Acórdão nº 01522/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Novembro de 2004

Data24 Novembro 2004
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: A… interpôs neste Supremo Tribunal recurso contencioso de anulação do despacho conjunto do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, de 15/7/99 e 15/9/99, respectivamente, que lhe fixou a indemnização pela privação temporária do uso e fruição do prédio rústico denominado "… e …", de que foram desapossados no âmbito da Reforma Agrária, e pela cortiça que nele foi extraída durante o período da ocupação.

Por douto Acórdão da Secção de 3/2/04 foi concedido parcial provimento ao recurso e anulado o acto impugnado apenas "no tocante ao cálculo e fixação do valor das rendas, por haver incorrido no enunciado vício de violação de lei".

A Recorrente não se conformou com a parte do Acórdão que lhe foi desfavorável e, por isso, agravou para este Tribunal Pleno rematando as suas alegações do seguinte modo: 1. Por documento junto ao processo, elaborado pela Entidade Recorrida, ficou provada a extracção da cortiça em 1976 e bem assim o valor líquido de encargos, proposto pela própria Entidade Recorrida para efeitos de indemnização.

  1. Por erro nos pressupostos de facto, o douto Acórdão recorrido ao não incluir no cálculo da indemnização o valor da cortiça extraída em 1976, violou o disposto no art.º n.º 5, nº 2, d) do DL 199/88, de 31/5, na redacção do DL 38/95, de 14/1.

  2. A cortiça extraída em 76, 79 e 80 é um fruto pendente com 8/9, 5/9 e 4/9 do ciclo de criação, à data da expropriação dos prédios.

  3. A qualificação da cortiça como fruto pendente para efeitos de indemnização da Reforma Agrária, está prevista nos art.s 9.º e 10.º do DL 2/79, de 9/01, tendo em conta a periodicidade do corte (9 anos) e o número de anos de criação.

  4. O Tribunal não pode pura e simplesmente ignorar esta lei, que determina o pagamento da indemnização da cortiça como fruto pendente, em função dos anos de criação à data da ocupação dos prédios.

  5. A cortiça tem um período frutífero de 9 anos de criação podendo ser extraída com a idade de 9 anos, excepcionalmente com 7 ou 8 anos ou em qualquer ano, no caso das árvores terem sido afectadas por incêndio, art.º 9.º do DL 11/97, de 14/01.

  6. O momento da separação da cortiça nada tem a ver com a sua qualificação como fruto pendente, sendo apenas relevante para efeito de venda de frutos antes da colheita, transferência do direito de propriedade e posse - arts. 203.º a 205.º e 208.º do Código Civil.

  7. Só para os eucaliptos assume relevância a sua autonomia (corte) para efeitos da sua qualificação de fruto pendente, uma vez que os eucaliptos foram expressamente excluídos das indemnizações da Reforma Agrária como frutos pendentes - art.º 10.º, n.º 4 do DL 2/79 e art.º 42.º da Lei 77/77.

  8. O direito à indemnização pelos frutos pendentes à data da expropriação está previsto no art.º 1.º, n.º 3, da lei 80/77.

  9. A cortiça extraída em 76, 79 e 80 cujo valor foi arrecadado pelo Estado integra o conceito de fruto pendente para efeitos de indemnização - art.s 212.º a 215.º do Código Civil , art.s 9.º, n.ºs 1, 3, 4 e 5 e art.º 10.º do DL 2/79, de 9/1, Parecer da Procuradoria Geral da República, n.º 135/83, publicado no DR, II Série, de 10/1/84, homologado por despacho do Sr. Secretário de Estado de 22/8/83.

  10. Os valores fixados para as cortiças foram deflacionados à taxa de 2,5 % ao ano desde a data da extracção para 75, para adequar o processamento do pagamento da indemnização em títulos do Tesouro de harmonia com o art.º 24.º da Lei 80/77, de 26/10.

  11. O acréscimo aos valores da cortiça fixados de 76, 79 e 80, dos juros à taxa de 2,5 % ao ano previstos nos art.s 19.º e 24.º da Lei 80/77 desde 75 até ao pagamento conduziu no caso concreto à atribuição de uma indemnização desadequada e irrisória tendo em conta a desvalorização acentuada da moeda que se verificou desde 76 a 103, Portaria 439/04, de 30/04.

  12. A cortiça considerada como fruto pendente faz parte do capital de exploração - art. 1.º, n.º 2, da Lei 2/79 - e é indemnizada por valores de 94/95 - art.º 3.º, c), da Portaria 197/A-95.

  13. A Recorrente em sede de indemnização provisória teria sempre direito a ser indemnizada por 8/9, 5/9 e 4/9 da cortiça extraída em 76, 79 e 80 por valores de substituição à data do pagamento, art.º 9.º e 13, n.º 1, do DL 2/709.

  14. Como os prédios foram considerados como não expropriados e foram devolvidos à Recorrente esta tem o direito a receber a totalidade da cortiça extraída em 76, 79 e 80 como fruto pendente e por valores de 94/95, art.º 3, c), da Portaria 197-A/95, de 17/03.

