Acórdão nº 048087 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Janeiro de 2006

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução19 de Janeiro de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A A..., Lda.

, com melhor identificação nos autos, vem recorrer do acórdão da 1.ª Subsecção deste Tribunal, de 25.5.05, que concedeu parcial provimento ao recurso contencioso por si interposto do despacho conjunto dos Ministros da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, de 3.5.01 e 23.5.01, que lhe fixou definitivamente a indemnização global pela privação do uso e fruição da terra dos prédios denominados ... e...., arrendados à data da ocupação, e pelo valor da cortiça extraída em 1974 e vendida em 1975 do prédio ....

Terminou a sua alegação formulando as seguintes conclusões: 1ª - A indemnização a que se referem os autos é devida pela privação temporária do uso e fruição de prédios rústicos indevidamente expropriados e ocupados e posteriormente devolvidos, Decreto-Lei 199/88 de 31/05.

  1. - Uma coisa é o cálculo da indemnização referente ao período que mediou entre 13/10/75 e 17/10/91, reportando-se os valores das rendas aos respectivos anos de privação, outra coisa é a actualização dessas rendas para valores reais e correntes da data do pagamento ou valores de 94/95.

  2. - O valor real e corrente previsto no art. 7 n° 1 do Decreto-Lei 199/88 de 31/05, deverá no mínimo de ser reportado a valores de 94/95, data da publicação do Decreto-Lei 38/95 de 14/02 e Portaria 197-A/95 de 17/03, que fixaram os critérios de pagamento das indemnizações no âmbito da Reforma Agrária, os componentes indemnizatórios por valores de 94/95, data considerada como a mais próxima do pagamento da indemnização.

  3. - A indemnização para ser justa tem de garantir ao expropriado o valor real do bem no momento do pagamento.

  4. - A renda previsível ou presumível durante o período da ocupação terá de corresponder sempre aos valores das rendas fixadas na legislação que regula o arrendamento rural.

  5. - Nos termos do art. 8 do Decreto-Lei 385/88 de 25/10, as rendas são sempre actualizadas anualmente não podendo ultrapassar contudo as tabelas do arrendamento rural.

  6. - Todos os bens objecto de indemnização da Reforma Agrária foram actualizados pela Lei Especial para preços correntes ou valores de 94/95, com excepção do valor das rendas, art. 3 a), b) e c) da Portaria 197-A/95 de 17/03.

  7. - Existe uma autêntica lacuna na legislação especial das indemnizações da Reforma Agrária conforme refere o Acórdão do Pleno do S.T.A. de 17/05/01, Rec. 44.114 e o Acórdão do Pleno do S.T.A. de 03/07/02, Rec. 45.608, onde se refere nomeadamente a omissão de um critério de actualização das rendas, preconizando ambos os Acórdãos, para colmatar essa lacuna recorrer se necessário ao legislador.

  8. - A Lei 80/77 de 26/10 não se aplica às indemnizações pela privação do uso e fruição de bens expropriados ou nacionalizados no âmbito da Reforma Agrária.

  9. - A indemnização pela privação do uso e fruição, a que se referem os autos surge pela primeira vez com a publicação do Dec.- Lei 199/88 de 31/05., 11ª - A lei 80/77 não regulou de forma exaustiva e absoluta todas as indemnizações da Reforma Agrária, nomeadamente a indemnização pela privação do uso e fruição, uma vez que vigorava ao tempo o princípio da irreversibilidade das nacionalizações e expropriação no âmbito da Reforma Agrária.

  10. - A Lei 80/77 não define directamente as formas de pagamento das indemnizações, mas tão só as condições de emissão dos títulos da dívida pública que seriam utilizados até certo limite no pagamento das indemnizações.

  11. - Actualmente as indemnizações da Reforma Agrária já não são pagas em títulos da dívida pública mas em dinheiro.

  12. - O Dec.-Lei 199/88 e a Portaria 197-A/95 de 17/03, que fixam a indemnização dos demais componentes indemnizatórios para valores de 94/95, não contêm nenhuma disposição legal que contemple a actualização das rendas e dos produtos florestais.

  13. - Existe assim uma lacuna na lei que deveria ser preenchida pelo recurso ao Código das Expropriações, art. 1 n° 2 do Dec.-Lei 199/88.

  14. - O acórdão recorrido ao decidir que não há lacuna de regulação do Dec.-Lei 199/88 de 31/05, ao não proceder à actualização das rendas, por erro de interpretação da Lei violou o disposto no art. 1 n° 1 e n° 2 e art. 7 do Dec.-Lei 199/88 de 31/05 e art. 24 do C. de Expropriações, Dec.-Lei 168/99 de 18/09.

