Acórdão nº 01119/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Janeiro de 2005

Magistrado ResponsávelROSENDO JOSÉ
Data da Resolução11 de Janeiro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção do Contencioso Administrativo do STA: I - Relatório.

A.... com sede em Sines Intentou contra: - O Estado Português - O Instituto Florestal e - O Município de Sines Acção declarativa de condenação com processo ordinário em que pede a condenação solidária dos Réus a pagar a quantia que se liquidar em execução de sentença, a titulo de indemnização pelos prejuízos decorrentes da não aprovação do projecto de construção das instalações necessárias à actividade piscícola que se propunha desenvolver em S. Torpes e que lhe foi concessionada por contrato.

A acção foi julgada improcedente no saneador-sentença do TACL, de 19 de Dezembro de 2003, com fundamento em que o R. Estado cumpriu a prestação a que se encontrava adstrito por virtude da concessão do domínio público e não se verificar a ilicitude da conduta imputada ao Município.

É desta sentença que vem interposto o presente recurso jurisdicional da A....

A alegação da A... apresenta as seguintes conclusões: 1ª. O art° 569° do Cód. Civil no impõe a obrigação de quantificação, na petição inicial, dos danos sofridos.

  1. O pedido genérico deve ser atendido quando, como acontece no caso dos autos, à data da propositura da acção, relativamente a perdas emergentes e lucros cessantes, actuais e futuros, não estar determinada, de forma definitiva, a sua quantificação.

  2. Há que distinguir entre a factualidade alegada e a impossibilidade de, em consequência de fracasso da prova, se concretizar e ou quantificar os prejuízos. 4ª. Encontram-se, deste modo, preenchido os requisitos para a formulação de um pedido genérico.

  3. Ao assim não ter sido entendido, violou-se, entre outros, o estabelecido nos art°s 471°, n° 1, b), 564°, 569° e 661°, n°2, todos do Cód. Proc. Civil.

  4. A A., na p.i., não alegou a não validade e ou a não subsistência do contrato de concessão de fls. 90 e segts. nem tampouco pediu a restituição das rendas pagas nos termos e ou por força desse contrato.

  5. O que a A. fez foi coisa diferente, foi, no âmbito das perdas emergentes, considerar o valor das rendas já pagas a par do despendido com pareceres, estudos e projectos (cfr. art°s 210° e 211° da p.i.).

  6. Ao ter considerado da forma e modo que o fez na, aliás Douta, sentença recorrida, o Mmo Juiz "a quo" interpretou de forma errada os factos alegados na p.i. e, assim, aplicou também de forma errada a lei.

  7. Já que não existe uma incompatibilidade de pedidos, mas sim um pedido único de condenação dos RR. no pagamento de indemnização, resultante do comportamento culposo ou, pelo menos, negligente dos R.R., no caso do R estado, na condução do processo de concessão e, quanto a ambos os R.R., na não aprovação do projecto de licenciamento, o que tudo impediu a A. de proceder à exploração de piscicultura nos prédios objectos do contrato de concessão de fls. 90 e segts.

  8. Deste modo, também não se verificam as excepções de inadmissibilidade de coligação dos R.R. e da cumulação objectiva de pedidos e de ineptidão da p.i., erradamente julgadas procedentes na sentença recorrida.

  9. O valor atribuído à acção na sentença recorrida não tem em atenção os critérios legais fixados no Cód. Proc. Civil.

  10. Na verdade, para o efeito é totalmente irrelevante o alegado no art° 195° da p.i., uma vez que aí não se indica qualquer prejuízo, mas apenas uma perda de receita, faltando, em consequência, para determinação do prejuízo, a indicação da correspondente despesa, 13ª. E, quanto às demais quantias indicadas na p.i, as mesmas têm carácter provisório.

  11. Pelo que, tratando-se de pedido genérico, o valor da acção deve ser o atribuído pela A. na p.i..

  12. Deve, em consequência, ser revogada a alteração dada ao valor da causa.

  13. Os factos alegados pela A. e que não foram impugnados pelos RR. nas contestações apresentadas encontram-se assentes.

  14. Ao assim não se ter procedido, na sentença recorrida foi violado designadamente o disposto no art° 659° do Cód. Proc. Civil.

  15. Deve, pois, a decisão relativa à matéria de facto ser alterada e substituída por outra que considere, efectivamente, todos os factos assentes e, sendo caso disso, que sujeite a produção de prova os restantes.

  16. Tendo o Gabinete da Área de Sines (GAS) lançado um concurso público para a concessão e exploração da actividade de aquacultura, em terrenos de sua propriedade, assinalados na planta anexa ao programa desse concurso, o mesmo GAS sabia ou, pelo menos, tinha a obrigação de saber que esses terrenos podiam ser, na realidade, destinados e utilizados a esse fim, "a concessão de exploração, em regime de exclusivo, da actividade piscícola.

