Acórdão nº 707/08.4TAMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Abril de 2011

Magistrado ResponsávelARTUR VARGUES
Data da Resolução13 de Abril de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

RECURSO Nº 707/08.4TAMAI.P1 Proc. nº 707/08.4TAMAI, do 3º Juízo Criminal, do Tribunal Judicial de Matosinhos Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I - RELATÓRIO 1. Nos presentes autos com o NUIPC 707/08.4TAMAI, do 3º Juízo Criminal, do Tribunal Judicial de Matosinhos, em processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, foi a arguida B…, por sentença de 09/06/2010, condenada pela prática de dois crimes de difamação qualificada, p. e p. pelos artigos 180º, nº 1 e 184º, ambos do Código Penal, na pena de 120 dias de multa, à razão diária de 10 euros, por cada um deles e, após cúmulo jurídico, na pena única de 180 dias de multa, à mesma razão diária.

  1. A arguida não se conformou com o teor da aludida decisão e dela interpôs recurso.

    2.1 Extraiu a recorrente da motivação as seguintes conclusões (transcrição): 1ª A arguida insurge-se contra a decisão que condenou o seu constituinte, o que fez, por muitas páginas, onde foram vertidas as expressões imputadas de difamatórias.

    1. Os trechos transcritos da peça de alegação de recurso, são consequência e têm urna redacção completa (e não cortada corno está no despacho judicial): "O Tribunal teve dois pesos e duas medidas, o que desde já é de lamentar "E nesta medida, a decisão de que se recorre, não foi séria, constituindo outrossim uma verdadeira desonestidade intelectual".

    2. Percebe-se que são a conclusão de um raciocínio, no âmbito da crítica feita à apreciação da prova e à resposta à matéria de facto.

    3. Em concreto, a arguida, questionou o facto de o Tribunal não ter considerado justificada a falta do arguido C…, pese embora o requerimento de justificação da falta formulada, conforme se verifica da acta de fls.., e, ter considerado justificada a falta da testemunha de acusação D…, que não apresentou qualquer justificação legal, conforme acta de fls.. e, o facto de o depoimento de certa testemunha de acusação (E…) ter sido valorado na decisão, mau grado estar ele (o depoimento) em alegada contradição com o que a mesma (testemunha) havia declarado em sede de inquérito. E que, apesar da manifesta contradição dos depoimentos (em inquérito e em julgamento) o Tribunal, a par de valorar as declarações prestadas na audiência, não ordenou a extracção de certidão para instauração de eventual procedimento criminal, por falsas declarações.

    4. Omissão esta que, contraria o que foi feito pelo mesmo Tribunal em circunstâncias equivalentes (de contradição de depoimento em inquérito e em julgamento), quanto a uma testemunha de defesa (F…).

    5. Foi face a estes factos que, a arguida tirou aquelas conclusões, de que, "O Tribunal teve dois pesos e duas medidas" e "A decisão de que se recorreu constituiu uma desonestidade intelectual".

    6. Há dados que são objectivos.

    7. O primeiro, que o Tribunal mandou tirar certidão para procedimento criminal contra a testemunha de defesa (F…), com aquele fundamento, o que consta da acta.

    8. O segundo, que o Tribunal assim não fez, quanto à tal primeira testemunha de acusação (E…), o que igualmente consta da acta, o que está em contradição com o facto provado sob o n.° 12 da factualidade provada, já que, não foi só nas alegações de recurso que a arguida considerou que deveria ter sido extraída certidão para procedimento criminal por falsas declarações.

      Tal requerimento foi efectuado e consta da acta sem que tenha sido deferido.

    9. Se a arguida entendeu que o depoimento do E… contrariava o que este disse em inquérito, então é legítima a conclusão de que perante idênticas circunstâncias, a acção do Tribunal divergiu, sendo lógico para a arguida que teria havido dois pesos, ou medidas diferentes.

    10. O terceiro dado objectivo, é que o depoimento do E… foi valorado positivamente pelo Tribunal (cf motivação da decisão de facto a fls. 1004 do Acórdão).

    11. O mesmo sucedendo relativamente à justificação das faltas do arguido e da testemunha de acusação referida, ou seja, o Tribunal para idênticas situações decidiu de forma diferente.

    12. Foi por tal divergência de decisões para situações idênticas, no modesto entender da arguida, que esta tenha tido a decisão por intelectualmente desonesta.

    13. Foi este o sentido das expressões conclusivas contidas na acusação e sentença, que só se podem enquadrar na sequência lógica da defesa, com sustentação, e como tal, não a extravasam, nem constituem ofensa aos Senhores Magistrados que proferiram o Acórdão.

    14. No binómio liberdade de expressão - direito à honra, no caso em apreço, a arguida situou-se no âmbito estrito do exercício da liberdade de expressão e direito de defesa, que reconhecidamente, tem um papel essencial na vida pública num Estado de Direito e numa sociedade democrática e pluralista.

    15. O que foi escrito, foi-o com o propósito de se exercer tais direitos e revela-se corno um meio adequado e razoável, do cumprimento do fim que pretendia atingir no caso concreto, havendo que considerar atípicas as expressões que os ofendidos entendem terem ofendido a sua honra e consideração, todas elas, desprovidas de qualquer relevância jurídico-criminal.

    16. As afirmações da arguida não se revelando como absolutamente gratuitas, desproporcionadas, nem ultrapassando manifestamente a necessidade própria do exercício do direito de crítica, de liberdade de expressão e de defesa, não podem deixar de se enquadrar na esfera, da atipicidade, no âmbito do recuo da tutela da honra inerente à discussão jurídica, ou como enquadrando situação de exclusão da ilicitude, ou de causa de não punibilidade.

    17. Não estão verificados os elementos constitutivos, objectivo e subjectivo do tipo legal de difamação, devendo a sentença ser revogada por acórdão que absolva a arguida.

    18. A actuação da arguida não deve ser considerada penalmente ilícita e punível, e como tal deverá ser absolvida.

      Remata impetrando a revogação da sentença recorrida e a prolação de acórdão que absolva a arguida dos crimes por que foi condenada.

  2. Respondeu o Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal a quo à motivação do recurso, pugnando pela sua improcedência, pelos fundamentos constantes das respectivas conclusões, que se transcrevem: a) A arguida B… recorreu da sentença proferida nos presentes autos, alegando violação dos ares 180", 184" 31" do Código Penal e 37° da CRP, pugnando pelo reconhecimento da injustiça da sua condenação; b) Defende-se dizendo que as expressões que utilizara nas alegações de recurso o foram no âmbito da estrita defesa do seu mandante, e no exercício do legítimo direito de crítica à apreciação da prova; Nada disso porém sucedeu.

    1. A arguida agiu com consciência e vontade, proferindo afirmações objectiva e subjectivamente vexatórias, porque atentatórias da honra e brio profissional dos Magistrados judiciais atingidos, cuja independência, imparcialidade e honestidade intelectual manchou; d) Tais expressões não foram, nem eram, necessárias à defesa do seu constituinte, porque não aproveita à defesa dizer que o Tribunal usou de dois pesos e de duas medidas, ou que é intelectualmente desonesto; e) O direito legítimo de crítica e de discordância das decisões judiciais deve pautar-se por um dever de lealdade e de urbanidade que merece especial atenção no Estatuto da Ordem dos Advogados, cujos deveres a arguida conhece e que tão flagrantemente te violou; f) Não há nenhuma causa de exclusão dc ilicitude do comportamento da arguida, designadamente nenhum conflito de deveres ou...

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