Acórdão nº 2672/07.6TBAGD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 31 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução31 de Maio de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.

Em 7 de Novembro de 2007[1], R… e mulher, M… (AA. e Apelados) demandaram O… (R. e aqui Apelante)[2] invocando terem adquirido a esta, em 05/04/2005, um prédio urbano (uma moradia), sendo que no início do ano de 2007 detectaram o surgimento de diversos defeitos nessa moradia (designadamente rachas, infiltrações e diversas manchas de humidade), tendo comunicado esses desvalores à R. por carta de 10/07/2007 (trata-se do documento de fls. 19), sem que esta tenha desencadeado a sua reparação. Em função desta omissão da R. formulam os AA. os seguintes pedidos: “[…] [S]er a R. condenada: A) [a] Proceder a expensas suas às necessárias e urgentes obras de reparação do prédio […] eliminando todos os defeitos de construção denunciados […], ou à substituição do que não puder ser reparado; B) Que essas reparações e substituições tenham início 15 dias após o trânsito em julgado da decisão da presente acção; C) A pagar aos AA., a título de danos morais o valor de €1.500,00; […] Ou, se não proceder à reparação ser a R. condenada a:

  1. Pagar aos AA. a quantia de €26.800,00 acrescidos da taxa de IVA em vigor; B) Pagar os demais prejuízos resultantes da actualização dos preços constantes no orçamento junto e nos demais prejuízos resultantes dos demais defeitos que entretanto ocorreram e que se apurarão em liquidação de sentença; C) Pagar a quantia de €1.500,00, a título de danos não patrimoniais sofridos; D) Pagar os juros moratórios legais das referidas quantias desde a data da citação até integral pagamento; […]” [transcrição de fls. 7/8] 1.1.

A R. apresentou o seu articulado de contestação (fls. 30/35), deduzindo nele, desde logo, um incidente de intervenção principal provocada [artigo 325º do Código de Processo Civil (CPC)] de J… e da Sociedade de Construção Imobiliária H…, Lda.

(que, adiante-se, viriam a ser admitidos como Intervenientes acessórios a fls. 60/64), respectivamente empreiteiros da edificação (dito alvoramento) do prédio (o primeiro) e dos acabamentos e exteriores (a segunda), sendo que a R. funcionou, relativamente a estes dois intervenientes, aquando da construção da moradia, como dona da obra.

Paralelamente, quanto à venda do prédio aos AA., negou a R. qualquer responsabilidade pelos defeitos invocados e o conhecimento dos mesmos à data dessa venda.

1.2.

Findos os articulados – incluíram estes um articulado próprio do Interveniente acessório J… (fls. 68/70)[3] –, foram os autos objecto de saneamento e condensação prosseguindo para o julgamento que se mostra documentado a fls. 169/174.

Findo este, depois de terem sido fixados os factos provados por referência às questões indicadas na base instrutória (despacho de fls. 175/176), foi a acção julgada parcialmente procedente através da Sentença de fls. 192/208 – esta constitui a decisão objecto do presente recurso – cujo pronunciamento decisório final se expressou nos seguintes termos: “[…] a) [C]ondenamos a R. a realizar as obras necessárias à eliminação dos defeitos descritos em II.10 a II.12 ou à substituição do que não for possível de reparação, no prazo de 15 dias após o trânsito em julgado da sentença.

  1. [C]ondenamos a R. a pagar aos AA., a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de €1.500,00.

  2. [A]bsolvemos no mais a R.

[…]” [transcrição de fls. 207] 1.3.

Inconformada, interpôs a R. o presente recurso motivando-o a fls. 215/233, rematando tal peça processual com as conclusões que ora se transcrevem: “[…] [transcrição de fls. 230/232] II – Fundamentação 2.

Caracterizado que foi, no antecedente item, o processo nas suas incidências gerais, importa ter presente que as conclusões acima transcritas, formuladas pela Apelante, operaram a delimitação temática do objecto deste recurso (artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1, ambos do CPC).

Visa a Apelante alcançar, por via deste recurso, o reconhecimento, enquanto elemento de bloqueio do direito dos AA. a obter dela (vendedora) a reparação dos defeitos supervenientemente detectados na moradia, da situação prevista no trecho final do artigo 914º do Código Civil (CC): “[o] comprador tem direito de exigir do vendedor a reparação da coisa […]; mas esta obrigação não existe, se o vendedor desconhecia sem culpa o vício ou a falta de qualidade de que a coisa padece” (sublinha-se aqui o trecho em causa).

Para este efeito pugna a Apelante, por um lado, pelo acrescento de um facto ao elenco emergente do julgamento na primeira instância e, por outro lado, com ou sem essa almejada alteração dos factos, pela subsunção da situação ao desconhecimento, sem culpa do vendedor, dos defeitos da moradia, aquando da venda, integrando-se assim a facti species do indicado trecho final do artigo 914º do CC.

Apresenta a apelação, pois, enquanto fundamentos distintos colocados à consideração deste Tribunal de recurso, uma dimensão fáctica e uma dimensão de subsunção à indicada previsão legal, sendo que esta última se nos apresenta como ligada mas não condicionada pela alteração dos factos pugnada pela Apelante, subsistindo, enquanto fundamento do recurso, mesmo sem o acrescento de qualquer facto.

2.1.

Assim, começando pela referida dimensão do recurso atinente aos factos, indicaremos, como ponto de partida expositivo, qual o elenco destes fixado na primeira instância: “[…] [transcrição de fls. 195/200] 2.1.1.

Combina este elenco os factos primeiramente fixados na fase condensatória (fls. 77/81) – os factos logo provados a culminar o confronto de posições que teve expressão nos articulados – e os resultantes das respostas dadas em julgamento aos quesitos constantes da base instrutória (fls. 81/82 e 175/176), adrede elaborada na mesma ocasião, sendo que a Apelante, no que respeita a estes últimos factos (aos positivamente fixados), não pretende propriamente a alteração das respostas dadas pelo Tribunal a quo – intui-se do texto da motivação que a Apelante não contesta qualquer dessas respostas, não indicando provas que conduziriam a outras respostas a esses quesitos (v. artigo 690º-A, nº 1 do CPC) –, limitando-se a Apelante, pois, a pugnar pela consideração de uma determinada circunstância de facto não incluída nesse elenco: os AA. – afirmam-no eles próprios no recurso –, conforme decorreria do depoimento da testemunha (irmão da R.) P…, teriam ido habitar a moradia vendida alguns meses antes da formalização dessa venda (o contrato respectivo data de 05/04/2005, item 1. dos factos), devendo esta circunstância – defendem-no os Apelantes – ser adicionada por esta Relação ao rol dos factos (note-se que só assim seria possível a ponderação dessa circunstância)[4]. Expressando-se nestes termos o fundamento do recurso respeitante aos factos – a saber: deve ser adicionada a estes a circunstância dos AA. terem ido habitar para a moradia alguns meses antes da celebração do contrato de compra e venda –, importa esclarecer a razão pela qual este elemento não constou do elenco fáctico considerado pela primeira instância, sendo que desse esclarecimento resultará clara a não verificação de qualquer desvalor procedimental ou decisório por parte do Tribunal a quo.

Com efeito, tendo presente que os factos a ter em conta são – só podem ser – os alegados pelas partes, deparamo-nos com a completa ausência da invocação deste elemento em qualquer dos articulados existentes na acção, tanto no dos AA. como no da R. e, bem assim, do Interveniente, sendo em função desta omissão que se explica a não consideração de tal aspecto, como facto...

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