Acórdão nº 0975/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Março de 2011

Data24 Março 2011
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, na Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A…, SA, intentou no Tribunal Administrativo Fiscal de Sintra (TAFS) contra B…, acção administrativa especial de contencioso pré-contratual, na qual impugnou o acto de adjudicação, em favor do agrupamento de empresas formado pelas contra-interessadas C…, SA e D…, SA (C…/D…), no âmbito do procedimento concursal número 644/2009, a que respeita o aviso publicado no Diário da República, II Série, nº 144, de 27.7.2009, e que teve por objecto a «Prestação de Serviços e Locação de Viaturas e Equipamentos de Limpeza Urbana e Recolha de RSU no Concelho de Sintra», pedindo a declaração de nulidade ou a anulação da adjudicação e, cumulativamente, a anulação do Acordo Quadro ou outro contrato entretanto celebrado, bem como a condenação da entidade adjudicante a praticar os actos e operações necessárias à reconstituição da situação actual hipotética.

Por sentença de 30.4.10, o TAFS julgou a acção improcedente e absolveu a autoridade demandada, assim como as contra-interessadas, dos pedidos formulados.

Inconformada, a Autora (A.) A… recorreu para o Tribunal Central Administrativo-Sul (TCAS) que, por acórdão de 14.9.10, concedeu provimento ao recurso e anulou o acto impugnado e o Acordo Quadro, celebrado entre a Ré (R.) e as contra-interessadas, condenando a R. a praticar os actos e operações materiais necessárias ao restabelecimento da situação actual hipotética.

E é deste acórdão do TCAS que adjudicatário C…/D…, bem como a R. B… vieram interpor, ao abrigo do art. 150 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), o presente recurso de revista.

O recorrente C…/D… apresentou alegação, com as seguintes conclusões: A) Nos termos do disposto no art.º 668°, nº 1, al. b) do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi art. 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), a sentença (acórdão) é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito da decisão.

B) Esta exigência de "fundamentação", que tem assento constitucional (cfr. art. 205º/1 da CRP), apenas se satisfaz com a indicação das razões de facto e de direito que conduzem o julgador, num raciocínio lógico, a decidir em determinado sentido.

  1. O Douto Acórdão ora recorrido encontra-se absolutamente omisso das razões (itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido) que conduziram o julgador a tomada da decisão nele plasmada.

  2. Nestes termos, o Douto Acórdão recorrido é NULO por ausência total e absoluta de fundamentação.

  3. A questão essencial neste processo de contencioso pré-contratual consiste em apurar se a declaração sobre "revisão de preços" que acompanha e integra a proposta do concorrente Agrupamento C…/D…, ora Recorrente, se circunscreve unicamente aos trabalhos a mais previstos no art. 30º do Caderno de Encargos (CE).

  4. O Douto Acórdão recorrido, no que ao ora Recorrente respeita, limitou-se a concluir que "esse sentido [a não circunscrição da declaração aos trabalhos a mais previstos no art. 30° do CE] é ainda mais patente na proposta do Agrupamento C…/D…" transcrevendo de seguida o conteúdo da declaração.

    G) E mais não diz não se percebendo assim qual o raciocínio lógico-jurídico que permite alcançar, sustentar e fundamentar esta "conclusão".

    H) Pergunta-se: mas como chegou o Tribunal a quo a esta constatação? Quais os critérios que nortearam esta apreciação quantitativa? Qual o processo lógico e racional subjacente a esta conclusão, com base na qual se alterou uma decisão jurisdicional anteriormente proferida? I) Na medida em que o Acórdão recorrido revoga a Sentença anteriormente proferida pelo TAF de Sintra, assume especial relevo a necessidade de se apreender o raciocínio lógico e racional que conduziu a tal decisão e que a sustenta, o qual deve constar de exposição concisa e completa dos motivos de facto bem como das razões de direito que justificam a decisão.

  5. O agrupamento C…/D…, ora Recorrente, tem o direito Constitucional de conhecer e perceber as motivações que conduziram a que o Tribunal a quo concluísse que a sua proposta apresenta um sentido amplo de revisão de preços ainda mais patente do que a proposta do concorrente E…, tendo, apenas fundado nesta conclusão, decidido a exclusão da sua proposta.

  6. A motivação de uma sentença/acórdão deve ser tal que, intraprocessualmente, permita aos sujeitos processuais e ao Tribunal a quem o exame do processo lógico e racional que lhe subjaz; e, extraprocessualmente, a fundamentação deve assegurar, pelo seu contendo, um respeito efectivo do princípio de legalidade na sentença.

