Acórdão nº 048235 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Junho de 2003

Magistrado ResponsávelANGELINA DOMINGUES
Data da Resolução04 de Junho de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1.1- O Gestor do Programa Pessoa recorreu para o Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, com fundamento em oposição de julgados, do acórdão da 1ª Secção, 1ª Subsecção deste Supremo Tribunal Administrativo, proferido a fls. 694 e seguintes, que, revogando a decisão em contrário do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, considerou ser contenciosamente recorrível, por imediatamente lesivo dos direitos ou interesses legalmente protegidos da recorrente, o acto praticado por aquela entidade, pelo qual foi aprovado o pedido de pagamento de saldo, com redução de financiamento, no âmbito do Programa Operacional I (Medida 94 2230 PJ) financiado pelo Fundo Social Europeu.

Indicou como acórdão fundamento o proferido no Processo nº 45 917, da 3ª Subsecção deste Supremo Tribunal Administrativo.

1.2Por acórdão deste Pleno, proferido a fls. 884 a 890 inclusive dos autos, foi reconhecida a existência da oposição de julgados entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento.

1.3A entidade ora recorrente apresentou, nos termos do preceituado no artigo 767º, nº 2 do Código do Processo Civil, as alegações de fls. 894 e seguintes, que concluiu do seguinte modo: 1. Gestor do Programa Pessoa exerce funções junto do membro do Governo, por força do disposto do n.º 2 do art. 25.º e n.º 2 do art. 29.º do DL 99/94 de 19/04, na redacção do DL 208/98 de 14/07, sendo as intervenções operacionais de iniciativa comunitária, como é o caso em análise, geridas sob a responsabilidade do membro do governo responsável pela gestão nacional dos fundos comunitários.

  1. Ao Gestor aplica-se o regime previsto no art. 23.º do DL 323/89, e 26/09, que define o Estatuto do Pessoal Dirigente, resultando daquele dispositivo e mesmo da economia de tal diploma que os chefes de missão, aos quais são equiparados os Gestores, exercem funções junto dos membros do Governo, e deles dependem hierarquicamente por não lhes ser reconhecida competência exclusiva.

  2. De acordo com o disposto nos arts. 2.º, nºs 1 e 2, art. 3.º, n.ºs 1, 3 e art. 4.º do Dec. Reg. 15/96 de 23 de Novembro, é ao "Ministro para a Qualificação e Emprego" que cabe os poderes de regulamentação, de gestão, nomeação e destituição dos Gestores.

  3. O n.° 4, alíneas a) e d), do art. 6.º do Diploma acabado de citar, define as competências dos Gestores, embora "sem prejuízo dos poderes das entidades de controlo de nível superior".

  4. Aliás, o facto da responsabilidade pela gestão global da vertente FSE do QCA passar do Instituto do Emprego e Formação Profissional (I.E.F.P.) - na vigência do Dec. Reg. n.º 15/94, de 6 de Julho - para o Ministro - Dec. Reg. 15/96, de 23 de Novembro é indiciador de um propósito de concentração e de coordenação dos apoios concedidos ao abrigo dos diversos programas operacionais de formação profissional com fundos públicos às políticas definidas pelo Governo.

  5. Com efeito, para que os seus actos sejam a última palavra da Administração, carecem de controlo hierárquico do Membro do Governo de que estejam dependentes. Neste caso do Ministro da Segurança Social e do Trabalho.

  6. Efectivamente, o Gestor do Programa Pessoa está integrado como órgão coadjuvante do Ministro da Segurança Social e do Trabalho, na estrutura daquele Ministério - e atento à sua natureza não duradoura. torna-se desnecessário vir referido na estrutura orgânica, mas fazendo igualmente parte da Administração Central - , com o estatuto de encarregado de missão, não tendo urna competência exclusiva, mas estando dependente, quanto à definitividade dos seus actos, da última palavra do Ministro a quem cabe a gestão global de todos os programas da vertente FSE do Quadro Comunitário de Apoio; pelo que não tem o poder de emitir actos definitivamente lesivos e, como tais recorríveis desde logo contenciosamente.

  7. Assim, atendendo a que o acto praticado pelo Gestor assenta numa competência que não lhe era exclusiva, porque não definida na lei como tal, só é possível concluir, contrariamente ao entendimento expresso nas alegações do Recorrente, que dele cabia recurso hierárquico necessário para o membro do Governo responsável.

  8. Do acto administrativo praticado pelo Gestor, por não ser verticalmente definitivo, cabe recurso necessário, urna vez que a lei não caracteriza as competências dos gestores ou encarregados de missão como competências exclusivas.

  9. Nos termos do art. 167º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), os actos sujeitos a recurso necessário são insusceptíveis de recurso contencioso, por não serem verticalmente definitivos (art. 25°, n° 1, da LPTA).

  10. O recurso contencioso deve pois, ser interposto da decisão (tácita ou expressa) que recaia sobre o recurso gracioso necessário, pois só esta assume o carácter definitivo e executório eventualmente lesivo dos referidos direitos ou interesses e, como tal, é contenciosamente recorrível.

