Acórdão nº 048089 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Março de 2004

Magistrado ResponsávelMADEIRA DOS SANTOS
Data da Resolução31 de Março de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A..., identificada nos autos, interpôs recurso jurisdicional do acórdão da Subsecção, de fls. 203 e ss., que anulou em parte, e manteve na parte restante, o despacho conjunto - proferido pelo Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e pelo Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças - que lhe atribuíra a indemnização de 16.272.000$00, resultante da legislação aplicável no âmbito da reforma agrária.

A recorrente extraiu da sua alegação de recurso as conclusões seguintes: 1 - A indemnização a que se referem os autos é devida pela privação temporária do uso e fruição de prédios rústicos indevidamente expropriados e ocupados, e posteriormente devolvidos (DL 199/88, de 31/5). 2 - A indemnização a que se referem os autos nada tem a ver com a expropriação ou nacionalização de prédios rústicos e concretamente com a sua perda a favor do Estado.

3 - O critério de cálculo da indemnização devida pelo prédio arrendado, preconizado pelo acórdão recorrido, segundo a repartição do rendimento líquido do prédio, é ilegal e contraria a jurisprudência unânime do STA.

4 - O critério de cálculo da indemnização devida pelas rendas terá de atender à renda previsível e presumível que vigorou em cada um dos anos do arrendamento, durante a privação do uso e fruição dos prédios arrendados, como vem sendo decidido pelo STA.

5 - A renda previsível ou presumível durante o período da ocupação corresponde sempre aos valores das rendas máximas fixadas na legislação que regula o arrendamento rural.

6 - O Estado, nos contratos de arrendamento de áreas expropriadas, sempre fixou as rendas pelas tabelas máximas do arrendamento rural.

7 - Uma coisa é o cálculo da indemnização referente ao período que mediou entre 16/10/75 e 2/11/87, reportando-se os valores das rendas aos respectivos anos de privação, outra coisa é a actualização dessas rendas para valores reais e correntes da data do pagamento ou valores de 94/95.

8 - A indemnização pelo valor das rendas não recebidas terá de ser calculada em analogia com o que se passa com o explorador directo em função dos rendimentos médios actualizados de 1995 e, depois, multiplicado o valor encontrado para a renda pelo número de anos de ocupação dos prédios (art. 2º, n.º 1, da Portaria 197-A/95).

9 - Nos termos do art. 8º do DL 385/88, de 25/10, as rendas são sempre actualizadas anualmente, não podendo ultrapassar contudo as tabelas do arrendamento rural.

10 - Os valores das rendas previsíveis e presumíveis que correspondem ao valor da indemnização deverão ser actualizados para valores de 94/95.

11 - O pagamento da indemnização do valor das rendas, depois de fixado pelo valor previsível e presumível durante a ocupação, apenas beneficia de um acréscimo de 2,5% ao ano até à data do pagamento (arts. 19º e 24º da Lei 80/77), o que não assegura de forma alguma o valor real e corrente do bem à data de 1995.

12 - O somatório das rendas calculadas pelo valor previsível em cada um dos anos de fruição do prédio não contém em si mesmo qualquer actualização para valores de 94/95 ou da data do pagamento da indemnização.

13 - A actualização das rendas deverá ser efectuada de acordo com o seu valor real e corrente.

14 - A indemnização dos valores da cortiça extraída e comercializada em 85 e 88 foi paga à recorrente pelos respectivos valores da data da comercialização.

15 - A cortiça extraída em 85 e 88 é indemnizada como perda do rendimento florestal.

16 - A Portaria 197-A/95, de 17/3, que actualizou os componentes indemnizatórios para valores de 94/95, é omissa quanto à actualização do valor da cortiça, quando considerada como perda do rendimento florestal.

17 - Para integração dessa lacuna, dever-se-á recorrer aos arts. 22º e 23º do Código das Expropriações, procedendo-se à actualização para o valor real e corrente da data do pagamento.

18 - Em alternativa, por valores e preços de 94/95, tendo por base as publicações oficiais de 94/95, por aplicação analógica dos arts. 2º, n.º 1, e 3º, c), da Portaria 197-A/95, de 17/3.