  7. O que efectivamente não se verifica com o Douto Acórdão ora recorrido.

    SEM CONCEDER, M) Caso este Venerando Tribunal entenda que a mera constatação do Tribunal a quo de que a proposta do ora Recorrente apresenta um sentido amplo de revisão de preços ainda mais patente do que a proposta do concorrente E… preenche suficiente e adequadamente a exigência Constitucional de fundamentação das decisões judiciais, então sempre o Acórdão recorrido será igualmente NULO, nos termos do art. 668°, nº 1, alínea c) do CPC, aplicável ex vi art. 1° do CPTA, por manifesta contradição lógica no seu "silogismo judiciário".

    N) Toda a decisão judicial é a conclusão de certos pressupostos (de facto e de direito). E porque a decisão incorpora em si e se justifica nos respectivos fundamentos, o erro na avaliação e interpretação dos seus pressupostos atinge a validade da própria decisão, ou seja, inquina o silogismo judiciário.

  8. Este erro é sancionado, pelo art. 668°, nº 1, alínea c) do CPC, com a nulidade da sentença/acórdão.

  9. A nulidade do Douto Acórdão e uma matéria que se integra, com toda a propriedade, no contexto dos pressupostos de cujo preenchimento o art. 150º do CPTA faz depender a admissibilidade do recurso de revista.

    Q) O silogismo judiciário presente no acórdão ora recorrido apresenta erros lógicos na construção dos raciocínios que vão sendo desenvolvidos no processo intelectual de formação da decisão.

  10. Com efeito, o acórdão ora recorrido evidencia uma manifesta contradição entre as premissas consideradas (o conteúdo das "declarações" de revisão de preços dos concorrentes E… e Agrupamento C…/D…) e a conclusão expressa, pois a análise comparativa das declarações, auxiliada e orientada pelo destaque a negrito concedido (no acórdão) ao segmento da declaração do concorrente E… ("bem como para os trabalhos a mais que venham a existir") conduz necessariamente a conclusão contrária aquela que foi escrita, que estaria, concerteza, no espírito do Julgador, pois flui naturalmente do exercício comparativo levado a cabo, mas que, por lapso ou erro (manifesto), acabou por ser erradamente expressa.

  11. Dúvidas não existem que qualquer declaratário normal, medianamente instruído, conclui, da análise das declarações em confronto, que é inegável o sentido amplo da revisão de preços contido na declaração do concorrente E… mas o mesmo já não se verifica na declaração do Agrupamento C…/D…, que se limitou a expressar uma forma de revisão, que tem de ser contextualizada e interpretada no espírito do Caderno de Encargos.

  12. O CE, nos termos da sua cláusula 30ª, sujeita a prestação de "novos serviços" a revisão de preços, sem estabelecer ou fixar os respectivos termos, nomeadamente, o método de cálculo e a periodicidade.

  13. A proposição dos termos da revisão de preços, designadamente, o método de cálculo e a periodicidade, cuja fixação é, nos termos do art. 300º do CCP, imprescindível para a concretização da "revisão", foi deixada aos concorrentes.

    V) O único traço distintivo da "revisão de preços" prevista no art. 30° do CE relativamente a uma "revisão de preços" dita tradicional, reside no âmbito de aplicação e não no modo efectivo da sua concretização.

  14. Pelo que era absolutamente imperioso que a "declaração" de revisão de preços produzida para efeitos do art. 30° do CE propusesse uma concreta fórmula de revisão (o ora Recorrente propôs a taxa de inflação anual, mero IPC anual), propusesse a periodicidade da revisão (o Recorrente propôs revisões anuais), e, por adequação à fórmula proposta, o ora Recorrente considerou o mês de Janeiro como referência temporal para cálculo da revisão, visto os índices IPC anuais serem (em regra) publicados neste mês.

    X) Porque a periodicidade da revisão é anual (a alternativa seria revisões mensais) é necessário ter em consideração os índices IPC anuais relativos a cada ano que antecede a efectiva realização dos trabalhos a mais previstos na cláusula 30ª do CE.

  15. O facto de a referência anual da revisão de preços proposta pelo ora Recorrente ser o mês de Janeiro, tal em nada contende com a contextualização da "declaração" no art. 300 do CE.

    Z) A indicação de um qualquer outro mês, inclusivamente aquele em que tivesse...

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