Acórdão nº 06A017 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Março de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFERNANDES MAGALHÃES
Data da Resolução07 de Março de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA "AA" intentou acção ordinária contra o Estado Português pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 101.914,05€ e juros a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais por injustificadamente lhe terem sido impostas medidas de coacção em processo-crime em que foi constituído arguido.

O processo correu seus termos com contestação do Réu e resposta do Autor, vindo após audiência de julgamento a ser proferida sentença a julgar a acção procedente em parte e a condenar o Réu a pagar ao Autor 65.911,86€ (55.708,44€ + 8.703,42€ + 1.500,00€) a título de danos patrimoniais, sendo que desta quantia ao valor de 64.411,86€ (55.708,44€ + 8.703,42€) haverá que deduzir-se o que o Autor descontaria se os houvesse percebido no tempo próprio; e 20.000,00€ a título de danos não patrimoniais; e ainda juros moratórios à taxa legal sobre o quantitativo líquido relativo aos danos patrimoniais, desde a data da citação (17/10/2002) até efectivo pagamento.

Inconformado com tal decisão dela interpôs o Réu recurso de apelação com êxito, proferindo o Tribunal da Relação acórdão a julgar a acção improcedente.

Recorreu agora de revista o Autor formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: «(...) A) O Tribunal da Relação não alterou a factualidade considerada provada pelo tribunal de 1° instância no sentido de o Autor ter sido alvo de medidas de coacção inadequadas e desproporcionadas; B) Tais medidas foram aplicadas no início de um processo de inquérito sobre a actuação do Autor enquanto médico e apesar de o inquérito ter sido mandar arquivar pelo MP 23 dias depois, por inexistência de indícios seguros da prática dos crimes, foram as mesmas mantidas por ordem do Mm° Juiz; C) Impossibilitado de exercer a sua profissão, foi afastado das suas funções como presidente do Conselho de Administração do Centro de Saúde de Vila do Porto, que só veio a retomar em Julho de 2000, sendo evidente o nexo de causalidade entre as medidas e os prejuízos sofridos pelo Autor D) O artigo 22° da CRP abrange as hipóteses de responsabilidade por actos lícitos incluindo a responsabilidade por facto da função jurisdicional traduzido em acção ou omissão; E) Essa responsabilização não se limita, de forma alguma, aos casos previstos no artigo 27°, n° 5 da CRP; F) Quer o artigo 22° quer o artigo 27° da CRP são normas exequíveis independentemente da criação de legislação ordinária específica de desenvolvimento dessas normas constitucionais; G) O ordenamento positivo português contempla já a consagração do princípio geral da obrigação de indemnização dos cidadãos pelo Estado por actos materialmente lícitos que tenham àqueles causado encargos ou prejuízos especiais e anormais, aplicável às decisões jurisdicionais, por recurso directo ao artigo 90 do Decreto-Lei n° 48051, pela sua aplicação por analogia, ou por criação, pelo intérprete, de uma norma dentro do espírito do sistema (artigo 10°, n°s 2 e 3 do Código Civil), conforme entendimento de significativa corrente jurisprudencial do Supremo Tribunal de Justiça.

H) No caso sub judicio, a aplicação das medidas de coacção acima referidas significaram para o Autor, ora recorrente, pesadas consequências, cuja factualidade foi fixada na 1ª instância sem alteração pelo Tribunal da Relação; l) Apesar de a Relação ter, na sua decisão, sopesado o facto de uma decisão que vem apenas posteriormente a parecer errada, não o parecer na altura da respectiva assunção, não se debruçou sobre as condições factuais concretas da manutenção das medidas de coacção ao longo do período em que o Autor as sofreu quando já nada indicava que elas se justificavam nem sobre o peso insuportável das mesmas na sua carreira de médico e dos efeitos na sua imagem face à comunidade onde vive e exerce a sua profissão; J) A prova produzida no tribunal de 1ª instância criou a convicção no tribunal, não abalada em sede de recurso, da justeza da pretensão do Autor, conduzindo o Exm° Magistrado que proferiu a sentença a caracterizar as medidas de coacção tomadas como tendo acarretado graves e injustas consequências materiais e morais cujo cálculo se encontra justificado na referida sentença.

Assim, deve ser revogado o Acórdão recorrido por incorrecta interpretação dos factos e do direito, confirmando-se a interpretação e aplicação de direito efectuada pelo tribunal da 1ª instância.

» Corridos os vistos, cumpre decidir.

É a seguinte a matéria de facto provada: «O Tribunal da Comarca de Vila do Porto dera como provada, com relevo para a decisão, a seguinte matéria de facto não modificada pela Relação e, como tal, a considerar para a subsunção jurídica.

  1. O autor exerce funções como médico de clínica geral em Vila do Porto, desde 1982. (A1.A) Factos Assentes) b) Por despacho do Governo Regional, de 25 de Março de 1988, com efeitos a partir de 1 de Abril de 1998, foi nomeado, em comissão de serviço, presidente do Conselho de Administração do Centro de Saúde de Vila do Porto. (A1.B) Factos Assentes) c) Na sequência de queixa apresentada, foi instaurado um processo de inquérito (n.°1/99) na Delegação da Procuradoria de Vila do Porto contra o autor no âmbito do qual este prestou termo de identidade e residência. (A1.C) Factos Assentes).

  2. Por despacho de 2 de Junho de 1999, o Mm.° Juiz de Vila do Porto considerou que havia indícios da prática, pelo menos, de um homicídio negligente...

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