19 - Trata-se de uma indemnização devida pela perda do rendimento florestal que o proprietário deixou de auferir, o qual deve ser colocado na mesma situação, caso não se tivesse verificado a ocupação e expropriação do prédio.

20 - Esta indemnização está subtraída ao princípio nominalista, devendo ser reconstruída a situação que existiria se não tivesse ocorrido a expropriação e ocupação do prédio (art. 562º do CPC).

21 - A indemnização em causa corresponde ao princípio de que o valor do bem expropriado deve ser calculado em momento tão próximo quanto possível da data em que a indemnização vem a ser fixada e paga.

22 - Não seria justo que o expropriado, além do prejuízo sofrido pela privação do bem, viesse ainda a suportar os prejuízos emergentes do atraso da fixação e pagamento da indemnização.

23 - Seria profundamente injusto fixar uma indemnização sem atender à actualização do rendimento florestal do prédio, quando são decorridos mais de 18 anos do início da privação desse rendimento.

24 - As indemnizações da reforma agrária «serão fixadas com base no valor real e corrente desses bens e direitos...» de modo a assegurar uma justa compensação pela privação dos mesmos bens e direitos (art. 7º, n.º 1, do DL 199/88, de 31/5).

25 - Todos os bens e direitos objecto de indemnização da reforma agrária foram actualizados para preços correntes ou valores de 94/95 (art. 11º, ns.º 4, 5 e 6, do DL 199/88, na redacção do DL 38/95, de 14/2, art. 2º, n.º 1, e art. 3º, a), b) e c) da Portaria 197-A/95, de 17/3).

26 - A Lei 80/77, de 26/10, não previa, nem podia prever, a indemnização pela privação do uso e fruição dos prédios rústicos, que só veio a ser concedida pelo DL 199/88, de 31/5.

27 - Os juros previstos no art. 24º da Lei 80/77 apenas são aplicáveis às indemnizações pela perda de património (art. 1º, n.º 2, da Portaria 197-A/95, de 17/3), e não à indemnização pela privação temporária do uso e fruição, que é o caso dos presentes autos (art. 1º, n.º 2, da Portaria 197-A/95, de 17/3).

28 - Mesmo que fosse aplicável à indemnização pela privação do uso e fruição o disposto no art. 24º da Lei 80/77, o acréscimo decorrente dessa aplicação ao valor da cortiça reportada a 85 e 88 nunca atingiria o valor real e corrente por forma a alcançar a justa indemnização, como é imposto pelo art. 7º, n.º 1, do DL 199/88.

29 - Os juros a que se reporta o art. 24º da Lei 80/77 são remuneratórios, não se destinando a atender a qualquer actualização da moeda.

30 - Os juros previstos no art. 24º da Lei 80/77 são igualmente aplicáveis aos demais componentes indemnizatórios depois de actualizados para valores de 94/95.

31 - As normas de direito internacional sobre indemnizações por expropriação, acolhidas no direito constitucional (art. 8º) e no direito interno (preâmbulo do DL 199/88), e bem assim as normas do ordenamento jurídico português sobre indemnizações, impõem a actualização dos danos à data da respectiva liquidação e pagamento.

32 - O art. 62º da CRP é aplicável às indemnizações das reforma agrária.

33 - A redacção do art. 62º, resultante da 4.ª revisão constitucional, ao eliminar a expressão «fora dos casos previstos na Constituição», determina a aplicação desta disposição constitucional às indemnizações pela expropriação no âmbito da reforma agrária.

34 - Pelo art. 7º, n.º 1, do DL 199/88, de 31/5, ficou consignado e reconhecido o princípio da actualização de todos os componentes indemnizatórios no âmbito da reforma agrária.

35 - Uma coisa é receber o valor da cortiça na data da sua extracção, que teve lugar em 85 e 88, e outra, bem diferente, é receber esse valor em 2003, decorridos mais de 18 anos da data do início da privação do rendimento.

36 - O pagamento da cortiça pelos valores históricos da data da comercialização não constitui qualquer indemnização, mas apenas o reembolso e pagamento de um valor em dívida, por parte do...

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