Acórdão nº 047389 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelEDMUNDO MOSCOSO
Data da Resolução29 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NO PLENO DA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: 1 - A... SA, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho conjunto do MINISTRO DA AGRICULTURA DO DESENVOLVIMENTO RURAL E DAS PESCAS e do SECRETÁRIO DE ESTADO DO TESOURO E FINANÇAS, assinado respectivamente em 18.10.2000 e 29.11.2000, que lhe atribuiu uma indemnização decorrente das Leis da Reforma Agrária do montante global de 160.710.706$00.

2 - Por Acórdão da Secção 21.07.2005 foi concedido "provimento parcial ao recurso contencioso, determinando a anulação dos actos recorridos na parte em que fixaram a indemnização relativa às culturas de regadio" e negado "provimento ao recurso, mantendo os actos recorridos, na parte em que fixaram a indemnização relativa à cortiça extraída durante a ocupação do prédio em causa".

Inconformados com tal decisão, dela vieram a interpor recurso jurisdicional quer a A...SA na parte em que o acórdão recorrido lhe é desfavorável "uma vez que não actualiza o valor da indemnização referente às cortiças para valores reais e correntes da data do pagamento da indemnização" (doc. de fls. 124), quer o MINISTRO DA AGRICULTURA DO DESENVOLVIMENTO RURAL E DAS PESCAS "na parte em que considerou dever ser fixada a indemnização do proprietário que dá de exploração o prédio mediante contratos de campanha como se fosse explorador directo" (doc. de fls. 24).

2.1 - Na respectiva alegação (fls. 134/156 cujo conteúdo se reproduz), a A...SA formulou as seguintes CONCLUSÕES: I - A indemnização a que se referem os autos é devida pela privação temporária do uso e fruição de prédios rústicos indevidamente expropriados e ocupados e posteriormente devolvidos, Decreto-Lei n.º 199/88 de 31 de Maio.

II - Uma coisa é o cálculo da indemnização dos produtos florestais, reportando-se os valores das cortiças aos respectivos anos de extracção e comercialização, outra coisa é a actualização para valores reais e correntes da data do pagamento ou valores de 94/95; III - O valor real e corrente previsto no artigo 7.º n.º 1 do DL n.º 199/88, de 31/5, deverá no mínimo ser reportado a valores de 94/95, data da publicação do DL n.º 38/95, de 14/02, e Portaria 197-A/95, de 17/03, que fixaram os critérios de pagamento das indemnizações no âmbito da Reforma Agrária, os componentes indemnizatórios por valores de 94/95, data considerada como a mais próxima do pagamento da indemnização; IV - A indemnização para ser justa tem de garantir ao expropriado o valor real do bem no momento do pagamento; V - Todos os bens objecto de indemnização da Reforma Agrária, foram actualizados para preços correntes ou valores de 94/95, com excepção do valor das cortiças - art.º 3.º a), b) e c) da Portaria 197-A/95 de 17/03; VI - Existe uma autêntica lacuna na legislação especial das indemnizações da reforma agrária no que se refere à actualização dos valores das cortiças recebidas pelo Estado durante a ocupação.

VII - A Lei 80/77, de 26/10 não se aplica às indemnizações pela privação do uso e fruição de bens expropriados ou nacionalizados no âmbito da reforma agrária.

VIII - A indemnização pela privação do uso e fruição, a que se referem os autos surge pela primeira vez com a publicação do Dec.- Lei 199/88 de 31/05.

IX - A lei 80/77 não regulou de forma exaustiva e absoluta todas as indemnizações da Reforma Agrária, nomeadamente a indemnização pela privação do uso e fruição, uma vez que vigorava ao tempo o princípio da irreversibilidade das nacionalizações e expropriação no âmbito da Reforma Agrária.

X - A Lei 80/77 não define directamente as formas de pagamento das indemnizações, mas tão só as condições de emissão dos títulos da dívida pública que seriam utilizados até certo limite no pagamento das indemnizações.

XI - Actualmente as indemnizações da Reforma Agrária já não são pagas em títulos da dívida pública mas em dinheiro.

XII - O Dec.-Lei 199/88 e a Portaria 197-A/95 de 17/03, que fixam a indemnização dos demais componentes indemnizatórios para valores de 94/95, não contêm nenhuma disposição legal que contemple a actualização das rendas e dos produtos florestais.

XIII - Existe assim uma lacuna na lei que deveria ser preenchida pelo recurso ao Código das Expropriações, art. 1 n° 2 do Dec.-Lei 199/88.

