Acórdão nº 5398/07.7TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelMOREIRA ALVES
Data da Resolução11 de Janeiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Área Temática: DIREITO CIVIL - DIREITO PROCESSUAL CIVIL Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 221.º, N.º2, 824.º, N.º4. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 888.º (ENTRETANTO REVOGADO PELO DL N.º 180/96, DE 04-07). D.L. 132/93, NA REDACÇÃO DO D.L. 315/98, DE 20-10 (C.P.E.R.E.F.): - ARTIGOS 175.º, 200.º, N.º3.

Sumário : I - A apreciação crítica de um depoimento testemunhal que se julgou insuficiente para afirmar a matéria de facto, que a parte pretende que esse depoimento provaria, situa-se no plano da matéria de facto que o STJ não pode sindicar.

II - Segundo o art. 824.º do CC, no processo de execução, vendidos os bens penhorados, ficam imediatamente extintas as penhoras que sobre eles incidam, transmitindo-se os direitos que lhe são inerentes – no caso, a preferência no pagamento –, para o produto da venda, o que ocorre automaticamente, sem necessidade de qualquer despacho nesse sentido – a penhora traduz-se num direito real de garantia cuja caducidade a lei determina por efeito da venda.

III - Decorre do disposto nos arts. 175.º e 200.º, n.º 3, do CPEREF (DL n.º 132/93, de 23-04, na redacção do DL n.º 315/98, de 20-10) que, após a sentença declaratória da falência, procede-se imediatamente à apreensão de todos os bens susceptíveis de penhora, sendo certo que na graduação de créditos a efectuar no processo de falência não é atendida a preferência resultante da penhora. Tal significa que a apreensão efectuada, no processo de falência, absorve logo as penhoras anteriores que incidam sobre os bens apreendidos, deixando estas de produzir os seus efeitos típicos.

IV - Resulta do art. 888.º do CPC (entretanto revogado pelo DL n.º 180/96, de 04-07) que os direitos de garantia que oneram os bens caducam logo com a venda executiva, por força do n.º 2 do art. 824.º do CC, no sentido de que se transferem para o produto da venda; mas o subsequente cancelamento dos registos carece de despacho judicial a proferir oficiosamente, servindo a certidão de tal despacho de fundamento para o cancelamento dos registos (e, se não for proferido despacho a ordenar o cancelamento, qualquer interessado poderá requerer a prolação desse despacho).

V - O art. 888.º do CPC limita-se a adjectivar o n.º 2 do art. 824.º do CC: a razão de ser do despacho a que se refere o art. 888.º do CPC encontra-se no princípio da legalidade e no princípio da instância registral, mas não tem a ver com a subsistência dos ónus após a venda e antes do cancelamento, até porque este ocorre exactamente porque os ónus se extinguiram prévia e substantivamente, nunca acompanhando os bens vendidos.

VI - Apesar de estar convencionado, num contrato-promessa, que competia à autora avisar a ré, por carta, da data, hora e local da escritura, nada impedia que ela fosse marcada, dentro do prazo estabelecido, por acordo verbal das partes. Tal alteração representa uma estipulação verbal posterior ao contrato-promessa, uma mera cláusula acessória – e não cláusula contrária ou adicional –, em relação à qual não se impõem as razões especiais de segurança jurídica que determinam a exigência de forma escrita para o contrato-promessa relativo a imóveis, e, por conseguinte, é perfeitamente válida como resulta do disposto no art. 221.º, n.º 2, do CC.

Decisão Texto Integral: Relatório*Nas Varas Cíveis do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, AA-D... – Compra, Venda e Administração de Imóveis S.A., intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra BB-A... – PROMOÇÕES IMOBILIÁRIAS S.A.

, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de 250.000€ a título de indemnização (cláusula penal acordada para a hipótese de não haver sinal passado), por esta se ter injustificadamente recusado a celebrar consigo o contrato de compra e venda de 2 imóveis (identificados nos autos), conforme se obrigara mediante prévio contrato-promessa.

*Alegou em fundamento e resumidamente que: - em 09 de Janeiro de 2004, CC licitou e adquiriu, no processo de falência do Hospital Clínico das A..., dois imóveis, tendo depois, por contrato de 26 de Junho de 2006, cedido à Autora a respectiva posição contratual na dita adjudicação; - por contrato de 08 de Maio de 2007, a Autora prometeu vender à Ré, e esta prometeu comprar-lhe, livres de quaisquer ónus ou encargos e devolutos de pessoas e bens, os ditos dois imóveis, pelo preço de € 3.200.000,00, sendo o sinal a prestar de € 1.000.000,00; e, caso esse sinal não fosse prestado, e algumas das partes viesse a incumprir as respectivas obrigações, o valor da indemnização devida à outra parte seria de € 250.000,00: - a Autora, tendo acordado com a Ré que a escritura de compra e venda devida entre ambas seria celebrada na mesma data e em hora imediatamente anterior à que lhe cabia celebrar com a Sr.ª Liquidatária Judicial da falência do Hospital Clínico das A..., Lda, viria a marcá-la para o dia 26 de Julho de 2007, pelas 12.00 horas; - contudo, no dia 23 de Julho de 2007, a Ré comunicar-lhe-ia que não iria outorgar a escritura de compra e venda, sob alegação de que, necessitando de recorrer a um empréstimo bancário para o efeito, o mesmo era-lhe recusado perante a permanência do registo de ónus e encargos sobre os prédios prometidos vender, contrapondo ainda uma redução do preço para € 2.500.000,00; - mercê do exposto, a Autora deu sem efeito a marcação da escritura e prosseguiu negociações com a Ré, com vista a evitar o rompimento do contrato, tendo-se aquela proposto pagar o preço de € 2.700.000,00, o que não aceitou, por entender que, por mera força da prévia aquisição que fizesse à Massa da Falência, os ónus e encargos caducariam automaticamente; - mantendo-se as partes intransigentes nas suas posições, a Autora viria a resolver o contrato por carta remetida à Ré em 24 de Setembro de 2007, tendo por isso direito à indemnização de € 250.000,00 pré-fixada na Cláusula 9a, n° 3 do contrato em causa.

