Acórdão nº 0239/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Dezembro de 2005

Magistrado ResponsávelCÂNDIDO DE PINHO
Data da Resolução06 de Dezembro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da 1ª Subsecção da 1ª Secção do STA I- Relatório A...

, com os demais sinais dos autos, recorre do acórdão da 1ª Subsecção da 1ª Secção deste STA- que concedeu provimento ao recurso jurisdicional interposto da decisão do TAC de Coimbra, que por seu turno havia julgado procedente o recurso contencioso ali movido contra a deliberação da Câmara Municipal de Leiria de 27/06/2001- por considerá-lo em oposição com o proferido em 14/12/2000 no processo nº 046682.

Nas respectivas alegações, apresentou as seguintes conclusões: «1º O Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra considerou, em decisão de 24.04.03, que a deliberação camarária, proferida em 27-06-2001, que indeferiu o pedido de licenciamento de bloco habitacional, sito na ..., em Leiria Processo de Obras Particulares nº 702/00, padece do vício de violação de lei alíneas a) e g) do art. 63°, do DL 445/91, de 21-11, na redacção pelo DL n.º 250/94, de 15 de Outubro e, quanto aos fundamentos dados para integrar a alínea b), existe efectivamente o vício de insuficiência de fundamentação, o que equivale à inexistência da mesma -art. 124° e 125° do CPA.

  1. A sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra, ao dar provimento ao recurso contencioso de anulação interposto pela ora Recorrente não merece qualquer reparo, pelo que o acórdão deste STA proferido nos Autos de recurso n.º 239/04, da 1" subsecção não pode ser mantido.

  2. Com efeito, o Parecer desfavorável, obrigatório e vinculativo do IPPAR, invocado pela CML para indeferir o projecto de arquitectura de bloco habitacional sito na ... em Leiria padece de vício de forma por falta de fundamentação tanto de facto, como de direito.

  3. Quer o Parecer n.º 29-DRC/2001, quer a Informação n.º 28/GAB/ASS/PRESS/O1, ambos do IPPAR, fundamentam o indeferimento do mencionado projecto de arquitectura na violação de um Plano de Pormenor da Zona Envolvente do Castelo de Leiria, também conhecido por Plano de Pormenor da Avenida 25 de Abril, que não se encontra em vigor sendo a todos os títulos inaplicável no ordenamento jurídico português.

  4. Desta sorte não sendo este plano válido e eficaz, motivo pelo qual não vincula, directa ou indirectamente, os particulares, e servindo ele de fundamento ao parecer desfavorável do IPPAR, o mesmo (o parecer) não pode deixar de revelar-se inquinado por vício de violação de lei e vício de forma, por falta de fundamentação 6º Quanto à análise do projecto de arquitectura em si mesmo, não pode vingar a fundamentação apresentada pelo IPPAR assente no facto de "a projectada construção constituir um elemento dissonante na paisagem", dado que tal fundamento teve por base, mais uma vez, o prejuízo que a projectada construção traria a "um trabalho consistente de ordenamento urbanístico que está a ser ultimado para a zona", ou seja, a construção só é um elemento dissonante na paisagem porque não se adequa a um instrumento de gestão territorial que ainda hoje apresenta um carácter totalmente virtual e ineficaz perante os administrados.

  5. A informação n.º 28/GAB/ASS/PRES/O1 refere, por último, que "a presente proposta desrespeita embora que ligeiramente, a alínea e) do n.º 1 do art. 45º do Regulamento do Plano Director Municipal." 5º Ora, a expressão "desrespeita, embora que ligeiramente" com a qual o IPPAR justifica a alegada violação da referida norma do PDM de Leiria, revela-se dúbia, vaga e incompleta, dela não se podendo determinar inequivocamente o sentido e alcance da alegada violação -logo estamos perante uma violação do disposto no art. 123º nº 2 do CPA.

  6. Tal fundamentação é insuficiente e obscura, o que equivale à falta da mesma, nos termos do disposto no art. 125º, n.º 2 do CPA.

