Acórdão nº 07229/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução17 de Março de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul Vem interposto recurso da sentença do TAC de Lisboa que julgou totalmente improcedente o requerimento cautelar, no qual se pediu: - a suspensão de eficácia dos actos administrativos de autorização de introdução no mercado (AIMs) concedidos pelo Infarmed às contra-interessadas Gl……….. ………. S.R.O., e A……… Produtos Farmacêuticos, SA, incluindo-se a menção de tal suspensão no respectivo website durante o período de vigência do CCP 67 para os medicamentos indicados no requerimento inicial; - que a DGAE na pessoa do requerido MEI, seja intimada a abster-se de, enquanto o CCP 67 estiver em vigor, fixar os PVP requeridos ou a requerer pelas contra-interessadas, suspendendo o respectivo procedimento administrativo ou a abster-se de fixar tais preços sem que essa fixação fique condicionada a apenas entrar em vigor na data em que o CCP caducar, relativamente aos medicamentos indicados sob as designações indicadas ou quaisquer que venham a ser as designações destes medicamentos no futuro.

Em alegações são formuladas as seguintes conclusões: 1. O presente recurso interposto da sentença que decidiu não decretar as medidas cautelares tem efeito suspensivo nos termos dos arts. 143.°, n.º 1 e n.º 2 do CPTA em conjugação com o art. 692.° n.º 3 alínea d) do CPC ex vi 140.° do CPTA. em conformidade, de resto, com o decidido por este Tribunal ad quem em 06.05.2010 (Processo n.º 06058/10)" , e sobe imediatamente e nos próprios autos, nos termos do artigo 147.°, n.º 1 do CPTA.

  1. O Tribunal a quo não considerou todos os factos alegados e relevantes para a apreciação da ameaça aos direitos da Requerente, como o impunha o disposto nos artigos n.°2 do artigo 264°e 511.° do CPC, aplicáveis ex vi artigo 1 ° do CPTA, que assim foram violados.

  2. Baseando-se a presente providência cautelar, nomeadamente, na alegação de que uma AIM e a fixação de um PVP se traduzem no levantamento de barreiras administrativas à violação dos direitos de propriedade industrial ("DPI") da Recorrente emergentes da PT 84569 e do CCP 67, é imprescindível à decisão da causa saber-se se a comercialização dos Genéricos Quetiapina irá violar tais direitos, tendo o Tribunal a quo ignorado os factos essenciais alegados pela Requerente a esse respeito.

  3. Fundando-se na presunção prevista no artigo 98.° do CPI a Recorrente alegou . no requerimento inicial (artigo 66.°) que a Quetiapina usada nos medicamentos Genéricos Quetiapina é produzida pelo processo patenteado pela PT 84569, facto esse que tem manifesto interesse para a decisão da causa, por isso que integra os produtos destes autos no escopo de protecção concedido pela Patente e, posteriormente, pelo CCP e apenas nele poderá assentar qualquer juízo sobre a ameaça de violação dos direitos da Recorrente.

  4. A aplicação da presunção a que se refere do artigo 98.° do CPI depende, para o efeito do ónus da prova relativo à não violação da Patente da Recorrente recair sobre os Requeridos e as Contra-Interessadas, de se concluir que a Quetiapina era um produto novo à data do pedido da Patente ou ao tempo dessa prioridade nos termos da Convenção de Paris, pelo que a novidade do produto Quetiapina, nos termos e para os efeitos artigo 10.° do Código de Propriedade Industrial de 1940, em vigor à data do pedido da Patente, artigos 50.° e 51.° do Código de Propriedade Industrial de 1995, e 55.° e 56.° do Código de 2003 em vigor, constituía igualmente matéria relevante para o juízo sobre a ameaça de violação dos direitos da Recorrente.

  5. Quanto à novidade da Quetiapina alegada nos artigos 11.° a 14.° do Requerimento inicial, encontra-se demonstrado, pelo Doc. 2 junto a esse articulado, que EP ………. foi uma das primeiras referências à Quetiapina, e da conjunção desse Doc.

    2 com o Doc. 3, que tal EP ………. reivindica a mesma prioridade da PT ………., resultando ainda provado no ponto 5 dos factos dados como provados que só em 31.07.1997 é que a Quetiapina foi sintetizada e autorizada a respectiva comercialização.

  6. Constam, pois, do processo elementos de prova (Doc.s 1 a 3) que permitem alterar a decisão quanto à matéria de facto alegada nos artigos 11.° a 14.° do requerimento inicial, dando-a como provada, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 149.° do CPTA (em consonância com o disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 712,° do Código de Processo Civil): A substância Quetiapina foi descrita pela primeira vez na família de patentes derivada do pedido de patente britânica GB 8607684, de 27 de Março de 1986.

    Essa família de patentes inclui, entre outras, a Patente Europeia EP ……… e Patente Portuguesa PT ………..

