Acórdão nº 01060/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução19 de Maio de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: 1. Relatório A…, magistrada do Ministério Público com a categoria de procuradora adjunta, recorreu para o Pleno deste Supremo Tribunal Administrativo de um acórdão proferido pela Secção que julgou improcedente a ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL por si intentada contra o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

Terminou a sua motivação com as seguintes conclusões: I. Ao julgar improcedente a acção administrativa especial de impugnação da deliberação do plenário do Conselho Superior do Ministério Público, de 22 de Julho de 2009, que, indeferindo a sua reclamação aplicou à recorrente a sanção disciplinar de 80 dias de suspensão de exercício, o acórdão recorrido incorre em erro de julgamento, devendo ser revogado.

  1. Desde logo, ao contrário do que sustenta o acórdão «a quo», a recorrente considera que não é válida a delegação de competência constante do nº 1, alínea u), da deliberação do Conselho Superior do Ministério Público, de 29 de Novembro de 2006, publicada no Diário da República, 2ª série, nº 249, de 29 de Dezembro de 2006 e, por isso, não é igualmente válida a subdelegação feita pelo despacho do Senhor Procurador-Geral da República, de 23 de Maio de 2008, publicado no Diário da República, 2ª série, nº 110, de 9 de Junho de 2008.

  2. A competência para converter um inquérito em processo disciplinar (artigo 214º EMP) não se encontra abrangida pela norma de habilitação invocada pelo acórdão recorrido (artigo 31º/1 EMP). Trata-se de uma competência exclusiva, que só pode ser exercida pelo Conselho Superior do Ministério Público, sem possibilidade de delegação. Termos em que o acórdão apelado procedeu a uma errada aplicação do direito ao caso concreto, devendo ser revogado e substituído.

  3. No caso dos autos, na inexistência de fundamentação quanto à impossibilidade de aguardar pela reunião do Conselho Superior do Ministério Público por referência a critérios que a delegação não estabeleceu, a conversão do inquérito em processo disciplinar sempre se deve ter por inválida.

  4. Em qualquer caso, a conversão de inquérito em processo disciplinar não é acto que, por natureza, não possa aguardar pela realização de uma reunião do órgão colegial (em plenário ou em secção). Termos em que o acórdão apelado procedeu a uma errada aplicação do direito ao caso concreto, devendo ser revogado e substituído.

  5. Existe contradição entre a fundamentação e a decisão, já que a própria fundamentação não explicita em que medida são de desconsiderar os factores que reconhece terem influenciado e justificado a acção da recorrente. Termos em que o acórdão apelado procedeu a uma errada aplicação do direito ao caso concreto, devendo ser revogado e substituído.

  6. O acórdão recorrido errou ainda ao não sancionar os erros sobre os pressupostos de facto e sobre os pressupostos de direito em que incorreu o acto impugnado na acção administrativa especial.

  7. No caso do erro sobre os pressupostos de direito, está mesmo em causa a determinação da culpa, por existirem indícios de não poder ser imputada à recorrente qualquer negligência ou qualquer desinteresse pelo exercício das suas funções. Termos em que o acórdão apelado procedeu a uma errada aplicação do direito ao caso concreto, devendo ser revogado e substituído.

  8. E a constatação referida na conclusão anterior reflecte-se no carácter excessivo da sanção aplicada, em violação do princípio da proporcionalidade, pelo que também por esta razão deve o acórdão recorrido ser revogado.

  9. Finalmente, a recorrente entende que, tendo em conta os elementos relativos à gravidade dos factos, à suas culpa e personalidade e às circunstâncias que militam a seu favor resultantes do contexto, como impõe o artigo 185º do Estatuto do Ministério Público, o acto impugnado violou a lei ao não foi utilizar o instituto previsto no artigo 186º do mesmo diploma normativo - atenuação especial da sanção.

Termos em que, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, revogado e substituído acórdão recorrido por ter procedido a uma desadequada aplicação do Direito ao caso concreto, assim se fazendo a usual justiça.

O CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO sustentou a manutenção do Acórdão recorrido, dizendo, para tanto, o seguinte: 1° - Insurge-se a Recorrente contra o Acórdão da Secção de 7 de Setembro de 2010 que julgou totalmente improcedente a Acção que tomou por objecto a deliberação do Plenário do CSMP de 22 de Julho de 2009, que confirmou a aplicação da pena disciplinar de "SUSPENSÃO DE EXERCÍCIO" pelo período de 80 dias, operada pela decisão da respectiva Secção Disciplinar de 16 de Abril de 2009.

2° "Ressuscitando" as questões a) da ILEGALIDADE DA CONVERSÃO DO INQUÉRITO EM PROCESSO DISCIPLINAR, por ser: aa) um acto da exclusiva competência do CSMP e, por isso, INDELEGÁVEL, quer no Procurador-Geral da República, quer no Vice-Procurador-Geral da República; e ab) um acto, cuja prática pelo órgão delegado, carece de fundamentação sobre as razões pelas quais não deve aguardar a reunião do órgão delegante; b) da CONTRADIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS ADOPTADOS E A DECISÃO; c) do ERRO SOBRE OS PRESSUPOSTOS DE FACTO E DE DIREITO, por se terem dado como assentes factos que não considera provados e por se ter concluído por uma conduta negligente e desinteressada, passível de censura disciplinar; e d) do ERRO SOBRE OS PRESSUPOSTOS DE DIREITO, por violação da norma dos artigos 185° e 186°, ambos do Estatuto do Ministério Público (EMP), aprovado pela Lei nº 47/86, de 15 de Outubro, na redacção da Lei nº 60/98, de 27 de Agosto. Questões estas que 3° Já vinham apontadas, nos mesmos termos, ao acto que foi objecto da Acção, pretendendo a Recorrente a revogação do Acórdão por ERRO DE JULGAMENTO, NA MEDIDA EM QUE CONFIRMOU O ACTO PUNITIVO IMPUGNADO, julgando improcedentes tais questões.

