Acórdão nº 045941 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Abril de 2003

Magistrado ResponsávelADÉRITO SANTOS
Data da Resolução03 de Abril de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, na Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: (Relatório) 1.

O Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais recorre do acórdão do Tribunal Central Administrativo que concedeu provimento ao recurso contencioso ali interposto por A..., que tinha por objecto o indeferimento tácito do recurso hierárquico que apresentara àquela entidade do despacho, de 28.2.96, do Director Geral das Contribuições e Impostos, na parte em que, embora procedendo ao seu reposicionamento no Novo Sistema Retributivo (NSR) nos termos que decorreriam da promoção automática a liquidador tributário principal na data em que reuniu as condições legais (25.10.89), recusou efeitos retroactivos a esse reposicionamento.

Apresentou alegação (fl. 128/130), na qual formulou as seguintes conclusões: 1) O douto Acórdão recorrido não podia evocar, como fundamento da anulação do indeferimento tácito impugnado, o vício de violação do artigo 145, nº 2, do CPA, uma vez que esse vício jamais foi arguido pela recorrente contenciosa.

2) O douto acórdão recorrido fez errada aplicação do disposto no art. 145, nº 2, do CPA, uma vez que o despacho de 28-2-96, por não ter sido praticado no contexto do artigo 141, nº 1, do CPA, não tinha de ter necessariamente efeitos retroactivos.

3) O douto Acórdão recorrido devia ter rejeitado o recurso contencioso, por não se ter formado o indeferimento tácito indicado, pela recorrente contenciosa, como objecto do mesmo.

4) O douto Acórdão recorrido fez incorrecta aplicação do artigo 145, nº 2, do Código do Procedimento Administrativo e desrespeitou o disposto nos artigos 668, nº 1, alínea de), 2ª parte, do Código do Processo Civil e 25, nº 1, da LPTA, não merecendo, em consequência, ser confirmado.

A recorrida apresentou contra-a alegação (fl. 131/135), com as seguintes conclusões:

  1. O Acórdão recorrido não incorre em excesso de pronúncia, uma vez que o motivo determinante da anulação do indeferimento tácito contenciosamente recorrido foi igualmente invocado pela recorrente, a saber, o carácter vinculadamente retroactivo da revogação operada pelo despacho de 28/02/96.

  2. A questão da alegada natureza interna do acto do Sr. DGCI de 28/02/96 - suscitada pela Autoridade Recorrente, embora sem inequivocamente a levar às respectivas conclusões - mostra-se igualmente improcedente, visto tratar-se, efectivamente, de um acto plural, que define a situação jurídica de cada um dos interessados, entre os quais o ora recorrida, que se encontram suficientemente identificados no parecer onde foi exarado o despacho (cf. pontos 14, 16, 17, 25 e conclusão I do parecer); C) Quanto aos restantes vícios imputados ao Acórdão pela Autoridade recorrente, não são procedentes, uma vez que a Autoridade recorrente esquece ou omite que a decisão a quo pressupôs, e bem, que a margem de livre apreciação do despacho do Sr. DGCI de 28/02/96, objecto do recurso hierárquico necessário, se esgotou na opção quanto a manter ou revogar o acto ilegal, ainda que já consolidado na ordem jurídica (cf., os doutos Acórdãos desse STA de 27/04/95, rec. 35341 e de 05/03/96, rec. 37751).

  3. Resulta, pois, esgotado que estava o respectivo poder discricionário, nos termos expostos, ter a Autoridade recorrente ficado subordinada a estritos critérios de legalidade no plano da definição do caso concreto.

A fl. 138, dos autos, foi proferida decisão de sustentação do acórdão recorrido, nela se concluindo que este não enferma de qualquer nulidade.

O Exmo. Procurador Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer final: Vem interposto recurso do acórdão de fls. 116 e segs. em que o TCA anulou o acto tácito de indeferimento, imputado ao Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, do recurso hierárquico interposto pela recorrente do despacho de 28-02-98, do Director Geral das Contribuições e Impostos que, revogando anterior decisão, ordenou o seu reposicionamento remuneratório, mas apenas com efeitos para futuro.

No presente recurso, a entidade recorrente imputa a decisão recorrida os seguintes erros: A - nulidade do acórdão por violação da al. d), do artigo 668, do C.P Civil; B - o despacho de 28-02-96 é uma orientação de serviço, um acto interno irrecorrível pelo que não impendia sobre o Secretário de Estado a quem foi dirigido o recurso hierárquico do despacho do Director Geral o dever legal de o decidir. Em consequência o recurso contencioso carece de objecto pelo devia ser rejeitado; C - errada interpretação e aplicação do artigo 145, n.º 2, do CPA.

Analisando: A - Quanto à arguida nulidade por excesso de pronúncia, a nosso ver, não ocorre.

De facto, apesar do recorrente não ter invocado expressamente a violação do artigo 145, n.º 2, do CPA, a verdade é que o acórdão estriba o conhecimento de tal vicio através do apelo que faz aos artigos 266, nº 2, da CRP, e 664, do CPCivil que dispõe que " o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito".

