Acórdão nº 0933/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelJOÃO BELCHIOR
Data da Resolução23 de Maio de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA).

I.RELATÓRIO A...

, melhor identificado nos autos, recorreu por oposição de julgados do acórdão do Tribunal Central Administrativo (TCA) que concedeu provimento ao recurso jurisdicional interposto da sentença proferida no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que anulara o despacho datado de 10-11-2000, dois membros da Direcção da Caixa Geral de Aposentações (CGA), indicando como fundamento o acórdão da 1ª Secção, 2ª subsecção, do TCA, de 3-07-2003, proferido no Recurso n.º 11206/02.

Por despacho do relator (cf. fls. 165) foi reconhecida a invocada a oposição e determinado o prosseguimento do recurso.

Tendo as partes sido notificadas para os fins a que se refere o artigo 767º, n.º2, do Código de Processo Civil, redacção anterior ao DL n.º 329-A/95, o recorrente formulou as seguintes conclusões: "1ª. Para o acórdão fundamento o regime contido no n.º 3 da citada norma, limitou-se a consagrar uma regra que já resultava da interpretação adequada do art° 24.°, 26.° n.° 1 al. a) ambos do EA e do art° 127.º do EMFA/99.

  1. Conclui assim, que a disciplina contida no n.º 3 e 4 do art.° 44.° do EMFA/99 na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 25/2000 também se aplicava aos militares que passaram à reforma (antecipada) entre 1 de Janeiro de 1990 e 1 de Julho de 1999, ou seja antes da entrada em vigor do novo EMFA, 3ª. Pois o legislador não excluiu expressamente tais situações, e tendo a lei disposto directamente sobre o conteúdo dessas relações jurídicas, abstraindo-se dos factos que lhes deram origem, abarcará as próprias relações já constituídas que subsistam à data da sua entrada em vigor ( n.° 2, segunda parte do art.° 12.° do CC ).

  2. O art.° 24.° do EA impõe oficiosamente, a contagem de todo o tempo de serviço em qualquer das situações a que corresponda direito de inscrição.

  3. E segundo o art.°26.º sempre que tenha havido remuneração, ainda que não corresponda a efectiva prestação de serviço, o respectivo tempo conta para o cálculo da pensão de reforma (até ao limite de 36 anos, cf. n.°2 do art.°28.° do EA em conjugação com o n.°1 al. a) do art.° 26.° e art.° 53º do mesmo estatuto).

  4. Em abono da natureza interpretativa do n.° 3 do art.° 44.° do EMFA/99, acresce um outro argumento. A norma do art° 27.° do EA, segundo a qual, só o tempo que a lei declarasse especialmente, não considerar como "tempo de serviço", é que não seria contado para efeitos de reforma.

  5. Ora para o acórdão recorrido o tempo na reserva fora do serviço efectivo é tempo de serviço.

  6. E assim sendo, à luz do art° 63.° da CRP e dos artºs 24.° e 53.° n.°1 do EA, esse tempo contribui para o cálculo das pensões de velhice e invalidez até ao limite de 36 anos.

  7. A favor da aplicação, aos militares antecipadamente reformados ao abrigo do EMFA/90, do regime previsto nos n.ºs 3 e 4 do art.° 44º do EMFA/99, encontramos os seguintes argumentos: a norma de salvaguarda prevista no n.°2 do art.° 43.° do EA, o n.° 3 do art.° 44.° não distingue entre as situações de reforma já existentes e as futuras, à introdução (pela Lei 25/2000) de um n.°4, ao legislador (face às garantias dadas no EMFA/90) ter querido dar tratamento igual a situações juridicamente idênticas, ao regime previsto no n.°2, segunda parte do art.°12.° do CC pois que a lei dispôs directamente sobre o conteúdo dessas relações jurídicas, abstraindo-se dos factos que lhes deram origem, pelo que abraçará as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.

