Acórdão nº 01277/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução04 de Outubro de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório: A...

, e ..., com melhor identificação nos autos, vêm recorrer do acórdão do Tribunal Central Administrativo, Sul (TCA), que negou provimento ao recurso contencioso que interpuseram da deliberação da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), de 2.10.01. que "anulou o concurso para provimento de dois juristas em regime de requisição, para a Comissão Nacional de Protecção de Dados, aberto pelo aviso n.º 4800/2001, publicado no DR, II Série, n.º 74, de 28 de Março de 2001 e decidiu iniciar novo processo de selecção de juristas a requisitar".

Indicaram recorridos particulares.

Terminaram as suas alegações formulando as seguintes conclusões: 1. Entendendo estar o procedimento concursal para requisição de dois juristas submetido ao regime do Dec-Lei n° 204/98, de 11 de Julho, o acórdão recorrido violou o art.º 1° desse diploma que expressamente restringe o seu objecto ao concurso para recrutamento e selecção de pessoal para os quadros da Administração Pública.

  1. A renúncia ao seu cargo de um vogal da CNPD, membro do director de instrução colegial designado júri, e a circunstância de não terem sido designados suplentes não integram impossibilidade superveniente, não tornam impossível a finalidade a que o concurso se destina - requisição de dois juristas para a CNPD (art.º 112° n.º 1 do CPA).

  2. O concurso pode prosseguir, como aliás prosseguiu, sem o renunciante, pode designar-se outro membro para o substituir e pode (in casu, deve), substituir-se a totalidade dos membros.

  3. O concurso dos autos rege-se pelas normas do CPA que não prevêem, não consagram a designação de suplentes (art.º 14° e seguintes, art.º 86° n.º l e 4). Mas, 5. Mesmo que ao concurso fosse aplicável o Dec-Lei n° 204/98, a renúncia dum vogal do júri aliada à circunstância de não terem sido designados suplentes não determina, não integra impossibilidade superveniente (art.º 12° n.º 6 do Dec-Lei n.º 204/98).

  4. Entendendo ter a CNPD extinto a instância procedimental do concurso com fundamento em impossibilidade superveniente, quando a factualidade subjacente a tal impossibilidade não a integra, e entendendo correcta a subsunção dos factos reconhecidos como juridicamente relevantes no Dec-Lei n.º 204/98, incorreu o acórdão recorrido em erro de julgamento, violando além disso o disposto no art.º 12° n.º 6° do citado Dec-Lei n° 204/98, que considerou aplicável.

  5. Decidindo ser a decisão de anular o concurso contenciosamente insindicável quando tal decisão assenta em erro manifesto e está eivada de diversas violações de lei, o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento e violou o n.º 2 do art.º 112° do CPA.

  6. Entendendo que tudo o que se situar fora da esfera de livre decisão é judicialmente sindicável porque estará em causa a validade da conduta administrativa e decidindo que a decisão de anular o concurso por impossibilidade superveniente decorrente da renúncia do vogal da CNPD e dada a circunstância de não terem sido designados suplentes é insindicável, acrescentando ainda que a extinção de um procedimento por impossibilidade superveniente é expressamente admitida, 9. O acórdão recorrido é nulo por oposição entre os respectivos fundamentos e a decisão (art.º 668° n.º 1 c) do CPC).

  7. Decidindo que "não se verificam os vícios de forma e violação de lei assacados à deliberação impugnada nas conclusões 10 a 30, mostrando-se prejudicado o conhecimento da violação do direito de audiência, dos itens 1 a 9 das conclusões" o acórdão recorrido deixou permanecer na ordem jurídica actos a vários títulos ilegais e violadores de diversos princípios de direito e designadamente de princípios constitucionais, como os da imparcialidade, da justiça, da boa fé e da confiança legítima violando o art.º 140° n.º 1 b) e c), art.º 4°, art.º 6° e 6° A do CPA, art.º 2°, art.º 266° n.º 1 e 2 da CRP.

  8. Violou pois o disposto no art.º 140° n.º 1 b) e c), art.º 4°, art.º 6° e art.º 6°A do CPA, art.º 2°, art.º 266° n.º 1 e 2 da CRP bem como o princípio da justiça material. Com efeito, 12. O acto de admissão dos Recorrentes, candidatos legalmente admitidos ao concurso, é constitutivo de direitos e interesses legalmente protegidos dos mesmos, tendo a CNPD, porque abriu concurso, a obrigação legal de requisitar os candidatos que o ganharem.

  9. Tal acto de admissão dá aos candidatos legalmente admitidos e só a estes o direito de se apresentarem às provas de selecção e nelas serem classificados, o direito de verem as suas candidaturas apreciadas a final, em confronto com aqueles (e só aqueles) opositores que a ele se apresentaram.