XIV - O acórdão recorrido ao decidir que não há lacuna de regulação do Dec.-Lei 199/88 de 31/05, ao não proceder à actualização das cortiças, por erro de interpretação da Lei violou o disposto no art. 1 n° 1 e n° 2 e art. 7 do Dec.-Lei 199/88 de 31/05 e art. 24 do C. de Expropriações, Dec.-Lei 168/99 de 18/09.

XV - Os prédios da recorrente expropriados e ocupados ao abrigo das Leis da Reforma Agrária, foram integralmente devolvidos por direito de reserva e considerados indevidamente abrangidos pelas medidas da Reforma Agrária e não expropriáveis, art. 31 da Lei 109/88.

XVI - O direito de reserva restabelece o direito de propriedade tal como existia à data das medidas de expropriação, art. 38 da Lei 77/77 e 14 da Lei 109/88.

XVII - A demarcação e delimitação do direito de reserva precede a expropriação dos prédios, art. 2 da Lei 77/77 e art. 26 n° 2 da Lei 109/88, sendo repristinado à data da expropriação.

XVIII - As expropriações no âmbito da Reforma Agrária destinavam-se à eliminação dos latifúndios e das grandes explorações agrícolas e às finalidades previstas no art. 94 n° 2 da CRP e do art. 50 da Lei 77/77.

XIX - Com a devolução integral dos prédios a título de reserva, o objectivo do Estado ao proceder à expropriação das terras do recorrente, não se consumou ou concretizou.

XX - No caso da recorrente não teve assim lugar a imposição constitucional prevista no art. 83 da CRP da apropriação colectiva de meios de produção nem a entrega da terra aos pequenos agricultores, às unidades colectivas de produção, ou às cooperativas de trabalhadores rurais, nos termos do art. 94 n° 2 da CRP e art. 50º da Lei 77/77 de 29/09.

XXI - Não houve nem se confirmou a apropriação colectiva dos meios de produção previstos no art. 83 da CRP, que presidiu à nacionalização e expropriação dos prédios da recorrente no âmbito da Reforma Agrária.

XXII - A indemnização devida à recorrente não decorre de apropriação colectiva dos meios de produção com vista à eliminação dos latifundiários na ..., como conclui o Acórdão recorrido, pelo que não está sujeita ao critério de cálculo da indemnização do art. 94 da CRP, mas ao art. 62 nº 2 da CRP.

XXIII - A intervenção e gestão do Estado durante a privação temporária dos prédios também não se enquadra nas medidas de intervenção transitórias previstas no art. 11 do Dec.-Lei 406-A/75 de 27/07, uma vez que não se verificou por parte do Estado uma intervenção na exploração agrícola da recorrente e nos seus meios de produção.

XXIV - O conteúdo do direito de propriedade garantido pelo art. 62 nº 2 da CRP abrange também o direito à não privação temporária do direito de propriedade, fundamento da indemnização objecto deste recurso constitucional.

XXV - No caso dos autos, não chegou a haver lugar à expropriação ou nacionalização de prédios no âmbito da Reforma Agrária, mas tão só à privação do uso e fruição dos prédios, durante a qual o Estado recebeu os valores da cortiça extraída nos prédios dos recorrentes.

XXVI - A indemnização da recorrente não tem como fundamento a perda de património a favor do Estado por expropriação, mas advém da ocupação ilícita dos prédios donde resultou a privação do uso e fruição de rendimentos, nomeadamente os valores da cortiça que o Estado vendeu e arrecadou.

XXVII - À indemnização devida à recorrente é aplicável o art. 62 n° 2 da CRP.

XXVIII - A recorrente, no que se refere à não actualização das rendas e cortiça foi tratada de forma particularmente desfavorável e sem qualquer fundamento legal, relativamente a outros cidadãos que receberam os bens indemnizáveis actualizados.

XXIX - O Acórdão recorrido por errada interpretação do art. 24 da Lei 80/77, afronta o principio da igualdade do art. 13 n° 1 da Constituição.

XXX - O Acórdão recorrido, na medida em que entendeu não actualizar o valor da cortiça para os valores contemporâneos do pagamento da indemnização, ou para valores de 94/95, violou o disposto no art. 1, n° 1 e 2 e art. 7 n° 1 do Decreto- Lei 199/88 de 31/05, art. 13 n° 1 e 2 da Lei 80/77 de 26/10, o art. 4 n° 4 do Decreto-Lei 38/95 de 14/02, o art. 2 n° 1 e art. 3 a), b) e c) da Portaria 197-A/95 de 17/03.

XXXI - O art. 24 da Lei...

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