É que o recorrente nos articulados alega violação do princípio da igualdade, invocando expressamente os artigos 5, do CPA e 266, n.º 2, da CRP, alegando ainda e não se está perante o "uso de um poder discricionário porquanto o direito à promoção decorre da aplicação de poderes vinculados resultantes da lei " - cfr. conclusão f) das alegações do recurso contencioso.

Tal alegação, ainda que implicitamente, contém uma referência à violação do princípio consagrado no artigo 145, nº 2, do CPA, segundo o qual a revogação dada em ilegalidade tem efeitos retroactivos, movendo-se pois, o acórdão recorrido no âmbito do pedido e da causa de pedir pelo que também não ocorre a nulidade prevista na al. d), do artigo 668, do C. P. Civil - cfr. neste sentido o ac. de 5-03-00, Rec.º n.º 45.143.

B - Rejeição do recurso contencioso por falta de objecto, face a natureza tema do despacho de 28-02-96, do DGCI.

A questão tem sido tratada em vários arestos deste STA de forma diferente.

Na verdade enquanto parte da Jurisprudência da 1ª Secção deste Tribunal tem ido no sentido da rejeição do recurso contencioso, atribuindo natureza interna ao acto de 28-02-96 - cfr. entre outros os acórdãos de 15-02-00, Rec.ºs n.º 44.858, 5.023, 45.067, 45.230 e 45.665 - outra parte talvez ligeiramente maioritária, tem decidido que tal despacho constitui um verdadeiro acto administrativo definidor da situação individual e concreta do recorrente, pelo que sobre o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais impendia o dever legal de decidir, o que faz atribuir ao seu silêncio a presunção de indeferimento tácito indispensável para a abertura da via contenciosa cfr. neste sentido, entre outros, os acórdãos de 23-02-00, Proc.ºs n.º.862, 45.113, 45.325, 45.459 e de 15-03-00, Rec.º n.º 44.865.

Pela nossa parte, e na esteira desta última jurisprudência, afigura-se-nos que, ao contrário do defendido pelo aqui recorrente, o despacho hierarquicamente pugnado não constitui uma mera orientação genérica para os serviços, Mas, desde logo, define a situação dos seus destinatários - os funcionários a quem se aplique o reposicionamento salarial ordenado - impondo-lhe de modo unilateral e autoritário que tal reposicionamento não terá efeitos retroactivos.

Trata-se, pois de um acto lesivo, sujeito a recurso hierárquico necessário, pelo que o recurso contencioso interposto tem objecto - o presumido indeferimento tácito o recurso hierárquico - pelo que, nesta parte, não assiste razão à entidade aqui recorrente.

C - Errada aplicação, no acórdão recorrido, do disposto no artigo 145, n.º 2, do CPA.

A questão reside em saber se a revogação operada pelo despacho de 28-02-98 teve em vista a reposição da legalidade - o que implicaria a retroactividade dos seus feitos, nos termos do artigo 145, n.º 2, do CPA (tese do acórdão recorrido) - ou se teve como fundamento razões de mera conveniência da Administração, derivadas do facto de ter constatado coexistirem regimes remuneratórias diversos quanto a funcionários em igualdade de condições que, apesar da convalidação da eventual ilegalidade de anterior acto lesivo, entendeu por bem reparar e impedir que, no futuro, tais situações se mantivessem, hipótese em que o regime da revogação será o dos actos válidos e, nos termos do artigo 145, n.º 1, do CPA, terá efeitos para futuro.

Esta questão tem sido decidida uniformemente, neste STA, neste último sentido, i. e. que à revogação operada se deve aplicar o regime da revogação dos actos válidos.

Na verdade, como se escreve no acórdão deste STA de 12-01-00, Recurso n.º 44.839, a propósito de caso idêntico, a Autoridade administrativa ao proferir o acto revogatório teve " apenas a preocupação de tomar homogéneo o estatuto remuneratório dos funcionários, numa perspectiva de boa administração ou de conveniência, atente a indesejável disparidade que casos diversos haviam provocado.

Assim a eventual ilegalidade, embora "sanada", no entender da administração, dos actos revogados surge no discurso fundamentador do acto em causa apenas como pretexto da revogação, assumindo especial relevo justificativo a circunstância de coexistirem regimes remuneratórios diversos quanto a funcionários em igualdade de situações funcionais. A revogação radica portanto essencialmente num fundamento de conveniência, não tendo sido emitido o acto em análise com mera intenção de repor a legalidade. " Assim, a sentença recorrida ao considerar a revogação como a de um acto inválido, e ao anular o despacho contenciosamente recorrido, com o fundamento no facto de, ao atribuir-lhe efeitos para futuro, ter violado o disposto no artigo 145, n.º 2, do CPA, incorreu em erro de julgamento pelo que deve este Tribunal proceder à sua revogação e ordenar a baixa do processo ao TCA para conhecimento dos outros vícios alegados e ainda não conhecidos.

Somos, pois nos termos expostos, pela procedência do presente recurso jurisdicional.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

(Fundamentação) OS FACTOS 2.

O acórdão recorrido deu como provada a seguinte matéria...

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