  15. Mesmo considerando que às indemnizações da Reforma Agrária não é aplicável o art.º 62.º, n.º 2 , da CRP, mas o art.º 94.º e referindo esta disposição constitucional o direito á correspondente indemnização , o cálculo da indemnização por valores de 75/76 preconizado pelo art.º 1.º, n.º 1, a), e n.º 2 da Portaria 197-A/95, ter-se-á de considerar inconstitucional, uma vez que a aplicação desta disposição legal conduz a uma indemnização ridícula e irrisória, o que é manifestamente notório e que se demonstrou no caso concreto.

  16. Ficou demonstrado nos autos que o acréscimo dos juros à taxa de 2,5 % ao ano previstos nos art.s 19 e 24.º da Lei 80/77, aos valores da cortiça fixados em 76, 79 e 80 não satisfaz a justa ou correspondente indemnização, face à inflação e desvalorização da moeda que ocorreu entre 76 e 2003, Portaria 439/04, de 30/4.

  17. A interpretação que o Acórdão recorrido fez dos art.s 19.º e 24.º da Lei 80/77, no sentido de que o valor atribuído às cortiças é actualizado através dos juros previstos nessa disposição legal violou os arts. 62.º, n.º 2, e 94.º da CRP, uma vez que a indemnização daí decorrente não satisfaz a justa ou correspondente indemnização conduzindo a uma indemnização processo valores desproporcionados e irrisórios.

  18. A indemnização por valores desproporcionados e irrisórios não é consentida pelos princípios gerais do direito contidos no nosso ordenamento jurídico em matéria de indemnizações.

    O Sr. Ministros da Agricultura contra alegou formulando as seguintes conclusões: 1. O documento invocado pela Recorrente é uma informação de um técnico da Divisão de Gestão e Estruturação Fundiária da Direcção Regional de Agricultura do Alentejo que não foi apreciada pelo respectivo Director Regional, nem submetida a despacho do Ministro recorrido sendo, por isso, um mero documento interno sem qualquer eficácia externa.

  19. Acresce que de tal documento nunca se poderia extraia a conclusão que dele retira a Recorrente pois o mesmo é claro ao afirmar que da campanha da cortiça de 1976 "nada consta".

  20. O documento invocado não põe em causa o acerto da decisão recorrida, antes confirma o Acórdão quando neste se diz que "o processo instrutor não oferece qualquer elemento de onde possa concluir-se que houve extracção de cortiça nos anos de 1975 e 1976".

  21. Só no momento da extracção é que a cortiça, que é um fruto natural, ganha autonomia e podes Entidade Recorrida considerado fruto pendente, fazendo parte do rendimento fundiário.

  22. E como se trata de um rendimento dos sobreiros implantados no prédio rústico, devolvido à Recorrente, deve ser indemnizado pelo rendimento líquido ferido ao tempo da venda, acrescido do rendimento que aquele montante líquido geraria se aplicado como capital, conforme é jurisprudência do STA, seguido pelo douto Acórdão recorrido.

    O Ilustre Magistrado do MP emitiu parecer contra o provimento do recurso por entender que o Acórdão recorrido acompanhou a jurisprudência deste Tribunal proferida em inúmeros processos iguais ao presente e que, a fazê-lo, fez boa justiça.

    FUNDAMENTAÇÃO I. MATÉRIA DE FACTO.

    A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos : 1. Durante o período compreendido entre 28/5/75 a 19/8/92 o prédio rústico, propriedade da Recorrente, denominado "…, … e …" foi ocupado no âmbito das leis sobre a Reforma Agrária.

  23. Através do despacho conjunto proferido pelo Sr. Ministro da Agricultura e Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças foi atribuída à Recorrente uma indemnização no âmbito das leis sobre a Reforma Agrária no montante de esc. 105.603.260$00.

  24. Essa indemnização foi calculada nos termos de fls. 74 a 64 do processo instrutor, que aqui se dão por reproduzidos.

  25. A indemnização atribuída à Recorrente, quanto ao valor das rendas perdidas foi encontrada através do valor das rendas à data da ocupação do prédio. A partir desta data procedeu-se à sua actualização, por aplicação das taxas previstas no anexo á Lei 80/77.

  26. A indemnização quanto ao valor da cortiça perdida foi fixada tendo em conta as quantidades de cortiça que foram extraídas e comercializadas, o preço da comercialização e os encargos com operações culturais e de exploração e com a extracção. Tal valor foi actualizado nos termos dos art.s 19.º a 24.º da Lei 80/77 e dos art.s 9.º e 10.º do DL 213/79.

  27. Não foi fixada qualquer indemnização para a cortiça extraída nos anos de 1975 e 1976.

    Foi ainda considerado que se não encontrava provado que nos anos de 1975 e 1976 tenha havido extracção de cortiça.

    II O DIREITO.

  28. O antecedente relato informa-nos que os Recorrentes, com fundamento em vício de violação de lei, interpuseram recurso contencioso contra o despacho conjunto do Sr. Ministro da Agricultura e do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, que lhes atribuiu a indemnização que lhes era devida em resultado da ocupação temporária a que foi sujeito o seu prédio denominado "…, … e …", no âmbito da Reforma...

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