Acórdão nº 153/06.4TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA VASCONCELOS
Data da Resolução13 de Janeiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1) - A lesão da personalidade é, em princípio, ilícita.

2) - Para a apreciação do grau de ilicitude deve ser ajuizado, em concreto, o modo como for feita a publicação da imagem ou a revelação dos factos da vida privada.

3) - O direito à honra é uma das mais importantes concretizações da tutela da privacidade e do pudor e do direito da personalidade.

4) - Só deve considerar-se ofensivo da honra e consideração de outrem aquilo que, razoavelmente, isto é, segundo a sã opinião das pessoas de bem, deverá considerar-se ofensivo daqueles valores individuais.

5) - A dignidade das pessoas exige que lhe seja reconhecido um espaço de privacidade em que possam estar à vontade, ao abrigo da curiosidade dos outros.

6) - A reserva da privacidade deve ser considerada a regra e não a excepção.

7) - O direito à privacidade só pode ser licitamente agredido quando – e só quando – um interesse público superior o exija, em termos tais que o contrário possa ser causa de danos gravíssimos para a comunidade; 8) - O direito à privacidade colide frequentemente com o direito à liberdade de expressão, principalmente com da liberdade de imprensa.

9) - Quando o interesse público o imponha, o direito à honra e à privacidade não podem impedir a revelação daquilo que for estritamente necessário e apenas no que for estritamente necessário.

10) - Qualquer pessoa tem o direito de exigir que o conhecimento da sua situação de presidiária seja apenas conhecida pelas pessoas que necessariamente e inevitavelmente tomaram contacto com ela como actores de factos relacionados com a prisão e não seja publicitada para além desse círculo de pessoas.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Em 05.12.29, nas Varas Cíveis de Lisboa, AA e BB, a primeira, por si, e ambos, em representação da filha menor CC, vieram instaurar a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário contra DD Lisboa - Edição e Distribuição, SA, EE, FF e GG pedindo que - se decretasse a apreensão de todos os exemplares do nº 143 da revista Pais e Filhos, de propriedade da ré DD Lisboa, SA, ainda encontrados por vender; - se condenasse as rés no pagamento às autoras, a título de compensação pelos graves danos morais causados, de toda a importância resultante da venda dos vários exemplares do nº 143 da revista em causa vendidos, fixada em quantia nunca inferior a 25.000,00 euros alegando em resumo, que - a autora CC é filha da autora AA e de BB; - em Novembro de 2002, a autora AA encontrava-se preventivamente presa no Estabelecimento Prisional de Tires, na zona designada por "Casa das M....", na companhia da autora CC, sua filha menor; - nessas circunstâncias de tempo e lugar compareceu a ré GG que fotografou ambas as autoras; - a autora AA foi surpreendida pelas fotografias que foram feitas por essa ré, tendo comunicado à mesma que não autorizava e que se opunha a qualquer exposição ou publicação das fotografias porventura feitas; - no número 143 da revista mensal "Pais & Filhos", edição de Dezembro de 2002, páginas 72 a 76, foi publicado um artigo intitulado “Casa das M.... - Presos por amor", da autoria da ré EE, onde aparecem fotografias, em que as autoras são identificáveis, acompanhadas de texto conotado com o tráfico de drogas e a prática de crimes, de forma lesiva dos seus direitos de personalidade; - nem a autora AA nem o BB deram consentimento ou autorização para a feitura de qualquer fotografia da autora CC ou para a exposição ou publicação de qualquer fotografia da mesma porventura feita; - as autoras sentiram-se lesadas na sua imagem, honra e consideração social com a publicação do artigo em causa e com a apresentação das fotografias das mesmas, no contexto em que se inserem, onde as autoras são perfeitamente identificáveis a partir das fotografias em referência, com evidentes efeitos negativos; - a revista em causa é propriedade da ré DD, que a edita, redige e administra, sendo dirigida pela ré EE; - qualquer das rés actuou em vista à projecção da importância da revista e à obtenção de obter ganho económico resultante da venda dos 31.500 exemplares da tiragem do seu nº 143, sem se importarem com o prejuízo para a imagem, a honra e a consideração das autoras que daí resultassem.

Contestando e também em resumo, as rés alegaram - a falta interesse em agir por parte das autoras; - prescrição do direito de indemnização que invocaram; - que a autora AA consentiu expressamente na obtenção e publicação das fotografias em causa, relativamente à sua pessoa, assim como à da sua filha; - que não vislumbram que com a publicação da reportagem e fotografias em apreço tenha resultado qualquer consequência negativa ou dano à imagem das autoras, não sendo a conduta das rés minimamente censurável ou ilícita.

As Varas Cíveis de Lisboa consideraram-se incompetentes em razão do território, ordenando a remessa dos autos aos Juízos Cíveis de Oeiras, por serem os competentes.

Nestes, foi proferido despacho saneador onde, além do mais, se julgou improcedente a excepção da prescrição em relação ao direito invocado pela autora CC e se relegou para final o conhecimento da mesma excepção em relação à autora AA.

No mesmo despacho, foi fixada a matéria assente e elaborada a base instrutória.

Foi realizada audiência de discussão e julgamento.

Em 09.10.02, foi proferida sentença em que se julgou a acção improcedente, por o direito invocado pela autora AA se encontrar prescrito e o direito invocado pela autora CC não se ter provado.

As autoras apelaram, sem êxito, pois a Relação de Lisboa, por acórdão de 10.06.01, confirmou a decisão recorrida.

Novamente inconformadas, as autoras deduziram a presente revista, apresentando as respectivas alegações e conclusões.

Os recorridos contra alegaram, pugnando pela manutenção do acórdão recorrido.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

As questões Tendo em conta que - o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso - arts. 684º, nº3 e 690º do Código de Processo Civil; - nos recursos se apreciam questões e não razões; - os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido são os seguintes os temas das questões propostas para resolução: A) – Prescrição; B) – Indemnização.

Os factos São os seguintes os factos que foram dados como provados nas instâncias:

  1. A 2ª Autora nasceu a 14 de Setembro de 2002 (aI. A) dos Factos Assentes).

  2. A 2ª Autora é filha da Autora e de BB (al. B) dos Factos Assentes).

  3. Em Novembro de 2002, a Autora encontrava-se preventivamente presa no Estabelecimento Prisional de Tires, na zona designada por "Casa das M....", na companhia da 2a Autora (al. C) dos Factos Assentes).

  4. Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em C), compareceu a 4ª Ré, que fotografou ambas as Autoras (aI. D) dos Factos Assentes).

  5. Nenhuma das Rés comunicou a BB a pretensão de fotografar a 2ª Autora ou de expor a...

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