Acórdão nº 1488/08.7GBAGD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Abril de 2011

Magistrado ResponsávelJORGE JACOB
Data da Resolução12 de Abril de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – RELATÓRIO: Nestes autos de processo comum que correram termos pelo Juízo de Instância Criminal da Comarca do Baixo Vouga (Juiz 2), após julgamento com documentação da prova produzida em audiência, foi proferida sentença em que se decidiu nos seguintes termos: (…) Por todo o exposto, operada que se mostra a alteração da qualificação jurídica dos factos, decide-se condenar SS...

como autor material de um crime de ameaça agravada na forma consumada, p. e p. pelo nº 1 do art. 153º e pela al. a) do nº 1 do art. 155º do Código Penal na pena de 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 8,00 (oito euros), perfazendo € 720,00 (setecentos e vinte euros) ou, subsidiariamente, caso não cumpra, na pena de 66 (sessenta e seis) dias de prisão; (…) Pelas razões preventivas que se fazem sentir em face de crimes praticados mediante a utilização de armas de fogo, levando a que mesmo o presente crime de ameaça assuma relevo, pela facilidade na obtenção de armas, potenciando a possibilidade de efectivação do mal futuro cominado, declaro perdidas a favor do Estado as armas e as munições apreendidas (fls. 34 e 35), nos termos do nº 1 do art. 109º do Código Penal.

(…) Inconformado, o arguido interpôs recurso, retirando da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1º - O presente recurso é interposto da sentença que condenou o Arguido pela prática de um crime de ameaça agravado previsto e punido pelos artigos 153 n° 1 e alínea a) do nº 1 do artigo 155° do Código Penal e da decisão constante que declarou perdidas a favor do Estado as armas de caça e munições apreendidas - nÔ 1 do artigo 1090 do mesmo Código.

  1. - O arguido entende ter sido incorrectamente dado como provado o seguinte facto que se transcreve integralmente "O arguido agiu de forma livre e voluntária, com o propósito concretizado de, com a conduta descrita intimidar e amedrontar a TV..., ao ameaçar atentar contra a sua vida provocando-lhe medo e inquietação e prejudicando a sua liberdade de determinação; 3° - Na verdade, se atentarmos nos depoimentos das duas (e únicas) testemunhas da acusação verifica-se que o Tribunal " a quo" não deveria ter dado estes factos por provados e em conformidade deveria ter absolvido o arguido.

  2. - Senão vejamos: a testemunha ZC..., (depoimento gravado em sistema integrado digital do tribunal - 11.23.03 a 11.35.05 e contador do sistema informático do mandatário de 0.00 a 8.45), sogra do arguido, referiu com interesse para o caso o seguinte: A instâncias da Digna Procuradora–Adjunta - respondeu, " Sim e ele devia estar um bocadinho enervado ou qualquer coisa e disse que ia dar um tiro na minha filha e num velho, que ele diz que é um velho. Mas eu de momento receei, contei á minha filha porque receei que ele o fizesse porque tinha armas em casa. Mas ele como nunca foi uma pessoa agressiva ... " M.P.- Portanto, ele nunca foi agressivo? Testemunha- Não, mesmo depois disso, nunca foi agressivo.

    O Meritíssimo Juiz questionou então a testemunha: Mas o arguido tratava mal a filha da senhora de alguma maneira? Chamava-lhe nomes, batia-lhe, havia algum contexto Testemunha - Não, bater-lhe eu tenho ideia que ele nunca lhe bateu.

    Juiz - A senhora já disse que terá proferido esta expressão ... , foi algum nervosismo momentâneo do arguido, ou ele em regra era uma pessoa mais reactiva, que explodia facilmente, que de algum modo reagia perante a presença da filha da senhora com o intuito de a humilhar e tratar mal, ou foi uma coisa naquele momento.

    Test - Eu penso que foi uma coisa de momento.

    Juiz - Desnorteou-se naquele momento, foi assim? Test - Sim.

    Juiz - E na perspectiva da senhora ele disse aquilo que não queria dizer ou que não devia dizer , foi um momento mais nervoso ou ele em regra agia assim para amedrontar a filha da senhora '? Test- Eu penso que aquilo foi uma coisa de momento, que ele reagiu assim, Juiz- Estava de cabeça perdida é assim '? Test- Devia estar.

  3. - Quanto á outra testemunha, TV..., testemunha também arrolada pelo M.P., casada com o arguido á data dos factos referiu o seguinte (depoimento gravado no sistema digital integral do tribunal de 11.32.37 a 11.38.01 e no contador do sistema informático do defensor de 0.00 a 5.24) : Após o Meritíssimo Juiz a ter informado que teria o direito a não prestar declarações, disse: " Eu posso falar, eu pensava que isto já estava arquivado".

    Mais adiante prossegue o depoimento afirmando, após instada pelo Digna representante do M.P. se após os relatos dos factos que a sua mãe lhe transmitiu, se sentiu ameaçada de alguma forma respondeu: - Tive um certo receio só.

    M.P.- Então concretamente teve receio, porquê ? Test- Tive receio porque o ambiente em casa não estava muito favorável e depois como ele disse aquilo á minha mãe e havia armas em casa, eu tive um certo receio mas ...

    Adiante perguntada se o arguido alguma vez tinha sido agressivo para com ela respondeu: " Nunca" .

    ... Eu , no momento, não o estaria a ver a fazer isso, mas tive um certo receio, mas ao mesmo tempo também nunca pensei que ele o fizesse, que o acabasse por fazer, mas ...

    Perguntada se o receio foi mais momentâneo e se assim não fosse se teria voltado a casa e continuado a viver com o arguido respondeu: " Claro que não, se tivesse mesmo medo, nem sequer lá punha mais os pés".

    Juiz- Antes ou depois, o arguido tratava a senhora mal, agredindo-a que verbal quer fisicamente? Enfim, salvo discussões mais acaloradas, mas em termos reiterados ...

    Test- Não.

    Juiz- De habitualmente a tratar de maneira injuriosa, chamar nomes, de a tentar denegrir de forma a fragilizar a senhora, de a assustar, atemorizar no casamento? Test- Não.

    Juiz - Nem verbal, nem fisicamente? Test- Não.

    Juiz- Do tempo em que os senhores, a senhora e seu marido viveram juntos houve algum episódio semelhante a este? Test- Nunca.

    Poder-se-á concluir que a ter proferido estas expressões o arguido agiu de alguma maneira, de cabeça perdida, algo desnorteado, naquele momento só? Test- Sim.

  4. - Ora se atentarmos na fundamentação da matéria de facto constante da douta sentença, refere-se o seguinte: "Tendo o arguido exercido o direito ao silêncio, ZC...relatou os factos em termos coincidentes com o despacho de acusação, esclarecendo contudo, que o arguido, que se encontrava nervoso, num contexto de rotura conjugal, e que terá, no momento, "perdido a cabeça".

    " TV... mostrou não ter conhecimento dos factos, esclarecendo contudo, que o arguido tinha armas, o que fez com que interpretasse a ameaça como séria, ainda que nunca tenha sido maltratada pelo arguido. Atribuiu ainda a conduta a um momento de desnorte, num contexto de mau relacionamento conjugal, e em que o arguido, possivelmente agiu com ciúmes".

  5. _ Mais adiante (página 3 da sentença) refere ainda o Meritíssimo Juiz o seguinte: " Já que no concerne á matéria...

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