Vejamos: Quanto à ILEGALIDADE DO ACTO QUE CONVERTEU O INQUÉRITO EM PROCESSO DISCIPLINAR: 4° A Recorrente parece confundir a natureza EXCLUSIVA da competência para a prática de um acto, com a natureza INDELEGÁVEL dessa competência. Na verdade, 5° Um órgão que detenha a COMPETÊNCIA EXCLUSIVA para a prática de um determinado acto PODE DELEGAR essa mesma competência exclusiva num outro órgão, nos termos do artigo 35°, do Código do Procedimento Administrativo (CPA) e, no caso em presença, de harmonia com o disposto no artigo 31° do EMP - O QUE SÓ FAZ SENTIDO SE A COMPETÊNCIA FOR EXCLUSIVA.

6° O que não pode ser objecto de DELEGAÇÃO é a prática de ACTOS INDELEGÁVEIS, POR NATUREZA OU POR LEI, como todos os que se descrevem no Acórdão recorrido - cfr. ponto 2.2.1.1., a fls. 6 - e os que, por exemplo, se consagram no artigo 14°, nºs 1, 2, 4 e 5, do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas (ED), aprovado pela Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro. Por outro lado, 7° Desta aparente confusão entre a natureza EXCLUSIVA da competência para a prática de actos e a natureza INDELEGÁVEL da prática de actos, decorre outra confusão, que se prende com a AUTORIA da prática dos actos: na situação da Recorrente, O ACTO QUE CONVERTEU O INQUÉRITO EM PROCESSO DISCIPLINAR, embora materialmente consumado pelo Vice-Procurador-Geral da República - em substituição do Procurador-Geral da República, autorizada pelos artigos 13°, nº 1, do EMP e 41º, nº 3, do CPA, sem necessidade até da subdelegação de competência invocada pela Recorrente - É IMPUTÁVEL ao CSMP.

8° Por isso, a Recorrente demandou - e bem - o CSMP na Acção. Acresce que 9° O órgão delegante (CSMP), embora "a posteriori", RATIFICA E SINDICA o acto praticado pelo órgão delegado, podendo revogá-lo, ou mantê-lo, como aconteceu no caso da Recorrente. Além disso, 10° Pelas razões invocadas no Acórdão recorrido, que aqui damos por reproduzidas, a delegação de poderes do CSMP no Procurador-Geral da República para a prática do acto que converte o inquérito em processo disciplinar NÃO CARECE DE FUNDAMENTAÇÃO CASUÍSTICA SOBRE O CONCRETO JUÍZO DE NECESSIDADE. Por isso, 11° Não enferma o Acórdão recorrido de ERRO DE JULGAMENTO, na apreciação desta questão.

Quanto à CONTRADIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO: 12° O Acórdão recorrido abordou detalhada e expressamente todas as contradições apontadas pela Recorrente ao acto punitivo, afastando-as, fundamentadamente, num juízo lógico e coerente, que, por isso, não merece censura - cfr. ponto 2.2.2., a fls. 10, 11 e 12 - concluindo que "a motivação da deliberação impugnada é coerente, não contém contradições internas inconciliáveis com as exigências atinentes ao dever de fundamentar ..." – sic.

Quanto ao ERRO SOBRE OS PRESSUPOSTOS DE FACTO E DE DIREITO: 13° Posto que o Pleno da Secção desse Supremo Tribunal não pode conhecer MATÉRIA DE FACTO, por força do estatuído no artigo 12°, nº 3, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pela Lei nº 13/2002, de 19 de Fevereiro, não pode a Recorrente pôr em causa a apreciação operada pelo Acórdão recorrido EXCLUSIVAMENTE quanto à materialidade assente respeitante à DISTRIBUIÇÃO DE SERVIÇO, à PRESENÇA DO PROCURADOR DE CÍRCULO NAS AUDIÊNCIAS DE DISCUSSÃO E JULGAMENTO E AOS PROCESSOS DE CONTRA-ORDENAÇÃO SEM ATEMPADA EXECUÇÃO PATRIMONIAL. Na verdade, 14° O Acórdão recorrido - ao qual se não aponta omissão de pronúncia - abordou apenas os factos descritos nos artigos 24º e 112º da acusação - cfr. fls. 12, "in fine" - impugnados pela Autora na fase de defesa. Por isso, 15° IRRELEVAM, no âmbito do presente recurso jurisdicional, todos os argumentos alinhados pela Recorrente no ponto C. 5. da sua Alegação, bem como no ponto C. 6. - alegadamente quanto a ERRO SOBRE OS PRESSUPOSTOS DE DIREITO - na medida em que se reporta também a Juízos DE FACTO OU SOBRE MATÉRIA DE FACTO, operados pelo Acórdão recorrido, sem apelo à sensibilidade jurídica dos julgadores e sem necessidade de interpretação de qualquer norma legal. Na verdade, 16° As conclusões sobre a actuação negligente e desinteressada da Recorrente constituem Juízos DE...

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