Acórdão nº 10494/01 de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Junho de 2005

Magistrado ResponsávelCristina dos Santos
Data da Resolução02 de Junho de 2005
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

António ......, com os sinais nos autos, vem impugnar o despacho proferido em 11.AGO.2000 de Sua Exa. o Secretário de Estado da Justiça, que indeferiu o recurso hierárquico por si interposto contra o despacho de 24.MAR.2000 proferido pelo Director Geral dos Registos e Notariado que nomeou Elsa ......na categoria de 2º ajudante da 2ª CR Predial de Aveiro, concluindo como segue: 1 A autoridade recorrida invoca que não procedeu à audiência dos interessados, ao abrigo da ai. a) do n.° 1 do art.° t03.° do CPA, porque o provimento seria urgente dadas as necessidades de serviço.

2 Porém, este juízo de urgência deve ser fundamentado com a indicação dos factos que determinam não apenas esse carácter de urgência, como também deve indicar as razões pelas quais a audiência não pode ser realizada no prazo mínimo da lei, sendo que só mediante o cumprimento destas exigências se pode restringir um princípio que já foi considerado, por muitos, como uma "pequena grande revolução" na actuação administrativa.

3 No vertente caso a administração limitou-se a uma fundamentação genérica relativamente à suposta urgência, fazendo apelo à necessidade de serviço (fórmula genérica, conclusiva tipo passe partout, criticada por exemplo no Ac. TP de 17/3/93 ao referir "...deve enunciar expressamente os motivos de facto e de direito, não podendo contentar-se em meros juízos conclusivos, com a reprodução da fatispecie legal, com fórmulas "passe partout" ou simples afirmações vagas e genéricas.") não adiantando, ademais, as concretas razões pelas quais a audiência não pode ser realizada no prazo mínimo.

4 Ademais, constata-se que a autoridade recorrida faz um uso sistemático da excepção da urgência neste tipo de concursos, conforme atesta uma certidão junta aos autos, pois aos 885 concursos desenvolvidos tio primeiro semestre de 2000 foi atribuído o carácter de urgência.

5 Como é consabido, as excepções aos princípios devem funcionar como forma de os adequar a casos específicos, sempre que públicos interesses, como é o caso de um qualquer interesse público especifico e concreto, o justifiquem e não de forma sistemática como é manifestamente o caso vertente.

6 Temos assim que, em resenha, sendo a justificação do carácter de urgência genérica e não tendo sido adiantadas quaisquer razões concretas que justifiquem a não realização da audiência no prazo mínimo legai, essa motivação não justifica, no caso concreto, a excepção invocada pela administração a que se refere o art. 103/» do CPA e a preterição do princípio da audiência e, como tal, o acto recorrido sofre de vício de forma por preterição de formalidade essencial.

7 Também se poderá concluir que a aplicação da excepção constante no art. 103.° do CPA a todos os concursos públicos de serviços de notariado e registos, incluindo o presente concurso, revela uma interpretação deste normativo que, ao fazer da excepção regra e do princípio excepção, afronta não só o princípio da participação enquanto princípio jurídico consagrado na lei procedimental administrativa como também afronta o mesmo princípio no seu alcance e dignidade constitucionais - Cf r. art. 8.° do CPA e 267.° n.° 4 da Constituição da República Portuguesa, quando, agravadamente, o que se sabe é que todos os normativos devem ser interpretados à luz dos princípios e em conformidade com a lei fundamental.

8 Ainda a propósito da violação da formalidade essencial constante do art. 100,° do CPA, o recorrido invoca que, mesmo que tivesse Ocorrido a sobredita violação da formalidade essencial - o que indicia que tem consciência da verificação da mesma - teria sempre de se considerar que a mesma não determinaria a anulação do acto, por aplicação do princípio do aproveitamento do acto administrativo.

9 No tocante à preterição da audiência dos interessados, em geral, poderá concluir-se que se esta formalidade pudesse influenciar o conteúdo da decisão administrativa, quer através de esclarecimentos prestados, quer pela invocação de elementos de direito erroneamente ponderados e aplicados na decisão, não se poderá fazer uso do princípio do aproveitamento do acto administrativo.

10 Reportando-nos agora ao presente caso, temos que o recorrente poderia ter sido chamado a atenção da autoridade administrativa para o facto de a concorrente provida não preencher um dos requisitos de que dependia a sua participação no concurso público em questão, ou seja, não tem, pelo menos, três anos de "bom e efectivo serviço prestado em repartição da mesma espécie da do lugar vago, conforme exige o n.° 2 do art. 108.° do Decreto Regulamentar n.° 55/88. aplicável ao concurso em causa, tudo isto para além de outros erros nos pressupostos de facto da decisão, como melhor se verá infra.

11 A propósito da invocada violação de lei por erro nos pressupostos, o parecer dos serviços que fundamentou a proposta de decisão conclui que os candidatos n.° 3 e 5 (escriturários superiores) e 2, 8 e 16 (2.°s ajudantes) encontram-se em igualdade de condições legais, nos termos do nº 2.° do art.

