Acórdão nº 035338 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Março de 2004

Data31 Março 2004
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: A...

recorre do douto Acórdão da Secção de 18/2/99, que negou provimento ao recurso que interpôs do acto do Sr. Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, de 26/3/94, que declarou a incompatibilidade do Alvará de Loteamento de que era titular com as normas do Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve.

Notificado para apresentar as suas alegações o Recorrente concluiu assim : 1.

O douto Acórdão recorrido enferma de erro de julgamento, ao considerar que, embora esteja provado que o recorrente não foi ouvido previamente à prática do acto recorrido, no procedimento em causa não se justificaria a audiência dos interessados (art.º 100.º e sgs do CPA), a conformidade à lei o despacho recorrido afastaria a necessidade de cumprimento desta formalidade (cfr. texto, n.ºs 1 a 5) : - os art.ºs 100.º e seguintes do CPA consagram um direito de audiência dos sujeitos, que é um direito fundamental atípico, sujeito ao regime dos Direitos, Liberdades e Garantias; - as disposições dos art.ºs 100.º e seg.s do CPA são aplicáveis a todos os procedimentos administrativos, quer os mesmos prevejam ou não tal fase de forma expressa e qualquer que seja a data dos respectivos diplomas legais, nomeadamente o processo previsto no DL 448/91, de 29/11 (Loteamentos - cfr., F.AMARAL, O novo Código do Procedimento Administrativo, in Código do Procedimento Administrativo, Seminário, FCG, 1992, p. 31/32); - A instituição da audiência dos interessados nos procedimentos decisórios de 1.º grau configura o cumprimento de uma directiva constitucional (artigo 267.º/4 da CRP), prevalecendo sobre quaisquer disposições de procedimentos especiais (cfr. Acs. STA de 9/5/96, A D. 418-1134 e de 30/10/96, Proc. 38064); - A não audição da recorrente no caso vertente não se enquadra em qualquer das situações previstas no artigo 103.º/1 e 2 do CPA, que de qualquer forma não foi invocado pelo acto recorrido, pelo que aquela sempre teria de ser ouvida; - Na situação de inexistência ou dispensa de audição do interessado, deverá a Administração, no momento em que tal diligência deveria ter lugar, justificar expressa e fundamentadamente a sua opção (Ac. STA de 19/12/96, P.º 36987); - O exercício de um poder vinculado não pode impedir o cumprimento da formalidade da audiência dos interessados antes do autor do acto decidir, tal como vem prevista nos artigos 100.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (v. por todos, Ac. STA de 24.10.95, in BMJ, 450, 536 e Acs. do STA de 26.06.97 e de 02.10.97, in AD do STA, 433, 19 e BML 470, 657, e, sobre a ratio do artigo 103.º do CPA, F. AMARAL, ob. cit., p. 34 a 37); 2. Em consequência, o acto impugnado enferma de violação de lei, determinante da sua nulidade, pois o recorrente não foi ouvido previamente à prática do acto recorrido, tendo sido violado o direito de audiência prévia consignado nos artigos 267.º/5 da CRP e 8.º e 100.º e ss. do CPA, um direito fundamental de natureza análoga aos Direitos, Liberdade e Garantias, sendo materialmente inconstitucional, por violação da citada norma, a interpretação dos artigos 100.º e seguintes do CPA propugnada pelo douto Acórdão recorrido (cfr. SÉRVULO CORREIA, ob. cit., p. 157); 3. O DL 176-A/88, de 18/5, enferma de inconstitucionalidade material, formal e orgânica, por não ter sido precedido da necessária autorização legislativa da Assembleia de República, violando o disposto nos artigos 62.º/2, 168.º/1/b), l) e s) e n.º 2 da CRP, pois (cfr. números 6 a 12): - Se os critérios de ordenamento do território e zonamento que cada um dos PROT estabelece são impostas às várias entidades públicas, quer na elaboração dos planos municipais de ordenamento, quer nos momentos de licenciamento de actividades, quer aos particulares, nomeadamente, através da nulidade dos actos desconformes (art.º 12.º do DL 176-A/88), então a vertente expropriativa do plano deveria ter sido acautelada e a matéria objecto da competente lei de autorização legislativa, o que não sucedeu, determinando a inconstitucionalidade material, formal e orgânica do DL 176-A/88; - Na senda do que tem vindo a ser defendido pela maioria da doutrina, o jus aedificandi enquadra-se no âmbito do direito de propriedade privada consagrado pelo artigo 62.º da CRP (cfr. Parecer de DIOGO FREITAS DO AMARAL e PAULO OTERO e Parecer de J.M. SÉRVULO CORREIA e J. BACELAR GOUVEIA, in Direito de Ordenamento do Território e Constituição (A inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.º 351/93, de 7 de Outubro), Coimbra, 1998, p. 35 e 150, respectivamente, e no mesmo sentido, DIOGO FREITAS DO AMARAL, Apreciação da Dissertação de Doutoramento do Licenciado Fernando Alves Correia - O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 1991, p.p. 99 e ss. e JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENÇÃO, O Urbanismo e o Direito de Propriedade, in Direito do Urbanismo, ob. col. INA, 1989, pp. 322 e ss.), pelo que todas as suas alterações, nomeadamente as constantes do DL 176-A/88 e do DR 11/91, deveriam ter sido objecto de lei da Assembleia da República ou de Decreto-Lei autorizado, tendo em conta a reserva de competência estabelecida pelo artigo 168.