  10. Não pode pois, lesar-se o interesse legítimo, o direito dos candidatos legalmente admitidos ao concurso em prosseguirem nele até final, com classificação e ordenação na lista final, sem estarem sujeitos à eventual admissão de outros opositores ou ao preenchimento por outrém dos lugares postos a concurso (Neste sentido se pronunciou, entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 3 de Junho de 1993, publicado in BMJ, n.º 428, pag. 380 e seguintes). Aliás, 15. A abertura de concurso - o aviso de abertura não é um puro acto de trâmite - implica imediatamente uma alteração da situação jurídica pois que, 16. Implica a outorga aos concorrentes duma posição jurídica de vantagem, na medida em que, segundo o princípio da boa fé, a Administração se vincula, face aos concorrentes, a levar o concurso até ao fim e a requisitar os que vierem a ganhá-lo, em confronto com aqueles e só aqueles opositores que a ele se candidataram e que reúnam as condições legais para o efeito.

  11. A abertura do concurso produz, por si própria, efeitos na esfera jurídica dos potenciais concorrentes - origina uma situação de concorrência potencial, delimita o âmbito pessoal e material do concurso, define a situação dos potenciais concorrentes e dos excluídos e condiciona os termos da decisão final.

  12. É um acto constitutivo de direitos e interesses legalmente protegidos dos candidatos ou potenciais candidatos.

  13. Também por isso, não pode o concurso dos autos ser anulado.

  14. No exercício da actividade administrativa, anulando o concurso ao invés de o concluir, a Administração não considerou a confiança suscitada na contraparte pela abertura do mesmo e violou os art.º s 140° n.º 1 b) e c), art.º 4°, art.º 6°, 6°A do CPA e art.ºs 2° e 266° n.º 1 e 2 da CRP, os princípios da Boa Fé e da Confiança Legítima, ínsito no princípio do Estado de Direito Democrático, princípios que a vinculam, uma vez aberto o concurso, a levá-lo até ao fim e a requisitar os candidatos que o ganharem.

  15. E violou de novo os aludidos princípios da Boa Fé e da Confiança Legítima (art.ºs 6° A do CPA e art.ºs 2° e 266° n.º 2 da CRP), bem como o princípio da concorrência concursal, quando restringiu a área de recrutamento do concurso consequente dele excluindo a priori os ora Recorrentes (curiosamente ao arrepio da prática anterior no sentido de anulação do concurso e abertura de outro convidando os concorrentes a actualizarem os curricula).

  16. Considerando estar a deliberação de iniciar um novo processo de selecção de juristas a requisitar submetida às regras da conveniência ou oportunidade de agir da Administração, tendo como limites externos os princípios da prossecução do interesse público e do respeito dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, o acórdão recorrido violou o disposto nos art.ºs 266° n.º 1 da CRP, art.º 4° do CPA e o princípio da Justiça material. Na verdade, 23. A deliberação de iniciar novo processo de selecção de juristas a requisitar restringindo a área de recrutamento que limitou a técnicos de 2.ª e 1.ª classes, dele excluindo a priori os Recorrentes não está submetida às regras da conveniência ou da oportunidade de agir da Administração pois que, sendo um acto consequente da anulação do primeiro concurso a que os Recorrentes foram legalmente admitidos, desrespeita direitos e interesses legítimos destes, violando o art.º 266° n.º 1 da CRP e os art.º s 4°, 140° n.º 1 b) e c) art.º 6°, art.º 6°A do CPA e art.º 266° n.º 1 e 2 da CRP e o principio da concorrência concursal.

  17. Não pode admitir-se que quando os candidatos a um concurso exercem o seu direito à impugnação, a Administração, ao invés de repor a legalidade que violou, opte pela anulação do concurso e dê início a outro procedimento de selecção dele afastando aqueles que impugnaram o projecto de ordenação final dos candidatos ao primeiro.

    A autoridade recorrida concluiu assim a sua: 1. Foram independentes - no tempo e no objecto - os procedimentos de selecção de pessoal iniciados com o Aviso publicado em Março de 2001 e com a deliberação constante da Acta n° 24/2001, de 2 de Outubro de 2001.

  18. É de concordar com o acórdão recorrido, na medida em que entende que a sustação do processo de selecção iniciado com o Aviso de Março de 2001 não afectou direitos subjectivos dos interessados.

  19. E isto porque se tratava de um processo de selecção tendente à requisição de dois elementos de certa categoria.

  20. A requisição é um acto discricionário, fundado na conveniência de serviço verificada no momento da prática desse acto.

  21. A abertura do procedimento encetado com o Aviso de Março de 2001 não podia conferir direito à requisição, nem sequer à sua conclusão.

  22. A sua designação de "concurso" teve apenas sentido analógico, significando que, a decidir a CNPD realizar as requisições previstas, o faria segundo a ordenação final do procedimento.

  23. O novo enquadramento legal da CNPD, resultante da Lei n° 43/2004, retira objecto ao recurso, pois, criada a categoria de consultor, a recrutar por contrato ou requisição, não poderia a Comissão estar vinculada a admitir juristas apenas mediante requisição, através da conclusão do procedimento em causa.

  24. A renúncia de um dos membros do júri (sem existência de suplentes) tornou inviável atingir o objectivo do procedimento em questão - a escolha dos melhores candidatos - para...

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