Acórdão nº 035747 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Julho de 2002

Data11 Julho 2002
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, na Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: I - RELATÓRIO 1. A..., casado, residente na Rua da ..., n.º ..., ... andar, sala ..., na cidade do Porto, interpôs recurso contencioso do despacho conjunto, de 20.06.94, do Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território (SEALOT) e do Secretário de Estado do Turismo (SET), que declarou a incompatibilidade com as regras de uso, ocupação e transformação do solo constantes do Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve, aprovado pelo DR 11/91, de 21 de Março, do projecto de Unidade Hoteleira, em Lagos, ..., Processo HT-8135, da Direcção Geral do Turismo, aprovado por despacho de 30.01.91.

Imputou ao acto recorrido vício de forma, por deficiente fundamentação, e, ainda, vícios de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, revogação ilegal de licença de construção emitida pela Câmara de Lagos, revogação ilegal da declaração tácita de compatibilidade do referido projecto e violação do direito à propriedade privada e dos princípios constitucionais da confiança e da proporcionalidade e da não retroactividade das leis.

  1. Responderam as entidades recorridas, a fls. 38 e segts e 44 e segts., respectivamente, sustentando ambas a rejeição do recurso, por irrecorribilidade do acto contenciosamente impugnado.

    Defende o SET, que este se limitou a declarar a caducidade dos direitos do recorrente, operada pelo DR 11/91, que aprovou o PROTAL, e a confirmar o acto administrativo, definidor da situação jurídica do recorrente, constante do art. 13 desse mesmo diploma legal.

    No mesmo sentido, sustenta o SEALOT que o acto recorrido apenas certifica a caducidade do direito do recorrente, operada pela publicação daquele DR 11/91. Defende, ainda, esta entidade que aquele acto assenta fundamentalmente na Informação n.º 563/94 do Gabinete do SEALOT, que o projecto de construção respeita a zona classificada, no PROTAL, como ‘imperativa' de ‘Protecção dos Sistemas Aquíferos', mostrando-se, assim, o mesmo acto devidamente fundamentado e verificados os pressupostos de aplicação do regime estabelecido no n.º 1 do art. 1 do DL 351/93. Pelo que era ilegal a declaração tácita de compatibilidade, implicitamente revogada, com esse fundamento, pelo acto recorrido. Por fim, e no sentido da demonstração da inexistência das inconstitucionalidades imputadas aquele DL 351/93 pelo recorrente, junta fotocópia de parecer de autoria do Prof. Jorge Miranda.

    Notificado para se pronunciar sobre a questão prévia de irrecorribilidade, suscitada nas respostas das entidades recorridas, o recorrente veio defender, a fls. 101, e segts., que o acto recorrido lesou os respectivos direitos e interesses protegidos, sendo, por isso, contenciosamente recorrível.

  2. O representante do Ministério Público junto deste Supremo Tribunal, sobre a mesma questão prévia, emitiu parecer (fls. 106, ss.), no sentido de que não procede qualquer dos fundamentos, a propósito, invocados pelas recorridas, concluindo que o acto recorrido, proferido como decisão final do procedimento «instituído pelo DL 351/93 é acto lesivo e, para quem julgue operativa a terminologia da LPTA, acto definitivo e executório».

    O recorrido SEALOT requereu, a fl. 116, dos autos, a junção de relatório de averiguação sumária (Proc. 150.500.1.95), realizada pelos serviços da Inspecção Geral da Administração do Território (IGAT), sobre a legalidade, designadamente, do licenciamento do projecto apresentado pelo recorrente e a respectiva compatibilidade com o PROTAL, no qual se afirma que, de acordo com este, o terreno a que respeita esse projecto está localizado em Zona de Atractivo Paisagístico.

    Notificado da junção de tal relatório, o recorrente veio sustentar que, em face do respectivo teor, deverá concluir-se pela existência de erro nos pressupostos de facto do acto recorrido, que se baseou em que o empreendimento projectado se situa em Zona de Protecção aos Sistemas Aquíferos.

    Por despacho do Relator de fl. 139v., dos autos, foi relegado para final o conhecimento da questão prévia suscitada nas respostas das entidades recorridas.

  3. O recorrente apresentou alegação (fl. 152, ss.), na qual formulou as seguintes conclusões: I. O acto recorrido enferma de vício de forma, por ser insuficiente, obscura, abstracta e contraditória a sua fundamentação; II. O despacho recorrido enferma de vício de forma, por ter omitido a audiência do interessado; III. O despacho recorrido enferma de vício de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, violando o disposto nos artigos 7º, 8º e 13º do D.R. 11/91; IV. O acto recorrido consubstancia uma revogação ilegal de declaração tácita de compatibilidade que se havia operado, violando o disposto nos artigos 138º, 140° e 141º do Código de Procedimento Administrativo; V. O despacho recorrido é ainda ilegal por consubstanciar uma forma de tutela não inspectiva.