  7. Com efeito, o projecto de arquitectura obedece a todas as disposições constantes do Regulamento do PDM de Leiria que lhe são aplicáveis, conforme alegou a ora recorrente em 46º da sua petição de recurso e nunca a Câmara Municipal de Leiria alegou quaisquer factos que demonstrassem o contrário ou que permitissem determinar o conteúdo do alegado desrespeito "ainda que ligeiro".

  8. Também os fundamentos de direito apresentados no Parecer do IPPAR, designadamente o art. 23º da Lei 13/85, de 6 de Julho e os art. 2º, nº 2, al f) e 25º, nº 3, al. e) do DL 127/97, de 16 de Maio não esclarecem concretamente a motivação do referido carecer e como tal revelam-se inexistentes, nos termos do disposto no art. 125º, nº 2 do CPA, uma vez que aquele instituto se limitou a invocar, para justificar o seu veredicto desfavorável, e de forma mais do que insuficiente, as normas que lhe atribuem competência para emitir o tipo de parecer ora em questão.

  9. As conclusões e fundamentos do parecer do IPPAR foram homologadas e transpostas para a decisão de indeferimento do pedido de licenciamento, emitida pela CML, constituindo um elemento integrativo essencial da referida decisão final.

  10. Estando o parecer do IPPAR inquinado pelo vício formal de falta de fundamentação, tanto de facto como de direito, a que corresponde a sanção da anulabilidade, também a deliberação camarária está inquinada pelo mesmo vício, sendo, por isso, anulável.

  11. Acresce que, a decisão do tribunal a quo não violou o princípio do aproveitamento dos actos administrativos, uma vez que, segundo a jurisprudência dominante deste Supremo Tribunal, esse princípio é de aplicação exclusiva aos actos vinculados e mesmo quanto a estes apenas quando o tribunal conclua através de um juízo de prognose póstuma que a decisão tomada era a única possível, ou seja, se fosse possível garantir que o acto teria a mesma configuração decisória quaisquer que fossem as vicissitudes do procedimento - Acórdão do Pleno de 0802.2001 Recurso n° 46.660 e Acórdão do ST J de 17.01.2002 -Recurso n.o 46.482 12º Ora, é medianamente claro que, perante todos os vícios quer de forma, quer de violação de lei, de que padece a deliberação camarária objecto dos presentes autos, o tribunal nunca poderia concluir que a decisão tomada era a única possível.

  12. Aliás, a única decisão que a CML deveria ter tomado, consubstanciava-se no deferimento expresso do pedido de licenciamento, atendendo a que a licença de construção tem um carácter vinculado, decorrente de a Administração apenas poder indeferir a pretensão construtiva do particular desde que esteja perante um dos fundamentos tipificados no supra referenciado art. 63º do DL 445/91, de 20.11, alterado pelo DL 250/94, de 15.10, e não para fazer cumprir um plano de pormenor que, ainda hoje, não se encontra em vigor.

  13. Embora não possamos deixar de concordar que a Câmara Municipal de Leiria estava perante um parecer obrigatório e vinculativo a que devia obediência, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 18º, nº 4 do DL nº 445/91, de 20 de Novembro e 98º nº 1 do Código de Procedimento Administrativo, não é correcta a afirmação de que aquela edilidade nada mais podia fazer se não acatar tal parecer.

  14. Contrariamente ao alegado pela Câmara Municipal de Leiria, a deliberação camarária sub judice não é uma inevitabilidade, uma mera formalidade pré-determinada pelo parecer desfavorável do IPPAR, 16º Com efeito, embora o parecer do IPPAR fosse relativamente vinculativo para a CML, era a si que pertencia a competência decisória e nessa medida, dentro desta, ela teria sempre a faculdade de averiguar da legitimidade formal do parecer, porque se ele tiver sido proferido em condições ou circunstâncias formais ilegais, como de facto aconteceu in casu, ela não está obviamente obrigada a acatá-lo, devendo mandar repetir a formalidade e, confirmada ela, tirar das conclusões do parecer as necessárias implicações em termos de decisão -vide neste sentido Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco Amorim, in "Código do Procedimento...

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