Acórdão nº 01442/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Maio de 2005

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução19 de Maio de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A..., ..., ... E ..., com melhor identificação nos autos, vêm interpor recurso contencioso de anulação do despacho do Secretário te Estado da Administração Local, de 5 de Maio de 2003, tornado público mediante publicação no Diário da República, 2.ª Série, n° 127, e 2 de Junho que, no uso da delegação de competências proferida e ratificada pelo despacho n° 9016/2003 do Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, publicado no Diário da República n° 106 de 8 de Maio (2° série) indeferiu o pedido de reversão apresentado pelos recorrentes, de uma parcela de terreno a destacar do prédio denominado ..., com os fundamentos de facto e de direito constantes das informações técnicas n° 4/DSJ, de 3 de Fevereiro de 2003 e 34/DSJ, de 23 de Abril de 2003, da Direcção Geral das Autarquias Locais.

Concluíram a petição de recurso referindo que: 1- O pedido de reversão funda-se na alínea a) do n.º 1 do artigo 5° do CE aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, por ser o vigente à data em que foi formulado o pedido; 2- Sendo que o regime anterior, constante do CE aprovado pelo DL 438/91, previa, no n.º 1 do seu art. 5°, uma regulamentação em tudo idêntica àquela; 3- Dispõe aquele preceito que, sem prejuízo do disposto no n.º 4, há direito de reversão se no prazo de dois anos, após a data de adjudicação, os bens expropriados não forem aplicados ao fim que determinou a expropriação; 4- Da matéria factual resulta que o bem expropriado foi adjudicado por sentença de 5/11/1999, e que as obras de execução do parque de estacionamento terão tido início entre 16/11/2001 e 28/2/2002, ou seja, após o decurso do prazo de dois anos, a contar da adjudicação da parcela à Câmara Municipal da Mealhada; 5- Assim sendo, verificam-se os pressupostos de facto e de direito da reversão requerida; 6- É irrelevante, no que concerne à interrupção do prazo de dois anos previsto no preceito legal supracitado, ter sido a obra consignada em data anterior ao decurso do prazo; 7- O despacho recorrido sofre do vício de violação de lei, por errada interpretação, com erro nos pressupostos de direito, do disposto no artigo 5º, n.º 1, alínea a) do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro.

A autoridade recorrida notificada para responder veio suscitar as seguintes questões, já decididas: irrecorribilidade do acto por ser confirmativo de acto tácito anterior e ofensa de caso decidido por ofender o mesmo acto tácito já consolidado; Quanto ao fundo, defendendo que apenas estava em causa uma questão de direito, sustentou o improvimento do recurso.

Citado para o recurso o Município da Mealhada veio arguir a nulidade consistente na falta de notificação de elementos relevantes, a produção de prova testemunhal em relação a alguns factos, questões já indeferidas, defendendo que o recurso não podia ser provido.

A Magistrada do Ministério Público pronunciou-se sobre as referidas questões.

As partes foram notificadas para alegações.

Os recorrentes, mantendo essencialmente a posição anteriormente assumida, apresentaram a seguinte alegação: 1° Dá-se aqui integralmente por reproduzido todo o conteúdo da petição de recurso.

  1. Incorporou a decisão recorrida os fundamentos de facto e de direito constantes nas informações técnicas nº 4/DSJ de 3 de Fevereiro de 2003 e 34/DSJ de 23 de Abril de 2003 da DGAL, nomeadamente o de que o prazo de dois anos se interrompeu com a consignação da obra a um empreiteiro.

  2. No tocante a esta motivação dão-se aqui como reproduzidos os argumentos aduzidos na petição de recurso.

  3. Para além disso, e conforme consta da declaração de utilidade pública, atribuiu-se igualmente carácter urgente à expropriação do imóvel, objecto do presente recurso.

  4. Declaração n.º 69/99 (publicada no Diário da República II Série de 03/03/1999), a qual consta ou deve constar do processo administrativo, que por força do número 1 do artigo 46° da L.P.T.A. a autoridade recorrida era obrigada a remeter ao Tribunal.

  5. De acordo com o n.º 2 do artigo 13° do Código das Expropriações, a «atribuição de carácter urgente à expropriação é sempre fundamentada e confere à entidade expropriante a posse administrativa imediata dos bens a expropriar, nos termos dos artigos 17° e seguintes, sem prejuízo do disposto no n.º 3.» 7° O artigo 15° da Lei 168/99, de 18 de Setembro, cuja a epígrafe é "Atribuição de carácter de urgência", dispõe no seu número 2 que «A atribuição do carácter urgente à expropriação deve ser sempre fundamentada e confere de imediato à entidade expropriante a posse administrativa dos bens expropriados nos termos previstos nos artigos 20° e seguintes, na parte aplicável.» 8° Ou seja, enquanto na norma do CE/91 se lia «Confere à entidade expropriante a posse administrativa imediata dos bens a expropriar, na actual norma lê-se agora «Confere de imediato à entidade expropriante a posse administrativa dos bens expropriados».

