Acórdão nº 0885/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Fevereiro de 2011

Data08 Fevereiro 2011
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A…, já devidamente identificado nos autos, interpõe, para este Supremo Tribunal, ao abrigo do disposto no art. 150º/1 do CPTA, recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido a fls. 230-244, que, negando provimento a recurso jurisdicional, manteve a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente a acção administrativa especial de intimação para a prática de acto devido, prevista no art. 112º do RJUE, que intentou contra a Câmara Municipal de Ponte de Lima.

Apresenta alegações com as seguintes conclusões: I. O prazo de que os serviços do Ministério da Cultura dispunham para se pronunciar no âmbito da consulta que lhe foi feita pela CMPL era de 20 dias e não de 40 dias.

II.

O imóvel (prédio rústico) para o qual foi requerida a informação prévia de uma operação urbanística de loteamento não constitui qualquer imóvel de interesse nacional ou de interesse público, apenas se situando numa pequena parte do mesmo, dentro da zona de protecção de um outro imóvel, esse sim, classificado de imóvel de interesse público (...), sendo que dos polígonos de implantação apresentados para os lotes resulta que nenhuma obra é implantada, sequer, dentro dessa zona de protecção.

III.

A referida norma apenas se refere a obras a introduzir em imóveis de interesse nacional ou de interesse público, sendo que o pedido de informação prévia requerido pelo recorrente não se refere a quaisquer obras, muito menos em qualquer imóvel classificado, antes dizendo respeito a uma operação urbanística de loteamento, que não é mais do que uma operação de fraccionamento ou de divisão fundiária do solo (divisão material da propriedade).

  1. Nada autoriza que se amplie de forma tão ampla o sentido e alcance da norma do art. 13°-A/3 do RJUE, como o fizeram as doutas decisões das instâncias, não apenas considerando que a norma se referia igualmente a obras dentro das zonas de protecção de imóveis classificados, como também que um loteamento constitui uma obra.

  2. Uma coisa é uma obra relativa a um imóvel classificado; outra coisa é uma obra relativa a uma zona de protecção de um imóvel classificado, sendo que o que é classificado é o imóvel e não a zona de protecção, que apenas se destina a estabelecer um perímetro de protecção em redor do imóvel, sem se confundir com aquele.

  3. Nada justifica admitir-se que o legislador disse menos do que aquilo que pretendia ou, pior do que isso, que se expressou mal, sendo que, se tivesse querido consagrar a hipótese referida na douta decisão recorrida, bastaria que na norma do art. 13°-A/3 do RJUE se falasse em “operações urbanísticas”, em vez de “obra” e que se falasse em imóveis classificados e respectivas zonas de protecção em vez de, apenas, imóveis classificados.

  4. Uma operação de loteamento não constitui uma “obra”.

  5. Desde há muitíssimos anos (desde o Decreto-Lei nº 46.673, de 29.11.1965, passando pelos DL. 289/73, de 6.06, 400/ 84, de 31.12, 448/91, de 29.11, até se chegar ao actual RJUE, com as várias versões que já apresentou), que a operação de loteamento é tratada pelo legislador, essencialmente, como uma operação de fraccionamento ou de divisão fundiária da propriedade, que dá origem a lotes destinados à construção.

  6. O conceito de loteamento constante do art. 2°/1) do RJUE, na versão em vigor à data da apresentação do pedido de informação prévia dos autos definia as operações de loteamento como sendo as acções que tenham por objecto ou por efeito a constituição de um ou mais lotes destinados, imediata ou subsequentemente, à edificação urbana e que resulte da divisão de um ou vários prédios ou do seu reparcelamento, nada autorizando, a partir dele, a confusão entre um loteamento e uma obra.

  7. A lei do Património Cultural contém um regime próprio para os imóveis classificados como de interesse nacional ou de interesse público, por um lado, e um regime para as respectivas zonas de protecção, por outro, não sendo legítima a confusão entre eles.

  8. O parecer emitido pelo MC foi emitido e recebido na Câmara Municipal de Ponte de Lima muito para além do prazo de 20 dias de que dispunha para o efeito, e que terminou em 20 de Abril de 2009 (emitiu-o em 29.04.2009 e remeteu-o à CMPL em 5.05.2009) havendo que o considerar, por isso, como parecer concordante, nos termos do art. 13°/5 do RJUE.

  9. A CMPL, para tomar a sua decisão final, dispunha do prazo de 20 dias a contar da data de recepção do último dos pareceres solicitados às entidades exteriores ao Município que tivessem sido consultadas ou do termo do prazo para a obtenção de tais pareceres, o qual terminou em 19 de Maio de 2009, sendo que não emitiu qualquer decisão após a emissão do parecer do MC.

  10. Como a decisão expressa proferida pelo Senhor Vice-Presidente da CMPL de 8.01.2009 foi uma decisão de deferimento condicionada à aprovação do MC, sendo a aprovação deste um facto, há que concluir que a pretensão formulada no procedimento, ou seja, o PIP se encontra deferido expressamente por despacho de 8.01.2009.

