Acórdão nº 048140 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Fevereiro de 2006
Magistrado Responsável | SÃO PEDRO |
Data da Resolução | 07 de Fevereiro de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A... inconformada com o Acórdão da 1ª subsecção deste Supremo Tribunal, que negou provimento ao recurso contencioso de anulação que oportunamente interpusera do despacho do SECRETÁRIO DE ESTADO DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E CONSERVAÇÃO DA NATUREZA, de 9 de Agosto de 2001, pelo qual foi declarada a incompatibilidade do Alvará n.º 1/93, de 26 de Março de 1993, com o Plano Regional de Ordenamento do Território do Litoral Alentejano, recorreu para o Pleno da 1ª Secção, formulando as seguintes conclusões: i) O Alvará n.º 1/93, cuja incompatibilidade com o PROTALI foi declarada pelo acto ora impugnado, foi integralmente substituído, em 19 de Janeiro de 1996, pelo Alvará n.º 1/96, pelo que o acto em apreço declara a incompatibilidade com o PROTALI de um acto que já não existe; tem, portanto, objecto impossível determinante da sua nulidade; ii) O Tribunal a quo conhecia a existência do Alvará n.º 1/96, bem como o facto de este ter substituído integralmente o Alvará n.º 1/93, não tendo daí retirado as devidas consequências legais. A saber: a declaração oficiosa da nulidade do acto impugnado. A nulidade pode contudo ser conhecida a todo o tempo não se encontrando ainda precludida a respectiva oportunidade processual; iii) A competência para a prática do acto impugnado deve ser aferida à data da sua emissão sendo que o despacho de delegação de poderes que transferiu para a autoridade recorrida o exercício da competência para emitir as declarações de incompatibilidade previstas no Decreto Lei 351/93, de 7 de Outubro, limita-se a determinar a delegação do Senhor Secretário de Estado recorrido das competências ministeriais relativas a "Ordenamento do território", pelo que viola o dever de especificação dos poderes delegados, vertido no artigo 37º, 1 do CPA, sendo anulável, com base em incompetência relativa; iv) As obras de urbanização tituladas pelo Alvará de loteamento n.º 1/93 iniciaram-se em 1 de Junho de 1993, portanto antes da entrada em vigor do PROTALI, que só foi aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 26/93, de 27 de Agosto, não se tendo suspendido ou interrompido até essa data, factos de que a autoridade recorrida tinha conhecimento oficioso à data da emissão do despacho recorrido, o que dispensou a sua prova por parte do recorrente no decurso do procedimento administrativo; v) Como tal, não se verifica, "in casu", um pressuposto de facto (negativo) da emissão da declaração de incompatibilidade exigido pelo Decreto-Lei n.º 351/93, de 7 de Outubro, motivo pelo qual o acto impugnado padece do vício de violação de lei, por falta de pressupostos conducente à sua anulabilidade; vi) Não se verifica qualquer incompatibilidade entre o Alvará n.º 1/93 e o PROTALI, nomeadamente, no toca à cércea máxima das edificações; motivo pelo qual o acto impugnado enferma de violação de lei por erro de facto nos pressupostos, conducente à sua anulabilidade; vii) O acto impugnado revogou por substituição o acto tácito de deferimento do requerimento de declaração de compatibilidade, em violação do art. 140º, n.º 1, al. b) do CPA, padecendo, portanto, de violação de lei e sendo consequentemente anulável.
Respondeu a entidade recorrida defendendo a manutenção do Acórdão recorrido.
O Ex.mo Procurador-geral Adjunto, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais foi o processo submetido ao Pleno da 1ª Secção para julgamento do recurso.
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Fundamentação 2.1. Matéria de facto O Acórdão recorrido deu como assentes os seguintes factos: a) A recorrente requereu em finais de 1992 o licenciamento de um loteamento e respectivas obras de urbanização no prédio sito em Porto Covo, freguesia de Porto Covo, concelho de Sines, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sines sob o nº 749, Livro B3, fls. 59.
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Em 26/03/1993 a Câmara Municipal de Sines emitiu o alvará de loteamento nº 1/93, (fls. 31).
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As obras de urbanização tituladas por esse alvará iniciaram-se em 1 de Junho de 1993 (fls. 40).
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Em 27 de Agosto foi publicado o Decreto Regulamentar nº 26/93, que aprovou o Plano Regional de Ordenamento do Território do Litoral Alentejano (PROTALI).
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Em 8/10/1993 iniciou a sua vigência o DL nº 351/93, de 7/10, que veio estabelecer novas regras sobre as relações entre os planos regionais de ordenamento do território e as licenças de loteamento, de obras de urbanização e de construção, devidamente tituladas, nomeadamente por alvarás, emitidos anteriormente à data da entrada em vigor dos planos regionais de Ordenamento do Território (PROT).
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Por força do disposto no art. 1º, nº1 deste diploma, a recorrente requereu ao Ministro do Planeamento e da Administração do Território (MPAT), em 17/11/1993, a confirmação de compatibilidade da licença titulada pelo Alvará nº 1/93 com o PROTALI.
