Acórdão nº 0715/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Janeiro de 2011
Magistrado Responsável | ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 11 de Janeiro de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
1.1. A…, identificado nos autos, propôs acção ordinária contra o Estado Português, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 460.878,00, a título de indemnização pela frustração dos rendimentos que lhe advinham da exploração de uma pedreira em local que passou a integrar o perímetro do Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios de Ourém/Torres Novas, do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros.
Alega em fundamento do pedido deduzido, em síntese útil, que iniciou a exploração da pedreira em 1987, mantendo-a nos exactos limites da exploração preexistente, exclusivamente dela retirando o seu sustento e o do seu agregado familiar, até que de tal foi impedido em consequência da inclusão do prédio no perímetro antes indicado.
1.2. Por despacho saneador, fls. 90/92, começou a acção por ser julgada improcedente, com base na natureza legislativa do acto que o Autor elege como causa dos danos, já que o artigo 9º do Decreto-Lei n.º 48051 se referiria, exclusivamente, a actos administrativos.
Esse despacho foi revogado pelo acórdão deste Tribunal de fls. 146 e ss, que decidiu que não havia razão para, sem mais indagações, julgar a acção improcedente.
1.3. A tramitação da acção prosseguiu vindo o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra a proferir a sentença de fls. 298-307, pela qual a acção foi julgada improcedente.
1.4. Inconformado, o autor interpõe o presente recurso, em cujas alegações conclui: «1) O Mmo Juiz “a quo” não devia ter julgado improcedente o pedido por inexistência de dano indemnizável; 2) Ao invés do que sustenta o Mmo Juiz “a quo”, estamos perante uma situação especial e anormal que merece a tutela do direito por forma a reparar os danos sofridos pelo recorrente decorrentes da actuação do Estado; 3) A proibição imposta pelo Monumento Natural Pegadas Dinossáurio Ourém causou ao recorrente um dano de gravidade e intensidade tais que torna injusta a sua não equiparação à expropriação para o efeito de lhe dever ser paga uma indemnização; 4) E uma das situações que, por via da gravidade e da intensidade dos danos, produz na esfera jurídica dos particulares, impõe o pagamento de uma indemnização é aquela em que um DR posterior vai retirar eficácia a uma exploração de pedreira preexistente dos solos constantes dessa área protegida; 5) A douta sentença recorrida viola, entre outras, as normas insertas no art. 9º do DL 48051 de 21-11-67, isto porque 6) já Tribunal Constitucional no seu acórdão n.º 329/99 de 20-7-1999 considerou que o direito a ser indemnizado podia fazer-se decorrer do art. 9° do DL 48051 de 27-11-67, que deve ser interpretado à luz do art. 22° da CRP não pode deixar de impor ao Estado o dever de indemnizar o particular que se viu “expropriado” de faculdades ou direitos que antes lhe foram validamente reconhecidos.
7) A decisão recorrida padece pois do vício de violação de lei por desrespeito às normas legais aplicáveis ao presente caso.
8) E por ter sido proferida em violação aos princípios constitucionais relevantes em matéria de direito de propriedade privada, nomeadamente os constantes dos arts. 62° e 22° da CRP.» 1.5. O Estado, pelo Ministério Público, alegou em contrário, concluindo: «1ª- Para haver indemnização ao abrigo do art. 9° nº 2, do Decreto-Lei n° 48.051, de 1967.11.21, tem de ocorrer um sacrifício especial e anormal, isto é, um sacrifício que não seja imposto à generalidade das pessoas, mas a pessoa certa e determinada em razão de uma posição só dela, e que não possa considerar-se um risco normalmente suportado por todos em virtude da vida em colectividade.
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- Por outro lado, aquele sacrifício há-de ser certo, actual (não eventual) e duradouro.
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- “Apenas estão sujeitas a indemnização as disposições dos planos urbanísticos que provoquem danos na esfera jurídica dos particulares, lesando as suas posições subjectivas...” (Ac. do STA, de 2000.01.13, Proc. n° 044287).
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- Ora, o Autor, à data da publicação do Decreto Regulamentar n° 12/96 (22 de Outubro), que criou o “Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios de Ourém/Torres Novas, não era titular do direito a explorar a pedreira no seu prédio incluído no perímetro delimitado por aquele monumento.
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- Por isso, como se diz na douta sentença recorrida, “...
o acto normativo de criação do Parque Natural das Pegadas de Dinossáurios de Ourém/Torres Novas não privou o Autor de qualquer faculdade ou direito que anteriormente se haja constituído, de forma válida, na sua esfera jurídica, pelo que não infligiu dano susceptível de indemnização”.
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- Por outro lado, não ficou demonstrado que a criação do Monumento Natural foi causa adequada de danos imprevisíveis e anormais, como exige o n° 1 do art° 9° do DL 48.051, de 21/11/1967».