109.° do Decreto Regulamentar n.° 55/89, de 08/10, conjugado com o art. 2 do Decreto-Lei n.° 52/89 de 22/02 (despacho n.° 28/97, publicado no BRN n. 8/97).

12 Contudo, quer os factos assentes, quer os dispositivos legais mencionados não permitem retirar a conclusão inserida no parecer, que fundamentou a decisão administrativa, em causa, ou seja, não permitem concluir pela igualdade de condições entre os escriturários superiores e 2.ós ajudantes que cumpram os requisitos negativos consignados no n,° 2 do art. 109.° do Decreto regulamentar supra mencionado.

13 A ratio legis do art. 109.° do Decreto Regulamentar n.° 55/80 é de atribuir preferência legal aos escriturários superiores sobre os 2.°s ajudantes, apenas quando estes tenham menor experiência profissional, apesar de exercerem funções idênticas às do lugar para que concorrem.

14 Ora, mediante uma interpretação a contrario da norma em questão, temos que verificados os requisitos da antiguidade de funções dos segundos ajudantes e do Bom serviço prestado, os mesmos passam a gozar de preferência legal sobre os escriturários superiores.

15 Ou ainda sob outro enfoque, mediante uma interpretação sistemática do art. 109.° e do 110.° do Decreto Regulamentar n.° 55/80, importa concluir que o legislador consagrou, isso sim, uma preferência legal para os ajudantes de categoria igual à do lugar vago, pelo facto destes exercerem as mesmas funções durante 5 ou mais anos e terem dado provas de que as exerceram bem (mediante a classificação de Bom), tudo como sucedeu na situação de que se trata.

16 Sendo assim que o acto recorrido enferma de vicio de violação de lei por erro, aliás patente, nos seus pressupostos.

17 Adernais, ainda que o recorrente e a candidata nomeada devessem considerar-se em igualdade de condições legais - o que não é o caso -, a verdade é que segundo o critério adoptado pela administração (maior antiguidade) o recorrente continuava a ter preferência legal.

18 Isto porque o critério da maior antiguidade na categoria, refere-se às .categorias que serviram de titulo habilitante aos concorrentes para serem oponentes ao respectivo concurso, só podendo averiguar-se qual dos concorrentes tem maior antiguidade na carreira ou na função pública quando aqueles detenham a mesma antiguidade nas respectivas categorias, 19 Sendo assim, o critério utilizado pela autoridade recorrida para fundar a decisão recorrida - a maior antiguidade na função pública - viola manifestamente o art. 37.° do DL 204/98 de 11/07, o qual determina que em caso de igualdade de classificação em concursos internos preferem, sucessivamente, o candidato mais antigo na categoria, na carreira e na função pública.

20 Sendo pois e assim que, também por este motivo, o acto recorrido enferma de vício de violação de lei por erro nos seus pressupostos.

21 Por último, e este é o vício mais grave da decisão ora recorrida, pois determinaria que a concorrente vencedora não se poderia sequer ter habilitado ao concurso, cumpre referir que a funcionária nomeada deveria ter três anos de bom serviço da mesma espécie da do lugar vago - conforme exige o art. 108.° do Decreto Regulamentar, com as alterações introduzidas pelo Dec.Lei n° 52/89, de 22 de Fevereiro.

22 Porém, o que se constata de facto, é que a funcionária nomeada tem apenas a classificação de Bom desde 31/12/97. não reunindo assim os requisitos legais exigidos para concorrer ao lugar em causa.

23 Mas o mais espantoso é que a autoridade recorrida, não obstante ter-se apercebido do erro nos pressupostos da sua decisão, procurou fundamentar este erro, no parecer da DGRN, da seguinte forma : "O citado normativo não comporta, de forma alguma a interpretação de que a ausência de nota, possa considerar-se inferior a Bom".

24 De facto esta argumentação não têm qualquer suporte legai, pois que o n.° 2 do art. 83.° do Decreto Regulamentar n.° 55/80, aplicável à categoria de 2.°s ajudantes pelo art. 116.° do mesmo diploma, determina que os funcionários, que pretendam exercer algum direito que dependa da prévia existência de classificação de serviço, devem requerer a sua classificação ao respectivo serviço, sob pena de o direito que invocam ficar suspenso até que a referida classificação seja realizada.

25 Assim, esta norma consagra uma espécie de ónus que impõe aos funcionários a obrigação de requererem a fiscalização do seu serviço, quando pretendam invocar um benefício que se funde numa determinada classificação do seu desempenho profissional.

26 Pelo que, também por aqui, o acto recorrido padece de vicio de violação de lei, por afronta ao disposto nos art.s 108.° e 109.°, n.° 2 e 83.°, n.° 2 do Decreto Regulamentar n.° 55/80.

* A AR contra-alegou, concluindo como segue:

a) A fundamentação da inexistência da audiência dos interessados encontra-se plasmada no parecer da O.G.R.N. de 23.03.00 (fls. 60 do processo instrutor) afigurando-se como suficiente.

b) Uma decisão urgente não carece de observar o estatuído no art° 100° do...

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