  15. - A indemnização dos valores da cortiça extraída em 1974, comercializada e arrecadada pelo Estado em 1975, foi paga à recorrente pelos respectivos valores da data da comercialização.

  16. - A portaria 197-A/95 de 17/03, no seu art. 3, alínea c) determina que a indemnização da cortiça quando considerada como capital de exploração, é calculada pelos valores de 94/95, constantes das publicações oficiais.

  17. - A indemnização pela cortiça que se encontrava extraída à data da ocupação do prédio em 22/08/75 deveria ter sido efectuada por valores de 95 nos termos do art. 3 c) da Portaria 197-A/95 de 17/03.

  18. - A cortiça a que se referencia os autos é considerada como parte integrante do capital de exploração é indemnizada por valores de 1995, art. 3 c) da Portaria 197-A/95 de 17/03, conforme orientação concluída do STA.

  19. - Neste sentido decidiram entre outros os Acórdãos do STA proferidos nos processos 47.420/00, 1.389/02, 1.620/02, 729/03-11, 47.394/01, 22/03-11, 2000/03 e 47.417.

  20. - A cortiça, considerada como capital de exploração é sempre paga em espécie, ou no caso de não ser possível pelo valor de substituição, art. 11 n° 4 do D.L. 199/88 na redacção do D.L. 38/95 de 14/02, e art. 13 n° 1 do D.L. 2/79 de 09/01.

  21. - O douto Acórdão recorrido ao não considerar a cortiça como fazendo parte do capital de exploração e ao não a indemnizar por valores de 95 violou o disposto no art. 1 n° 2 da Lei 2/79 de 09/01 e o art. 3 c) da Lei 197-A/95 de 17/03.

  22. - Os prédios da recorrente expropriados e ocupados ao abrigo das Leis da Reforma Agrária, foram integralmente devolvidos por direito de reserva e considerados indevidamente abrangidos pelas medidas da Reforma Agrária e não expropriáveis, art. 31 da Lei 109/88.

  23. - O direito de reserva restabelece o direito de propriedade tal como existia à data das medidas de expropriação, art. 38 da Lei 77/77 e 14 da Lei 109/88.

  24. - A demarcação e delimitação do direito de reserva precede a expropriação dos prédios, art. 2 da Lei 77/77 e art. 26 n° 2 da Lei 109/88, sendo repristinado à data da expropriação.

  25. - As expropriações no âmbito da Reforma Agrária destinavam-se à eliminação dos latifúndios e das grandes explorações agrícolas e às finalidades previstas no art. 94 n° 2 da CRP e do art. 50 da Lei 77/77.

  26. - Com a devolução integral dos prédios a título de reserva, o objectivo do Estado ao proceder à expropriação das terras do recorrente, não se consumou ou concretizou.

  27. - No caso da recorrente não teve assim lugar a imposição constitucional prevista no art. 83 da CRP da apropriação colectiva de meios de produção nem a entrega da terra aos pequenos agricultores, às unidades colectivas de produção, ou às cooperativas de trabalhadores rurais, nos termos do art. 94 n° 2 da CRP e art. 50 da Lei 77/77 de 29/09.

  28. - Não houve nem se confirmou a apropriação colectiva dos meios de produção previstos no art. 83 da CRP, que presidiu à nacionalização e expropriação dos prédios da recorrente no âmbito da Reforma Agrária.

  29. - A indemnização devida à recorrente não decorre de apropriação colectiva dos meios de produção com vista à eliminação dos latifundiários na ZIRA, como conclui o Acórdão recorrido, pelo que não está sujeita ao critério de cálculo da indemnização do art. 94 da CRP, mas ao art. 62 nº 2 da CRP.

  30. - A intervenção e gestão do Estado durante a privação temporária dos prédios também não se enquadra nas medidas de intervenção transitórias previstas no art. 11 do Dec.-Lei 406-A/75 de 27/07, uma vez que não se verificou por parte do Estado uma intervenção na exploração agrícola da recorrente e nos seus meios de produção.

  31. - O conteúdo do direito de propriedade garantido pelo art. 62 nº 2 da CRP abrange também o direito à não privação temporária do direito de propriedade, fundamento da indemnização objecto deste recurso constitucional.

  32. - No caso dos autos, não chegou a haver lugar à expropriação ou nacionalização de prédios no âmbito da Reforma Agrária, mas tão só à privação do uso e fruição dos prédios, durante a qual o Estado recebeu os valores da cortiça extraída nos prédios dos recorrentes.

  33. - A indemnização da recorrente não tem como fundamento a perda de património a favor do Estado por expropriação, mas advém da ocupação ilícita dos prédios donde resultou a privação do uso e fruição de...

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