Acórdão nº 525/09.2SAGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelCALV
Data da Resolução04 de Maio de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório: I.1.

Em processo comum e perante Tribunal Singular o M.P. deduziu acusação contra: LM..., residente na …, ..., imputando-lhe factos susceptíveis de integrar a prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º, n.º 1, do Cód. Penal, e um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos artigos 153º, n.º 1, e 155º, n.º 1, al. a), do Cód. Penal.

*** 1.2.

O assistente AF...

aderiu à acusação formulada pelo Ministério Público e deduziu ainda o pedido de indemnização civil contra o arguido constante de fls. 117 a 121, peticionando o pagamento do montante total de €10.000,00 a este título.

*** 1.3 Efectuado julgamento, por sentença de 27 de Setembro de 2010 (fls. 171/183) foi decidido:

  1. Condenar o arguido LM... pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143º, n.º 1, do Cód. Penal, na pena parcelar de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, e pela prática de um crime de ameaça agravada previsto e punido pelos artigos 153º, n.º 1, e 155º, n.º 1, al. a), ambos do Cód. Penal, na pena parcelar de 120 (cento e vinte) dias de multa, tudo na pena única de 220 (duzentos e vinte) dias de multa à taxa diária de €10,00 (dez euros), num total assim de €2.200,00 (dois mil e duzentos euros) b) Condenar o demandado civil LM... a pagar ao demandante civil AF... a quantia de €5.000,00 (cinco mil euros) a título de indemnização civil.

    Custas na parte criminal pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) U.C.’s.

    Custas na parte cível pelo demandante e pelo demandado na proporção dos respectivos decaimentos.

    *** I.4.

    Inconformado, com esta decisão, veio o arguido LM..., recorrer da mesma (fls. 185/191, formulando na respectiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): “A)Existe questão prejudicial, do conhecimento funcional do julgador, que obstam ao julgamento do arguido, porquanto no mesmo juízo do mesmo Tribunal a cargo do mesmo magistrado judicial (julgador nestes autos) corre termos o Processo n.º 210/10.2TBGRD, onde é promovido o internamento compulsivo do arguido.

    B)Tendo o julgador comprovadas suspeitas sobre a imputabilidade do arguido, ao ponto de, no mesmo dia do julgamento o mandar conduzir ao hospital para efectuar exames - avaliação clínico-psiquiátrica -, não o poderia ter submetido a julgamento sem, primeiro aguardar pelos resultados de tal avaliação clínica e psiquiátrica, C)Esta questão é sindicável em sede de recurso nos termos previstos no artigo 410° do C. P.C., porquanto o Tribunal (o julgador), fruto do seu conhecimento funcional poderia e deveria ter tomado conhecimento desta questão.

    D)Deve, assim, ser anulado o julgamento e ordenar a baixa do processo à primeira instância para, previamente ao julgamento, se apurar o estado mental do arguido.

    1. A prova produzida nos autos não se nos revela suficiente para a condenação do arguido, sendo formada exclusivamente, a partir das declarações do próprio assistente e os elementos de prova recolhidos, mais não permitiam ao julgador do que sustentar um juízo de dúvida, absolvendo ao arguido em nome do principio constitucional direito penal, do in dúbio pro reo.

      F)As penas aplicadas ao arguido não se mostram justas e adequadas, deparando-se desconformes com os critérios legais e com a justiça devida ao caso concreto.

      G)De acordo com os critérios enunciados no artigo 71° do C. Penal, a pena deveria situar-se muito próxima dos limites mínimos.

      H)Em termos de indemnização cível, os invocados danos não se podem considerar provados e o valor arbitrado, não resulta de qualquer nexo de causalidade entre factos e danos, padecendo, a sentença, neste particular, de contradição, por um lado, e falta de fundamentação, por outro.

      I)A sentença recorrida viola as disposições legais constantes dos artigos 20°, 47º, nº2 e 71° do C. Penal, 97, n° 5, 125°, 127°, 374° n° 2 e 410° do CPP e do artigo 32°, n° 2 da CRP, verificando-se em termos cíveis a violação das normas dos artigos 158° n° 2 do CPC e as regras atinentes 'a responsabilidade civil constantes do artigos 483° e segs. do C. Civil.

      Nestes termos e mais de direito, revogando a douta sentença recorrida e substituindo-a por outra que decrete a anulação do julgamento com a baixa dos à primeira instância para, previamente ao julgamento, se apurar o estado mental do arguido ou que decrete a absolvição do arguido.