    De acordo com a enciclopédia clássica "The Merck Index" (14ª Edição, na versão electrónica), as primeiras referências à Quetiapina (Seroquel®) foram as patentes Norte Americana US 4.879.288 e Europeia EP 240.228 8. Caso não seja este o entendimento deste Tribunal ad quem - o que apenas se equaciona para efeitos de raciocínio, sem conceder - face à essencialidade dos factos supra descritos e à deficiência da decisão por não os ter considerado, deverá então concluir-se pela necessidade de ampliação da decisão quanto à matéria de facto (de forma a serem considerados os factos alegados nos artigos 11.° a 14.° do requerimento inicial) e produção de prova testemunhal (em conjugação com a documental já produzida) nesta sede nos termos do disposto no artigo 149.° nº 2 do CPTA, ou, caso não se entenda ser aplicável esta disposição, mediante a anulação oficiosa da decisão e baixa do processo à 1a Instância, para ampliação da decisão quanto aos factos, e produção de prova testemunhal (em conjugação com a documental já produzida), nos termos do disposto no artigo 712.º nº 4 do CPC, aplicável ex vi o disposto no artigo 140.° do Código de Processo Civil.

  7. Uma vez provada a novidade da Quetiapina, porque entre os factos provados não se encontram quaisquer factos relativos ao concreto processo utilizado na obtenção da Quetiapina que compõe os genéricos das Contra-Interessadas, e às suas diferenças quanto ao processo patenteado na PT 84569, tanto bastaria para não se considerar ilidida a presunção prevista no artigo 98.° do CPI, concluindo-se como a Requerente, e ora Recorrente, no artigo 66.° do Requerimento Inicial: a Quetiapina usada nos Genéricos Quetiapina é produzida de acordo com o processo descrito nas reivindicações da PT 84569, e protegido pelo CCP 67.

  8. Com efeito, são absolutamente irrelevantes os factos alegados - e não demonstrados - pelo Infarmed e pelas Contra-Interessadas quanto à existência de outros processos de obtenção da Quetiapina pois tais factos não impedem (nem extinguem) os direitos da ora Recorrente para os quais se mantém aplicável a presunção constante do artigo 98.° do CPI; 11. Se o entendimento expresso em 9 supra não for, porém, o entendimento deste Tribunal ad quem quanto à Contra-Interessada Glenmark- o que apenas se configura para efeitos de raciocínio, sem conceder - e se se entender que deve ser ampliada a decisão de facto após a devida produção de prova testemunhal sobre o alegado pela Contra-Interessada Glenmark nos artigos 44.° a 53.° da sua oposição, e pela ora Recorrente nos artigos 74.° a 79.° da resposta à oposição da Glenmark com a necessária assessoria técnica do Tribunal, nos termos do disposto no artigo 649° do CPC, aplicável por forca do artº 1° do CPTA, deve a mesma ser ordenada e ter lugar nos termos do disposto no nº 2 do artigo 149.° do CPTA ou, caso não se entenda ser aplicável esta disposição, mediante a anulação oficiosa da decisão e baixa do processo à 1a Instância (712° nº 4 do CPC, aplicável ex vi o disposto no artigo 140.° do CPTA).

  9. A sentença recorrida omite qualquer análise dos requisitos da concessão da providência quanto à intimação relativa ao MEI e aos actos a aprovar pela DGAE de aprovação de PVP, não se pronunciando, em consequência, sobre este concreto pedido, o que configura nulidade nos termos do artigo 668.° nº 1. d) que desde já se invoca.

  10. O fumus bonus juris existe, nos presentes autos, no seu mais elevado grau, tendo o tribunal a quo decidido em sentido contrário apenas porque fez erradas assumpções e não identificou correctamente a questão jurídica aqui em discussão.

  11. A questão jurídica que aqui se coloca, é a de saber se, um acto administrativo que concede uma autorização de comercialização de um produto que irá violar uma patente válida e em vigor, é inválido porque ilegal e, por isso, deve ser invalidado pelo tribunal, se for concedido pelo Infarmed - e não, contrariamente ao afirmado pela decisão recorrida, a de saber se o Infarmed seria capaz de facilmente determinar se os medicamentos em causa violam a Patente e o CCP no âmbito de um procedimento de concessão de AIM.

  12. Se o tribunal a quo tivesse correctamente identificado a questão jurídica em discussão, teria concluído, como foi alegado pela Recorrente no requerimento inicial, que as AIMs impugnadas deveriam ser declaradas nulas ao abrigo dos artigos 135." e 133.°, n.º 2 c) e d) do CPA e o ME1 condenado a abster-se de emitir os PVPs, 16. Os actos de concessão de AIM ou de fixação de PVP de um medicamento são actos administrativos cujo objecto é o da viabilização jurídica da actividade de comercialização desse medicamento no território nacional, actividade essa que, doutro modo, estaria interdita ao interessado, decorrendo, além disso, da AIM, a imposição ao seu titular do dever de exercício dessa mesma actividade.

  13. Os direitos de propriedade industrial emergentes de uma patente constituem direitos exclusivos temporários, que se traduzem na proibição legal de qualquer terceiro, sem o consentimento do seu titular, explorar o invento patenteado, por qualquer das formas definidas no artigo 101.° n.º 2.° do CPI, durante o seu período de vigência.

  14. O direito emergente da Patente é um direito fundamental, análogo aos direitos liberdades e garantias, com especifica protecção constitucional, beneficiando do regime constitucional a estes...

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