º/1/b) da CRP; - Não tendo o DL 176-A/88 sido previamente autorizado nos termos do n.º 2 do artigo 168.º da CRP, de novo se renova a inconstitucionalidade orgânica e formal deste diploma (v. art.ºs 17.º, 18.º, 62.º e 168.º/1/b) da CRP, e, sobre a natureza de direito análogo e extensão da alínea a) do art.º 168.º/1 da CRP, cfr. por todos, G. CANOTILHO e V. MOREIRA, ob. cit., p. 142 e 672); - Os PROT estabelecem uma verdadeira disciplina material do estatuto das autarquias locais, pois implicam a delimitação negativa das opções a estabelecer pelas autarquias no âmbito dos instrumentos municipais de planeamento, impondo uma limitação às atribuições constitucionalmente previstas e interferindo com o princípio da autonomia das autarquias locais, consagrado nos art.ºs 6.º/1, 237.º e seguintes e 288.º/n da Constituição, integrando-se na matéria abrangida no art.º 168.º/1/s) do mesmo diploma; 4. O PROTAL, aprovado pelo DR n.º 11/91, padece de inconstitucionalidade derivada ou consequência, resultante da inconstitucionalidade do DL 176-A/88, e de violação do direito de propriedade e da garantia de indemnizabilidade da expropriação, previstos nos artigos 62.º/2 da CRP, nos termos antes expostos; 5. Em consequência, o Acórdão ora recorrido, bem como o despacho recorrido e os pareceres que lhe servem de suporte, enfermam de erro de direito, por ausência de suporte legal, determinante da sua nulidade, por ofensa dos Direitos Fundamentais da recorrente (maxime o Direito de Propriedade - art.º 133.º/2/d) do CPA), tendo o acto recorrido violado o disposto no art.º 13.º/2/a) do DL 448/91, de 29/11; 6. O acto recorrido enferma de inconstitucionalidade e invalidade consequente da inconstitucionalidade do DL 351/93 pois (cfr. texto, n.ºs 13 a 16) : - Os poderes de intervenção constantes do artigo 1.º do DL 351/93, de 7/10, configuram uma manifestação de tutela governamental sobre as autarquias locais; - E a tutela representa um dos cernes essenciais do estatuto das autarquias locais, nos termos do disposto no artigo 243.º, sendo matéria incluída no âmbito da norma do artigo 168.º/1/s), ambos da CRP, pelo que é manifesta a inconstitucionalidade orgânica e formal do DL 351/91, especificamente, da norma do artigo 1.º/2 (v., por todos, M. REBELO DE SOUSA, Parecer sobre a constitucionalidade das normas do Decreto-Lei n.º 351/93, de 7 de Outubro, in Revista Jurídica de Direito do Urbanismo e do Ambiente, n.º 1, Junho 1994, p. 137 e JOSÉ MENÉRES PIMENTEL, Pedido de Fiscalização da Constitucionalidade ao Tribunal Constitucional pelo Provedor de Justiça, in Direito do Ordenamento do Território e Constituição (A inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.º 351/93, de 7 de Outubro), Coimbra, 1998, p.p. 212 e 213); - As normas do DL 351/93 são materialmente inconstitucionais, em virtude da sua retroactividade, por afectarem os princípios do estado de direito democrático, da tutela de confiança e da igualdade, decorrentes dos artigos 2.º, 13.º e 266.º da CRP, bem como por violar o disposto nos artigos 17.º, 18.º/2 e 62.º da CRP, por afectar direito fundamental de natureza análoga aos Direitos, Liberdades e Garantias; - O prazo de caducidade previsto no artigo 6.º do diploma viola o princípio da proporcionalidade (artigos 19.º/3 e 266.º/2 da CRP); 7. O acto recorrido revogou igualmente os actos constitutivos de direitos de aprovação do loteamento e de emissão do alvará pela CML (de 18.08.83 e 19.08.88) e de aprovação tácita da compatibilidade, verificada em 17.03.94, violando o disposto nos artigos 140.º/1/b) ou 141.º do CPA (v., por todos, JOSÉ MENÉRES PIMENTEL, ob.

cit. p. 209, e, no mesmo sentido, Ac. STA, datado de 09/11/95 (Proc. n.º 035820), pois (cfr. texto n.ºs 17 a 19) : - A revogação dos actos da CML não invoca qualquer ilegalidade e sempre seria extemporânea; - Os prazos procedimentais especialmente previstos na regulamentação do DL 351/93, nomeadamente o prazo de 90 dias previsto no artigo 2.º/2 deste diploma, são prazos substantivos, não lhes sendo aplicável o disposto no art.º 72.º do CPA, pois tal sujeição determina uma diminuição das garantias dos particulares (art.º 2.º/6) do CPA), como sucede no caso vertente, uma vez que representa a exclusão de um deferimento tácito num processo a que o DL 351/93 imprimiu celeridade (v. a este propósito, e em sentido paralelo, as considerações tecidas no Acórdão do STA de 14.06.94, in A.D. 396-1392); - O acto recorrido é omisso quanto aos fundamentos da revogação do acto tácito de deferimento da compatibilidade (art.º 2.º/3 do DL 351/93); 8. O acto recorrido é nulo, por actuar uma expropriação do jus edificandi incluído no direito de propriedade do recorrente, sem determinar o pagamento de uma justa...

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