Acórdão nº 04881/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução26 de Maio de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

O Ministério Público inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. Face aos documentos constantes dos autos e não tendo a Requerida (que foi citada e não contestou) apresentado outros elementos, entende-se que se pode concluir pela inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional.

  1. A própria decisão recorrida reconhece, aliás, que, perante a factualidade apurada, é até discutível que se possa afirmar que a Requerida possui ligação efectiva à comunidade portuguesa.

  2. Tratando-se de uma acção de simples apreciação negativa, impunha-se que a Requerida trouxesse ao processo os elementos que pudessem fundar o direito à aquisição da nacionalidade portuguesa, afirmado nas declarações que prestou na Conservatória do Registo Civil de Viseu.

  3. A conduta processual da Requerida (que nem sequer apresentou contestação) não pode redundar em prova efectiva do direito à aquisição da nacionalidade portuguesa.

  4. Tendo decidido como decidiu, a douta sentença recorrida violou o disposto no artigo 9.°, alínea a) da Lei n.° 37/81, na redacção da Lei n.° 2/2006, de 17 de Abril, artigo 56.°, n.° 2, alínea a) do Decreto-Lei n.° 237-A/2006, de 14 de Dezembro e artigo 343.°, n.° l, do Código Civil.

  5. Pelo que deve ser revogada e substituída por outra, que julgue procedente a acção de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa a que se reportam os autos.

    * Colhidos os vistos legais e entregues as competentes cópias aos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência.

    * Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade: 1. Rute ……………., nasceu no Brasil, a 13 de Março de 1974 e está registada como filha de Alexandre ……….. e de Luba ………….., ambos naturais do Brasil; 2. A Ré celebrou matrimónio no Brasil a 23 de Março de 2002, com José …………, cidadão nacional de Portugal; 3. A Ré vive com o seu marido, na Vila ………., V……..; 4. A 26 de Junho de 2006, na Conservatória do Registo Civil de Viseu, a Ré, ao abrigo do art. 3º, da Lei 37/81, declarou a vontade de aquisição da nacionalidade portuguesa, com fundamento na celebração do seu casamento com nacional português, tendo declarado que estabeleceu residência em Portugal, na vila de ………, não pretendendo regressar ao Brasil. Convive com a comunidade daquela vila, na qual se encontra perfeitamente inserida económica e socialmente; É solicitada e participa nos principais eventos sociais que decorrem naquela comunidade. Reside com o marido em casa própria cedida pelos sogros. O marido exerce uma actividade profissional cuja remuneração é suficiente para sustentar sem dificuldades a família. Conhece perfeitamente os costumes deste país; Encontra-se inscrita no Ministério das Finanças e está inscrita no Ministério da Saúde desde 18-4-2006, sendo utilizadora das Bibliotecas Municipais de …… e V……….

  6. Com base em tal declaração foi instaurado na Conservatória dos Registos Centrais o processo nº 22287/06, onde se questionou a existência de facto impeditivo da pretendida aquisição de nacionalidade portuguesa, razão pela qual foi remetida ao MP certidão para efeitos de instauração do presente processo 6. A presente acção foi instaurada a 4.5.2007.

    DO DIREITO O discurso jurídico fundamentador em sede de sentença é o que, de seguida, se transcreve: “(..) De acordo com o disposto no art. 3º nº 1, da Lei da Nacionalidade [Lei 37/81, de 3 de Outubro, na redacção da Lei Orgânica 2/2006, de 17/4 (1) ], "O estrangeiro casado há mais de três anos com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração feita na constância do matrimónio.

    " [cfr., em sentido idêntico, o art. 14º nº 1, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo DL 237-A/2006, de 14/12 (2)].

    Esta solução legal inspira-se na protecção do interesse da unidade da nacionalidade familiar.

    O legislador não impõe este princípio da unidade, mas é uma realidade em que se encontra interessado e que por isso promove ou facilita sempre que ela seja igualmente querida pelos interessados.

    Com efeito, o facto relevante para a aquisição da nacionalidade não é o casamento - o estabelecimento de uma relação familiar -, mas a declaração de vontade do estrangeiro que case com um nacional português - cfr., os citados arts. 3º, da Lei da Nacionalidade, e 14º nº 1, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa.

    Como adverte Rui Manuel Moura Ramos, Do Direito Português da Nacionalidade, 1992, pág. 151, "o casamento não é mais do que um pressuposto de facto necessário dessa declaração mas não é ele o elemento determinante da aquisição".

    Assim, no regime da nossa lei, a aquisição da nacionalidade portuguesa pode ter lugar desde que o estrangeiro casado há mais de três anos com nacional português declare, na constância do casamento, que pretende adquirir esta nacionalidade.

    Mas o efeito da aquisição da nacionalidade não se produz inelutavelmente pela simples verificação do facto constitutivo que a lei refere - a manifestação de vontade do interessado.

    De facto, importa também que ocorra uma condição negativa, ou seja, que não haja sido deduzida pelo Ministério Público oposição à aquisição da nacionalidade ou que, tendo-a sido, ela seja considerada judicialmente improcedente.

    A intencionalidade deste instituto é clara: visa evitar a penetração indesejada de elementos que não reúnam os requisitos considerados, por lei, necessários para aquisição da nacionalidade por efeito da vontade, ou seja, que o casamento não seja designadamente um simples meio para a aquisição da nacionalidade portuguesa.

    Estipula o art. 9º, da Lei da Nacionalidade (cfr. em sentido idêntico o art. 56º nº 2, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo DL 237-A/2006), que: "Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa: a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional; b) A condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo legal igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa; c) O exercício de funções públicas sem carácter...

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