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Em 29/03/1994, ao abrigo de competência delegada pelo MPAT, através do Despacho nº 61/93 (fls. 389), o Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território (SEALOT) proferiu despacho pelo qual declarava a incompatibilidade do alvará nº 1/93 com o PROTALI (fls. 41).
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Devido a um erro material na identificação do Alvará, este despacho foi rectificado mediante novo despacho do SEALOT, em 12/05/1994 (fls. 42).
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Interposto, entretanto, recurso contencioso desse despacho, ao mesmo viria a ser concedido provimento e, consequentemente, anulado por vício de forma decorrente da falta de audição do interessado, por acórdão do STA de 1/03/2001 (cfr. fls. 44/78).
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Em 09/08/2001, desta feita precedendo audiência da recorrente, o Secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza (SEOTCN), renovou o despacho anulado, voltando a declarar a incompatibilidade do Alvará 1/93 com o PROTALI (fls. 79/80).
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No DR, II série, de 30/12/99 foi publicado o Despacho nº 25784/99, de 30/12/99, em que o Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território delegava competência ao Secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza para, entre outros fins, despachar os assuntos relativos ao Ordenamento do Território (fls. 106).
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Em 19/01/1996 a Câmara Municipal de Sines emitiu o Alvará nº 1/96, que dizia «que substitui integralmente o Alvará de Loteamento nº 1/93…» (fls. 367/371).
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Este alvará, porém, veio a ser objecto de averbamento para rectificação no trecho onde referia substituir integralmente o Alvará nº 1/93, passando agora a constar «que o substitui nas partes que foram objecto de alteração», conforme Aviso nº 46/96, in DR, III, nº 168, de 22/07/1996, pag. 12654 (fls. 380 e 382).
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Em 17/09/2001 a recorrente moveu acção contra o Estado Português para efectivação de responsabilidade civil extracontratual pelos danos decorrentes da declaração de incompatibilidade declarada pelo despacho ora impugnado, correndo termos no TAC de Lisboa, sob o nº 492/01, da 2ª Secção (fls. 115/139).
2.2. Matéria de direito A recorrente insurge-se contra o acórdão da subsecção por este não ter conhecido de um vício de nulidade por impossibilidade do objecto do acto impugnado e ainda por não ter reconhecido no acto qualquer vício, sendo que em seu entender o mesmo enfermava, para além da referida impossibilidade do objecto, dos vícios de incompetência (por ilegalidade do acto de delegação de poderes); erro nos pressupostos de facto; e ofensa da proibição de revogação de acto tácito (constitutivo de direitos) anteriormente formado.
Apreciaremos, em primeiro lugar, as questões que se prendem directamente com os vícios do acto (que o acórdão não reconheceu) e pela ordem da respectiva arguição; apreciaremos, por último, salvo qualquer relação de prejudicialidade, o erro de julgamento imputado ao acórdão por ter decidido não conhecer do vício de impossibilidade do objecto.
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Incompetência relativa do autor do acto.
Neste ponto o Acórdão recorrido abordou a questão, nos seguintes termos: "Na conclusão vi) a recorrente advoga que o acto de delegação não especifica os poderes delegados, o que constituiria ofensa ao art. 37º do CPA Dissonante, por seu turno, a entidade recorrida encara a delegação de poderes em apreço como "acto político", portanto, imune à aplicação das regras do art. 35ºe sgs. do CPA. Ora bem. Quanto a nós, nenhuma das teses dos pleiteantes colhe o nosso aplauso. Efectivamente, o acto de delegação, desde que vise a prática de actos administrativos nas matérias nele abrangidas, mesmo que traduza a concretização de uma qualquer política sectorial do Governo, não deixa de se submeter à disciplina normal por que se regem todos os actos delegatórios. Por conseguinte, em pleno respeito da observância dos arts. 35º e sgs do CPA. Mas, de todo o modo, também cremos que à recorrente falece a razão, pois que, se em causa está um despacho de compatibilidade - que tem que se orientar pelos critérios normativos existentes à data do acto contenciosamente anulado - da mesma maneira o suporte material em que ele se funde igualmente não pode deixar de ser o que "ab initio" e àquela data havia legitimado o seu autor no respectivo exercício. Neste sentido, o que se transporta no tempo para sustentar a legalidade do novo acto é todo o bloco jurídico que dominava à época do acto anulado por vício de forma (v. jurisprudência citada no ponto 2.1 supra). E nesse bloco não pode deixar de integrar-se o próprio acto de delegação. O que significa que os poderes exercidos pelo órgão delegado assentam numa competência derivada do primitivo acto de delegação. Por outras palavras, tal como não se atenderá à lei vigente no momento em que é praticado o acto renovador, mas sim à lei que regulava a situação de facto à data do acto renovado, mesmo que agora, porventura, já revogada, assim também, por identidade de razões, será unicamente no despacho de delegação que sustentou o acto anulado que se colherá o fundamento para a prática do acto renovador, mesmo que o titular do órgão delegante tenha, eventualmente, sido entretanto...
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