*A Ré contestou, por excepção e por impugnação, e deduziu pedido reconvencional, impetrando a condenação da Autora a pagar-lhe a quantia de € 250.000,00 a título de indemnização pelo incumprimento do contrato celebrado entre ambas, quantia aquela acrescida de juros de mora, calculados à taxa aplicável aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, contados desde a notificação à Autora do seu pedido reconvencional e até integral pagamento. Alegou para o efeito, em síntese: - que só não pagou o sinal acordado de € 1.000.000,00 porque a Autora não conseguiu obter a garantia bancária prevista na Cláusula 5ª e no Anexo V do contrato-promessa celebrado, tendo-se apercebido depois que a mesma não dispunha dos € 1.800.000,00 de que necessitava para previamente os adquirir, pretendendo financiar-se junto de si (assim se explicando que as duas escrituras de compra e venda tivessem que ser celebradas na mesma data, em actos imediatamente subsequentes); - que, não implicando a prévia aquisição a realizar pela Autora a automática inexistência de ónus ou encargos, como a mesma passara a sustentar, esteve na disposição de manter o acordado, mediante redução do preço (primeiro para € 2.500.000,00, e depois para 2.700.000,00), o que aquela não aceitou; - que, por carta de 17 de Setembro de 2007, interpelou a Autora a marcar a escritura de compra e venda até 04 de Outubro de 2007, sob pena de perda de interesse na aquisição dos imóveis, só então recebendo a carta daquela, de 24 de Setembro de 2007, imputando-lhe o incumprimento do contrato e resolvendo o mesmo; - que a Autora viria, porém, no dia imediatamente a seguir, 25 de Setembro de 2007, a comprar os dois imóveis à Massa Falida e, em acto imediatamente subsequente, vendê-los a terceiros, pelo preço global de € 2.400.000,00, com registo de ónus e encargos, que se mantinha em 21 de Dezembro de 2007.

Já em sede de fundamentação do pedido reconvencional, a Ré, alegando que cabia à Autora proceder à marcação da escritura de compra e venda devida entre ambas, e nunca o tendo feito, vendendo inclusivamente a terceiros os imóveis que lhe tinha prometido alienar, defendeu ter a mesma incumprido o contrato subscrito, pedindo por isso a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 250.000,00, a título de indemnização.

*A Autora replicou, pedindo que se julgasse a reconvenção improcedente, por não provada, e a exigência formalizada no pedido reconvencional como consubstanciando um abuso de direito, ou como não sendo devida, por a Ré não ter tido qualquer prejuízo com o incumprimento contratual que lhe imputou Alegou para o efeito e em síntese: - ter a Ré aceite fazer a escritura de compra e venda dos dois imóveis com os ónus que impendiam sobre eles ainda registados, porque sabia que iriam caducar quando fossem previamente adquiridos por si à Massa Falida, sendo que só com o envio, em 17 de Julho de 2007, da documentação necessária à marcação das escrituras, a Ré se apercebeu que, a aqui Autora, iria ter um proveito no negócio de € 1.400.000,00 (já que compraria à Massa Falida por € 1.800.000,00, e lhe venderia por € 3.200.000,00); - só então a Ré passou a obstacular a realização da escritura, agendada para 26 de Julho de 2007, admitindo celebrá-la mas apenas pelo preço de € 2.500.000,00 (pretendendo dividir em seu proveito o lucro do negócio que naquela altura conhecera), tendo consciência de que lhe seria difícil à A, pelo menos a curto prazo, obter um financiamento para pagar o preço à Massa Falida; - que o contrato prometido só não foi concretizado porque a Ré, após ter acordado que as duas escrituras de compra e venda (pela Autora à Massa Falida, e pela Ré à Autora) se realizassem em simultâneo, levando a que ela própria não se financiasse para aquele efeito, se recusou depois a cumprir o acordado, pretextando que os ónus que impediam sobre os prédios não tinham sido previamente cancelados, sendo que os conhecia antes e que sabia que caducariam automaticamente com a primeira venda.

Defendeu, por...

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