  17. Ao assim não ter actuado, o GAS actuou, no mínimo, com negligência.

  18. Pois, como se verifica do Programa do Concurso e Caderno de Encargos (cfr. docs. de fls. 97 a 83) esse fim era essencial para o Concedente, uma vez que estabelece sanções para a concessionária (cfr. art°s. 16º e 17° do Caderno de Encargos), essencialidade essa que também se verificou para a concessionária, a A., ao ser transcrita no Contrato de Concessão, a fls. 90 e segts..

  19. O GAS não ignorava nem, de resto, podia ter ignorado., a necessidade de se efectuarem obras para a implantação e funcionamento do referido contrato de concessão de exploração (cfr. cláusula 2° do contrato de fls. 90 e segts.) bem como que, para a sua execução, era necessário serem previamente obtidas os necessários licenciamentos, os quais estavam a cargo da Câmara Municipal de Sines.

  20. Pelo que competia ao Estado, inicialmente através do GAS, assegurar que a Câmara Municipal de Sines permitiria a instalação e exploração nos prédios objecto do Concurso Público e do contrato de concessão da Aquacultura e que o seu licenciamento seria possível.

  21. Ao não tê-lo feito o R. Estado actuou, no mínimo, com negligencia.

  22. De resto, o GAS, quer na formação do contrato quer nos preliminares, não agiu segundo as regras da boa fé. na medida em que, ao negociar com a A.. criou-lhe expectativas de negócio que, à partida, já sabia que não se poderiam realizar, omitindo o que poderia determinar a não celebração do contrato.

  23. Como refere o R. Município de Sines no art° 3° do sua contestação, "o GAS não tinha (...) competência para determinar a utilização dos aludidos terrenos para fins de piscicultura actividade que (...) teve de ser licenciado por um membro do Governo, no caso o Ministro do Mar, depois, aliás de ter sido diferido o mesmo licenciamento pelo Secretário de Estado da Agricultura que posteriormente revogou esse despacho." 27ª. O R. Município, depois de ter "reconhecido) interesse económico e social ao projecto para o Município de Sines" e de ter proferido despacho de deferimento do projecto de licenciamento, por deliberação da sua Câmara Municipal de 24.07.91, indeferiu o mesmo licenciamento.

  24. Por outro lado, após o referido deferimento de licenciamento, o R. Município fez aprovar um PDM. no qual não previu a referida situação de deferimento, o que veio a conduzir a que não mais viesse, com fundamentos vários, a aprovar o licenciamento necessário à instalação e exploração no local concessionado no contrato de fls. 90 e segts. de uma actividade piscícola.

  25. Essa omissão e consequentes despachos de indeferimento por parte da Câmara Municipal de Sines violou os direitos da A..

  26. O R. Município estava obrigado, segundo o princípio da garantia da existência ou manutenção, a, em prejuízo do que veio ser estabelecido no PDM, manter, com todas as consequências, o deferimento para o licenciamento das obras de instalação e exploração da actividade piscícola no referido prédio. 31ª. Ao ter proferido o referido despacho de deferimento, o R. Município ficou vinculado, perante a A., com todas as inerentes consequências, a permitir e a tudo fazer para permitir, até às últimas consequências, a referido instalação e exploração por parte da A..

  27. O R. Município, ao ter proferido o citado despacho, ao admitir que o projecto tinha interesse económico e social para o Município de Sines e ao, repetida e continuadamente, ter exigido e solicitado, da A. bem como de terceiros, estudos, projectos e pareceres, criou na esfera jurídica da A. legítimas expectativas e um direito adquirido de que iria proceder ao licenciamento das obras necessárias para a implementação do identificado contrato de concessão de fls. 90 e segts..

  28. A conduta dos R.R. violou as expectativas e os direitos adquiridos que a A. adquiriu pelo Concurso Público de fls. 47 e segts., pelo contrato de fls. 90 e segts., e nos requerimentos, respostas e pareceres, designadamente com os R.R..

  29. O princípio da legalidade, que manda a Administração obedecer à lei, e o princípio de respeito pelos direitos e interesses legítimos dos particulares, que obriga a Administração a não violar as situações jurídicas protegidas dos administrados, foram, no caso, violados pelos R.R..

  30. Devem, assim, os R.R. indemnizar a A. das perdas emergentes e lucros cessantes que lhes causaram, em montante a liquidar em execução de sentença.

  31. Deve, por conseguinte, dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a, aliás Douta, sentença recorrida e substituindo-se esta por Douto Acórdão que julgue a acção provada e procedente ou, quando assim se não entenda, que ordene a baixa do processo à primeira instância para produção de prova e prolação de nova sentença em conformidade com a mesma e de acordo com as regras e princípios constantes da p.i. e desta alegação, O R. Estado contra alegou e formulou as conclusões seguintes (fls. 487).

1- Os factos provados encontram-se devidamente discriminados na douta sentença, motivo pelo qual não se verifica a invocada violação do disposto no art. 659° do Código de Processo Civil; 2- O incidente do valor da causa foi decidido em harmonia com a lei.

3- Não ficaram provados quaisquer factos, dos quais se possa concluir que o R. Estado se constituiu na obrigação de indemnizar a A., quer a título de responsabilidade pré-contratual, quer a título de responsabilidade contratual, ou a nível de responsabilidade...

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