    VI. O acto recorrido viola o princípio da proibição do excesso por impor ao Recorrente um sacrifício desproporcionado relativamente ao fim a prosseguir, quando nos termos do fundamento do próprio despacho apenas uma pequena posição do loteamento estaria abrangida pela reserva Ecológica Nacional pelo que bastaria declarar a incompatibilidade relativamente a essa parte do loteamento; VII. O D.L. n.º 351/93 é inconstitucional orgânica e materialmente: - por violação da reserva relativa da A.R.; - por violação do princípio da autonomia das autarquias; - por violação do princípio da irretroactividade da lei em matéria de direitos de natureza análoga a direito, liberdade e garantia; - por violação do princípio da proporcionalidade (prevendo nova causa de caducidade de actos administrativos válidos e por não prever indemnização por não confirmação de actos válidos).

    Contra-alegou, apenas, o SEALOT, sustentando, em resumo, o seguinte: - não é possível afirmar, com rigor, que o terreno em questão esteja situado em Zona de Protecção aos Sistemas Aquíferos; - mesmo aceitando que o mesmo terreno se situa em Zona de Atractivo Paisagístico, a anulação do acto recorrido não poderia conduzir ao deferimento da pretensão do recorrente, que sempre teria de negar-se, face às disposições dos artigos 20 e 26 do PROTAL; - a legalidade do acto recorrido tem de aferir-se pelas disposições legais vigentes à data da sua prática, pelo que não procede a argumentação do recorrente, no sentido de que deveria ser revogado, por o projecto se situar em área urbana, segundo o Plano Director Municipal, posteriormente publicado; - o recorrente não faz prova de que, conforme invocou em resposta ao Relatório da IGAT, lhe foi concedida pela Câmara Municipal de Lagos prorrogação, para além de 04Nov.94, do prazo para apresentação dos cálculos de estabilidade. Pelo que, como consta desse relatório, caducou a licença de que era titular; - não deve conhecer-se, por extemporânea, da alegação de existência de vício de forma, por violação do art. 100 do Código do Procedimento Administrativo, por não serem as alegações o momento próprio para invocar ‘ex novo' vícios do acto recorrido.

  4. O Ex.mo magistrado do Ministério Público emitiu parecer final (fl. 172, ss.), no sentido de que o recurso não merece provimento, por não procederem os vícios imputados ao acto recorrido, pelas razões invocadas pela entidade recorrida, apoiadas na doutrina contida no parecer que fez juntar aos autos.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    II - FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS Com relevância para a decisão a proferir, apura-se a seguinte matéria de facto:,

    1. O recorrente é proprietário, juntamente com B... e C..., de um prédio rústico, composto de terra de semeadura e uma casa em ruínas, no ..., freguesia de São Sebastião, concelho de Lagos, inscrito na respectiva matriz sob o artigo dois, Secção T e descrito na Conservatória do Registo Predial de Lagos, sob o n.º 16050.

    2. Em 30.01.91, com base em parecer (n.º 23/91) nesse sentido emitido pelos serviços da Divisão de Projectos de Instalações Turísticas da Direcção de Serviços de Equipamentos da Direcção Geral do Turismo, o Director Geral do Turismo aprovou o projecto, apresentado pelo recorrente, de instalação, naquele prédio, de um Hotel Apartamento (cfr. fl. 16/17, dos autos).

    3. Em 01.04.91, a Câmara Municipal de Lagos deliberou pela emissão de licença para construção desse mesmo estabelecimento hoteleiro (cfr. fl. 22, dos autos).

    4. Em 04.01.94, deu entrada, nos serviços da Comissão de Coordenação da Região do Algarve, requerimento do recorrente para que, nos termos e para os efeitos do disposto no DL 351/93, de 07.10, lhe fosse «passada a confirmação da compatibilidade de uso, ocupação e transformação do solo para a construção de um Aparthotel na ... - Lagos, conforme projecto devidamente aprovado pela Direcção Geral do Turismo e pela Câmara Municipal de Lagos e que se encontra em fase de licenciamento» (cfr. fl. 32, do processo instrutor (PI) apenso).

    5. Em 02.05.94, foi elaborada, na Direcção Geral do Turismo (cfr. fl. 5/6 do PI), a seguinte Informação de Serviço n.º 385/94 D.S.E./D./O.

    Assunto: Certificado de Compatibilidade com o Plano Regional de...

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