    12Ora, a decisão em apreço não é verticalmente definitiva, não constitui a última palavra da administração e não é imediatamente lesiva dos direitos ou interesses legalmente protegidos da Recorrente para efeitos do disposto no art. 268°, n° 4 da Constituição da República Portuguesa (CRP)." 1.4Não houve contra-alegações e a Exmª Procuradora da República junto deste S.T.A. emitiu o parecer de fls. 904 e 904v, que se transcreve: "A questão da recorribilidade contenciosa dos actos do Gestor do Programa Pessoa que aprovam os pedidos de pagamento de saldo final, com redução de financiamento, não tem sido pacífica na jurisprudência deste S.T.A. .

    Assim, o acórdão fundamento, à semelhança de outros, tais como o de 15/6/2000 - Rec. 45 749, de 8/2/2000 - Rec. 45 431 e de 31/1/01 - Rec. 45 917, consideraram que tais actos estão sujeitos a recurso hierárquico necessário para o Ministro do Trabalho e da Solidariedade, não sendo, consequentemente, directamente recorríveis contenciosamente.

    Afigura-se-me, no entanto, de aderir ao entendimento do acórdão recorrido, até porque me parece ser esta a tese que mais tem vingado na recente jurisprudência deste Supremo Tribunal, sobre esta questão.

    Assim e na esteira desta última jurisprudência (cfr. acs. de 22/11/01 - Rec. 47 306, de 14/3/02 - Rec. 48 235, de 23/5/02 - Rec. 47 868 e de 11/7/02 - Rec. 905/02), tem-se entendido que o Dec. Reg. 15/96 de 23/11 não prevê qualquer recurso hierárquico (próprio ou impróprio) necessário a interpor das decisões dos gestores dos programas, em matéria de aprovação de pedidos de pagamento de saldo final, com redução de financiamento, ao abrigo da competência fixada no artº 6º nº 4 als. a) e b) do referido diploma. Pelo que, tais decisões se apresentam como directa e contenciosamente impugnáveis, não carecendo de interposição de recurso contencioso para abertura de via contenciosa.

    Sou, pois, de parecer que o presente recurso não merece provimento, devendo ser mantido o acórdão recorrido." 2 - Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    2.1No acórdão recorrido, considerou-se relevante a seguinte matéria de facto, tida como assente na sentença do Tribunal Administrativo de Círculo, apreciada pelo mesmo: "i. Em Janeiro de 1997 a aqui recorrente, na qualidade de entidade promotora, candidatou-se à obtenção de apoios à formação profissional no âmbito do FSE, concretamente ao Programa PESSOA, tendo apresentado para tanto plano de formação; ii. Feita a análise técnica e instruído tal pedido a recorrente formulou dois pedidos de financiamento: o pedido n° 10, relativo à medida 94 2230 P1, aqui em causa e um outro n° 11 medida 94 2120 P1; iii. Tais candidaturas vieram a ser aprovadas, e no que toca à medida 94 2230 P1 foi a recorrente notificada em Agosto de 97 de tal aprovação.

    iv. Tal Medida de financiamento veio a ser objecto de auditoria contabilística e financeira de controlo final, realizada por entidade terceira a mando do Gestor do Programa.

    v. A recorrente veio a apresentar o pedido de pagamento do saldo final do apoio em causa; vi. Mas foi notificada da proposta de redução de tal financiamento tendo por base os dados recolhidos naquela auditoria.

    vii. Depois dos respectivos procedimentos de audiência prévia, e de reapreciação do financiamento e saldo a subsidiar, veio a recorrente a ser notificada do despacho ora impugnado e a que se refere no cabeçalho da petição - oficio notificação recebido em 29.07.99 - doc. 1 junto com a p.i., a fls. 92, cujo teor aqui se dá por reproduzido e subscrito pelo Gestor." 2.2 O Direito Dado que, de harmonia com o preceituado no artigo 766º, nº 3 do Código do Processo Civil, o acórdão que reconheça a existência da oposição não impede que o tribunal pleno, ao apreciar o recurso, decida em sentido contrário, cabe aqui reafirmar que, tal como se decidiu no acórdão interlocutório, de fls. 884 e seguintes, é manifesta a oposição de julgados entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento.

    De facto, enquanto o acórdão recorrido considerou que o despacho do Gestor do Programa Pessoa era um acto administrativo verticalmente definitivo e contenciosamente recorrível, e, com esse fundamento, revogou a decisão do Tribunal Administrativo de Círculo que havia decidido em sentido contrário, o acórdão fundamento, ao invés, considerou carecer de definitividade vertical o despacho do Gestor do Programa Pessoa, decidindo, por tal motivo, ser ilegal o despacho do Secretário de Estado do Trabalho e Formação que, com base no entendimento de que o acto do Gestor do Programa Pessoa era definitivo, havia rejeitado o recurso hierárquico para ele interposto A jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo esteve, durante certo tempo, dividida sobre a solução a dar à questão em debate, como, de resto, dá também nota o parecer da Exmª Magistrada do Ministério Público acima transcrito.

    Todavia, a partir do acórdão deste Pleno da 1ª Secção, de 15/10/02, no recurso nº 45 917, consolidou-se a orientação perfilhada no acórdão fundamento, isto é, o entendimento segundo o qual são próprias, mas não...

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