  11. Mesmo que porventura assim se não entendesse, sempre o resultado seria o mesmo, pois que sempre se verificaria uma situação de deferimento tácito do PIP, por falta de decisão da CMPL dentro do prazo de 20 dias de que dispunha para o efeito.

  12. O pedido de informação prévia favorável constitui um acto administrativo constitutivo de direitos, nos termos do art. 17° do RJUE, vinculando as entidades competentes na decisão sobre o respectivo pedido de licenciamento da operação de loteamento que com ele seja conforme - como é o caso -, e que com ele se conforme — como é igualmente o caso, tal como se vê.

  13. Perante o PIP apresentado pelo recorrente, e perante o entendimento da CMPL que a mesma respeitava a lei e se justificava o seu deferimento, era obrigatória a consulta externa ao MC no próprio procedimento, em virtude de uma parte do prédio se situar dentro de uma zona de protecção especial de imóvel classificado e em virtude de ocorrer a situação prevista no art. 15° do RJUE.

  14. Neste caso, tanto a CMPL podia consultar primeiro as entidades externas que se tinham de pronunciar (no caso, o MC) e decidir ela própria logo que obtivesse o parecer do MC ou nos 20 dias imediatos ao termo do prazo de 20 dias de que o MC dispunha para se pronunciar, como podia optar por emitir a sua pronúncia, condicionando-a ao sentido do parecer daquela entidade, mas tratando de a consultar de seguida, tendo optado por esta segunda situação.

  15. Tendo consultado no próprio procedimento o MC, a única coisa que ocorreu foi que essa entidade emitiu o seu parecer e remeteu-o à CMPL muito para além do prazo de 20 dias de que dispunha para o efeito, em função do que tem o mesmo de ser havido como parecer favorável.

  16. Não é legítima a consideração de que a CMPL condicionou a sua decisão favorável no PIP ao parecer favorável a emitir pela MC no pedido de licenciamento do loteamento, ou seja, no procedimento que se lhe seguiria, em termos lógicos e temporais.

  17. Nem a CMPL condicionou a sua decisão favorável relativa ao PIP apresentado à obtenção de parecer favorável no pedido de licenciamento do loteamento que se iria seguir, nem o Tribunal podia considerar essa hipótese, ignorando a consulta concreta ao MC que foi feita no próprio PIP, a obrigatoriedade de a fazer, a data concreta da remessa do parecer de tal entidade, nem os efeitos da sua emissão e remessa fora do prazo.

  18. Não se mostra prematura a decisão final do pedido de licenciamento.

  19. No pedido de licenciamento da operação de loteamento apresentado pelo recorrente em 14.09.2009 foi ilegalmente ignorado o acto constituído a seu favor por força da informação prévia favorável obtida.

  20. Só ao cabo de 5 meses após a apresentação de tal pedido e ao cabo de mais de 4 meses após a apresentação de todos os elementos que lhe foram solicitados no procedimento, é que o recorrente foi notificado do despacho do Sr. Vice Presidente da CMPL segundo o qual a operação requerida “pode vir a reunir condições para aprovação ...

    mediante o indispensável parecer favorável do MC”.

  21. Tendo ocorrido a consulta ao MC no processo relativo à informação prévia, tendo em conta que esta informação prévia se tem de considerar concordante com a pretensão formulada, constituindo o pedido de informação prévia favorável um acto constitutivo de direitos e tendo sido apresentado o pedido de loteamento - que respeita integralmente o âmbito da informação prévia dentro do prazo de um ano, não havia - nem há -, que proceder a nova consulta da mesma entidade no respectivo processo de licenciamento do loteamento. (cfr. Fernanda Paula Oliveira, Maria José Castanheira Neves, Dulce Lopes e Fernanda Maçãs, ir Regime Jurídico da Urbanização e Edificação Comentado, 2ª ed., Coimbra, Almedina, 2009, anote. ao art. 17°, p. 231).

  22. Nada justificaria que, sendo a matriz comum de toda a legislação urbanística aprovada e publicada nos últimos anos a simplificação administrativa e a celeridade da decisão administrativa, no âmbito do Programa Simplex 2007, que a mesma entidade tivesse de ser consultada e ouvida duas vezes justamente sobre uma mesma pretensão, ainda que em dois procedimentos de natureza distinta, e ainda por cima depois de a decisão proferida no pedido de informação prévia favorável consubstanciar um acto administrativo constitutivo de direitos e, nessa medida, vincular as entidades competentes na decisão sobre um pedido de licenciamento apresentado dentro do prazo de um ano, nos termos do art. 17°/1 e 2 do RJUE. (cfr., nomeadamente, a 1ª parte do preâmbulo do DL. 555/99, de 16.12 e nota da Presidência do Conselho de Ministros/Gabinete do Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local emanada aquando da publicação da Lei nº. 60/2007, de 4.09., V., igualmente, Pedro Gonçalves, Controlo Prévio das Operações Urbanísticas Após a Reforma Legislativa de 2007, in Direito Regional e Local, nº...

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