      E assim, Vossas Excelências, como sempre, farão JUSTIÇA” *** I.5 Cumprido o art. 413º, nºs 1 e 2 do CPP, o Ministério Público apresentou resposta ao recurso (fls. 197/204), onde pugna pela manutenção da sentença recorrida, formulando as seguintes conclusões (transcrições): “1ª- Face à matéria de facto dada com provada, não merece qualquer reparo a decisão ora em recurso; 2ª- Adere-se, integral e plenamente à decisão ora em recurso, quer no que toca aos argumentos fácticos quer de ius nela explanados, a qual, na nossa opinião, não merece qualquer reparo, encontrando-se exemplarmente trabalhada e fundamentada; 3ª-O arguido praticou os crimes por que foi condenado pelo que se tem, para nós, isenta de reparos e juridicamente inatacável a sua condenação; 4ª- Não se compreende como é que só agora, " in extremis ", o arguido vem alegar que poderá ser inimputável quando se sujeitou a ser julgado e a ser eventualmente condenado, por não ter levantado anteriormente e em sede própria, tal problema, vendo, assim, o seu bom nome e reputação pessoal, profissional, familiar e social serem beliscados; 5ª- Não se aceita, nesta fase, que o presente processo possa ficar dependente de u ma eventual decisão de inimputabilidade do recorrente, decorrente de processo de internamento compulsivo onde ainda não foi realizado o exame às suas faculdades mentais; 6ª- Não se acompanha, pois, neste particular, as motivações do arguido, devolvendo-se-lhe as mesmas; 7ª- Atenta a factualidade dada como provada, entende-se que foi parcimoniosa a pena concreta aplicada ao arguido; 8ª- Também se concorda com o montante fixado a título de indemnização civil; 9ª-Inexistem os vícios apontados pelo arguido na decisão ora em crise; 10°- A sentença ora em recurso não violou as disposições dos art°s 20º, 47º nº 2 e 71° do CPenal, 97° n° 5, 125°, 127°, 374° n° 2 e 410° estes do CPPenal, nem quaisquer outras.

      Termos em que, Deve ser mantida, nos seus precisos termos, a sentença ora em recurso, como é de Justiça e Direito.” *** I.6.

      Por sua vez, o assistente, veio também em resposta ao recurso do arguido (fls. 213), defender a manutenção do decidido, devendo ser julgado improcedente o recurso do arguido.

      I.7.

      Admitido o recurso interposto pelo arguido (fls. 214) e subidos os autos, aquando da vista a que se reporta o art. 416.º do CPP, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta, acompanhando o Digno Magistrado do M.ºP.º da 1.ª instância, emitiu o parecer de fls. 223/226, manifestando-se no sentido da improcedência total do recurso.

      *I.8.

      Cumprido o artº 417.º, n.º 2 do CPP, ninguém veio exercer o seu direito de resposta.

      Colhidos os vistos, foi o processo à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.

      *II. Fundamentação.

      1. Delimitação dos poderes cognitivos do tribunal ad quem e objecto do recurso: É hoje entendimento pacífico que as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso.

      Por isso, temos, como Questões a decidir: Dado que apenas o recurso do arguido foi admitido, importa apenas apreciar as questões suscitadas pelo mesmo e que são: 1- Da questão da imputabilidade ou inimputabilidade do recorrente.

      2- Da factualidade provada. Contradição entre factos provados (als O e P) e não provados (ponto 1). Da insuficiência da matéria de facto para a decisão.

      3- Da medida da pena.

      4 - Do direito á indemnização civil e do seu montante.

      * 2.

      Na sentença recorrida foi considerado, como factos provados, não provados e como motivação da matéria de facto, o seguinte (por transcrição): “

    2. DOS FACTOS 1. FACTUALIDADE PROVADA Discutida a causa, resultaram provados, com relevância para a decisão final, os seguintes factos: A) No dia 9 de Novembro de 2009, pelas 12h55m, no interior do Estabelecimento Comercial “ ...”, nesta cidade da ..., o arguido LM…, sem que nada o fizesse prever, desferiu um murro que atingiu o ofendido AF…, na zona temporal esquerda da cabeça, provocando-lhe dor.

    3. Da conduta referida não resultaram lesões ou seus vestígios.

    4. O arguido LM... agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o intuito concretizado de causar lesões corporais no ofendido AF…, assim o molestando no seu corpo e na sua saúde.

    5. Acresce que, no dia 23 de Novembro de 2009, o arguido perto da residência do ofendido, na Rua …, nesta cidade, dirigiu-lhe as seguintes expressões, em tom de seriedade; “ Vem para a escola que eu já te componho a roupa (…)”, “tens os dias contados, hei-de matar-te”.

    6. O arguido agiu voluntária livre e conscientemente, bem sabendo que as expressões proferidas, revestiam carácter de seriedade e fê-lo com o propósito de provocar medo e inquietação ao ofendido, bem como de lhe prejudicar a sua liberdade de determinação, o que conseguiu.

    7. Sabia igualmente que as suas condutas eram criminalmente puníveis pela lei penal.

    8. O arguido é professor, aufere o rendimento mensal de €2.350,00 fruto do seu trabalho, vive sozinho em casa própria, e tem duas filhas menores, de 15 e 11 anos de idade, contribuindo para o seu sustento com a quantia mensal de €204,00 para cada uma.

    9. O arguido não tem quaisquer antecedentes criminais.

    10. Em consequência da actuação do arguido no dia 9 de Novembro de 2009, AF...sentiu dores e zumbidos durante cerca de 10 dias.

    11. AF...estava na altura a trabalhar na sua tese de...

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