  8. Todo o militar reservista, quer esteja ao serviço efectivo quer esteja fora da efectividade do serviço, recebe uma remuneração mensal e sobre ela tem de descontar para a reforma/aposentação.

  9. No pressuposto de que o legislador consagra as soluções mais acertadas e tem em conta a unidade do sistema jurídico, não é configurável a não contabilização do "tempo fora do serviço efectivo" quando até as licenças sem vencimento do funcionalismo público, as situações de disponibilidade dos diplomatas e o tempo sem serviço dos militares que estiveram afastados do serviço pelas razões apontadas no art.° 115.° do EA, ou o tempo de duração dos cursos de ensino superior dos cidadãos recrutados contabilizam para a reforma.

  10. Cremos que a diferença de tratamento entre o "reservista" que se encontra fora do serviço efectivo e as duas ultimas situações que se apontam na conclusão anterior, é incompatível com o disposto no art.° 63.° da CRP e com o art.° 24.° do EA.

  11. Por outro lado, se a intenção do legislador fosse não aplicar o regime do n.° 3 e 4 do art° 44.° às próprias relações já constituídas que subsistam à data da sua entrada em vigor, tê-lo ia dito expressamente, sob pena de não o fazendo se presumir que soube expressar correctamente o seu pensamento. Onde o legislador não distinguiu não deve o intérprete fazer essa distinção.

  12. É inquestionável o afastamento quer do princípio geral sobre a aplicação das leis no tempo, consagrado no art.°12.° do CC quer da regra do n.°1 do art.°43.° do EA.

  13. Sobre a questão da relevância (na reforma) do tempo na reserva fora da efectividade do serviço e sobre o sentido e o alcance dos artigos 117.° e 120.° do EA, cf. as "Notas e Comentários ao Estatuto da Aposentação", anotado, editora Almedina, do Sr. Juiz Conselheiro do STA Dr. José Cândido de Pinho, respectivamente as pág. 431 e seg.tes, as pág. 437 e 438 e ainda as págs. 446 a 448.

O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal emitiu o seguinte parecer: "O dissídio jurisprudencial delineado no presente recurso jurisdicional, com fundamento em oposição de julgados, decorre de diferente entendimento quanto à questão de se saber se a previsão normativa constante do artigo 44.°, n.°3 do EMFAR, aprovado pelo DL n°236/99, de 25/6 (na redacção introduzida pela Lei n.° 25/00, de 23/8), de acordo com a qual, para efeito do cálculo da pensão de reforma, releva o tempo de permanência do militar na reserva fora da efectividade de serviço, é meramente interpretativa, expressando regra que já resultava do anterior EMFAR de 1990, com a sua consequente eficácia retroactiva, ou se, ao invés, constitui uma solução inovatória., apenas dispondo para o futuro, sendo inaplicável aos militares que passaram à situação de reforma antes da sua entrada em vigor.

No sentido de se tratar de norma inovadora se entendeu no acórdão recorrido.

Cremos que acertadamente, sendo de acolher a douta fundamentação em que esse entendimento se alicerça.

Na verdade, como se deixou expresso em sumário tirado do acórdão de 4-4-01, no recurso n.° 39.699 - "Na falta de exteriorização de uma intenção legislativa de atribuir natureza interpretativa a uma lei, ela só poderá ser como tal considerada se a solução do direito anterior era controvertida ou pelo menos incerta e essa interpretação se puder considerar ínsita na lei anterior, por forma a que o julgador ou o intérprete a ela poderiam chegar sem ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e aplicação da lei".

Ora, no caso em apreço, para além da inexistência de declaração expressa do legislador no sentido da natureza interpretativa da norma em questão, o certo que na vigência do anterior EMFAR de 1990 jamais se suscitou qualquer dúvida interpretativa relativamente à não relevância para efeito do cálculo da pensão de reforma do tempo de permanência dos militares fora da efectividade do serviço, não ocorrendo, deste modo, uma situação de incerteza na aplicação do direito que urgisse ser superada pela...

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