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
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2.1.1. A sentença julgou, em sede de matéria de facto: «De acordo com os documentos junto e não impugnados, que se dão por integralmente reproduzidos, nos locais onde se citam, resultando dos articulados, admitidos por acordo das partes, julgam-se provados os seguintes factos, com interesse para a questão a decidir, que correspondem à matéria considerada assente em sede do despacho saneador: A. O prédio rústico denominado “…”, composto por terra pedregueira, com 2400 m2, sito na Freguesia de Nossa Senhora das Misericórdias, concelho de Ourém, a confrontar do norte e nascente com estrada, sul e poente com baldio, encontra-se inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 11.177 e descrito na CRP de Ourém sob o n.º 01725, a favor do Autor A…, em 14-11-95 (cfr. Certidão de teor a fls. 11 e v°, dos autos); B. O referido prédio foi adquirido pelo Autor, por escritura de compra e venda celebrada em 31 de Agosto de 1995 (fls. 12 a 15 dos autos); C. O prédio acima identificado veio a ser inserido no perímetro do Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios de Ourém, do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, criado pelo Dec. Reg. n.° 12/96, de 22/10; D. O Autor apresentou, em 06-11-86, a declaração de início de actividade - extracção de calcário - como empresário em nome individual, na Repartição de Finanças de Vila Nova de Ourém (fls. 19 e 20 dos autos); E. O Autor, em 28-12-1998, apresentou na Delegação Regional de Lisboa, da Direcção-Geral da Indústria, Ministério de Indústria e Comércio, a ficha de estabelecimento industrial, mencionado como actividade principal a extracção de calcário (fls. 22 e 22 v.° dos autos): F. No dia 16 de Outubro de 1997, foi elaborado pelo Instituto de Conservação da Natureza o auto de notícia, cuja cópia constitui fls. 26 dos autos, e ao Autor foi aplicada uma coima no valor de Esc.: 100.000$00, pelo facto de ter procedido à alteração da morfologia do solo e do coberto vegetal mediante o desmonte de pedra para transformação de calçada (...) no prédio identificado na alínea A) (fls. 24/31 dos autos); Do relatório pericial e em função dos depoimentos prestados na audiência de discussão e julgamento foram considerados provados os seguintes factos: 1. O prédio rústico identificado na alínea “A” dos factos assentes, existe e era explorado como pedreira, desde há mais de 20 anos, tendo o Autor, após o haver adquirido, continuado a sua exploração; 2. O Autor começou a explorar o prédio referido em “A” desde o início de 1987, tendo-o adquirido por o mesmo ser propício à extracção de calcário, e se encontrar inserido numa zona onde já existiam outras explorações de pedreira; 3. O Autor declarou o início da actividade de exploração de pedreira, nos termos que constam dos pontos D) e E) da matéria assente, na pedreira já existente, mencionada no artigo 1.º desta base e explorada pelo anterior proprietário; 4. A Área real do prédio identificado na alínea A, calculada em Março de 2001, é de 2680 m2, tendo a pedreira nele existente a volumetria de 6816 m3; 5. O Autor extraía desta pedreira um metro cúbico e pedra calcária por dia; 6. O metro cúbito da pedra calcária tem o valor de €69,83; 7. A referida pedreira funcionou regularmente, sendo extraída pedra pelo Autor; 8. O Autor também retirava desta exploração o seu sustento e o do seu agregado familiar; 9. O Autor iria trabalhar na extracção de pedra, nesta pedreira, até aos 65 anos de idade.» 2.1.2. O recorrente, no corpo das alegações, aponta o seguinte: «A sentença recorrida padece de erro material, porquanto, na Fundamentação da mesma, na alínea E., consta o seguinte: “O Autor, em 28-12-1998, apresentou na Delegação Regional de Lisboa da Direcção-Geral da Indústria, Ministério de Indústria e Comércio, a ficha de estabelecimento industrial, mencionando como actividade principal a extracção de calcário o oficio”, quando deveria antes constar 28-12-1988, erro material que se repete no 1º parágrafo da página 7 da decisão, quando o tribunal refere que o Autor, em 28/12/1998, apresentou na Delegação Regional de Lisboa da Direcção-Geral da Indústria, Ministério de Indústria e Comércio, a ficha de estabelecimento industrial, mencionando como actividade principal a extracção de calcário”, quando deveria antes constar 28-12-1988, isto porque o documento junto como Doc. 5 do Autor (fls. 22 e 22v.º dos autos), tem aposto no verso um carimbo de entrada com a data 1988 DEZ. 28.
Assim, a sentença recorrida sofre de erro material pois o juiz “a quo” quando escreveu 28/12/1998, deveria antes ter-se escrito, 28/12/1988, devendo ser reparado tal erro na alínea E) dos factos provados e no primeiro parágrafo da página sete da sentença recorrida.
Estes dois erros materiais devem ser rectificados, nos termos do disposto nos artigos 666.° e 667.°, n.º 2 do CC».
O recorrente tem razão. Conforme o documento que menciona, a data que deve constar é de 28.12.1988, tratando-se de erro de escrita a indicação do ano de 1998.
Assim será considerado neste acórdão.
2.2.1. O ora recorrente intenta efectivação de responsabilidade civil do Estado no quadro do artigo 9.º, n.º 1, do DL n.º 48051, de 21...
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