Acórdão nº 1819/06.4TBMGR.C1.S1. de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Fevereiro de 2011
Magistrado Responsável | FONSECA RAMOS |
Data da Resolução | 22 de Fevereiro de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA e mulher BB, intentaram, pelo Tribunal Judicial da Comarca da Marinha Grande, em 27.9.2006, acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra: 1º Réu – CC 2ºs Réus – DDe mulher EE.
Pedindo que: a) - Seja declarado que o autor-marido, a 1ª Ré e os 2ºs Réus são os únicos herdeiros de FF, aquele nas qualidades de herdeiro legitimário e testamentário e estes tão só na qualidade de herdeiros legitimários, sendo os mesmos habilitados como tal; b)- Seja declarada a nulidade da compra e venda referida nos artigos 17º a 20º da petição inicial; c) - Seja declarado que essa compra e venda dissimulou a doação referida no artigo 24º da petição inicial e, bem assim, que este último acto é válido; d) - Sejam todos os Réus condenados a reconhecer a nulidade da mencionada compra e venda; e) - Sejam todos os Réus condenados a reconhecer que essa compra e venda dissimulou a doação referida no artigo 24º da petição inicial e, bem assim, que este último acto é válido; f) - Seja ordenado o cancelamento das inscrições prediais referidas no artigo 30º da petição inicial, em virtude de terem sido lavradas com base na sobredita compra e venda.
Os autores alegaram, em síntese, o seguinte: A 1ª ré e FF casaram entre si, no regime da comunhão geral de bens e em primeiras núpcias de ambos, no dia 12.12.1955, vindo, todavia, o último a falecer no dia 26.10.2005, no estado de casado com a 1ª ré.
O autor-marido e a segunda ré mulher são os únicos filhos do referido casal.
Os autores casaram entre si, no regime da comunhão de adquiridos, em primeiras núpcias de ambos, no dia 13/08/1988.
Os 2ºs réus casaram entre si, no regime da comunhão geral, em primeiras núpcias de ambos, no dia 24/12/1983.
O referido FF instituiu o autor-marido como herdeiro da quota disponível dos seus bens, por testamento público celebrado em 03/09/99, sendo que a herança aberta por seu óbito ainda não foi partilhada, e que aquele e a 1ª e a 2ª rés são os únicos e universais do mesmo.
O dito FF e a primeira ré eram donos do prédio urbano e dos dois prédios rústicos identificados no art.º 10º da p.i., que são contíguos entre si, em relação aos quais praticaram actos de posse conducentes à aquisição da sua propriedade.
Por escritura pública outorgada no dia 17/08/1983, o referido FF e a 1ª ré declararam vender ao 2º réu-marido, e este declarou comprar-lhes, aqueles referidos prédios pelo preço, que ali declararam já ter recebido, de 100.000$00.
No dia 09/12/1983, para que os referidos prédios entrassem no património comum do casal a constituir, os segundos réus celebraram entre si uma escritura pública de convenção antenupcial, na qual declararam adoptar, para o casamento que entre si iam então contrair, o regime da comunhão geral de bens.
Tais imóveis encontram-se descritos na respectiva Conservatória Predial e aí inscritos a favor do 2º Réu, com base na sobredita compra e venda.
Acontece que, com a celebração da referida escritura de compra e venda, nem o dito FF e a 1ª ré quiseram vender os imóveis ao 2º réu-marido, e nem este pretendeu comprar tais prédios àqueles, sendo o que aqueles, por um lado, e este último, por outro, efectivamente pretenderam com a celebração dessa escritura foi a doação por parte do casal a este, dos três imóveis aí mencionados, não tendo o segundo réu-marido pago àqueles, a título de preço, aquela quantia de 100.000$00, ou sequer qualquer outra importância, os quais, aliás, valiam, então, um preço muito superior àquele que foi declarado.
Pelo que a referida compra e venda dos aludidos prédios consubstancia um negócio simulado e como tal nulo (à luz do art. 240º do Código Civil), sendo que a doação que esteve subjacente a tal negócio configura um negócio dissimulado, e como tal deve ser declarado válido (à luz do art. 241, nº 2, do Código Civil).
Embora todos tenham sido citados para o efeito, só os 2ºs RR. apresentaram contestação.
Nesse articulado, os referidos réus, reconheceram a qualidade de herdeiros da 1ª e da 2ª rés e do próprio Autor e nos termos em que este o peticiona, mas, quanto ao demais, defenderam-se, em síntese, negando o essencial da versão factual vertida pelos AA., e mais concretamente que o contrato de compra e venda acima referido fosse simulado (o qual foi efectivamente real, e nos termos que constam da respectiva escritura), e que o mesmo fosse realizado a coberto de uma doação que os AA. alegam.
Pelo que terminaram pedindo a improcedência da acção, com a sua absolvição dos pedidos.
*** A final foi proferida sentença, que, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu: a) Reconhecer “que o autor-marido, AA a ré CC, a ré EE e marido DD, são os únicos herdeiros de FF, aquele nas qualidades de herdeiro legitimário e testamentário e os demais tão só na qualidade de herdeiros legitimários, assim se reconhecendo habilitados nessas qualidades.” b) Julgar, no mais, “a acção improcedente, absolvendo-se os réus dos pedidos.” *** Inconformados, os AA. dela interpuseram recurso, para o Tribunal da Relação de Coimbra, que, por Acórdão de 14.7.2010 – fls. 390 a 403 verso –, negou provimento ao recurso, confirmando a sentença apelada.
*** De novo inconformados, os Autores recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça, e, alegando, formularam as seguintes conclusões: 1ª. Pelo douto acórdão recorrido foi a apelação julgada improcedente, porquanto, no que para a presente revista importa, entendeu a Relação que do acervo factual tido por assente não resulta preenchido o terceiro requisito da simulação, imposto pelo art. 240º do Código Civil, ou seja, o intuito de enganar terceiros.
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Ora, como decidiu já o Supremo Tribunal de Justiça, “O intuito de enganar terceiros identifica-se com a intenção de criar uma aparência: intenção essa, adita-se, necessariamente revelada pela divergência entre a vontade real e a declarada e pelo acordo que tal determina.
Concertadamente criada aparência não conforme com a realidade, tanto basta para que tenha de...
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