A Recorrente não se conforma com a incorrecta interpretação do art.º 34º, nº 3, al. d) IRC, pois a sentença recorrida ao interpretar o art.º 34º, n.º 3, al. d) no sentido de que o mesmo é aplicável às participações directas e indirectas no capital da sociedade viola o princípio da legalidade e da tipicidade fiscal, ignorando as regras da hermenêutica jurídica.

II .A boa hermenêutica jurídica está clara e inequivocamente plasmada no artigo 11º, n.º 1 da Lei Geral Tributária portuguesa que na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis; não permitindo que se faça tábua rasa do texto da lei.

III - A legalidade/tipicidade (art.º 103º, 2 da CRP) também exige particular rigor no recorte do tipo legal, por razões de certeza e segurança, com particular vínculo a uma interpretação objectiva, assente no texto da lei.

IV - A matéria colectável em IRC determina-se em função do rendimento facturado e não do rendimento recebido, sendo que só o rendimento recebido permite cumprir na íntegra o primado constitucional da tributação pelo lucro real.

V - Assim, a possibilidade de dedução de provisões para créditos de cobrança duvidosa surge, exactamente, para diminuir a diferença entre rendimento facturado e rendimento recebido, e desta forma permitir a tributação das empresas (quase) pelo lucro real.

VI - Com efeito, os casos previstos no n.º 3 do artigo 34º (hoje, 35º) do CIRC são limitações à dedução fiscal de provisões.

VII - Não podendo ser interpretados no sentido do alargamento dos casos aos quais se aplica a excepção ao direito de dedução fiscal, que, por seu turno, se destina a cumprir um primado constitucional.

VIII - Reforça-se que, quando o legislador fiscal pretende abarcar a participação indirecta, di-lo expressamente no texto da lei, sendo inúmeros os exemplos: artigo 26º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, artigo 58º, nº 4, alínea b), artigo 60º, n.º 1 e artigo 63º, nº 2 do CIRC.

IX - Invoca-se também na sentença recorrida que "ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus" para justificar que as participações em causa no art.º 34º, n.º 3, al. d) CIRC são as directas e as indirectas, sendo certo que deste (definitivamente ultrapassado) princípio hermenêutico não pode o intérprete retirar uma conclusão que se traduz num alargamento de uma norma excepcional, por entender que o legislador disse menos do que aquilo que quis efectivamente dizer, alargando o âmbito da norma a situações em que as participações são meramente indirectas.

X - Da correcta interpretação do art.º 34º, n.º 3, al. d) do CIRC resulta que o mesmo deve ser aplicável e só às sociedades participadas directamente pela entidade que aprovisiona o crédito de cobrança duvidosa.

XI - Decidindo no sentido contrário, a sentença recorrida violou o art.º 34º, n.º 3, al. d) do CIRC.

XII - Face à factualidade assente e aos argumentos legais, deve a referida correcção decorrente da não aceitação como custo da provisão constituída sobre o crédito detido sobre a empresa B... Lda. (DC Vouga) no montante de 4.092.438,94€ ser anulada, bem como deve ser anulado o acto tributário de liquidação de IRC, derrama e juros compensatórios dela decorrente, com as legais consequências designadamente a restituição do imposto pago indevidamente pela recorrente, acrescido de juros indemnizatórios.

1.3 Não houve contra-alegação.

1.4 O Ministério Público neste Tribunal emitiu o seguinte parecer - cf. fls. 254v..

A meu ver, nas alegações de recurso faz-se a melhor interpretação da norma do artº. 34º. nº 3 al. d) do CIRC, na redacção vigente em 1999.

Na verdade, por um lado, no direito fiscal vigora o princípio de tipicidade e, por outro, o legislador, quando quer distinguir entre participação directa e indirecta em sociedades comerciais, expressa-o claramente (cfr., além dos exemplos referidos nas alegações, os artºs. 483º, 486º, 489º, 490º, 493º, 507º etc., do Código das Sociedades Comerciais, que tratam de sociedades em relação de grupo, relação em que estão a "...", a "..." e a "..." - as sociedades do caso dos autos).

Termos em que sou de parecer que o recurso merece provimento.

1.5 Colhidos os vistos, cumpre decidir, em conferência.

Em face do teor das conclusões da alegação, bem como da posição do Ministério Público, a questão essencial que aqui se coloca é a de saber se, para efeitos de dedução ao lucro tributável de provisões por créditos de cobrança duvidosa, a chamada "participação indirecta" no capital social da empresa está, ou não, compreendida, também, no conceito de participação na "empresa participada", a que se refere a alínea d) do n.º 3 do 34.º do Código do IRC (actual artigo 35.º).

2.1 Em matéria de facto, a sentença recorrida assentou o seguinte - cf. fls. 209 a 218.

  1. Em 22/4/1997, a empresa "..., S.A" celebrou com diversas associações sindicais o acordo de empresa que foi publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª. Série, n°. 17, de 8/5/1997, cuja cópia se encontra junta a fls. 133 a 152 dos autos e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido; 2. Em 31/5/2000, a empresa "..., S.A" entregou junto da A. Fiscal a sua declaração m/22, respeitante a I.R.C. do exercício de 1999, na qual apurou um lucro...

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