  6. Manteve-se assim o mesmo efeito jurídico.

  7. Neste enquadramento, o recorrido particular, Município da Mealhada, notificou por carta datada de 9 de Março de 1999 os expropriados da declaração de utilidade pública, do seu carácter urgente e da autorização de posse administrativa dos bens a expropriar, dando, assim, cumprimento ao artigo 18° do CE/91, conforme documento que se junta sob o n.º 1 e cujo conteúdo se dá integralmente reproduzido.

  8. Foram ainda os expropriados notificados da realização em 9 de Abril de 1999 da vistoria ad perpetuam rei memoriam, conforme doc. n.º 2, que se junta.

  9. Aliás, no requerimento de instrução do pedido de declaração de utilidade pública, foi também pedida a autorização de tomada de posse da parcela expropriada, conforme documento que se encontra junto ao processo administrativo.

  10. A este propósito escreve José Osvaldo Gomes, no seu livro Expropriações por Utilidade Pública, Texto Editora, 1997, p. 415: «De qualquer forma, e nos casos em que a expropriação tenha carácter urgente (v. Art. 13° do CE/91), ou a entidade expropriante tenha sido autorizada a tomar posse administrativa dos bens expropriados (v. Arts. 17° e 19°, n.º 9 do CE/91), o termo a quo do prazo de dois anos previsto no art. 5° n.º 1 do CE/91 deverá contar-se da data da efectivação da posse administrativa (v. Art. 19° do CE/91).

    É que, a partir desse momento, o expropriante não só pode como deve iniciar a aplicação dos bens ao fim de utilidade pública que justificou a expropriação, não fazendo qualquer sentido aguardar-se pela adjudicação da propriedade (v. Art. 50° n.º 4 do CE/91), para só então se iniciar o cômputo do respectivo prazo.» 14° Com a declaração de utilidade pública extinguem-se os direitos de propriedade do expropriado.

  11. Porém, a traditio ou corpus podem ocorrer posteriormente com a escritura ou o auto, na expropriação amigável, ou com a adjudicação judicial, na expropriação judicial.

  12. No entanto, atento o carácter urgente da expropriação, e conforme decorre do n° 2 do artigo 13° e artigo 17° n.º 1, conjugado com o artigo 18°, todos do CE/91 e artigo 15° do actual regime, a entidade expropriante tomou de imediato posse administrativa do bem.

  13. Em conformidade com a determinação prevista no artigo 18° do CE/91, foram os expropriados notificados da tomada de posse administrativa por parte da entidade beneficiária da expropriação, conforme resulta do documento já junto sob o n.º 1.

  14. Sendo assim, a beneficiária da expropriação entrou efectivamente na posse da parcela a partir de 3 de Março de 1999.

  15. É então lícito concluir que, à data da consignação da obra (12 de Julho de 2001), já tinha sido precludido o prazo de dois anos, contados a partir da efectivação da posse administrativa, a que alude o n° 1 do artigo 5° do CE/91, requisito do direito de reversão.

  16. Citando ainda o mesmo autor, transcrevemos: «deste modo, não considerar a data da sua efectivação para efeitos do exercício do direito de reversão seria pôr em causa os próprios fundamentos da posse administrativa.

    A não se entender assim, teria de concluir-se que o artigo 5° nº l do CE/91 trata de forma igual situações substancialmente distintas, postergando claramente os direitos e interesses legítimos dos expropriados, pelo que, também por essa razão, seria manifesta a sua inconstitucionalidade (v. Artigos 13°, 62° n° 2 e 266° nº 2 da CRP).» 21° Assim, em qualquer dos casos, quer pelos fundamentos expendidos na petição de recurso, nomeadamente que o facto jurídico de consignação da obra não é adequado a interromper o prazo, quer pelos motivos supra alegados, verificam-se os pressupostos de direito da reversão requerida.

  17. Invoca o recorrido particular na sua resposta o vício de nulidade por se ter verificado eventualmente lapso na junção dos documentos enviados, e ainda a não notificação do parecer da jurista que fundamentou o acto recorrido.

  18. O recorrente desconhece a que documentos se refere, se existiu ou não lapso, mas a ter existido, o recorrido particular deveria ter diligenciado a sua correcção, pois a tanto obriga o princípio da cooperação.

  19. No que concerne à não notificação do parecer da jurista alegar-se-á que não tinham os recorrentes a obrigação de o juntar pois encontra-se no processo administrativo, sendo que, nos termos do n.º 1 do artigo 46° da LPTA é obrigatória a sua remessa ao Tribunal com a resposta à contestação, onde o recorrido particular o poderia consultar.

  20. Assim, a invocada excepção de nulidade deve ser julgada improcedente.

  21. Impugna-se ainda o documento n.º 2 junto pelo recorrido particular porquanto do seu conteúdo não resulta a realidade e veracidade do facto alegado no artigo n.º 6 da sua resposta e atento ainda o facto de não se tratar de uma obra contínua.

  22. Quanto à demais matéria alegada pelo recorrido particular, deve a mesma considerar-se impugnada nos termos do supra alegado, sem que no que concerne à secção IV- Inconstitucionalidade e do elemento de culpa aí tratado, se alegue...

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