Acórdão nº 01260/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Junho de 2006

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução07 de Junho de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A... propôs a presente acção administrativa especial contra o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO impugnando a sua deliberação n.º 1242/2005, publicada no Diário da República, II Série, de 14-9-2005, através da qual foi determinado movimento de magistrados do Ministério Público.

O Autor termina a petição pedindo a anulação do acto impugnado e a condenação do Réu a praticar o acto que deveria ter praticado se tivesse aplicado correctamente os critérios de colocação.

O Réu contestou, defendendo que o acto impugnado não enferma dos vícios que o Autor lhe imputa.

Foram indicados cinco contra-interessados: - ...; - ...; - ...; - ...; - ....

Estes contra-interessados não contestaram.

O Autor apresentou alegação em que concluiu da seguinte forma: I. O acto impugnado é inválido por dois motivos: a) por vício de violação de lei, pelo que deve ser anulado nos termos do previsto no artigo 135º do Código de Procedimento Administrativo; b) por vício de forma, por preterição de formalidade essencial de audiência dos interessados, pelo que deve ser anulado também nos termos do previsto no artigo 135.º do Código de Procedimento Administrativo.

  1. O Estatuto do Ministério Público prevê um conjunto de critérios de acesso à categoria de procurador da República: a) o artigo 116º prevê que as promoções se fazem por um de dois meios: por mérito ou por antiguidade; b) nas situações de promoção por mérito, nos termos do n.º 2 do artigo 117º, é exigido que o candidato tenha classificação de Muito Bom ou Bom com distinção; c) por outro lado, o artigo 121º n.º 4 prevê que apenas podem ser promovidos à categoria de procurador da República, os procuradores-adjuntos que exerçam funções há mais de 10 anos; d) as vagas serão preenchidas na proporção de três por via de concurso e duas segundo a lista de antiguidade; e) por último, cumulativamente com os critérios gerais acima identificados, nos provimentos (por transferência ou promoção) para tribunais de competência especializada, o artigo 136º considera que a competência específica no ramo de direito em questão é também atendível.

  2. À data do concurso, o Autor exercia funções há 17 anos, 9 meses e 18 dias, com classificação de Muito Bom, e formação específica nas áreas de Direito Administrativo e em Direito do Trabalho, resultante da frequência de duas pós-graduações nestas áreas e do exercício de funções no Tribunal de Trabalho do Porto, durante 4 anos.

  3. No requerimento enviado à Procuradoria-Geral da República, o Autor informou de todos os dados acima descritos e manifestou a sua intenção de vir a ser promovido à categoria de procurador da República, indicando uma lista de 76 de tribunais de competência especializada e de círculo preferidos.

  4. Esta pretensão não foi atendida, acabando por ser transferido para a comarca de Matosinhos, pretensão subsidiária deduzida pelo Autor.

  5. O Conselho Superior do Ministério Público fundamentou a sua decisão num conjunto de critérios relativos ao movimento dos magistrados do Ministério Público, invocando como habilitação o n.º 4 do artigo 20º do Regulamento Interno da Procuradoria-Geral da República.

  6. O ponto 5.7 dos referidos critérios exclui expressamente a formação específica enquanto critério a ponderar para efeitos de acesso à categoria de Procurador da República, o que não se pode aceitar.

  7. O Estatuto do Ministério Público foi aprovado pela Lei nº 60/98, de 27 de Agosto, acto com forma e força de lei, nos termos e para os efeitos do artigo 112º da Constituição da República Portuguesa.

  8. O artigo 27º, alínea b), do Estatuto do Ministério Público concede competência ao Conselho Superior do Ministério Público para aprovar o Regulamento Interno da Procuradoria-Geral da República. Com efeito, o Estatuto do Ministério Público é a norma de habilitação e o Regulamento Interno da Procuradoria-Geral da República é um regulamento de execução.

  9. O Estatuto do Ministério Público é o critério, o fundamento e o limite do regulamento interno, que apenas pode desenvolver o regime criado pelo primeiro, mas nunca alterá-la, sob pena de ilegalidade, é o que resulta do artigo 112,º n.º 8, da Constituição e dos princípios fundamentais da ordem jurídica portuguesa.

  10. O artigo 266º, n.º 2, da Constituição que aduz o princípio da conformação à legalidade dos órgãos da Administração Pública, obriga à subordinação do poder regulamentar ao poder legislativo, ao mesmo tempo que se assume garantia dos interesses tutelados dos particulares face à discricionariedade da Administração Pública.

  11. Ora, o Regulamento Interno, ao afastar o critério da formação específica no acesso à categoria de Procurador da República, viola os artigos 134º e 136º do Estatuto do Ministério Público.

  12. Face ao exposto, o Autor tem por seguro que os critérios relativos ao movimento dos magistrados do Ministério Público e consequentemente o acto impugnado padecem de vício de violação de lei, pelo que deve ser anulado nos termos do artigo 135º do Código do Procedimento Administrativo.

  13. Quanto à invalidade do acto por preterição de formalidade essencial de audiência prévia dos interessados, o Réu considera que por ter sido divulgado na internet, a 4 de Julho de 2005, o projecto de decisão e uma vez que o Autor se pronunciou a propósito deste, a exigência do artigo 100º do Código de Procedimento Administrativo foi cumprida. Porém, não será certamente assim.

  14. A notificação de qualquer acto instrutória deve ser feita por meio de qualquer uma das formas previstas no artigo 70º do Código de Procedimento Administrativo, que não exclui a divulgação na internet, mas com ela não se basta.

  15. Por outro lado, o artigo 71º n.º 2 do Código de Procedimento Administrativo concede aos interessados prazo de pelo 10 dias (úteis) para responderem sobre assuntos acerca dos quais se devam pronunciar.

  16. Tendo em conta a exiguidade dos prazos, nem os interessados tiveram tempo legalmente adequado para se pronunciarem sobre o projecto de decisão, nem o Réu teve tempo para proceder a uma efectiva ponderação das objecções. Dada a sua posição, o Réu não deveria recorrer a este tipo de expedientes.

  17. Desta forma, o Autor reputa o acto é inválido por preterição de formalidade essencial de audiência prévia dos interessados, pelo que, nos termos do artigo 135º do Código de Procedimento Administrativo, deve ser anulado.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve a presente acção ser considerada procedente e o acto impugnado anulado, por vício de violação de lei e por preterição de formalidade essencial de audiência dos interessados, condenando-se o Réu a praticar o acto que deveria ter praticado, promovendo o Autor a Procurador da República e colocando-o num dos tribunais de competência especializada preferidos.

O Réu contra-alegou, apresentando as seguintes conclusões:

  1. A promoção a procurador da República obedece aos critérios fixados nos artigos 116º, 117º e 121º, todos do Estatuto do Ministério Público, ocorrendo por via de antiguidade e de concurso.

  2. Respeitando estes critérios o CSMP procedeu ao provimento de 20 lugares de Procurador da República através da promoção de 20 Procuradores Adjuntos, todos detentores de lugares mais antigos da que o do Autor e de mérito adequado.

  3. Concretamente, os Senhores Procuradores contra-interessados ..., ..., ..., ... e ... detêm, respectivamente, os 3º, 27º, 39º, 55º e 88º lugares na Lista de Antiguidade, tendo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT