Acórdão nº 01428/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2005

Data01 Março 2005
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da 2ª Subsecção da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A...

, com os sinais dos autos, interpõe recurso contencioso de anulação do despacho conjunto do Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Ministro das Finanças, de 20 de Março e 25 de Março de 2002, respectivamente, que lhe atribuiu uma indemnização definitiva, no âmbito da Reforma Agrária, no montante de 5.007.688$00, acrescida de juros nos termos do DL nº213/79, de 14 de Julho, pela privação da fruição temporária do seu prédio rústico " Herdade do ...", com a área de 1.316, 2512 ha, entre 1975 e 1999, invocando violação dos artº9º, 13º e 62º da CRP e da Lei nº80/77 e diplomas complementares.

*Na sua resposta, o Ministro da Agricultura arguiu a extemporaneidade do recurso e quanto ao mérito, entende que deve ser negado provimento, porque não se verificam os vícios apontados pela recorrente.

*Por acórdão de 08.07.03, foi julgada improcedente a questão prévia da extemporaneidade do recurso, acórdão de que foi interposto recurso para o STA, a que foi fixado o regime de subida diferida (cf. fls. 166).

*Foi cumprido o artº67º do RSTA.

A recorrente e a entidade recorrida apresentaram as suas alegações, tendo a recorrente formulado as seguintes CONCLUSÕES: I. O critério e o montante da indemnização dita definitiva fixada que, por estarem eivados de injustiça grosseira e notória, levam a que o Despacho Conjunto Recorrido esteja ferido de inconstitucionalidade material por violar os artº 9º, 13º e 62º da CRP.

  1. Quanto aos artº9º e 13º da Constituição veja-se que o Estado Português trata desigualmente sem motivo bastante para isso, em matéria de direito, a um rendimento a perceber pela propriedade da terra, o privado enquanto proprietário, em relações de neste caso a Recorrente, e por outro lado, o Estado também enquanto proprietário, arrendamento que na ficção criada pela jurisprudência de indemnizações definitivas em sede de Reforma Agrária, acabam por se sobrepor no tempo.

  2. Viola, depois ainda, o princípio da igualdade quando trata desigualmente o proprietário que desapossa da sua terra por acto de expropriação em 1976 e o mesmo proprietário, relativamente ao mesmo prédio, no âmbito da construção da barragem do Alqueva.

  3. Viola, depois, o artº62º da Constituição e, mais, ainda, o entendimento que deste impõe o reconhecimento Constitucional da sujeição do Ordenamento Português ao primado da Lei e aos princípios do direito nos termos que se seguem.

  4. E não diga que tanto nos termos da legislação em sede de indemnização por força da Reforma Agrária, como de acordo com a jurisprudência dos Venerandos Conselheiros do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal Administrativo, pode e deve com fundamento no interesse do Estado, existir desconformidade entre o valor pago por expropriação por utilidade pública e o valor pago por expropriações no âmbito da Reforma Agrária, já que " o legislador ordinário goza de discricionariedade na fixação dos critérios da indemnização por virtude destas intervenções expropriadas desde que se cumpram as exigências mínimas de justiça que vão implicadas na ideia de Estado de Direito e não conduzam ao estabelecimento de montantes irrisórios" (Acórdãos 17/01/2002).

  5. Louva-se o douto acórdão citado na jurisprudência no mesmo sentido no Acórdão 420/89 de 15/06/89 que, depois de afirmar a dignidade constitucional e a relevância para esta matéria do princípio da igualdade, afirma que são os Princípios Constitucionais que proíbem o arbítrio, entendido como a diferenciação de tratamento sem fundamento material bastante, indicando-se no mesmo Acórdão que o artº82º da Constituição exige em todo o caso que, em sede de nacionalizações se calcule e pague " uma indemnização razoável ou aceitável que cumpra as exigências mínimas de justiça que vão implicadas na ideia de Estado de Direito" ( Acórdão do Tribunal Constitucional 420/89).

  6. Quanto à terra não devolvida até à referente data, os 50, 8525 hectares, não será nunca possível pretender que se trata quanto a essa área de realização do Princípio da Igualdade para a progressiva eliminação de situações de desigualdade de facto de natureza económica (fundamento apresentado pelo citado Acórdão do Tribunal Constitucional de 15.06.89), já que os restantes 1265 hectares do mesmo prédio foram devolvidos à proprietária ora Recorrente.

  7. A aceitar-se essa argumentação chegaríamos ao absurdo de dizer que numa propriedade de 1265 hectares, o Estado realizava as tarefas constitucionais expropriando a totalidade devolvendo 1265 hectares à proprietária e conservando para si 50 hectares que ia arrendar à melhor oferta a agricultores sem terra.

  8. Tratar-se-ia de uma violação grosseira das normas constitucionais mas mais ainda da justiça que há-de ser prosseguida no âmbito do Estado de Direito e por força deste.

  9. O Despacho recorrido viola ainda a legislação em sede de indemnizações definitivas, nomeadamente, a Lei 80/77 e diplomas complementares e de alteração ao não actualizar os valores das rendas. Ao não integrar na renda a actualização a que a Recorrente tem direito como decorre da supracitada jurisprudência e ao não considerar parcelas inequívoca e pacificamente entendidas como do proprietário que são o rendimento cinegético e o rendimento florestal.

  10. De onde o Despacho recorrido ser considerado inconstitucional e sem efeitos jurídicos ordenando-se à Administração Pública que proceda ao novo cálculo da indemnização definitiva em conformidade com o exposto no presente recurso. E sempre, deve a indemnização a pagar pelo Estado à Recorrente ser de: . Pelas rendas não percebidas, 660.089,71 € . Pelo valor cinegético, 119.651,00€ . Pelo património não devolvido se esse for o entendimento, 128.895, 00 € . Pelo valor de indemnização pelo não aproveitamento florestal do montante de azinho, calculado com a referência aos valores mínimos fixados no artº57º da Portaria 475/2001 de 10 de Maio em 19 € por hectare.

. Pelos danos morais 50.000, 00 €.

*A entidade recorrida CONCLUIU assim: 1. A fixação das indemnizações no âmbito da reforma agrária obedecem a critérios próprios, constantes da Lei 80/77, de 22.10 e da legislação complementar, nomeadamente, DL 199/88, de 31.05, em parte alterado pelo DL 38/95, de 14.02 e Portaria 197-A/95, de 15.03.

  1. Tal regime está dotado de plenitude não admitindo interpretação analógica nem carecendo de recurso ao Código das Expropriações.

  2. A constitucionalidade de tal regime já está amplamente debatido e decidido por jurisprudência pacífica do STA e consagrada no artº 94º da Constituição.

  3. A indemnização fixada à recorrente pela perda de fruição do seu património e pela perda definitiva da propriedade de 50,8225 ha resultou da aplicação de tais critérios legais, o que não é, aliás, questionado pela recorrente.

  4. O despacho recorrido fez, porém, correcta aplicação da lei, não merecendo censura.

    *O Digno Magistrado do MP emitiu parecer concordando com as alegações da autoridade recorrida.

    Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

    *II- OS FACTOS Consideram-se provados os seguintes factos:

    a) Por despacho conjunto do Ministro da Agricultura do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Secretário de Estado do Tesouro e Finanças, proferido em 19-09-2002 e 20-03-2002, respectivamente, foi atribuída a A..., ora recorrente, indemnização definitiva pela privação do património não devolvido e pela perda de uso e fruição do património devolvido, constituído pela "Herdade do ...", no âmbito da aplicação das Leis de Reforma Agrária, no valor 5.007.688$00, a que acrescem juros nos termos do DL 213/79, de 14 de Julho.(cf. doc. nº1, junto com a pi).

    b) A recorrente é proprietária do referido imóvel, sito na freguesia da Póvoa de São Miguel, concelho de Moura, inscrito na matriz sob o artº1º Secção A/A1 desde 02.09.1969, por lhe ter sido legado em testamento, onerado com usufruto vitalício a favor de ..., (doc. nº2 junto com a pi).

    c) A referida usufrutuária deu de arrendamento a ..., o referido prédio, por contrato celebrado por um período de 6 anos, com início em 30.09.69 e termo em 29.09.75, renovável por igual período por acordo das partes (doc. nº3 junto a pi e a fls. 13 do respectivo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT