Acórdão nº 01P2751 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Fevereiro de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelLEAL HENRIQUES
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2002
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. No Círculo Criminal de Almada responderam os arguidos A e B, ambos melhor id. nos autos, sob a acusação de haverem cometido, o primeiro, um crime de homicídio p. e p. pelo art.º 131º do C.P. e o segundo um crime de favorecimento pessoal, p. e p. pelo art.º 367º, n.º 1, do mesmo diploma legal, vindo o primeiro a ser condenado na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, sendo o último absolvido. O arguido A foi ainda condenado, e solidariamente o Estado Português (dada a condição de agente da P.S.P. do arguido), nas indemnizações de 110.000$00 a C, e de 4.500.000$00 à assistente D, respectivamente irmã e mãe da vítima E, com juros à taxa legal até integral pagamento. Inconformada, interpôs a assistente D recurso da decisão condenatória para este Supremo Tribunal de Justiça, motivando-o para concluir deste modo: - «os factos considerados provados, permitem-nos discordar com a qualificação atribuída ao dolo ínsito na actuação do arguido, ao perpetrar o crime de homicídio, p. e p. pelo art.º 131º do C. Penal. - Não se tratando de mero dolo eventual, mas sim de dolo necessário. - Já que "a verificação do dolo necessário resulta bem evidenciado se se mostra provado que o arguido agiu livre e conscientemente, admitindo que da sua conduta resultava a finação da vida do ofendido e bem sabendo que o seu comportamento era contrário à lei" (Ac. S.T.J. de 26.03.92, Proc.º n.º 42497). - O douto acórdão recorrido considerou provados todos estes elementos, essenciais à qualificação do dolo necessário, pelo que não pode depois atribuir-lhe uma mera qualificação de dolo eventual, retirando daí ilacções sem qualquer suporte factual e intelectual. - Pelo que a pena de 3 anos suspensa pelo período de 3 anos, não é concernente com o crime de homicídio praticado pelo arguido, p. e p. pelo art.º 131º do C. Penal. - Devendo ao mesmo ser aplicada uma pena de prisão efectiva, que se situe nos 10 anos, sem qualquer outra atenuação especial. - Sendo o agente do crime, agente da P.S.P., deve ainda este ser expulso das suas funções, pelas necessidades de prevenção geral e especial, que cabem ao caso, atentos todos os factos provados pelo douto acórdão recorrido. - Os valores atribuídos à assistente, pela perda do direito à vida de um filho de 17 anos e pelo sofrimento de ambos, que são indemnizáveis, com base na responsabilidade por facto ilícito, são de todo desajustados por insuficientes e considerados ofensivos pela não valorização da vida humana. - A recorrente não prescinde pois dos valores peticionados, no total de 10.100.000$00, pela dor e sofrimento da perda do filho, pelo sofrimento deste e pela perda do direito à vida. - Sendo o valor de 4.500.000$00 manifestamente insuficiente, não dignificando a vida humana, nem desincentivando actos dolosos como o do arguido. - O qual, ao exercício de funções da P.S.P., torna o Estado Português solidariamente responsável pelos actos ilícitos que praticou. - Cabendo, pois, a modificação da pena de prisão a aplicar ao arguido. - Alterando-se também o quantum indemnizatório fixado à ora recorrente. - A não ser assim, ter-se-ão por violadas, em nosso entender, as normas dos art.ºs 131º, 14º, 71º, 72º e 129º, todos do C. Penal e ainda as normas dos art.ºs 483º, n.º 1, 496º, 497º, 562º e 563º, todos do C.Civil.» Contra-motivou o recorrido A para assim concluir: - «O arguido A, foi acusado da autoria material de um crime de homicídio p. e p. pelo art.º 131º do CP. - O arguido foi condenado, no acórdão recorrido, como autor material de um crime de homicídio p. e p. pelo art.º 131º do CP. na pena especialmente atenuada de 3 anos de prisão. - Nos termos do art.º 50º do C. Penal foi determinada a suspensão da execução pelo período de 3 anos. - (...) No seu recurso, a assistente D, não se conformou com o acórdão recorrido, nomeadamente no que concerne à medida da pena e ao quantum indemnizatório. - O tribunal formulou a sua convicção, relativamente à factualidade provada e não provada, na análise conjunta dos depoimentos das testemunhas, valorados em função da sua maior ou menor coerência e segurança, nas declarações dos arguidos, na prova documental e, por fim, na prova pericial constantes dos autos. - Cumpre mencionar que a assistente no seu recurso faz menção de factos que qualifica como provados e que, na realidade não fazem parte da matéria de facto dada como provada na tentativa de fundamentar o seu próprio recurso. - O tribunal "a quo", atenta a imagem global transmitida pelos factos provados, ponderado todo o circunstancialismo que envolveu a actuação do arguido e a sua culpa reportada ao caso concreto e, sem deixar de ter em consideração os pressupostos que determinam a necessidade da pena, entendeu que a moldura penal correspondente ao tipo de ilícito em causa seria desajustada. - (...) Não nos podemos alhear do facto de a actuação do arguido, agente da PSP, ocorrer durante uma perseguição policial para captura de um suspeito de crime com antecedentes criminais e considerado de alguma perigosidade. - E que no decurso de tal perseguição o mesmo desobedeceu a advertências constantes e traduzidas pelos sucessivos tiros disparados para o ar . - Não se pode ignorar, igualmente, que os factos passaram-se de noite, com condições de visibilidade reduzida e num terreno que apresentava acentuado declive e arbustos susceptíveis de ocultar uma pessoa. - Note-se ainda, que atentas as considerações feitas em relação ao terreno e condições de iluminação, o disparo foi efectuado a uma distância não concretamente apurada mas que se situa entre os 30 a 50 metros. - Feitas estas considerações, importa referir que o tribunal "a quo", entendeu imputar ao arguido a prática do tipo de ilícito em causa, a título de dolo, na modalidade de dolo eventual. - O dolo eventual existe quando o agente actua sem dirigir a sua actividade à produção de um facto, nem o representa como consequência necessária mas, apenas, possível. - O arguido, ao disparar sobre o corpo da vítima não pretendia causar-lhe a morte nem representou a morte como consequência necessária desse disparo, confiando que o resultado não se chegaria a produzir . - A determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção. - Um dos princípios basilares do actual Código Penal reside na compreensão de que toda a pena tem de ter como suporte axiológico-normativo uma culpa concreta, assim, o princípio da culpa significa não só que não há pena sem culpa, mas também que a culpa decide da medida da pena. - O instituto da atenuação especial da pena decorre da necessidade de reconhecer que existem circunstâncias que diminuem de forma acentuada as exigências de punição de um facto. - Entre as circunstâncias que desencadeiam tal procedimento contam-se ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados, conforme o art.º 73°, n° 2 al. d) do CP. - (...) Tal demonstração foi clara e inequívoca pela forma de comportamento logo após a produção do evento, isto é, o arguido ao aperceber-se das consequências do disparo, exteriorizou o seu desespero, tendo, logo de...

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